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terça-feira, 14 de maio de 2019

Young Marble Giants – “Colossal Youth” (1980)



“Lá vem os jovens gigantes de mármore/
Trazendo anzóis na palma da mão.”
Renato Russo
da música “L’Age D’Or”, 
da Legião Urbana, de 1992

A história do rock é escrita por linhas tortas. Aliás, não poderia ser diferente em se tratando do gênero mais subversivo da história da arte musical. Seria superficial traçar um caminho direto que fosse de Berry-Elvis nos anos 50, Beatles-Stones-Velvet-Floyd nos 60, Led-Sabbath-Bowie-Pistols nos 70 e U2-Prince-Madonna-Metallica nos 80, chegando aos 90 da Nirvana-Beck-Radiohead. Às vezes, trabalhos distintos surgem para riscar um traço transversal no mapa do rock, demarcando algo novo e que se incluirá nessa linha evolutiva, influenciando artistas que virão dali para frente. Ou o que mais seria a Can, intersecção entre a psicodelia dos anos 60 e o krautcock alemão, que alimentaria as cabeças da galera da britpop dos 90? Ou Grace Jones, que, no início dos 80, se pôs entre o reggae jamaicano e a new wave para apontar rumos ao pop que viria logo em seguida?

Um desses acidentes altamente influentes na trajetória rock é a Young Marble Giants, trio indie galês que, com um único disco, “Colossal Youth”, lançado pelo icônico selo Rough Trade, em 1980, foi capaz de abrir caminho para toda uma geração influenciada pelos acordes básicos do punk mas, naquele início de década, já desejosa de uma maior leveza pop – a qual os punks, definitivamente, não entregavam em seu grito de protesto. Era o chamado pós-punk, subgênero a que a YMG é considerada precursora. Motivos para esse apontamento existem, haja vista as marcas que a música da banda deixou em ícones como R.E.M., 10.000 Maniacs, Everything But the Girl, Nirvana, Massive Attack, Air e MGMT.

E o mais legal: a YMG fez tudo isso se valendo do mínimo. O som é calcado em um riff de guitarra, base de baixo, teclados econômicos, leve percussão eletrônica e voz. Dito assim parece simplório. Mas aí é que começam as particularidades da banda. Não se trata de apenas uma voz, mas sim o belo canto de Alison Statton em inspiradíssimas melodias vocais. Os riffs, geralmente tirados da guitarra ou dos teclados de Stuart Moxham, cabeça do grupo, são bastante inventivos. Curtos, mas inteligentes, certeiros. As bases de baixo do irmão de Stuart, Phillip, seguem a linha minimalista assim como as programações rítmicas, as quais cumprem sempre um papel essencial em termos de harmonia e texturas.

"Searching for Mr. Right", que abre “Colossal...”, de cara apresenta isso: um reggae estilizado em que baixo e guitarra funcionam em complemento fazendo a cama para um vocal doce e cantarolável. Já o country rock "Include Me Out" lembra o som que outra banda britânica da Rough Trade faria alguns anos deli e se tornaria famosa: uma tal de The Smiths.

O estilo sóbrio e produzido com exatidão dá ao som da YMG uma aura de art rock, lembrando o minimalismo da The Residents mas sem o tom sombrio ou da Throbbing Gristle sem a dureza do industrial rock. Pelo contrário: a sonoridade é delicada e lírica. Até mesmo quando namoram com a dissonância, como em “The Man Amplifier” e na ótima “Wurlitzer Jukebox”, a intenção soa melodiosa.

A lista de fãs da YMG impressiona pela quantidade de ilustres. Kurt Cobain e Courtney Love, especialmente, teceram os maiores elogios aos galeses, revelando o quanto os influenciaram. ”Music for Evenings" e “Constantly Changing” deixam isso bem claro no estilo de compor, tanto no riff da guitarra, na função contrapositiva do baixo e na melodia de voz. Mas a que deixa a reverência do casal Cobain/Love mais evidente é "Credit in the Straight World", das melhores do disco e que traz todas as características do que tanto Nirvana quanto Hole produziriam anos mais tarde. Tanto é que a Hole fez-lhe uma versão em 1994, no seu exitoso disco de estreia “Live Through This”. Se o Pixies é “a banda que inventou o Nirvana”, "Credit...”, da YMG, pode ser considerada a música que cumpriu esse papel gerativo da principal banda do grunge.

A influência da YMG, no entanto, não termina aí. Percebem-se em outras faixas de “Colossal...” o quanto previram tendências do rock, que se revelariam somente mais adiante. As instrumentais “The Tax” e “Wind in the Rigging” lembram o gothic punk minimalista que Steve Severin e Robert Smith fariam no icônico “Blue Sunshine”, de três anos depois (assim como “Colossal...”, o único disco da The Glove); “Choci loni” e “N.I.T.A.” antecipam ideias da Cocteau Twins de “Treasure”, de 1984, e da Air de “Moon Safari”, de 1998; "Eating Noddemix" é tudo que a Frente!, banda dos anos 90, queria ter feito; “Violet”, maior sucesso da Hole, poderia ser denunciada como plágio de "Brand - New - Life"; e até mesmo no Brasil a bossa nova pós-punk da Fellini traz muito da construção melódica da YMG.

A considerar o hermetismo de P.I.L, Joy Division e The Pop Group, a pegada avant-garde de Polyrock e Gang of Four, a guinada para o reggae/ska da segunda fase The Clash ou a preferência synth de Suicide e New Order, a YMG pode ser considerada, sim, a precursora do pós-punk tal como este gênero ficou conhecido. Eles conseguiram unir todas essas forças sonoras advindas com o punk e a new wave e sintetizá-las de forma concisa e pop. Como que com “anzóis na palma da mão” muito bem arremessados, os“Jovens Gigantes de Mármore” lançaram ao longe as linhas que fariam içar uma série de outros organismos vivos do rock nas décadas subsequentes, marcando, com sua simplicidade e criatividade, o pop-rock até hoje. Linhas estas, aliás, tortas, evidentemente.

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FAIXAS:
1.    "Searching for Mr. Right" – 3:03
2.    "Include Me Out" – 2:01
3.    "The Taxi" – 2:07
4.    "Eating Noddemix" (Phillip Moxham/ Alison Statton) – 2:04
5.    "Constantly Changing" – 2:04
6.    "N.I.T.A." – 3:31
7.    "Colossal Youth" – 1:54
8.    "Music for Evenings" – 3:02
9.    "The Man Amplifier" – 3:15
10.  "Choci Loni" (Moxham/ Moxham) – 2:37
11.  "Wurlitzer Jukebox" – 2:45
12.  "Salad Days" (Moxham/ Statton) – 2:01
13.  "Credit in the Straight World" – 2:29
14.  "Brand - New - Life" – 2:55
15.  "Wind in the Rigging" – 2:25
Todas as músicas de autoria de Stuart Moxham, exceto indicadas.

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OUÇA O DISCO:


Daniel Rodrigues

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Cocteau Twins – “Blue Bell Knoll” (1986)



Duas variações da capa do álbum
"Quando você morrer, e, em seguida,
abrir os olhos, se não estiver tocando ao fundo essa música,
provavelmente você está indo para o lugar errado."
Robert Christgau,
crítico musical
sobre “Blue Bell Knoll”





Era uma vez uma falange de anjos que, de saco cheio da exigência de serem angelicais o tempo todo, se revoltaram e desceram dos Céus. Desafiadores, eles vieram cair na Terra de propósito, justo neste planetinha atrasado dentre os tantos bilhões que podiam escolher na galáxia. Claro que foi, justamente, para desafiar as divindades. Se aqui achariam a inveja, a tristeza, a ganância, a incompreensão, a violência, era exatamente onde suas almas jovens e rebeldes queriam ficar. Como filhos desgarrados que precisavam se autoafirmar, puseram toda a revolta para fora. E como se não bastasse, inventaram de formar uma banda de rock, para desespero dos santos. Queriam seguir Lúcifer e não o chato do Gabriel. Assombro geral no firmamento.

No começo, foi o punk. Jogaram fora as auréolas e trajaram roupas de segunda mão rasgadas e sujas. Muito couro duro e escuro; nada de sedas leves e brancas como antes. Na música que criavam, todo esse inconformismo era transmitido na forma de depressão. Compunham canções soturnas, carregadas, chorosas, em que a guitarra mais parecia gemer pedindo clemência. O baixo, grave em sonoridade e intenção, e a bateria, marcada, repetindo uma interminável marcha fúnebre. Eram chamados não apenas de punks, mas de gothic-punks, ou seja, os punks de espírito dark. E na voz da anja, dor. Muita beleza e afinação divina. Mas dolorida. Gravaram o primeiro disco assim, em 1982, chamado “Garlands”, onde descarregaram as mágoas e aflições que vinham guardando desde casa, quando romperam com o Pai em busca do reconhecimento de si mesmos.

Acontece que uma vez anjo, sempre anjo. Os desgarrados, à medida que iam produzindo, iam também, pouco a pouco, amenizando a raiva. E, não coincidentemente, voltando a serem cada vez mais angelicais. O bom “Head Over Heells”, segundo deles, de um ano depois, é o meio termo entre esses dois polos de estado evolutivo. Avançam mais um pouco no sentido da suavização e chegam já praticamente renovados no referencial "Treasure", de 1984, que, embora lírico, ainda guarda um pouco da densidade dark dos anos iniciais. Já com as asas de volta, depois do astral “Victorialand” (1986), atingem o ápice da manifestação de suas almas celestiais com “Blue Bell Knoll”. Os querubins em questão são Elizabeth Fraser (voz), Robin Guthrie (guitarras, teclados) e Simon Raymonde (baixo): os escoceses do Cocteau Twins.

Maduros tecnicamente e afeitos aos estúdios da 4AD, eles mesmos produzem um álbum altamente delicado e sofisticado, bastante marcado pelas texturas espaciais dos teclados e pelas programações de ritmo. É assim que começa a faixa-título, numa das aberturas de disco mais belas da discografia do pop britânico dos anos 80: um ataque de teclados que lembra o som de cravo junto com a guitarra e bateria só no bumbo e chipô. Camadas sonoras preenchem o espaço. Não demora, subindo um tom, entra a deslumbrante voz de Liz Fraser articulando de improviso a letra em cima de uma melodia vocal. Já começa nesse nível. Em seguida, a bonita “Athol-Brose” antecipa uma das melhores do disco: “Carolyn’s Fingers”, encantadora, que, se for considerar o tema, essa tal Carolyn deve realmente ter dedos mágicos. Brit-pop clássico, com a tradicional batida funkeada em tempo 2/3, mas com o também tradicional riff twiniano. E o mais relevante: Liz Fraser dando um show de vocal, adicionando uma carga erudita ao pop-rock como poucas vezes se tinha visto. Deste jeito, jamais.

Guthrie, um guitarrista de qualidade, como boa parte de sua geração (Will SergeantBarney SumnerDaniel Ashirmãos Reid) não chegava aos pés em técnica de um Jimmy PageEric Clapton ou um Jeff Beck (no pós-punk, não raro o baixista era mais hábil que o guitarrista na banda). Porém, sua criatividade para compor e aproveitar os recursos sensoriais e de textura que as cordas lhe proporcionam é gigantesco. Foi a mente inventiva e observadora de Guthrie que cunhou uma rica assinatura melódica para a banda. Ele sintetizou uma espécie de “base de riffs” para o Cocteau Twins, a qual transmite, em notas geralmente de som cintilante, exatamente esse espírito suave e etéreo que lhes é característico. Trata-se de uma combinação de notas em tempo 7/7 que se assemelha ao andamento de uma valsa mas que, avaliando bem, é bastante hipnótica visto sua estrutura cíclica em arpejo. Com essa base, Guthrie é capaz de criar infinitos riffs, infinitas combinações valendo-se da variação de tom, das texturas, dos arranjos, dos timbres e por aí vai. Como um pintor que se vale das mesmas tintas para pintar quadros diferentes. É tão inteligente e marcante que pode até nem conter todas as 7 notas (6, 5 ou até 4 apenas), mas percebe-se o mesmo esqueleto ao se ouvir. O que apareceu pela primeira vez em 1983, na linda “Sugar Hiccup” (e que já vinha sendo já largamente usada por eles, basta ouvir “Pandora”, do “Treasure”, ou várias de “Victorialand”), é claramente repetido em “Carolyn’s Fingers”, na melodiosa "Suckling the Mender", cujo arranjo vocal do refrão a faz ganhar cores orientais, e em "Spooning Good Singing Gum", outra linda, que chega a pôr o ouvinte para voar.

O estilo Ethereal criado pelos Twins, impressionista e sofisticado, é fruto de uma improvável mescla de pós-punk, ambient music, new age, folclore celta e música barroco-renascentista, Isso é evidente em "The Itchy Glowbo Blow" e noutra balada, "A Kissed Out Red Floatboat", com seus sons espaciais e um lindo refrão, onde Liz, em overdub, põe o tom lá em cima. “Ella Megalast Burls Forever” é outra magnífica balada que evoca, aliás, tanto o sentido moderno do termo (canção sentimental em andamento lento) quanto sua acepção primeira, medieva, de uma forma de poesia lírica em estrofes. Chega a ser litúrgica de tão elevada, pois faz vir à mente suntuosas igrejas em que o som se propaga às alturas. Os ecos, as sobreposições e os contracantos só fazem aumentar essa sensação.

A voz de Liz Fraser, aliás, é um caso à parte. Ela não ficou conhecida no meio pop-rock alternativo como “a voz de Deus” por acaso. Talvez a melhor pupila de Cathy Barberian – mas também bastante inspirada em Meredith Monk, Joni Mitchell e nos intrincados arranjos de voz de Philip Glass – Liz foi, desde o início dos Twins, o maior destaque da banda. Soprano – diferente de Barberian, uma mezzo –, foi aperfeiçoando a técnica e soltando seu canto até chegar ao status que adquiriu. A capacidade de alcance dos agudos e a fluência pelas escalas são típicas de uma voz treinada e, acima de tudo, emocionalmente livre. “Cico Buff”, balada ambient muito terna, e "For Phoebe Still a Baby", cheia dos ornamentos vocais, foram escritas para que ela as conduzisse. Até o conteúdo do que ela canta tem sentido superior quando cria melismas e inventa palavras ininteligíveis e sem sentido semântico nenhum, apenas experenciando a musicalidade da pronúncia e dos encadeamentos. Não é possível – nem necessário – entender o significado, pois a música é sentida na essência, e essa é a própria concretização da linguagem universal da arte musical. Provavelmente, seja esse o idioma dos anjos.

Depois de “Blue...”, a sina desses anjos na Terra permaneceu no caminho de iluminação e de cores, influenciando diretamente bandas como Lush, Stereolab, My Bloody Valentine, The Cranberries, The Moon Seven Times, entre outras. Nos anos seguintes, vieram os também ótimos “Heaven or Las Vegas” (1990, considerado para muitos o melhor do grupo), “Four-Calendar Café” (1993) e “Milk & Kisses” (1998), este, o último antes da dissolução após apenas nove discos de estúdio (contando com o em parceria com o compositor vanguardista Harold Budd, “The Moon & The Melodies”, de 1986).

Nessa trajetória, eles viram que tinham razão quando se autoexpurgaram, pois o mundo precisa, sim, de um pouco de Satanás para sair do conformismo e quebrar barreiras. O Diabo, afinal, é o pai do rock. Mas compreenderam, igualmente, que havia uma inquestionável beleza naquilo que Gabriel representava – e que ele não era o chato como eles pintavam. Foi em “Blue Bell Knoll” que aprenderam isso e a não fugirem de seus próprios destinos, e que aceitar e elaborar suas próprias naturezas era o caminho mais acertado. Isso vale tanto para anjos quanto para pessoas. Quem sabe, então, não foi este, desde o início, o designo divino aos Twins quando vieram em missão: ensinar aos humanos que o importante é seguir o próprio coração?            

vídeo de "Carolyn's Fingers" - Cocteau Twins

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FAIXAS:
1. "Blue Bell Knoll" - 3:24
2. "Athol-Brose" - 2:59
3. "Carolyn's Fingers" - 3:08
4. "For Phoebe Still a Baby" - 3:16
5. "The Itchy Glowbo Blow" - 3:21
6. "Cico Buff" - 3:49
7. "Suckling the Mender" - 3:35
8. "Spooning Good Singing Gum" - 3:52
9. "A Kissed Out Red Floatboat" - 4:10
10. "Ella Megalast Burls Forever" - 3:39

todas as composições de autoria de Fraser, Guthrie e Raymonde.
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Ouça:
Cocteau Twins Blue Bell Knoll






segunda-feira, 11 de junho de 2012

Cocteau Twins - "Treasure" (1984)





“A voz de Deus”
como a imprensa britânica,
entusiasticamente apelidou
Liz Fraser quando do aparecimento da banda



 Tal qual um raio de sol iluminando o dia é como surge A Voz de Deus na canção que abre o terceiro álbum dos escoceses do Cocteu Twins, quando pela primeira vez conseguem extrair o melhor de sua potencialidade melódica, lírica e estética. Não que os trabalhos anteriores fossem ruins, mas a mecanicidade das programações de bateria, especialmente no primeiro trabalho, “Garlands” e a rigidez dos vocais da vocalista Elizabeth Fraser na época, quando a banda podia até mesmo ser enquadrada na cena dark tal a densidade e obscuridade das musicas, desperdiçava exatamente o que a banda tinha de melhor e comprovaria futuramente, que era a melodiosidade instrumental e o potencial lírico de sua vocalista.
Em “Head Over Heels”, segundo álbum o caminho começava a ser encontrado, as programações ainda estavam lá e ainda soavam frias, os climas ainda eram sombrios, mas já se notava uma evolução compositiva significativa e sobremaneira uma maior leveza na condução da vocalista, de evidente capacidade até então subexplorada. Mas era então em “Treasure”, de 1984, que o milagre acontecia e aquela abertura de álbum, com a voz semi-soprano de Liz Fraser surgindo doce e frágil, como que levantando do horizonte, anunciava que os Cocteau Twins encontravam o caminho que seguiriam dali para frente com cada vez maior apuro e perfeição técnica, desenvolvendo como nenhuma outra banda uma música de climas etéreos, incorpóreos, imateriais.
Com uma bela levada de violão à espanhola , “Ivo” tem uma interpretação envolvente e apaixonada de Fraser, fazendo nos refrões algo parecido com pequenos e graciosos soluços. “Lorelei” que a segue é alegre, fresca, cheia de sinos e pirilampos, enfeitando suas variações e brincadeiras vocais. Num clima todo clerical, “Beatrix”, com seus teclados sacros sobre uma notável linha de baixo de Simon Raymonde, traz a voz de Liz Fraser no máximo de seu potencial operístico, nesta que é uma das canções mais arrepiantes do disco.
Num álbum cujas canções levam títulos que remetem a seres fantásticos, lendas celtas ou personagens mitológicos, “Persephone” (a deusa dos mundos inferiores na mitologia grega) é uma pequena viagem ao inferno, lembrando muito a sonoridade do primeiro disco, “Garlands”, com programação de bateria dura, forte, pesada, marcada, indesmentivelmente eletrônica, mas aqui claramente com uma intenção formal mais consolidada. Montando uma atmosfera toda sombria e claustrofóbica, somados à batida fria, a guitarra de Robin Guthrie aparece mais ruidosa que nunca, o baixo de Raymonde cria uma espécie de camada sonora e Liz Fraser canta desesperada e angustiadamente, no limite entre o belo e o trágico.
“Pandora”, a outra deusa grega do disco, ao contrário da anterior, é como uma brisa amena, como uma fonte de água cristalina, como uma chuva de verão, tal a leveza da guitarra de Guthrie e a beleza dos vocais sobrepostos, ecoados e misturados de Fraser, cantando versos ininteligíveis, palavras inexistentes ou meras vocalizações de sonoridade interessante.
Num fado valseado que caracterizaria bem o som da banda dali para a frente, “Amelia”, apaixonante, traz mais uma interpretação de tirar o fôlego de Miss Fraser, cantarolando sem letra e explorando toda sua capacidade praticamente de cantora clássica.
“Cicely” é mais crua, com a bateria eletrônica soando dura; “Aloysius” tem uma bela melodia de escala decrescente de guitarra; e a nebulosa “Otterley” é praticamente sussurrada sobre leves dedilhados de violão, antecipando a sonoridade que seria tônica no trabalho seguinte, “Victorialand”.
“Donimo” anuncia o final do com a voz de Liz emergindo com uma doçura incrível, depois florescendo em sons até atingir um êxtase de emoção num final mais que digno para um disco como este.
Embora a banda não morra de amores pelo álbum, penso que a partir dele é que o trio escocês escreveu seu nome na história do rock com uma linguagem absolutamente singular. Muitos trabalham essa linha etérea, muitos a linha pop-lírico, alguns se parecem, alguns tantos como Lush, Bat for Lashes, St. Vincent, The Moon Seven Times, surgiram por causa deles; mas nenhum deles conseguiu colocar todos os ingredientes de melancolia, beleza, dramaticidade, paixão, dor, magia, juntos com tamanha perfeição como os Cocteau Twins. E isso, aliado à unidade sonora que conseguem, a essa assinatura inconfundível que criaram no universo pop, somando-se à voz de qualidades únicas e incomparáveis de Liz Fraser, garante a eles seu lugar de respeito no mundo da música e o de “Treasure” entre os FUNDAMENTAIS.

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FAIXAS:
  1. "Ivo" – 3:53
  2. "Lorelei" – 3:43
  3. "Beatrix" – 3:11
  4. "Persephone" – 4:20
  5. "Pandora (for Cindy)" – 5:35
  6. "Amelia" – 3:31
  7. "Aloysius" – 3:26
  8. "Cicely" – 3:29
  9. "Otterley" – 4:04
  10. "Donimo" – 6:19
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Ouça:


quinta-feira, 16 de julho de 2009

OS 100 MELHORES DISCOS DE TODOS OS TEMPOS

Coloquei no blog o primeiro da minha lista do melhores álbuns de todos os tempos e então agora resolvi listar o resto.
Sei que é das tarefas mais difíceis e sempre um tanto polêmica, mas resolvi arriscar.
Até o 10, não digo que seja fácil, mas a concepção já está mais ou menos pronta na cabeça. Depois disso é que a gente fica meio assim de colocar este à frente daquele, tem aquele não pode ficar de fora, o que eu gosto mais mas o outro é mais importante e tudo mais.
Mas na minha cabeça, já ta tudo mais ou menos montado.
Com vocês a minha lista dos 100 melhores discos de toda a história:



1.The Jesus and Mary Chain “Psychocandy”
2.Rolling Stones “Let it Bleed”
3.Prince "Sign’O the Times”
4.The Velvet Underground and Nico
5.The Glove “Blue Sunshine”
6.Pink Floyd “The Darkside of the Moon”
7.PIL “Metalbox”
8.Talking Heads “Fear of Music”
9.Nirvana “Nevermind”
10.Sex Pistols “Nevermind the Bollocks"

11.Rolling Stones “Exile on Main Street”
12.The Who “Live at Leeds”
13.Primal Scream “Screamadelica”
14.Led Zeppellin “Led Zeppellin IV
15.Television “Marquee Moon”
16.Deep Purple “Machine Head”
17.Black Sabbath “Paranoid”
18.Bob Dylan “Bringing it All Back Home”
19.Bob Dylan “Highway 61 Revisited”
20.The Beatles “Revolver”
21.Kraftwerk “Radioactivity”
22.Dead Kennedy’s “Freshfruit for Rotting Vegettables”
23.The Smiths “The Smiths”
24.The Stooges “The Stooges”
25.Joy Division “Unknown Pleasures”
26.Led Zeppellin “Physical Graffitti
27.Jimmy Hendrix “Are You Experienced”
28.Lou Reed “Berlin”
29.Gang of Four “Entertainment!”
30.U2 “The Joshua Tree”
31.David Bowie “The Rise and the Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars”
32.David Bowie “Low”
33.My Bloody Valentine “Loveless”
34.The Stone Roses “The Stone Roses”
35.Iggy Pop “The Idiot”
36.The Young Gods “L’Eau Rouge”
37.The 13th. Floor Elevators “The Psychedelic Sounds of The 13th. Floor Elevators”
38.The Sonics “Psychosonic”
39.Ramones “Rocket to Russia”
40.The Beatles “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”
41.PIL “Album”
42.REM “Reckoning”
43.Love “Forever Changes”
44.Madonna “Erotica”
45.Grace Jones “Nightclubbing”
46.Pixies “Surfer Rosa”
47.Pixies “Doolitle”
48.Rolling Stones “Some Girls”
49.Michael Jackson “Off the Wall”
50.Michael Jackson “Thriller”
51.Beck “Odelay”
52.Nine Inch Nails “Broken”
53.The Fall “Bend Sinister”
54.REM “Green”
55.Neil Young and the Crazy Horse “Everybody Knows This is Nowhere”
56.Kraftwerk “Trans-Europe Expreess”
57.The Smiths “The Queen is Dead”
58.New Order “Brotherhood”
59.Echo and The Bunnymen” Crocodiles”
60.Prince “1999”
61.Morrissey “Viva Hate”
62Iggy Pop “Lust for Life”
63.Pixies “Bossanova”
64.Chemical Brothers “Dig Your Own Hole”
65.Prodigy “Music For Jilted Generation”
66.Van Morrisson “Astral Weeks”
67.Pink Floyd “Wish You Were Here”
68.Muddy Waters “Electric Mud”
69.Sonic Youth “Dirty”
70.Sonic Youth “Daydream Nation”
71.Nirvana “In Utero”
72.Björk “Debut”
73.Nirvana “Unplugged in New York”
74.Björk “Post”
75.Jorge Ben “A Tábua de Esmeraldas”
76.Metallica ‘Metallica”
77.The Cure "Disintegration"
78.The Police ‘Reggatta de Blanc”
79.Siouxsie and the Banshees “Nocturne”
80.Depeche Mode “Music for the Masses”
81.New Order “Technique”
82.Ministry “Psalm 69”
83.The Cream “Disraeli Gears”
84.Depeche Mode Violator”
85.Talking Heads “More Songs About Building and Food”
86.The Stranglers “Black and White”
87.U2 “Zooropa”
88.Body Count “Body Count”
89.Massive Attack “Blue Lines”
90.Lou Reed “Transformer”
91.Sepultura “Roots”
92.John Lee Hooker “Hooker’n Heat”
93.The Cult “Love”
94.Dr. Feelgood “Malpractice”
95.Red Hot Chilli Peperrs “BloodSugarSexMagik”
96.Guns’n Roses “Appettite for Destruction”
97.The Zombies “Odessey Oracle”
98.Johnny Cash “At Folson Prison”
99.Joy Division “Closer”
100.Cocteau Twins “Treasure”