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quarta-feira, 3 de março de 2021
Música da Cabeça - Programa #204
quinta-feira, 5 de novembro de 2020
Gal Costa - "Legal" (1970)
Ao mesmo tempo em que começa a se tornar cada vez mais comum ver os ídolos brasileiros da geração dos anos 50/60 se irem, caso de João Gilberto, Sérgio Ricardo, Moraes Moreira, Luiz Melodia e, mais recentemente, Gerson King Combo, em contrapartida, é uma enorme satisfação presenciar estas mesmas figuras referenciais chegarem à idade avançada. É mais do que só um motivo de comemoração, e sim de emoção. Caso da "água viva" da MPB: Gal Costa, que, mais do que viva, está operante e produzindo muito bem, obrigado. Gal chega aos 75 anos de idade e 55 de carreira celebrada como uma das maiores vozes do Brasil, posto que ocupa desde os anos 60 quando, junto com Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé, Mutantes e toda a turma da Tropicália, revolucionou a musica brasileira para sempre. Parte dessa revolução, contudo, está de aniversario junto com ela: o genial disco da artista “Legal”, de 1970, que completa 50 anos de lançamento.
O contexto no qual o lançamento de “Legal” ocorreu, no entanto, não foi nada festivo. O que faz aumentar ainda mais seus méritos. AI5 em vigor há pouco mais de um ano; Caê e Gil exilados em Londres; Allende eleito no Chile; Seleção de Pelé e Jairzinho fazendo a alegria do povo; Estados Unidos bombardeando o Vietnã; Roberto Carlos tornando-se um rei “adulto”. Tudo isso sob a capa negra da “linha dura” da Ditadura Militar, que reprimia, perseguia, sequestrava, torturava e matava. Afora esta pior parte das violações à liberdade imposta pela ditadura, a repressão recaía, em maior ou menor grau, sobre qualquer um que se opusesse ao Estado. Para isso, os militares contavam, inclusive, com o policiamento da própria sociedade civil. Gal, que permaneceu no Brasil com a missão de manter tesa a sina do tropicalismo, não o fez sem vigília ou pressões. Ela conta que chegou, àquela época, a ser quase linchada em praça pública por "cidadãos do bem", que a viam como uma hippie subversiva e comunista. Afinal, pensar definitivamente não é um atributo de quem domina pela força.
Gal em 1970: cabelos repartidos ao meio em novo visual, que inspirou Oiticica |
E Gal tinha urgência. O rock com influências soul dessa indignada Etta James dos trópicos tem nos sopros arranjados por Chiquinho de Moraes e na guitarra rascante de Lanny a velocidade certa para acompanhar a cantora. Ou seja: com muita rapidez! Os garotos que andavam ao seu lado tinham certeza que ela andava mesmo apressada. Em resposta, a banda pratica o que em teoria musical se chama de “antecipação”, quando se encurta o tempo entre os acordes e joga-se uma nota estranha à harmonia, a qual, se verá logo em seguida que pertence ao acorde seguinte. Se Gal havia permanecido no Brasil, sua terra, ouvi-la dizer “Eu corro mesmo aqui no chão” fazia realmente muito sentido.
Se “Legal” começa assim, mostrando que não veio para brincadeira, o negócio era prender o fôlego e acostumar-se, pois seria assim até a última rotação da agulha no sulco. Em novo recado pros militares, Gal manda na sequência “Língua do Pe”, do exilado Gil. Já que o parceiro não podia como ela estar no seu próprio país, Gal dava um jeito de materializá-lo. Um novo rock se anuncia... só que não! Subvertendo a si mesma, de repente, a música torna-se um xaxado “pé de serra” animado no melhor estilo Luiz Gonzaga: zabumba, triângulo e sanfona. A letra, cifrada, tirava um sarro dos milicos: “Garanto que você/ Nãpão vapai não vai/ Compomprepeenpendeper/ Bulhufas”. Não compreenderam bulhufas, mesmo.Não precisa mais do que duas faixas pra se notar que “Legal”, contrariamente ao vocábulo, não se presta a ser nada amigável com os hipócritas devotos da moral e dos bons costumes. De pura ironia e musicalidade, “Love, Try And Die”, este Broadway jazz chistoso tem a luxuosa participação de dois mitos da música pop brasileira: o jovem Tim Maia, que recém havia lançado seu exitoso disco de estreia, e de Erasmo Carlos, que, na direção oposta do pop romântico de Roberto no pós-Jovem Guarda, corajosamente alinhava-se aos tropicalistas. Autoria de Gal com seus fiéis escudeiros Macalé e Lanny, lembra a invencionice transgressora de "Cinderella Rockfella", de Rogério Duprat com os Mutantes, de 1968, e a galhofa que os próprios Roberto e Erasmo criariam em 1971 com a canção "I Love You", o solfejo tropicalista de RC.
Novos petardos: uma versão futurista de “Acauã”, de Zé Dantas, reafirmando a cultura do Nordeste como desde o início propôs o tropicalismo. A pegada regionalista, contudo, vem empunhando uma peixeira como Lampião. Inversamente a “Língua do Pe”, que inicia rocker e depois alivia, aqui é o folk regional que prevalece até boa parte da faixa, mas que ganha uma reviravolta para um baião-heavy de dar inveja a qualquer guitar band enfezada. Bem que dava para desconfiar quando Gal, no começo da música, calmamente entoa os versos: “Teu canto é penoso e faz medo/ Te cala, acauã/ Que é pra chuva voltar cedo”.
Mais uma inédita de Gil: a psycho-bossa “Mini-Mistério”. Uma só dele seria pouco pra confrontar os militares. E se “Língua do Pe” soa quase anedótica, o recado desta é bem mais direto: "Compre, olhe/ Vire e mexa/ Não custa nada/ Só lhe custa a vida". Ou que tal isso aqui?: “Procure conhecer melhor/ O cemitério do Caju/ Procure conhecer melhor/ Sobre a Santíssima Trindade/ Procure conhecer melhor/ Becos da tristíssima cidade/ Procure compreender melhor/ Filmes de suspense e de terror”. E Gal, que não tinha medo nem de filmes de suspense e de terror, repete ostensivamente a última palavra: “Terror, terror, terror, terror”. Afinal, este era o melhor termo para definir o sentimento que tomava conta daquele Brasil de terríveis minimistérios: delações, perseguições, olhos vigiando por todos os cantos, amigos presos, “amigos sumindo, assim, pra nunca mais”. Sob um suingue jazzístico acachapante, Gal ainda aconselha: “Ande muito/ Veja tudo/ Não diga nada/ Além de dois minutos”.
Gal e Macalé: alta qualidade musical contra a repressão |
Jards, totalmente presente na concepção do disco, vem com outras duas suas. Primeiro, a emblemática e não menos provocativa “Hotel das Estrelas” (“No fundo do peito esse fruto/ Apodrecendo a cada dentada/ Mas isso faz muito tempo...”), que o próprio gravaria apenas dois anos depois em seu primeiro álbum solo. Interpretação tristonha e sensual de Gal na primeira parte, quando um blues jazzístico. Mas o andamento é bem mais variante que isso, e a banda acelera o ritmo para entrar numa soul quase gospel e, daí, voltar novamente à melancolia. Um arraso! De Jards e de Duda Mendonça também é o falso jazz “The Archaic Lonely Star Blues”. Falso até no idioma, pois, iniciando com versos em inglês, envereda, em seguida, para um samba-canção em que Gal deita e rola na interpretação sob o arranjo de cordas primoroso de Chiquinho de Moraes.
Transgressão pouca era bobagem para a combativa Gal. Ela guardava ainda mais munição em sua metralhadora sonora e poética. E, como as canções de Gil, vinham encomendadas também da Inglaterra as do mano Caetano. Primeiro, a carnavalesca “Deixa Sangrar”, cujo duplo sentido do título, obviamente, não é mera coincidência: “Deixa o coração bater, se despedaçar/ Chora depois, mas agora deixa sangrar/ Deixa o carnaval passar”. Alguma semelhança com a situação política de então? Neste aspecto, “Legal” ainda se beneficia pelo fato de ter sido lançado logo após o endurecimento da ditadura, ainda muito mais preocupada em reprimir a luta armada do que necessariamente censurar músicas – isso, até perceberam em seguida que o “perigo” era justamente a junção dos dois. Talvez por isso (e pela letra em inglês, esta na totalidade) tenha-se liberado “London London”, o tristonho canto de exílio de Caetano que atravessou o Atlântico trazendo ao Brasil os gélidos ventos do Velho Mundo poucos meses depois do próprio autor tê-la gravado no seu álbum londrino. Nesta rumba desenhada pela guitarra de Lanny e uma gaita de boca bem rithum n’ blues, toda a estridência que domina boa parte do disco dá lugar de vez à cantora melodiosa e de profundo apuro técnico.
Igual à matadora versão de “Falsa Baiana”, reduzindo de vez o compasso em alta voltagem que havia iniciado o disco lá em “Eu Sou Terrível”. Bossa nova pura. Leve e melodiosa. Um contraste tremendo com o fervente início do disco. Os distraídos podem até achar que se trata de uma contradição por não perceberam mais uma ironia. “Falsa baiana” não é necessariamente aquela que "requebra direitinho", mas a que, contrariando a pecha de um povo "preguiçoso" e "acomodado", se levanta contra a atrocidade humana. Fora isso, Gal, saudavelmente apressada de novo, antecipa justamente seu mestre João Gilberto, que gravaria este samba de Geraldo Pereira somente três anos depois em semelhantes moldes.
Arte de Oiticica completa, com as duas faces: capa e contracapa |
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Gal Costa cantando "Acauã", programa Ensaio (1970)
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1. “Eu Sou Terrível” (Erasmo Carlos, Roberto Carlos) - 2:30
2. “Lingua Do P” (Gilberto Gil) - 3:40
3. “Love, Try And Die” (Gal Costa, Jards Macalé, Lanny Gordin) - 2:23 – partic.: Tim Maia e Erasmo Carlos
4. “Mini-Mistério” (Gil) - 4:16
5. “Acauã” (Zé Dantas) - 2:49
6. “Hotel Das Estrelas” (Duda Machado, Jards Macalé) - 4:22
7. “Deixa Sangrar” (Caetano Veloso) - 2:53
8. “The Archaic Lonely Star Blues” (Duda, Macalé) - 3:03
9. “London, London” (Caetano) - 4:00
10. “Falsa Baiana” (Geraldo Pereira) - 2:11
sexta-feira, 15 de novembro de 2019
5º POA Jazz Festival - Centro de Eventos BarraShoppingSul - Porto Alegre/RS (8 e 9/11/2019)
Tributo a Geraldo Flach com o quinteto de Cristian Sperandir |
Grande presença de público na 5ª edição do festival |
A cantora meio francesa/meio dominicana Cyrille Aimée: bom, mas nem tanto |
Homenagem do festival ao jornalista, escritor, pesquisador e crítico musical Juarez Fonseca |
segunda-feira, 19 de novembro de 2018
Etta James - "Tell Mama" (1968)
Numa carreira repleta de retomadas, "Tell Mama", de 1968, é mais uma dessas voltas por cima da talentosíssima mas sempre um tanto problemática Etta James, que fosse por drogas, por álcool, relacionamentos, obesidade ou comportamento, autossabotava a carreira com alguma frequência. Mas no caso de "Tell Mama", a reabilitação foi no sentido estritamente musical. Depois de um longo tempo afastada das paradas com trabalhos medianos e sem maior inspiração, este a impulsionava novamente para os postos mais altos das paradas, alcançando a mais alta posição com a canção que dá nome ao disco. Impressionante pela versatilidade musical, trabalhando com blues, soul, jazz, baladas melancólicas e momentos de rock'n roll, o disco é extasiante a cada faixa. O disco já abre com "Tell Mama", que é daquelas coisas que justificam plenamente o fato de Etta figurar no hall das maiores cantoras de todos os tempos. Que interpretação!!! "I'd Rather Be Blind", que a segue, um clássico do rhythm'n blues, multi-regravada por inúmeros outros intérpretes, é uma balada daquelas bem sofridas e dolorosas com a guitarra fazendo um discreto mas interessante tremolo ao fundo durante praticamente todo o tempo; e "Watch Dog" é um rockão conduzido por uma "metaleira" responsa, com direito a um solo estridente de guitarra e tudo mais.
"The Love of My Man", "I'm Gonna Take What He's Got" e "Steal Away" são blues um pouco mais tradicionais nas suas estruturas; "The Same Hope" é adorável uma soul rock e "Security", versão para a música de Otis Redding traz outra interpretação absurda de Miss Peaches.
O soul pegado, carregado no piano, "My Mother in Law" é simplesmente contagiante; na balada "Don't Lose Your Good Thing" os metais soam mais graves e mais solenes deixando a canção com um clima mais pesado; em "It Hurst Me So Much", outra de cortar o coração, temos mais um daqueles momentos em que, mesmo evidente e presente em todas a outras faixas, não dá pra deixar de se impressionar com toda a qualidade vocal da cantora, que, a propósito, rasga a voz já na abertura de "Just a Little Bit", mais um soul envenenado, que por sua vez, fecha o disco.
"Tell Mama" foi apenas mais uma de tantas recuperações de Etta James que conviveria a vida toda com altos e baixos devido, principalmente, a seus problemas com drogas o que fez, de certa forma, que não recebesse durante muito tempo o devido reconhecimento pelo seu trabalho e talento, até meados dos anos 90 quando foi, por assim dizer, "redescoberta" e, aí sim, colocada em seu devido lugar como uma das maiores cantoras que a música já teve.
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FAIXAS:
- "Tell Mama"
- "I'd Rather Go Blind"
- "Watch Dog"
- "The Love of My Man"
- "I'm Gonna Take What He's Got"
- "The Same Rope"
- "Security"
- "Steal Away"
- "My Mother in Law"
- "Don't Lose Your Good Thing"
- "It Hurst Me So Much"
- "Just A Little Bit"
sábado, 27 de maio de 2017
"Cadillac Records", de Darnell Martin (2008)
Dia desses, arrumando minha coleçãozinha de blues e topando com meus CD's de Muddy Waters e Howlin' Wolf acabei lembrando de um filme muito legal e que nenhum fã de blues pode deixar de assistir. Trata-se de "Cadillac Records, filme da diretora norte-americana Darnell Martin, que de forma apaixonante apresenta a formação do blues de Chicago nos anos 50 e a criação da Chess Records, selo que foi berço de grandes nomes do gênero contribuindo para a divulgação e popularização do estilo e de seus praticantes pelos Estados Unidos.
O filme centra-se mais na figura de Muddy Warters, sua descoberta, sua ascensão, seu sucesso e seus conflitos amorosos e musicais, mas também destaca Howlin' Wolf e sua rivalidade com Muddy; um neguinho chamado Chuck Berry que misturava blues com "música de brancos", o alcoolismo do gaitista Little Walter e seu estilo inovador no instrumento e no estúdio; o talento e o affair de Etta James, com o chefe, Leonard Chess; e até um certo grupo inglês chamado Rolling Stones.
"Cadillac Records tem momentos tristes, alegres, divertidos, emocionantes, trágicos e conta com interpretações extremamente competentes como a de Jeffrey Wright como Muddy, intensas como a de Eammon Walker na pele de Wolf, e surpreendentes como a de Beyoncé (olha só!) vivendo Etta James. Adrien Brody é que está meio insosso como Leonard Chess mas nada que seja suficiente para fazer alguém não gostar do filme por causa disso.
Mas e o Cadillac? O que é que o Cadillac tem a ver com tudo isso? Foi o presente de Chess para Muddy, seu primeiro contratado, assim que alcançaram o primeiro grande sucesso. Depois disso todos que emplacavam um grande hit passaram a querer o seu. Tornara-se uma tradição na gravadora e aí só dava "crioulo" transitando de Cadillac nas barbas da sociedade racista dos anos 50. Teriam que engolir a "negrada". Ah, teriam. E aquilo era só o início.
Mais um Cadillac sendo entregue. |
sábado, 12 de setembro de 2015
Howlin' Wolf - "Howlin' Wolf" ou "The Rockin' Chair Blues" (1962)
ver as veias se incharem no seu pescoço
e, irmão, sua alma inteira
se concentrava naquela canção.
Ele cantava com a danada da alma."
Sam Phillips,
da gravadora Sun Records,
descrevendo Howlin' Wolf
Um uivo de lobo.
Uma voz potente.
Um homem transfigurado em animal no estúdio.
Assim era Chester Arthur Burnett, mais conhecido como Howlin' Wolf, um dos maiores nomes do blues de todos os tempos. Artista de admiráveis qualidades vocais, exímio manejo da guitarra e performances arrasadoras em shows, Wolf que começara na Sun, gravadora que revelou Elvis Presley, teve, no entanto, seu período de maior sucesso pelo famoso selo Chess, de Chicago, curiosamente levado pelas mãos do, sabidamente um arquirrival, Muddy Waters.
Rivalidades à parte, cada um com seus talentos, muitos diga-se de passagem, havia espaço para os dois na Chess. A maioria dos músicos do staff da gravadora gravavam as canções do baixista da casa e compositor Willie Dixon, mas poucos como Wolf tiraram tanto proveito desta parceria. Saíram das maos de Dixon alguns dos maiores sucessos de Howlin' Wolf e diga-se de passagem, em contrapartida, são dele algumas das melhores interpretações das músicas de Dixon.
Wolf já havia gravado um disco desde sua chegada à Chess mas que ainda trazia heranças da Sun Records, sua antiga gravadora, e contava apenas com as composições do próprio cantor, mas foi com o disco conhecido popularmente como "The Rockin' Chair Blues" que Wolf alçou voo definitivamente no universo do blues muito em função das composições de Dixon e de seu dedo na produção.
O disco abre com a excitante "Shake For Me", uma incitação à libido e já traz na sequência o clássico "The Red Rooster" cantado de maneira arrastada por Wolf com o acompanhamento de por uma slide guitar matadora do próprio cantor. A música ganharia inúmeras versões posteriores, nas quais ganharia o diminutivo pela qual é mais conhecida ("Little"), dentre elas a suingada de Sam Cooke, a suja do Jesus and Mary Chain e a maliciosa dos Rolling Stones.
"Who's Been Talkin'", um blues lento, quebrado com um toque latino é uma das duas, apenas, de autoria do próprio cantor no disco, e ""Wang Dang Doodle", que a segue é pegada, cheia de embalo, com uma guitarra vibrante e um refrão contagiante.
Outra que já foi regravada incontáveis vezes, por Etta James, Who, pelo Cream de Eric Clapton, mas que tem na versão deste blueseiro do Mississipi, a primeira, diga-se de passagem, uma de suas melhores interpretações, é a magnetizante "Spoonful", mais uma das obras-primas de Dixon imortalizada pelo vocal singular do Lobo.
Na chorosa "Going Down Slow" onde o vocalista praticamente apenas declama a letra, o que destaca-se mesmo, desde a introdução martelada, é o piano; já em "Back Door Man", Howlin' Wolf retoma o protagonismo e encarna o personagem soltando ganidos arrepiantes numa canção que é uma espécie de assombração sensual e sedutora e que cuja versão, talvez, mais conhecida seja a da banda The Doors gravada logo em seu álbum de estreia.
Bem ritmada, embalada, impetuosa, "Howlin' for My Baby" (que também é conhecida com a variação de "... My Darling"), talvez a melhor tradução da fusão de estilos do blues do Delta para o de Chicago, encaminha com grandiosidade o final do disco para que "Tell Me", a outra composição de autoria de Wolf no disco, um gostosíssimo blues com uma levada apaixonante de harmônica se encarregue de fechar de forma magistral.
Um daqueles caras para o qual a alcunha lenda do blues cabe perfeitamente, ainda mais reforçada pelo nome sugestivo que carregava, pelas performances insanas no palco, pelo feitiço que impunha às mulheres e pelos uivos quase animalescos que emitia em suas interpretações. Seria aquela figura na verdade uma criatura entre o home e o lobo? Teria ele, como o outro legendário Robert Johnson, feito algum pacto sinistro cujo preço seria que dividisse sua forma entre o humano e o bestial, metamorfoseando-se depois de determinada hora, em determinados dias, em dada fase lunar? Ficaria ele assim, mesmo em sua forma humana com traços do animal o que explicaria seus grunhidos, uivos e rosnados característicos e sua forma gigantesca e quase gutural? Bobagem, bobagem. Mas, ei... Alguém aí ouviu um uivo?
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FAIXAS:
- "Shake for Me" – 2:12
- "The Red Rooster" – 2:22
- "You'll Be Mine" – 2:25
- "Who's Been Talkin'" (Howlin' Wolf) – 2:18
- "Wang Dang Doodle" – 2:18
- "Little Baby" – 2:45
- "Spoonful" – 2:42
- "Going Down Slow" (St. Louis Jimmy Oden) – 3:18
- "Down in the Bottom" – 2:05
- "Back Door Man" – 2:45
- "Howlin' for My Baby" – 2:28
- "Tell Me" (Howlin' Wolf) – 2:52