Madonna em vários momentos do show que celebrou seus 40 anos de carreira.
De tempos em tempos parece que Madonna tem que vir com alguma para lembrar ao mundo quem manda no pedaço. Não devie ter que precisar, mas precisa.
Surge fulana com turnê mirabolante, cicrana com recorde de acessos em tal plataforma, beltrana com lançamento mundial do videoclipe badalado, e o burburinho, a forçação da mídia, as redes sociais, faz muita gente acreditar que aquilo seja algo espetacular, incomum, extraordinário. Aí a verdadeira e única Rainha da Coisa Toda resolve, para coroar sua turnê e 40 anos de carreira, fazer um megashow num dos cartões-postais do mundo, para 1,5 milhões de pessoas, e não só apresenta um espetáculo inesquecível, como esfrega na cara de quem quiser ver, como chegou até o topo desse reinado.
Um espetáculo em que toda a carreira da artista é repassado, passado a limpo, dentro de uma concepção artística, estética, visual, musical, absolutamente mágica, hipnotizante, embasbacante.
Embora esteja entre aqueles que entendem que um show dessa natureza, de um artista pop, com a dinâmica de teatralidade, troca de figurinos, cenários, etc., permita playbacks, devo admitir que fiquei um pouco incomodado e desconfiado quando soube que a apresentação não contaria com uma banda ao vivo. No entanto, ali, assistindo ao show, mostrou-se totalmente justificável a opção. "The Celebration Tour in Rio", antes de ser um concerto musical é um espetáculo artístico que envolve uma série de elementos que, para funcionarem bem, com um resultado impactante para o espectador (seja no local ou na TV), exigia tal 'sacrifício'. As performances, a ocupação de palco, a mecânica, os números musicais, a iluminação, a concepção visual, tudo me convenceu que, nós, público, só ganhamos com essa ideia de show.
Abertura do show com trecho de "Nothing Really Matters"
Dito isso, vamos ao que interessa: QUE SHOW DA PORRA!!!
Repertório bem planejado, blocos de músicas e atos divididos em uma estrutura muito precisa, mixagens e transições sempre interessantes, ótimas coreografias, iluminação incrível, e, é claro, uma estrela ousada, destemido, provocativa e de um talento que transcende a música.
O que foi aquela "Like a Prayer"??? Em uma das melhores músicas da cantora, uma atmosfera eclesiástica ritual, repleta de cruzes, sacerdotes, corpos pendurados, punições, culpa, inquisição... A hipocrisia e a opressão do catolicismo, numa dramática performance de arrepiar. Se teve gente que perguntou por que não projetaram o nome de Madonna no Cristo Redentor, como aconteceu com Taylor Swift, isso bastaria para responder perfeitamente.
Festa à brasileira em "Music". ("Music makes the people come together...")
"Erotica", com uma performance de luta de boxe, foi outra que passou seu recado: um direto no queixo dos moralistas. "Bad Girl" com a filha da cantora, Mercy James, ao piano foi lindíssima, "Burning Up" punkzona foi simplesmente afudê, as homenagens a Prince e Michael Jackson foram especiais, "Hung Up" latinizada ficou bem interessante, "Music", surpreendentemente para mim que a adoro na versão original, ficou incrível naquela releitura batucada brasileira, com uma participação 'apimentada' de Pabblo Vittar, e a espetacular "Vogue" com um desfile de moda ímpar, inigualável, julgado com a participação de Anitta foi uma festa incrível, uma espécie de nova versão do antigo Gala Gay do Copacabana Palace, em versão século XXI.
Madonna fez história de novo!
O Brasil nunca esquecerá esse show.
O mundo sempre lembrará.
Tenho medo de passar hoje por Copacabana e não encontrar o bairro lá ou encontrá-lo em ruínas, porque, cara... Madonna colocou tudo abaixo. Tudo mesmo! Dúvidas, conceitos, preceitos, preconceitos, resistências, padrões, limites, barreiras... Enfim. ., Ave, Madonna! Estamos todos a teus pés, ó Rainha!
Uma multidão em Copacabana para ver de perto a Rainha do Pop. (No meu caso, nem tão de perto)
"O Mistério de Candyman", de 1989 já ocupa seu lugar entre os clássicos do terror, mas "A Lenda de Candyman", de 2019, não veio pra brincadeira e quer desbancar o favorito.
É o caso de remake que não é exatamente uma refilmagem, estaria mais para uma sequência, um reboot, uma vez que tem ligação com os fatos já acontecidos, faz referência a personagens da trama original, mas cria de tal forma um novo conceito que o termo re-fazer torna-se totalmente mais adequado.
No original, de 1989, uma pesquisadora acadêmica, Helen, em busca de um bom assunto para sua tese universitária, investiga uma suposta lenda urbana de um homem negro, com um gancho no lugar de uma das mãos, que, segundo dizem, aparece sempre que invocado, cada vez que seu nome é repetido cinco vezes diante de um espelho. Ela mergulha na pesquisa e descobre que, há mais de um século atrás, o homem em questão, um negro filho de escravos, dotado de grande talento artístico, contratado para pintar um retrato da filha de um importante aristocrata, teria sido morto cruelmente por um poderoso aristocrata, depois de se apaixonar e engravidar a moça. O negro, conta a lenda, teria sido torturado, sua mão decepada e colocado um gancho em seu lugar, além de lambuzado em favos de mel, exposto a abelhas dentro de um antigo apiário, sendo picado até a morte e depois ainda, como se não bastasse jogado em uma fogueira. Ela visita um conjunto habitacional de baixo padrão na periferia de Chicago, o Cabrini-Green, construído no local onde há tempos atrás teria ocorrido a barbaridade com o artista, e onde moradores alegam ver a entidade, atribuindo a essa assombração a autoria de vários crimes ocorridos lá.
Ainda cética e incrédula quanto à lenda, ela invoca a entidade e a partir de então sua vida torna-se um inferno. Visões, apagões, pesadelos passam a fazer parte de seus dias, e assassinatos nos quais ela estivera presente nas cenas dos crimes, a tornam a principal suspeita das mortes, sendo que, sem memórias claras, nem ela mesmo tem certeza de não tê-los cometido.
É que Candyman, depois de invocado por Helen, passa a ter com ela uma estranha ligação e a exige em sacrifício em troca da vida de um bebê que sequestrara no Cabrini-Green. E, vingativo e ressentido, não pretende parar de matar até que Helen se entregue a ele e compense, de certa forma, a mulher por quem foi sacrificado.
"O Mistério de Candyman" - trailer
No novo, essa questão da injustiça social, do julgamento racial, de um negro pobre ser morto simplesmente por ser negro e pobre, ganha muito mais força e significação. Em "A Lenda de Candyman", todos aqueles fatos já teriam acontecido e agora ecoam como um boato, um mito distante, uma lenda, que quase ninguém leva a sério. No entanto, Anthony, um artista plástico em crise criativa, em busca de uma maior expressão em sua arte, que pretende recorrer às raízes do povo negro, suas mazelas, suas dores como inspiração para sua arte e nesta busca, numa conversa casual, esbarra na tal da lenda de Candyman. Descobre que o bairro onde vive localiza-se numa área hoje revitalizada mas que outrora abrigava um bairro de classe baixa tido como "barra pesada", onde um homem negro que costumava dar doces para as crianças, fora morto injustamente, linchado pela polícia. Resolve desenterrar a história e ver até onde aquilo tudo tem algum fundo de verdade. O próprio interesse dele na história, no personagem e sua verificação dos fatos e contestação dos acontecimentos desperta a força sobrenatural adormecida. Curioso, cada vez mais intrigado e envolvido com a história, meio que na brincadeira, ele resolve invocar a entidade, só que aquilo era tudo que Candyman precisava: um homem negro, angustiado, em busca de respostas, em busca de si mesmo... Quando esse negro se olha no espelho ele vê todos os negros injustiçados, subestimados, subvalorizados, pré-julgados, espancados, linchados, mortos, e todos esses negros estão simbolizados na figura de Candyman.
Inspirado pelo personagem que pesquisara e descobrira, Anthony cria uma instalação artística, uma espécie de espelho de banheiro, repleto de símbolos, imagens e recados em seu interior, que, exposta numa galeria causa alvoroço e incita alguns brancos desavisados, céticos, descrentes, ignorantes, a ousarem dizer seu nome na frente do espelho. "Candyman, Candyman, Candyman, Candyman, Candyman...". Branco, você não devia ter feito isso...
Se para um negro que o chama ele surge com essa força ancestral poderosa (assustadora, é verdade, difícil de incorporar com naturalidade), para um branco que o faz, por galhofa ou curiosidade, Candyman revela toda sua fúria justiceira deixando um rastro de sangue vingativo.
Aos poucos Candyman vai se apossando de Anthony. O que vemos é desagradável, não é bonito mas... é isso: nunca foi bonito. É a vez do artista encarnar toda a injustiça e a violência sofrida pelos negros ao longo dos tempos. Mas ele aceitará essa tarefa?
"A Lenda de Candyman" - trailer
Jogo duríssimo, hein...
Propostas de jogo parecidas mas com alternativas táticas diferentes.
Se o primeiro é um filme de serial-killer sobrenatural que toca em pontos sensíveis, como machismo, desigualdade social, violência policial, gentrificação e, sobretudo, racismo; o segundo coloca essas discussões no centro da trama e, ao contrário, faz do terror um acessório importante.
É o duelo dos técnicos! De um lado o britânico Bernard Rose que não brilhou muito em trabalhos posteriores mas que aqui mostra muita competência, e do outro a jovem treinadora Nia da Costa, cheia de novas ideias e já mostrando um ótimo trabalho em seu segundo longa. Mas com tramas tão bem desenvolvidas, mais do que um duelo de treinadores, a batalha dos Candyman revela-se uma guerra dos roteiristas. De um lado, nada menos que o mestre do terror Clive Barker, idealizador e roteirista do filme de 1989, e do outro um dos grandes nomes do gênero na atualidade, o excelente Jordan Peele. Como dá pra notar, comissões técnicas de peso.
E dentro de campo a coisa não é diferente. O antigo aposta nas individualidades com Virginia Madsen, do primeiro "Duna", numa ótima atuação, no papel da pesquisadora Helen, e o lendário Tony Todd, do remake de "Noite dos Mortos-Vivos", espetacular como o personagem que dá nome ao filme. O novo, sem nenhuma grande estrela, aposta no conjunto e como ponto a seu favor traz um um elenco predominantemente preto num filme sobre questões negras.
Partida equilibradíssima!!!
Quem leva?
Tony Todd é um Candyman muito melhor, mais assustador, mais impressionante com aquele rosto crivado de abelhas, do que o inexpressivo Michael Hargorve que é o Candyman que aparece na maior parte das vezes na nova versão. Embora sejam utilizados outros atores também no papel ao longo do filme em diferentes situações, Hargrove é quase aquele jogador que joga 'no nome'. Impressiona porque é O CANDYMAN, pois qualquer ator podia estar ali que faria o mesmo efeito, tanto que, grande parte das vezes, sequer vemos seu rosto com nitidez. Candyman 89 abre o placar.
Nia da Costa mostra-se mais diretora que Bernard Rose com um produto final mais bem acabado. Cor, iluminação, direção de arte, opções estéticas... tudo depõe a favor da norte-americana que conduz seu time com fluidez para o gol. Candyman 2019 empata o jogo. Jogada com o dedo da treinadora.
Mas o time de 1989 tinha uma arma secreta. A trilha sonora ficara a cargo de ninguém menos que o gênio Philip Glass. E ele não decepciona, entregando uma atmosfera tensa mas ainda assim extremamente elegante e sofisticada. É Candyman 89, novamente à frente no placar. 2x1.
Num time sem grandes estrelas, a diferença está na casamata. A treinadora Nia da Costa desequilibra de novo, com três momentos incríveis: o flashback recontando a origem do Candyman e os acontecimentos em Cabrini-Green, contado com muita sensibilidade estética num teatro de sombras; a morte da crítica de arte, Rebecca, sendo erguida e arrastada por uma força invisível, no interior de seu apartamento, filmada numa tomada afastada, quase como um vizinho observando; e a evocação final de Brianna, a namorada de Anthony, dentro da viatura entendendo o verdadeiro significado do Candyman. Cena fantástica, linda mas brutal, violenta mas emocionante. Golaço! Candyman 2019 deixa tudo igual novamente, 2x2.
Michael Brown, Jesse Washington, Sarah Bland, Geroge Floyd... Todos eles são Candyman. Diga o nome deles.
Difícil dar a vitória para algum dos dois aqui mas... a denúncia social, o recado anti-racista, a incisividade do discurso, a reinvenção de um clássico, dão a vitória para "A Lenda de Candyman".
A evocação de Candyman na frente do espelho é um convite a que cada negro olhe seu reflexo e entenda que a imagem que vê guarda consigo cada um dos outros tantos que foram escravizados, espancados, pendurados em árvores, injustiçados, vistos com desconfiança só por serem negros, presos só por serem negros, mortos por serem negros. Quando Nia da Costa propõe que seus personagens falem o nome de Candyman, remete ao "Say Her Name", movimento que defende mulheres vítimas de agressão policial. Uma provocação inteligente colocada de forma brilhante. Chamar o Candyman é um desafio para que evoquemos nomes como Jesse Washington, Michael Brown, George Floyd e outros tantos. Você, irmão, negro, não esqueça dos nomes deles e delas. Você, branco, você tem coragem de dizer o nome deles? É golaço! Sabe de quem? Candyman é o nome da emoção!
Vitória da Lenda de Candyman. Mas não foi fácil. Dois times de respeito num jogo, daqueles, para não esquecer.
No alto, à esquerda, Helen, e à direita, Anthony, ambos em busca de respostas sobre Candyman. Abaixo, os dois Candyman, à esquerda, o da primeira versão e, à direita, o (ou um dos) da refilmagem.
Parafraseando a letra daquela música que a galera canta no estádio:
Coutinho dirige e atua em seu "Cabra...", um dos 10 maiores e um dos 5 filmes do diretor na lista
Chegamos, enfim, ao momento mais aguardado: o final do nosso especial “Cinema Brasileiro: 110 anos, 110 filmes”. Ou melhor, o início, já que seguimos uma ordem numeral inversa, partindo dos últimos da lista para, agora, os primeiros. Chegou a hora de dar fim a um dos conteúdos especiais alusivos aos 15 anos do Clyblog em 2023, iniciada em abril e publicado em cinco partes ano longo dos meses. Nossa proposta foi trazer aqui, de forma criteriosa e misturando noções de crítica e história do cinema com preferências pessoais, títulos que representassem o cinema brasileiro neste corte temporal. E justamente num ano em que o cinema brasileiro completou 125 de nascimento segundo a efeméride oficial. O que não invalida a nossa intenção, a qual teve como referência, se não a gênese da produção cinematográfica nacional, em 1898, outro marco inconteste para a história da cultura audiovisual sul-americana, que é a exibição do mais antigo filme brasileiro preservado: “Os Óculos do Vovô”, de 1913.
Embora as corriqueiras e até salutares ausências (afinal, listas servem muito para que outras também sejam compostas), o que se viu aqui ao longo da extensa classificação foram títulos da maior importância e qualidade daquilo que foi produzido no cinema do Brasil neste mais de um século. De produções clássicas, passando pela fase muda, os alternativos, o cinema da atualidade aos sucessos de bilheteria. Num país de dimensão continental, houve trabalhos do Norte ao Sul, com representantes de seis estados da nação: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Bahia. Entre as décadas, leva pequena vantagem os anos 60 sobre os 80 e 2000, com 25, 24 e 23 títulos respectivamente, dando uma boa ideia dos períodos de maior incentivo à produção
Diretores consagrados e filmes marcantes para a cinematografia brasileira e mundial também percorreram a listagem de cabo a rabo. Nomes como Glauber Rocha, Cacá Diegues, Hector Babenco, Kléber Mendonça Filho, Leon Hirszman, Nelson Pereira dos Santos, Eduardo Coutinho e Joaquim Pedro de Andrade se fizeram presentes de forma consistente e todos com mais de um título, provando sua importância basal para a concepção formativa do cinema brasileiro. Glauber, maior cineasta brasileiro, encabeça, com seis filmes, seguido de Coutinho, com cinco, e Nelson, Leon e Babenco, com quatro cada. Porém, os novatos, nem por isso deixaram de também demarcarem seus espaços, feito talvez ainda mais louvável uma vez que, com pouco tempo de realização, já figuram entre os grandes. Caio Sóh, com “Canastra Suja”, de 2018, (107º colocado), Gustavo Pizzi, de “Benzinho”(2018), e Gabriel Martins, com “Marte Um”, de 2022 (79º) estão aí para provar.
Katia, uma das 7 cineastas mulheres: pouca representatividade
Embora em menor número, as diretoras não deixam de contribuir com seu talento ímpar. Kátia Lund (com duas co-direções, junto a Fernando Meirelles e a João Moreira Salles), Anna Muylaert, Daniela Thomas (“Terra Estrangeira”, com Walter Salles Jr.), Sandra Kogut, Laís Bodanzky, Tatiana Issa e Suzana Amaral formam o time de sete cineastas mulheres, que dão um pouco de diversidade à lista. Muito a se evoluir? Sim. Representatividades negras, LGBTQIAPN+ e indígenas aparecem de maneira periférica, até superficial, consequência natural participação de tais minorias na economia cultural brasileira ao longo da história. Quem sabe, daqui a mais uns anos não se precise demorar tanto mais para que se incluam definitivamente entre os essenciais do cinema brasileiro?
Outro recorte que vale ser frisado são os documentários, que se estendem por todas as postagens dessa série. Além de contarem com um dos dois mais representativos realizadores, Coutinho, rivalizam muito bem com as ficções, totalizando nada mais nada menos que 13 títulos neste formato, 11,8% do geral. Enfim, análises que podem se deduzir a uma coleção de filmes tão interessantes e simbólicos de uma nação, aqui representados por aqueles mais bem colocados e, de certa forma, mais significativos. Por isso, diferentemente do que vínhamos procedendo até então, ao invés de comentarmos apenas de 5 e 5, todos desta vez merecem algumas palavras. Afinal, eles podem se vangloriar de serem os 10 melhores filmes brasileiros de todos tempos. Ao menos, nesta singela e propositiva seleção.
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10.“Pixote, A Lei do Mais Fraco”, Hector Babenco (1980)
Babenco chega à maturidade de seu cinema e faz o até hoje melhor trabalho de sua longa e regular filmografia. Com ar de documentário, toma forma de um drama realista e trágico, trazendo à tona mais uma mazela da sociedade brasileira: a desassistência político-social às crianças e a violência urbana. O pequeno Fernando, que, ao interpretar Pixote, faz bem dizer ele mesmo, nos emociona e nos entristece. Marília está num dos papeis mais espetaculares da história. Indicado ao Globo de Ouro e vencedor do New York Film Critics Circle Awards (além de Locarno e San Sebastian), é considerado dos filmes essenciais dos anos 80 no mundo.
09.“Eles não Usam Black Tie”, Leon Hirszman (1981)
Como um “Batalha de Argel” e “Alemanha Ano Zero”, é uma ficção que se mistura com a realidade, e neste caso, por vários fatores. Adaptação para o cinema da peça dos anos 50 de Gianfrancesco Guarnieri sobre uma greve e a repressão política decorrente, transpõe para a realidade da época do filme, de Abertura Política e ânsia pela democracia, retratando as greves no ABC Paulista. E ainda: tem o próprio Guarnieri como ator, que, segundo relatos, codirigiu o filme. Filme lindo, que remete a Eisenstein e Petri. Música original da peça de 58 de autoria de Adoniran Barbosa. Prêmio do Júri em Veneza.
08. ”Cabra Marcado para Morrer”, Eduardo Coutinho (1984)
Mestre do documentário mundial, Coutinho não se entregava mesmo quando parecia impossível. “Cabra...”, um dos maiores filmes do gênero, é um documentário do documentário. Interrompido em 1964 pelo governo militar, narra a vida do líder camponês João Pedro Teixeira e teve suas filmagens retomadas 17 anos depois, introduzindo na narrativa os porquês da lacuna. Premiado na Alemanha, França, Cuba, Portugal e Brasil, onde conquistou Gramado e FestRio.
07. “Cidade de Deus”, Fernando Meirelles e Kátia Lund (2002)
Talvez apenas “Ganga Bruta”, “Rio 40 Graus”, “Terra em Transe” e “Dona Flor e Seus Dois Maridos” se equiparem em importância a “Cidade...” para o cinema nacional. Determinador de um “antes” e um “depois” na produção audiovisual não apenas brasileira, mas daquela produzida fora dos grandes estúdios sem ser relegada à margem. Pode-se afirmar que influenciou de Hollywood a Bollywood, ajudando a provocar uma mudança irreversível nos conceitos da indústria cinematográfica mundial. Ou se acha que "Quem quer Ser um Milionário?" existiria para o resto do mundo sem antes ter existido "Cidade..."? O cineasta, bem como alguns atores e técnicos, ganharam escala internacional a partir de então. Tudo isso, contudo, não foi com bravata, mas por conta de um filme extraordinário. Autoral e pop, “Cidade...” é revolucionário em estética, narrativa, abordagem e técnicas. Entre seus feitos, concorreu ao Oscar não como Filme Estrangeiro, mas nas cabeças: como Filme e Diretor (outra porta que abriu). Ao estilo Zé Pequeno, agora pode-se dizer: "Hollywood um caralho! Meu nome agora é cinema brasileiro, porra!".
06. “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, Roberto Santos (1965)
Uma joia meio esquecida. Leonardo Villar, de novo ele, faz o papel principal, que ele literalmente encarna. Baseado no conto-novela do Guimarães Rosa, é daquelas adaptações ao mesmo tempo fiéis mas que souberam transportar a história pra outro suporte. Obra-prima pouco lembrada.
05. "O Cangaceiro”, Lima Barreto (1953)
No nível do que Nelson Pereira faria com Jorge Amado e Ruy com Chico Buarque anos mais tarde, Lima Barreto teve a o privilégio de contar com diálogos escritos por Raquel de Queiroz. O que já seria suficiente ainda é completado por um filme de narrativa e condução perfeitas, com uma trilha magnífica, figurinos de Carybé, uma fotografia impecável e enquadramentos referenciados no Neo-Realismo de Vittorio De Sica e no western norte-americano de John Ford. O precursor do faroeste brasileiro ao recriar sua atmosfera e signos à realidade do nordeste. Se "Bacurau" foi aplaudido de pé em Cannes 66 anos depois, muitas dessas palmas devem-se a "O Cangaceiro", onde o filme de Barreto já havia emplacado o prêmio de Melhor Filme de Aventura e uma menção honrosa pela trilha sonora. Primeiro filme nacional a ganhar prestígio internacional, também levou os prêmios de Melhor filme no Festival de Edimburgo, na Escócia, Prêmio Saci de Melhor Filme (O Estado de S. Paulo) e Prêmio Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos.
04. “Limite”, Mário Peixoto (1930)
Scorsese apontou-o como um dos mais importantes filmes do séc. XX, tanto que o restaurou e para a posteridade pela sua World Cinema Foundation. David Bowie escolheu-o como o único filme brasileiro entre seus dez favoritos da América Latina. Influenciado pelas vanguardas europeias dos anos 20, Peixoto, que rodou apenas esta obra, traz-lhe, contudo, elementos muito subjetivos, que potencializam sua atmosfera experimental. Impressionantes pelo arrojo da fotografia, da montagem, da concepção cênica. Considerado por muitos o melhor filme brasileiro de todos os tempos. Um cult.
03. “Vidas Secas”, Nelson Pereira dos Santos (1963)
Genial. Precursor em muitas coisas: fotografia seca, roteiro, cenografia, atuações. Daquelas adaptações literárias tão boas quanto o livro, ouso dizer. Tem uma das cenas mais tristes do cinema mundial, a do sacrifício da cachorra Baleia. Limite também entre Neo-Realismo e Cinema Novo. Indicado a Palma de Ouro. Aula de cinema.
02. “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, Glauber Rocha (1963)
A obra-prima do Cinema Novo, um dos maiores filmes do século XX. De tirar o fôlego. Sobre este, reserva-se o direito de um post inteiro, escrito no blog de cinema O Estado das Coisas em 2010. Mais recentemente, este marcante filme de Glauber mereceu outra resenha, esta no Clyblog.
1º."O Pagador de Promessas", Anselmo Duarte (1960)
Com absoluta convicção, o melhor de todos os tempos no Brasil. Perfeito do início ao fim: fotografia, atuações, roteiro, trilha, edição, cenografia. Obra de Dias Gomes transposta para a tela com o cuidado do bom cinema clássico. Brasilidade na alma, das mazelas às qualidades. Cenas inesquecíveis, final arrepiante. E tem um dos papeis mais memoráveis do cinema: Leonardo Villar como Zé do Burro. E ainda é um Palma de Ouro em Cannes que venceu Antonioni, Pasolini e Buñuel. Tá bom pra ti? Irretocável.
Em junho, eu havia participado de uma sessão comentada sobre o belo “A Primeira Morte de Joana”, da cineasta gaúcha Cristiane Oliveira, na Cinemateca Paulo Amorim da Casa de Cultura Mário Quintana. Na ocasião, extremamente especial, pude discutir o filme com a produtora do longa-metragem Aletéia Selonk, da Okna Produções, a montadora Tula Agnostopoulos e a curadora da Cinemateca Paulo Amorim, minha colega de ACCIRS e de Jornalismo Mônica Kanitz, que me estendeu o convite. Mesmo com o gratificante posterior retorno da própria Cristiane, que mora em São Paulo e não pode comparecer naquele dia – mas assistiu ao vídeo completo do debate –, as correrias dos dias não me permitiram registrar aqui no blog aquele encontro.
Sessão de "A Primeira Morte..." com as parceiras de debate Tula, Mônica e Aletéa
Os meses passaram e um novo convite veio, intermediado pela mesma Mônica mas, desta vez, por ideia do próprio realizador, Giovani Borba, para uma sessão sobre o seu brilhante “Casa Vazia”, filme sobre o qual escrevi no Clyblog. Aliás, esta resenha, replicada nas redes sociais da produtora do longa, Panda Filmes, chegou a Giovani, que o motivou a contar comigo nesta feita. Saborosíssima, diga-se de passagem, seja por poder rever o filme, agora na tela grande, seja pelo contato presencial, seja pela ótima conversa, que transcorreu posteriormente à exibição.
Com a presença de um público enxuto, mas qualificado – entre os quais, um interessado Glênio Póvoas, meu ex-professor de cinema na faculdade e uma referência no que se refere à pesquisa e memória do cinema gaúcho – pudemos discorrer sobre aspectos de “Casa Vazia” muito interessantes e até elucidativos. Um deles é o rol de referências cinematográficas do jovem Giovani, que vai desde cinema iraniano à escola russa. Abbas Kiarostami e John Ford são duas delas. A mim já havia ficado evidentes as alusões aos irmãos Coen, principalmente ao new-western “Onde os Fracos não Têm Vez” (2007) e, especialmente, a Andrei Tarkowsky. A cena do incêndio da casa, chave para a trama de “Casa Vazia”, faz referência direta a de “O Sacrifício” (1986), porém é “O Espelho” (1979) com o qual o filme de Giovani guarda mais cruzamentos, seja na fotografia, nos enquadramentos e nos lances sensoriais.
Outro ponto bastante discutido foi a escolha de elenco e, em especial, a participação de Hugo Noguera, ator não-profissional mas que, nem por isso, atua com maestria – que lhe rendeu, inclusive, prêmio de Melhor Ator no Festival de Gramado de 2022, pelo papel do sofrido Raúl. Giovani contou que sua ideia inicial era de realizar um filme apenas com atores amadores, mas que essa ideia foi se modificando com o andar da pré-produção em razão de uma série de questões. Porém, o papel do protagonista era uma vontade a qual gostaria de não abrir mão de utilizar alguém que não fosse da profissão para que as características rústicas do gaúcho de fronteira restassem preservadas genuinamente. O encontro com Nogueira, homem de forte sotaque “portunhol” na vida real, foi quase por acaso, mas se mostrou certeiro. A obra se desenvolve, sim, a partir das ideias do roteiro do próprio Giovani, mas muito em função da forma de ser e da sensibilidade de Nogueira, que imprimiu, mesmo sem a técnica cênica formal, peculiaridades que ajudaram a formatar a personagem de Raúl. Giovani, como bom diretor, claro, acatou de bom grado tais contribuições.
Aos que não assistiram, “Casa Vazia” é um drama com toques de western, que trata do empobrecimento de regiões agrícolas, tendo no protagonista, um peão de meia idade de traços indígenas e gestos rudes, o retrato social de um típico gaúcho na atual região do Pampa gaúcho, abordando o tema da pobreza no campo e evidenciando a violência e os conflitos sociais, econômicos e psicológicos do personagem principal. Não é somente uma obra apreciável, mas, como bem disse professor Glênio durante a sessão como um entusiasta do filme, "Casa Vazia" é uma das melhores produções do cinema gaúcho contemporâneo, o que, assim como para com "A Primeira Morte...", pode-se já afirmar mesmo com tão pouco tempo de vida de ambos.
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Com Mônica e o talentoso Giovani falando sobre "Casa Vazia"
Foto "oficial" com os três após o rico papo na Cinemateca Paulo Amorim
São uma gente à parte - quase uma raça distinta das outras. Os que amam o Carnaval, como amam todas as outras festas, não são dignos do nome de carnavalescos. O carnavalesco é um homem que nasceu para o Carnaval, que vive para o Carnaval, que conta os anos de vida pelos Carnavais que tem atravessado, e que, na hora da morte, só tem uma tristeza: a de sair da vida sem gozar os Carnavais incontáveis que ainda se hão de suceder no Rio de Janeiro pelos séculos sem fim. Que se hão de suceder - escrevi eu. Porque o verdadeiro, o legítimo, o autêntico, o único tipo de carnavalesco real é o carnavalesco do Rio de Janeiro. A espécie é nossa, unicamente nossa, essencialmente e exclusivamente carioca: só o Rio de Janeiro, com seus Carnavais maravilhosos, delirantes e inconfundíveis, possui o verdadeiro carnavalesco. E não suponham que haja por aí muitos verdadeiros carnavalescos... Quase todos os foliões do Carnaval folgam por acidente, ou por imitação, ou por desfastio, ou por entusiasmo passageiro: folgam dois anos, ou cinco anos, ou dez anos - e cansam, e recolhem-se à vida séria. Mas o carnavalesco não tem cansaço nem aposentadoria: envelhece carnavalesco, e morre carnavalesco: morre no seu posto, extenuado pelo Carnaval, entisicado pelo Carnaval, devorado pelo Carnaval. O Carnaval é para ele ao mesmo tempo uma paixão absorvente e arruinadora, um vício indomável, uma religião fanática. Para ele, o Carnaval é o único oásis fresco e perfumado, que se antolha no adulto deserto da vida! Esse é o verdadeiro carnavalesco. Trabalha todo o ano, pena e sua 12 meses a fio, privando-se de tudo, alimentando-se mal, vestindo-se mal, acumulando, somiticamente, ansiosamente, alucinadamente, vintém a vintém, os contos de réis que há de gastar no Carnaval. são 12 meses de sacrifício, de renúncia, de desprendimento: o carnavalesco pensa no Carnaval. Não era maior que a sua a constância de Jacó, pastor apaixonado, servindo o velho Labão, pai da formosa Raquel... O carnavalesco para conquistar o Carnaval, pena toda a vida.
"Dizendo: mais penara, senão fora Para tão grande amor tão curta a vida!..."
Acontece, às vezes, que o carnavalesco já não é um rapazola, sem família a sem deveres sociais: - é um homem maduro, negociante matriculado, tendo próprio casal e nele assistindo, tendo mulher e filhos, tendo apólices e comenda. Pouco importa! É um carnavalesco... Na vida desse homem, de vida regrada e equilibrada, o Carnaval é um hiato, é uma síncope, é a anulação completa de sua consciência de homem e chefe de família, é a suspensão absoluta de toda a sua gravidade de negociante e de comendador.
A família conhece e perdoa a sua paixão: e, no sábado de Carnaval, ei-lo que se despede dos seus e parte para o delírio, com os olhos acesos em febre e o coração rufando um zé-pereira precipitado (...) Parte, e a família não o vê durante os três dias fatais: e, na Quarta-feira de Cinzas, o carnavalesco volta ao seu lar e seus negócios, moído, pisado, contundido - e muitas vezes com a cara quebrada -, mas sem remorso, sem arrependimento, com o orgulho que dá a consciência da missão bem cumprida...
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trecho da crônica"Carnavalescos" deOlavo Bilac (1901)
Michael Myers é, sem dúvida, um dos mais icônicos personagens dos filmes de terror e seu comportamento autômato, associado àquele semblante impassível de sua máscara, excessivamente inexpressiva até mesmo para uma fantasia de Dia das Bruxas, é algo absolutamente aterrorizante. No entanto, um dos melhores filmes da franquia "Halloween", originalmente criada por John Carpenter, lá em 1978, curiosamente, não conta com a presença do sanguinário slasher da máscara branca. "Halloween III - A Noite das Bruxas", de 1982, parte de uma premissa completamente diferente, tratando de um fabricante de artigos de Halloween que, pretendendo restaurar as tradições pagãs da festa, planeja realizar um sacrifício em massa de todas as crianças que estiverem utilizando as máscaras fabricadas por ele, na noite das bruxas. Como? Convencendo, com uma campanha publicitária massiva, todos seus consumidores a usarem o acessório às 21 horas na fatídica noite quando será exibido um comercial, em rede nacional, que acionará as máscaras e fará, literalmente, derreter as cabeças das pessoas. No entanto, um médico e a filha de um de seus pacientes que utilizara uma das máscaras, percebem que há alguma coisa de errado, uma vez que o paciente, depois de uma crise de alucinações é assassinado dentro do hospital. Eles então ligam o incidente às máscaras e vão à cidade onde elas são fabricadas e lá se deparam praticamente com uma cidade-fantasma, deserta, misteriosa e vigiada por estranhos "funcionários" quase robóticos trajando terno preto.
Usar a máscara e assistir ao comercial...
Uma combinação fatal.
Contado assim, diante da brutalidade e criatividade assassina de Michael Myers, para muitos, pode não parecer grande coisa. Mas não se engane! "Halloween 3" tem muito com o que apavorar. As mortes sanguinolentas não ficam devendo nada a nosso assassino mascarado, sendo a da primeira vítima, no hospital, terrível, e a demonstração do funcionamento da máscara pelo dono da fábrica, utilizando uma família qualquer, simplesmente, cruel e revoltante. Isso tudo sem falar na tensão proporcionada pela ameaça constante e onipresente dos 'seguranças' e sua postura zumbificada e, acima de tudo, por incrível que pareça, o inquietante e perturbador jingle da empresa, que anuncia, a cada dia, em contagem regressiva, a chegada do Halloween e do, derradeiro, momento da exibição do comercial. Sim, a musiquinha, repetitiva e 'irritante' da campanha publicitária do filme, talvez seja das coisas mais terrificantes e assustadoras do filme. Inegavelmente um diferencial em relação ao modelo padrão de filmes de terror da época onde o terror passava, necessariamente, por sustos gratuitos, clichês previsíveis e golpes de instrumentos perfuro-cortantes.
Pois é,... mas o modelo não agradou o público que, depois de ter visto os dois primeiros filmes com o competente e "carismático" matador Myers, se sentiu enganado de ver uma sequência sem ele e com uma temática inteiramente diferente. O problema todo foi que John Carpenter, o diretor dos dois primeiros, criador do personagem e produtor do terceiro filme, pretendia criar uma franquia com abordagens diferentes a cada sequência e, esta nova, depois da morte de Michael no segundo filme, representaria a virada no projeto. O filme foi muito mal recebido e, como acontece com Hollywood, sem nenhum constrangimento, o mais fácil, para agradar o povão e faturar mais, foi, mesmo contra a vontade de Carpenter, ressuscitar o serial-killer dando-lhe a capacidade sobrenatural de sobreviver a tudo e voltar e voltar e voltar, infinitamente, sempre no filme seguinte. Filme subestimado, pouco valorizado, pouco conhecido mas que, além de um terror de boa qualidade, com um conceito diferenciado e instigante, propõe uma reflexão sobre a comunicação em massa, a publicidade e as grandes mídias, e principalmente, uma crítica ao consumismo, em especial em datas de grande apelo comercial, como é o caso do Halloween, por lá. Se "Halloween III" não tem Michael Myers, tem a musiquinha do comercial, insistente e arrepiante, que funciona quase como um personagem, pois a todo momento que ela surge, a gente sabe que alguma coisa ruim está por acontecer. E o que é pior: ela, à sua maneira, grudenta e pegajosa nos ouvidos, assim como um maníaco mascarado, vai te perseguir e não vai te deixar em paz.
"Halloween III" - Jingle da empresa Silver Shamrock
Todo mundo tem mãe e, como não podia deixar de ser, no cinema, todo personagem tem mãe. Muitas vezes elas não são mencionadas, não aparecem, são secundárias, não tem sequer relação com a história, mas sabemos que elas existem. Contudo, em outros casos, elas são tão essenciais ou têm participação tão destacada na trama que é impossível não lembrar delas. o ClyBlog destaca algumas dessas mães aqui. Sei que cometeremos injustiças, vai faltar uma que outra, alguém vai dizer que essa ou aquela não podia faltar, mas procuramos fazer uma lista interessante e heterogênea em características, estilos, época, nacionalidade, ambiente, gênero cinematográfico, etc.
Então, vamos à lista:
*(Cuidado! Pode conter spoilers)
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Ela, inatingível, pairando sobre tudo.
1. "O Espelho", de Andrey Tarkovski (1975) - Para
mim, desde que vi pela primeira vez, "O Espelho", filme semiautobiográfico
do diretor russo Andrei Tarkovski, representa uma obra sobre mães. No filme
Maria (Margarita Terekova), uma mãe abandonada pelo marido, voluntário para o exército, vive com
seus dois filhos em uma propriedade campestre e ali acompanhamos parte do
cotidiano desse núcleo familiar corajosamente conduzido por uma mulher. Filme
cheio de simbologias e metáforas, embora traga elementos como infância,
saudade, nostalgia e seja passível de diversas interpretações, para mim, é a
maternidade o elemento que mais chama atenção e emociona. O olhar e as imagens
sempre poéticas de Tarkovski mostram aquela mulher como uma espécie de entidade
superior, uma criatura inabalável, altiva, incólume, impenetrável, mesmo com o
mundo desabando à sua volta. A cena de sonho em que ela flutua, elevada da
cama, confere a ela ares de divindade, de magia, de alguém com um poder
inexplicável que talvez até ela mesmo desconheça. E, na maioria das vezes, não
é bem assim que são nossas mães?
2. "Psicose", de Alfred Hitchcock (1960) - Esse é o caso de uma mãe que
é fundamental para a trama mas, na verdade, não está presente fisicamente
o tempo inteiro durante o filme. Hitchcock, genial como era, até nos deixa com
a pulga atrás da orelha num primeiro momento, sugerindo alguma farsa ou
assombração, uma vez que nos tornando conhecedores do fato que a mãe do dono do
motel, Norman Bates, está morta, faz aparecer um vulto feminino na janela da
casa, nos deixa ouvir uma bronca de voz feminina envelhecida no filho Norman e,
por fim mostra-nos uma senhora de cabelos brancos e coque esfaqueando a cliente
loura no chuveiro, numa das cenas mais clássicas do cinema. "Como
assim?", pergunta-se o espectador de primeira viagem. Acho que não
vou dar *spoiler porque a essas alturas, mesmo quem não viu, está
cansado de saber que é o próprio Norman que, perturbado e esquizofrênico assume
o papel da mãe, vestindo-se como ela e punindo quem quer que seja que venha a
despertar algum tipo de desejo no reprimido Norman.
É incrível mas uma das mães mais célebres do cinema, não está
verdadeiramente no filme. Loucura!
"Psicose" e sua famosa cena do chuveiro.
3. "O Bebê de Rosemary", de Roman Polanski (1968) - Rosemary (Mia Farrow) é uma
futura mãe que pressente uma ameaça ao filho que ainda está em sua
barriga, vinda de seus vizinhos, um casal de velhotes estranhos e enxeridos e,
por incrível que pareça, de seu próprio marido. Tudo começa quando se mudam
para o novo apartamento, conhecem os vizinhos e não muito tempo depois, o
esposo, um ator pouco valorizado, ganha um papel importante em um filme em
virtude da morte do ator que interpretaria o papel. O marido passa agir
estranhamente, os velhos passam a estar constante e inconscientemente presentes
em sua casa e sua vida e até mesmo administram à grávida uma estranha dieta à
base de algumas ervas de origem e efeitos duvidosos. Aos poucos Rosemary,
fragilizada física e emocionalmente, começa a desconfiar estar sendo
vítima de alguma espécie de seita para a qual o bebê que leva dentro de si,
provavelmente, virá a ser elemento chave.
Paranoia, imaginação, ansiedade, fantasia, reflexo de sua fraqueza física,
estresse da gravidez? Exagero ou não, essa mãe vai brigar até o último instante
para proteger seu filho de algo que, na verdade, nem ela sabe bem ao certo do
que se trata mas que, pelo que vai se apresentando a ela, parece algo muito,
muito maligno.
4. "Sexta-Feira Muito Louca", de Mark Walters (2003)
- Quantas vezes já não ouvimos que só estando no lugar da outra pessoa para
saber como ela se sente, não? Pois é, "Sexta-Feira Muito Louca"
promove essa possibilidade justamente em uma relação de uma mãe e uma filha.
Relação difícil, intolerância, falta de compreensão mútua... Só mesmo uma troca
de corpos para fazer com que cada uma perceba as dificuldades da vida da outra.
E nessa confusão quem sai ganhando é o espectador com situações muito
divertidas, com Jamie Lee Curtis fazendo uma adolescente no corpo de uma
"coroa", e da maluquete Lindsay Lohan curtindo uma de senhora
responsável presa num corpo de garota de colégio. Mamãe vai entender, ou talvez
lembrar, que existe pressão por notas, coleguinhas implicantes e insuportáveis,
professores chatos, paqueras, necessidade de privacidade, tempo para lazer,
etc. e talvez, a partir de tudo isso, se remodelar; e a filhota vai perceber
que ser mãe, ter obrigações, preocupações, casa, trabalho, e, principalmente
filhos aborrecentes, não é tarefa para qualquer uma.
Mães e filhas e suas histórias.
5. “Clube da Felicidade e da Sorte”, de Wayne Wang (1993) – Filme emocionante sobre mulheres que foram filhas, se tornaram mães e viram as filhas se tornarem mães.
Quatro chinesas com histórias diferentes em seu país de origem, vão parar nos Estados Unidos e lá constroem famílias, se conhecem e tornam-se grandes amigas. Muitos anos depois, após a morte de uma delas, Suyuan, é revelado à sua filha June, que as filhas gêmeas que a mãe tivera na China e que abandonara bebês durante a guerra em circunstâncias pouco esclarecidas, às quais todos acreditavam não terem sobrevivido, estavam, sim, vivas e dispostas a conhecê-la. Então, a festa de despedida de June, que embarcará para a China para conhecer as irmãs, serve de pano de fundo para conhecermos as histórias de vida de cada uma delas, de suas dificuldades na China, das particularidades das relações com suas próprias filhas quando crianças, e dos problemas da vida adulta destas como mulheres.
Traumas, reminiscências, roupa-suja, desabafos, remorsos, sacrifícios, esqueletos dentro do armário são trazidos à tona em momentos chave do filme de modo a preencher lacunas em aberto e colocar as coisas nos seus devidos lugares e apenas reafirmar aquilo que todos sabemos: que ela pode ter todos os defeito que tiver, mas que não existe ninguém como a mãe da gente.
6. "Dançando no Escuro", de Lars Von Trier (2000) - Tudo o que Selma queria era guardar um dinheirinho para fazer a cirurgia de olhos de seu filho para que ele não acabasse como ela, quase sem enxergar nada, uma vez que herdara dela a doença progressiva de perda de visão. Mas um vizinho, um policial proprietário do terreno onde ela vive num trailer com o filho, descobre sobre o dinheiro e rouba as economias da pobre coitada que, além de tudo, acabara de ser demitida da fábrica onde trabalhava. Tentando recuperar seu dinheiro, Selma acaba matando o vizinho e é presa por isso. Uma história dura, dramática, pesada, é verdade. Mas a vida de Selma, de certa forma, é embalada e seus momentos difíceis amenizada pela música. Amante dos musicais cinematográficos, Selma foge mentalmente de sua realidade imaginando estar em cenas de filmes musicais onde tudo à sua volta suscita sons e canções, desde as máquinas da metalúrgica onde trabalha ou mesmo passos, enquanto é levada pelos guardas na cadeia.
Filme do sempre controverso Lars Von Trier, com atuação brilhante da cantora Björk, no papel da protagonista, que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes.
Eis uma mãe que deu cada centavo de seu trabalho e fez tudo que estava a seu alcance pelo bem do filho. Até as últimas consequências.
"Dançando no Escuro", 107 passos
A maluca mãe de Carrie, disposta tudo para
que a filha continue pura.
7. "Carrie, A Estranha", de Brian De Palma (1976) -
Não tem como falar em mães no cinema e não lembrar da maluca, crente e
super-protetora mãe de Carrie White. Fanática religiosa, Margareth mantém a filha
afastada e alienada em relação ao mundo que a rodeia, expondo a jovem a constrangimentos diários como, por exemplo, o do início do filme em que se desespera
por ter menstruado e é ridicularizada pelas outras meninas no vestiário da
escola. Ah, mas não é uma boa ideia zoar com uma garota como Carrie com poderes
psicocinéticos que se manifestam especialmente quando ela se altera emocionalmente,
e essa galera que adora tocar um terror nos outros, vai entender isso da forma
mais dolorosa possível.
Uma das garotas do bullying no vestiário, verdadeiramente arrependida
e na boa intenção de se redimir com Carrie, convence o namorado, os gostosão da
escola, a convidá-la para o baile, de modo que a esquisitinha se enturme, socialize.
A mãe, brilhantemente vivida por Piper Laurie, tenta evitar de todas as maneiras
que a filha vá, utilizando-se de seus argumentos religiosos, chantagens
psicológicas e sua por fim de sua autoridade de mãe, mas Carrie, decidida a
viver pelo menos um dia de sua vida, começa a mostrar seus poderes em casa,
contra a própria mãe e termina de fazê-lo na festa, onde vítima de um trote de
muito mau gosto, do restante da turminha da pesada, proporciona um banho de
sangue em uma das cenas mais marcantes da história do cinema.
A velha podia ser louca, mas não dá pra dizer que ela não
avisou.
Sarah Connor não vai permitir que robô nenhum
se meta com seu filho.
8. "O Exterminador do Futuro II – O Julgamento Final", de James Cameron
(1991) - Tá certo que no início, lá no primeiro filme, por mais que tivesse
sido informada por um carinha do futuro que seria a mãe de um líder da
resistência humana numa guerra contra as máquinas, Sarah Connor estava mais
interessada era em salvar a própria pele do que de um bebê que, a bem da verdade,
ela nem tinha certeza se viria a existir mesmo. Mas a partir do momento que se
convenceu, da pior forma possível, depois de ter sido perseguida por um
ciborgue sanguinário e impiedoso, de que o papo de apocalipse das máquinas era
quente, foi determinada em ter a criança e, no pouco tempo em que teve com ele
antes de ser internada num hospital psiquiátrico, em treiná-lo e prepará-lo
para cumprir seu destino no front dos humanos contra as máquinas.
Durante todo o tempo em que esteve mantida no manicômio penitenciário por ter
destruído uma fábrica de eletrônicos e alegar que o fizera porque um robô
exterminador teria vindo do futuro para matá-la e a seu filho, Sarah (Linda Hamilton) sempre
ficou pensando numa maneira de sair dali para proteger o filho. A desconfiança que
o garoto tem, posteriormente no filme, quando a resgata do hospício, de que a
mãe está mais preocupada com a humanidade do que com ele, não demora para se
desfazer diante de toda o amor com que ela o protege.
Ela é fria é pragmática, objetiva, dura, durona, mas não poderia ser de outra
maneira quando se sabe que seu filho, além de já ser naturalmente importante
somente por ser seu filho, pode ser a salvação da humanidade.
9. "Leonera", de Pablo Trapero (2008) - Circunstância estranhas... Um
homem morto, outro ferido, uma mulher inconsciente. Um dos dois seria o
assassino? Teria sido uma quarta pessoa? Por que não ela não lembra de nada?
Teria sido drogada? Ou não quer lembrar? O fato é que nesse mistério todo, a
garota é quem vai parar na cadeia, só que grávida como se encontra, é enviada a
uma instituição onde é permitido que as internas tenham lá seus bebês e depois
permaneçam com as crianças no presídio, até os 4 anos de idade. Revoltada com a
gravidez, relutante e resistente em ter o filho, num primeiro instante, Julia
Zarate (Martina Gusmán), aos poucos vai sendo conquistada pelo seu pequeno rebento e seu
instinto e amor de mãe acabam prevalecendo, fazendo dela uma mãe atenciosa e
carinhosa, mesmo dentro daquele ambiente prisional.
O lugar, mesmo com as características tradicionais de uma instituição carcerária, em
muitos momentos acaba parecendo uma creche e a presença das crianças acaba
iluminando um pouco o lugar e garantindo-lhe, de certa forma, sempre um rasgo
de alegria e esperança.
Só que em meio às situações corriqueiras de um presídio, envolvimentos íntimos,
desavenças com outras internas, visitas do advogado, audiências de apelação,
Julia vê-se às voltas com as investidas de sua mãe para levar o neto dali
daquele ambiente que considera pouco apropriado para a criação de uma criança.
Sob pretexto de tratar um resfriado do menino, a avó consegue convencer a mãe a
tirá-lo de lá, em princípio, apenas para uma consulta médica, com a promessa de
levá-lo de volta. Só que isso não acontece e aí Julia vai fazer de tudo para
ter seu filho de volta.
Filme de uma mãe que até hesita um pouco no ofício divino que lhe é concedido
mas que a partir do momento que se sente mãe, não vai deixar que ninguém tire
isso dela. Uma leoa que protege sua cria a qualquer custo.
10. Kill Bill – vol.2”, de Quentin Tarantino (2004) – No final
do volume 1 é revelado, apenas para o espectador, que a criança que a noiva
baleada na cabeça num massacre numa igrejinha de interior, sobrevivera à chacina. Recuperada
de um coma de quatro anos, a mãe, uma assassina treinada que não perdera seus
instintos mortais, depois de se vingar de parte do grupo
que tentara matá-la, vai agora em busca do líder e ex-amante, Bill. O tempo inteiro, a grande
motivação da vingança de Beatrix Kiddo (Uma Thurman), também conhecida como a Mamba Negra, é
o fato de terem-lhe tirado seu bebê, tanto que a primeira coisa que faz quanto
desperta do coma, sem noção de quanto tempo estivera ali, é levar a mão à
barriga e perceber que não tem mais ali a criança. Aquela é a vingança de uma mãe.
Cada um que sucumbe a ela paga pelo fato de terem lhe tirado a oportunidade de poder
ter um filho, estar perto da criança, curtir cada momento. Ah, todos terão que
pagar por isso! O que ela não contava é que, às portas de seu confronto final,
ao encontrar Bill, encontraria também uma graciosa menina, doce, dengosinha e com
carinha de anjo. Ah, amigos, ela desaba! A determinação com que ela adentra a
vila onde habita o algoz, de arma em punho, pronta para aniquilar o homem que
lhe causara tanto sofrimento e privação, é completamente desestruturada assim
que vê a menina.
Ele, cavelheiresco como é, apesar de seu ofício, permite a
elas algumas horas juntas antes do inevitável duelo final entre os dois, que
serão os momentos mais gostosos e bem aproveitados por aquela mãe. Horas que
valerão por anos, até porque, ela não sabe o que acontecerá assim que sair
daquele quarto e colocar sua espada Hatori Hanzo em ação contra a de seu oponente,
o tão perseguido, Bill.
11. “Volver”, de Pedro Almodóvar (2003) - Almodóvar gosta de destacar mulheres em seus filmes e não raro, trata especificamente de mães, como acontece, por exemplo em "Julieta" (2016), "A Flor do Meu Segredo" (1995) e, é claro, "Tudo Sobre Minha Mãe" (1999). Mas não vamos cair na obviedade de destacar o filme que explicitamente dedica, já no título, sua temática às mães e sim um outro do qual gosto muito e que traz as questões das relações entre mães e filhas de uma maneira mais leve, mesmo contendo elementos dramáticos, polêmicos e sombrios. "Volver" é uma espécie de comédia surrealista onde uma mãe, Irene, brilhantemente interpretada por Carmen Maura, "retorna dos mortos" para alguns acertos, alguns ajustes, uma reconciliação com suas filhas, especialmente com Raimunda, vivida por Penélope Cruz, com quem nunca tivera, em vida, uma relação muito boa. Raimunda, diante da novidade da misteriosa volta da mãe, ainda vê-se às voltas com o assassinato cometido por sua filha adolescente Paula,que matara o padrasto que tentara abusar sexualmente dela. A não ser pelos relatos de Raimunda, não sabemos como era a mãe quando viva, mas o que sabemos é que a Irene "fantasma" é um personagem adorável que dá um brilho todo especial ao filme de Almodóvar. Um filme delicioso com uma mãe que vai nos mostrando, e às filhas, que tudo o que sempre fez, foi protegê-las, assim como a filha Raimunda faz agora em relação à sua pequena Paula. Aquele instinto que passa de mãe para filha.
12. "Indochina", de Régis Wargnier (1992) - Eliane (Catherine Deneuve), dona de uma vasta extensão de seringais na Indochina francesa e mãe adotiva de uma garota indochinesa, se apaixona e tem um romance com um oficial francês da Marinha, Jean-Baptiste, mas o rapaz também cai nas graças da filha Camille em um incidente na rua onde o militar salva sua vida. Em parte por ciúmes, em parte para protegê-la do cenário efervescente pela libertação da colônia, Eliane, rica e influente consegue fazer com que transfiram o oficial para os quintos-dos-infernos, numa ilha, literalmente, lá na cochinchina, de modo que fique longe da filha, imaginando assim que a jovem desista dele e, por fim, o esqueça. Só que aquela mãe não contava que o amor da menina pelo oficial fosse muito maior do que ela imaginava. A menina atravessa o país atrás do seu amor e, agora sem a proteção de sua posição social, como uma indochinesa comum e misturada a seu povo, conhece a relidade local, se afeiçoa à sua gente ele e se solidariza com sua luta pela independência.
A busca e Camille por Jean-Baptiste é comovente e tem momentos verdadeiramente lindos, mas em paralelo a isso, a mãe, verdadeiramente amorosa apesar do ato egoísta, desesperada, não mede esforços para encontrar a menina e move mundos e fundos para tê-la de volta. Mas aí já é tarde, a pequena e frágil Camille já virou uma revolucionária procurada e praticamente uma lenda em seu país.
O fato de ter afastado a filha da pessoa que ela amava pode parecer desqualificar Eliane no quadro das grandes mães. É verdade, ela foi um tanto egoísta, autoritária, até insensível. Mas não se engane, leitor. É o tipo do caso da mãe que acha que está fazendo o melhor para o filho, mesmo que isso tenha que custar algum sacrifício o qual, neste caso específico, era para ambas. A gente até fica com uma raivinha dela durante o filme mas na cena do reencontro das duas é de morrer de pena daquela mãe.
mostrando que mãe adotiva é tão mãe quanto qualquer outra.
"Indochina" - trailer
Uma das mortes clássicas de "Sexta-Feira 13".
Jason aprendeu direitinho com a mamãe.
13. “Sexta-Feira 13”, de Sean S. Cunnigham (1980) – Quando pensamos em “Sexta-Feira 13”, a primeira lembrança que nos vem à mente é o assassino psicopata da máscara de hóquei, Jason Voorhees, mas pouca gente lembra que quem mata no primeiro filme da franquia (* alerta de spoiler) é a mãe de Jason. Sim! Pamela Voorhees traumatizada e perturbada pela morte do filho, afogado por negligência dos monitores do acampamento de Crystal Lake, responsabiliza, de um modo geral, a todos os jovens cheios de vida e resolve que deve se vingar de todos aqueles que venham a acampar no lugar onde o filho morreu. E a mamãe capricha! É um banho de sangue com algumas cenas das mais clássicas do terror slasher como, por exemplo, a que Kevin Bacon, estreando, novinho ainda, tem a garganta atravessada por uma faca, deitado na cama. Caso em que o filho aprendeu direitinho os ensinamentos da mãe pois, dali em diante, nas sequências da franquia, é Jason quem assume o facão e mostra-se extremamente competente em sua tarefa.
Quem assistiu a “Sexta-Feira 13 – parte 1”, jamais vai esquecer a frase, dita com aquela vozinha fininha, imitando a de uma criança, sempre antecedendo mais uma atrocidade: “Mata ele, mamãe!”.
14. "A Troca", de Clint Eastwood (2009) - Agora, imagina se seu filho desaparece, você denuncia o fato às autoridades e depois de algum tempo eles vem pra você com uma outra criança e querem que você engula e aceite aquilo. Cara, é exatamente o que acontece em "A Troca", filme dirigido por Clint Eastwood e estrelado por Angelina Jolie, e o pior é que a coisa toda é baseada num fato real ocorrido em Los Angeles na década de 20.
Aquela mãe insiste, Christine Collins, reafirma que não é o mesmo menino que sumira, tenta provar de todas as maneiras, com os professores, com exames médicos, com fotos, mas a polícia não só tenta lhe impor que é o garoto que ela procura como a acusa de insanidade mental por não reconhecer o próprio filho.
Uma história angustiante em que ficamos cada vez mais envolvidos e torcendo por aquela mãe. Mas infelizmente, amigos, tenho que revelar que a situação só piora.
Caso de uma mulher que não desiste do filho, não desiste da verdade, mas que, mãe solteira, vê-se impotente e cada vez mais sufocada pelas autoridades, pelo machismo e pela conjuntura social de sua época.
15. "Mãe!", de Darren Aronofsky (2017) - Essa é a mãe de todos nós. Salvo outras possíveis interpretações, a Mãe, interpretada por Jennifer Lawrence no filme de Darren Aronofsky, representa mãe natureza, a vida. E tudo o que aquela mãe mais quer é viver em paz e preservar sua casa, que é, na verdade, a nossa casa. A casa em questão, uma propriedade retirada em reformas, é onde ela vive com Ele, um escritor em crise criativa, vivido por Javier Barden, que, vaidoso e inconsequente, permite visitas inconvenientes que cada vez mais vão tumultuando a vida e o lar dos dois. Primeiro são um homem e uma mulher, convidados por Ele (Adão e Eva); depois uma multidão mal-educada que chega para o funeral de um dos filhos do homem e da mulher, morto pelo irmão (Caim e Abel), e com seu mau comportamento, mesmo diante de todas as advertências, acabam causando um enorme vazamento (Dilúvio) e a ira da dona da casa; e por fim, quando ela já está grávida, os convidados que chegam para celebrar a nova obra do escritor que finalmente rompera seu bloqueio criativo e que assim que ela tem o bebê, em meio à sua noite de consagração, exibido, faz questão de levar e entregar seu filho, recém nascido à turba de insensatos que..., (* alerta de spoiler) literalmente, o devoram (Jesus Cristo).
Um filme complexo, para o qual cabem diversas outras interpretações ou variações, mas que não deixa dúvida quanto a uma coisa: o zelo que uma mãe tem pelo seu lar e pelos seus.
À parte as reflexões religiosas, com "Mãe!" você vai entender melhor o desespero da sua mãe quando chegava em casa e via aquele lugar de cabeça pra baixo.
Alguns outros filmes com mães marcantes que merecem destaque e poderiam perfeitamente estar na nossa lista:"O Óleo de Lorenzo", de George Miller (1992); "Mamãe Faz Cem Anos", de Carlos Saura (1979); "Mommy", de Xavier Dolan (2014); "Minha Mãe é Uma Peça", de André Pellenz (2013); "Tudo Sobre Minha Mãe", de Pedro Almodóvar (1999); "Mom", de Ravi Udyawar (2017); "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert (2015); "O Quarto de Jack", de Lenny Abrahamson (2016); "Precisamos Falar Sobre Kevin", de Lynne Ramsay (2012), "Juno", de Jason Reitman (2008); "Zuzu Angel", de Sérgio Rezende (2006)