"Tornou-se mais fácil e democrático criar música
e os home-studios foram se tornando cada vez mais sofisticados
até que chegamos a um ponto em que
começou a perder a graça, a ficar muito robótico,
pejorativamente falando, artificial até demais.
Com isso, muitos músicos e artistas, consagrados e independentes,
chegaram ao ponto de voltar a fazer uso
dos equipamentos analógicos,
utilizando velhos clássicos como o Minimoog,
ou a nova leva de synths e drum-machines
fabricadas nos dias de hoje
pelas empresas Moog, Korg e Roland.
(...) Tudo isso com as novas técnicas, digitais ou não,
para dessa forma, mesmo com máquinas,
produzir música eletrônica num processo
e com resultado mais "orgânico" e mais rico
em termos de qualidade sonora."
Paulo Beto
sound designer, DJ, produtor
e fundador da banda Anvil FX
Uma dupla de franceses que, quase no final do século XX, resolveu fazer música eletrônica à antiga. Bom..., quase à antiga. Embora seja inevitável a essas alturas, com toda tecnologia existente, deixar de utilizar os recursos disponíveis, Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunkel, encheram seu som de equipamentos quase esquecidos como Minimoog, sintetizadores Korg , valvulados, o velho Vocoder e o resultado foi um som sofisticadamente retrô.
Com cara de documentários dos anos 70, de jingles publicitários, de filmes de ficção científica, de sons automáticos, "Moon Safari" , do duo Air, French Band, como se apresentam na capa do álbum, é um dos projetos mais interessantes da cena eletrônica do final dos anos 90 antecipando uma tendência que cada vez mais se confirma do retorno a uma certa artesanalidade da música eletrônica depois de épocas pouco criativas e de excessiva automatização. O som robótico de "Sexy Boy", tão minimalista chegando a parecer quase como aqueles produzidos por brinquedos, é adorável, cantada em inglês na sua maior parte mas com o refrão sensualmente entoado em francês. "Remember" também carrega essa ambiguidade que é tipicamente kraftwerkiana do homem-máquina com uma introdução de um vocoder bastante marcante e duro é humanizada, por assim dizer, pelo próprio título da canção que de certa forma provoca como que perguntando "como esse 'robô' pode lembrar?". E lembrar, rever, reler é exatamente a proposta do álbum.
A belíssima "Talisman" tem um arranjo crescente extremamente bem elaborado e é enriquecida pelo preciso arranjo de cordas.
"La Femme D'Argent", que abre o disco é uma boa síntese da proposta retrô- futurista do álbum com sua base de baixo envolvente e elegante sobre a qual desfilam solos de órgãos e sintetizadores primitivos, s baladas "All I Need" e "You Make It Easy", ambas cantadas humanamente por belas vozes femininas são canções deliciosas e delicadas que remetem imediatamente à melhor tradição da música francesa; "Kelly Watch the Stars" com seu clima espacial é uma ótima canção pop; "Ce Matin La" seria perfeita para um comercial ou filme promocional setentista; e "New Star in The Sky", suave, flutuante, com sua doce melancolia parece uma viagem pelo espaço.
"Le Voyage de Penélope", a faixa final é outro dos grande momentos do disco coroando seu final com um show dos dois músicos nos sintetizadores acompanhados por um clarinete que dá um charme todo especial à canção.
O Air não reinventou a roda. Não fez nada que já não se tivesse feito em outro momento. Muita gente critica essa onda de revivalismo como sendo uma mera falta de recurso ou inventividade. Particularmente, acho válido e interessante quando feito com inteligência e criatividade o que é o caso do Air, que deu alguns passos atrás para, quem sabe, ter dado outros tantos à frente. Como dizia aquela frase de Chico Science, "modernizar o passado é uma evolução musical". E acho que talvez seja mesmo.
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FAIXAS:
1. La Femme d’argent
2. Sexy Boy
3. All I Need
4. Kelly, Watch the Stars!
5. Talisman
6. Remember
7. You Make It Easy
8. Ce matin-là
9. New Star in the Sky (Chanson pour Solal)
10. Le Voyage de Pénélope
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Ouça:
Cly Reis