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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

R.E.M. - "Green" (1988)


"Quem poderia imaginar que
uma compra impulsiva de [Peter]Buck,
de um velho bandolim italiano
em uma lojinha de Nova Iorque
poderia ter tamanho impacto na carreira da banda?"
Alan Jones
editor da revista Uncut



A grande explosão do R.E.M. em termos de público, aconteceu com o bom "Out of Time" de 1991, mas "Green" seu antecessor, de 1988, é na verdade seu inspirador e embrião em vários aspectos, desde a semelhança das capas, passando pelas características de cada canção, e até mesmo uma certa semelhança no formato e na distribuição das faixas. Sim, "Out of Time" foi um grande sucesso nas paradas e impulsionou o R.E.M. ao status de grande nome do pop-rock mundial, mas na minha opinião "Green", é infinitamente melhor e, este sim, verdadeiramente um ÁLBUM FUNDAMENTAL.
"Green" marca uma mudança interessante no som do R.E.M.: ao mesmo tempo que a banda mantinha características que a haviam consagrado no universo alternativo até a metade dos anos 80 e começaram a aparecer para o grande público a partir do álbum "Document", neste trabalho começavam a inserir instrumentos alternativos, pouco usuais em sua trajetória até então, como o acordeão, o violoncelo e principalmente, e com grande destaque em uma série de faixas, o bandolim, instrumento que o guitarrista Peter Buck havia recém adquirido e acabara de aprender a tocar.
O álbum começa, como anuncia o nome, com um pop de primeira qualidade, de riff repetido meio oriental e ritmo quebrado, "Pop Song 89". Título aliás bem característico da banda com uma espécie de brincadeira com 'a música pra tocar no rádio', como "Finest Worksong", "Radio Free Europe" e "Radio Song", que viria no álbum seguinte, "Out of Time", coincidentemente, também abrindo o disco.
"Get Up" que a segue é um pop alegre, pra cima; "You are the Everything" é uma belíssima canção folk (seria a "Half a World Away" do "Green"?) que marca bem a característica já salientada da tilização do acordeão e do bandolim, instrumento que seria utilizado também de forma fundamental no trabalho sucessor, como no mega-sucesso "Losing My Religion".
"Stand", outro daqueles pops extremamente gostosos, seria uma espécie de antecipação de "Shinny Happy People", até pelo sonzinho de 'carrosel' comum às duas; e a excelente "World Leader Pretend", com seu tom sério, quase dramático, a predecessora do clássico "Losing My Religion". Forte, grave, engajada, "World Leader Pretend" é, para mim a melhor faixa e o coração do álbum.
O álbum segue com a acústica "The Wrong Child", conduzida pelo bandolim e com um interessantíssimo vocal duplicado cantado de formas diferentes pelo próprio Michael Stipe; com "Orange Crush" e "Turn You Inside-Out" que fazem a dobradinha elétrica do álbum, no momento provavelmente mais vibrante do disco, com duas faixas relativamente pesadas, cheias de guitarras, pedais, distorção e energia; e com "Hairshirt", linda faixa acústica, também pautada pelo bandolim.
"I Remember California", outra das grandes do disco, também pesada, densa, com guitarras e interpretação marcantes e que seria o final original do álbum, certamente cumpriria o papel de encerrar um grande álbum de forma competente, mas a banda ainda nos revelaria uma espécie de surpresa com uma última faixa simplesmente... sem nome. Uma linda canção com um belíssimo trabalho de vocais e bateria, num manifesto pelo amor e pela vida que, de tal forma dá sentido ao nome do álbum que seu próprio título chega a ser dispensável. Daquelas faixas adoráveis que servem pra fechar um álbum de maneira perfeita. 
Como eu já disse, depois viria "Out of Time", muito bom álbum, consagrado e tudo mais, mas que é na verdade, nada mais que uma boa sequência do ótimo "Green".
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FAIXAS:
  1. "Pop Song 89"
  2. "Get Up"
  3. "You Are the Everything"
  4. "Stand"
  5. "World Leader Pretend"
  6. "The Wrong Child"
  7. "Orange Crush"
  8. "Turn You Inside-Out"
  9. "Hairshirt"
  10. "I Remember California" 
  11.   

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Ouça:
R.E.M. Green


Cly Reis

segunda-feira, 14 de junho de 2021

R.E.M. - "Out of Time" (1991)

 

“Não esperávamos o que aconteceu com ‘Losing my Religion’. É uma música de cinco minutos sem refrão perceptível, e o bandolim é o instrumento principal. Não há absolutamente nenhuma maneira de prever que a música seria um sucesso."
Mike Mills

"Eu realmente gosto muito do disco. Na verdade, eu amo o disco.”
Michael Stipe

O início dos anos 90 foi especial para apreciadores de rock de qualquer canto do planeta, inclusive no Sul do Brasil, sempre longe demais das capitais. Surgiam ótimas e promissoras bandas tanto nas paradas de sucesso quanto na cena alternativa, despontavam alguns músicos de fina estirpe, as rádios e uma ativa MTV repercutiam muita coisa boa, festivais legais aconteciam pelo mundo. Mas aquele período foi também de confirmação de velhos conhecidos. Oriundos dos anos 60, 70 e 80, muitos artistas em plena atuação faziam alguns de seus melhores trabalhos naquele começo da última década do século XX, o mesmo que viu, nos anos 50, o rock surgir enquanto movimento jovem e cultural de massas. Foi assim com Iggy Pop, Lou Reed, The Cure, Neil Young, Metallica, U2 e vários outros. Sabendo-se de seus potenciais e história, de certa forma esperava-se deles que trouxessem novidades a cada lançamento. Porém, por incrível que pareça, não se alimentava essa expectativa quanto a R.E.M. – ou, quem sabe, temporariamente se esquecia deles.

Talvez por terem demorado três anos para lançar algo novo ou por virem de uma série de ótimos discos, desembocando no acachapante “Green”, a impressão que dava era a de que eles haviam se livrado dessa cobrança. A ausência do peso da responsabilidade foi positiva, pois fez com que a chegada de “Out of Time” fosse ainda mais impactante naquele ano de 1991. O primeiro single, "Losing My Religion", cujo videoclipe foi ao mesmo tempo um choque e um sucesso imediato, tratava-se de um perfect pop com as características que lhe são comuns: refrão pegajoso, riff fácil e inteligente, melodia envolvente, evolução com carga emotiva. Mas, mais do que isso, um tom melancólico, grave, contristado, algo entre uma balada com ares sacros e um pop rock de massas. Fora isso, o instrumento principal é um incomum bandolim. E que letra! “Aquele sou eu no canto/ Aquele sou eu sob os holofotes/ Perdendo minha religião/ Tentando te acompanhar/ E eu não sei se eu consigo fazer isso”. Sabia-se que se estava presenciando o nascimento de um clássico do rock.

Dada a primeira boa impressão, o então novo disco da R.E.M., porém, levou um pouco para chegar no ainda atrasado mercado fonográfico do Brasil daqueles idos. "Losing My Religion", por sua vez, cumpria o papel de reacender os holofotes para o quarteto Michael Stipe, Peter Buck, Mike Mills e Bill Berry. A se ver pelo primeiro hit, prenunciava-se um disco acima da média. Foi então que o dia de conhecer “Out...” chegou ao Rio Grande do Sul (provavelmente, se não o primeiro estado no Brasil, dos primeiros a ter esse privilégio) através da finada Rádio Ipanema, que aos finais de tarde geralmente rodava na íntegra alguma novidade do mundo do rock. 

E as expectativas foram todas confirmadas. “Radio Song”, que abre o álbum, assinalava que a R.E.M. vinha, sim, para engrossar a fila das bandas veteranas em plena forma naquela virada de anos 80 para os 90. Um britrock ao estilo das melhores coisas da Ride e Stone Roses, com um ritmo funkeado, riff matador e carregado das guitarras espetaculares de Buck. Ainda assim, o arranjo também comportava uma orquestra de cordas e uma boa dose de variações de andamento. Mas isso não é tudo: dividindo os vocais com Stipe está o rapper KRS-One. Primeiro, soltando frases e melismas com o sotaque das ruas norte-americanas, o que dá uma personalidade totalmente própria à música. Depois, ao final, KRS-One engata, aí sim, somente ele um rap, encerrando a canção com o provavelmente quarto ou quinto ritmo apresentado na melodia. Que cartão de visitas “Radio Song”!

A audição de “Out...” se desenrolava e, a cada nova faixa, mais se confirmava que se estava diante de um grande disco. "Low" emulava com competência The Doors, tanto no canto de Stipe a la Jim Morrison e no riff de guitarra circunspecto, que lembra temas como "When the Music's Over" e "Strange Day", quanto, principalmente, no órgão Hammond como o de Ray Manzareck. Bem ao estilo guitar melody, a R.E.M. volta à sua pegada dos discos “Document”, “Reckoning” e, principalmente, “Green”, em "Near World Heaven", outra música de trabalho do disco, esta, cantada por Mills. Conforme se avança no sulco, percebem-se semelhanças com a construção de repertório desses álbuns anteriores que tão certo havia dado, os quais intercalam temas mais alegres com outros mais melancólicos, mais agitados com lentos, mais distorcidos com melodias doces. Mérito do produtor Scott Litt.

O que “Out...” guarda também, no entanto, são mais maravilhas. A emocionante instrumental "Endgame" é um country altamente melodioso em que, além da instrumentalização caprichada com escaleta, violão, cordas e percussões delicadas, ouve-se a voz de Stipe apenas para cantarolar melismas como mais um instrumento. Após uma canção tristonha, vem mais uma pulsante. E em alto astral, por sinal. Sinônimo de música pop alegre, o segundo maior hit do disco, "Shiny Happy People", traz, além do termo "alegria" no próprio título, a esfuziante participação de Kate Pierson, da B52's, musa da divertida new wave, dividindo os microfones com Stipe, que pega emprestada a ideia tão bem executada por Iggy Pop com a cantora um ano antes noutro sucesso daquele começo de década, "Candy". Assim como “Losing...” e espelhando-se num tema de função parecida de “Green”, “Stand”, é mais um perfect pop que também marcou época por conta de sua melodia animada e de seu clipe, que trazia uma cenografia festiva e colorida como a música.

O pop rock eficiente de "Belong" completa-se com uma nova redução na rotação e mais uma bela canção: "Half a World Away", balada misto da atmosfera folk de "Endgame", o vocal anasalado típico de Stipe em "Losing...", as cordas de “Radio Song” e a levada Doors de "Low" – desta vez trocando o órgão por um cravo. Na sequência, Mills encabeça outro tema assim como fez em “Near...”. É “Texarcana”, novamente um rock com magnífico riff e complemento de cordas. A construção do repertório é tão parecida com a de “Green”, que mais uma vez as faixas se espelham. Caso de “Country Feedback”, balada que remete a “The Wrong Child” do álbum anterior. Esta prepara o terreno para o encerramento com "Me in Honey", em que se repete a dobradinha Stipe-Pierson num tema pop se não à altura de grandes faixas do próprio “Out...” e nem do gran finale de “Green” (o rockasso "I Remember California"), ao menos mantém com dignidade a boa qualidade.

Chegado ao final daquela primeira audição de “Out...”, ação se repetiria centenas de vezes nesses últimos 30 anos que o disco completa em 2021, ficava evidente que a R.E.M. se superava. E se não era melhor do que seu antecessor “Green” – difícil tarefa que a banda jamais atingiria até se dissolver, em 2011 – ao menos aperfeiçoava seu estilo e discurso. Adicionava-se às guitarradas de Buck outras formas de criar riffs; ampliava-se a instrumentalização; aprofundam-se na raiz da música norte-americana; Stipe apurava ainda mais sua poesia e canto. Presente em listas de grandes discos dos anos 90, como a dos 100 Álbuns das revistas Rolling Stone e Slant, “Out...” ganhou três Grammy Awards em 1992 (Melhor Álbum de Música Alternativa e dois para "Losing My Religion"). E se hoje o disco é considerado um clássico, à época de seu lançamento ele alçava o grupo a um novo patamar: o de banda que transpunha a fronteira do alternativo para o pop. O esquecimento temporário da R.E.M. havia feito bem tanto para poderem apresentar aquele novo trabalho quanto, principalmente, para atingirem livres de preconceitos um feito que poucos conseguem: o de tornar-se internacionalmente conhecido, mas manter o status de cult.

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FAIXAS:
1. "Radio Song" - 4:13
2. "Losing My Religion" - 4:26
3. "Low" - 4:55
4. "Near Wild Heaven" - 3:17
5. "Endgame" - 3:48
6. "Shiny Happy People" - 3:45
7. "Belong" - 4:05
8. "Half a World Away" - 3:26
9. "Texarkana" - 3:37
10. "Country Feedback" - 4:07
11. "Me in Honey" - 4:06
Todas as músicas de autoria de Berry, Buck, Mills e Stipe

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Daniel Rodrigues

quarta-feira, 1 de abril de 2015

John Coltrane - “A Love Supreme” (1965)




"Vi a Deus.”
Genesis 32:30





Alice Coltrane viu seu marido descer as escadas vindo da sala onde costumava trabalhar na casa em que viviam em Long Island, Nova York. Fazia cinco dias que mal saía de lá. Musicista e compositora como ele, Alice entendia muito bem a situação. Ele parecia cansado das obsessivas horas de trabalho, mas “inusitadamente sereno”, relatou Alice. “Parecia Moisés descendo a montanha. Foi lindo. Ele me disse: ‘Esta é a primeira em vez que me veio toda a música que quero gravar, como uma suíte. Pela primeira vez, tenho tudo, tudo pronto.’” O ano era 1964. Visivelmente, não se tratava de uma situação comum. O desgaste dele era justificável, visto que também altamente recompensador. Naquele dia de setembro, começo do outono nos Estados Unidos, John William Coltrane, depois de horas de concentração (e, ao que tudo indica, também contrição), havia composto integralmente todas as músicas daquela que se tornaria sua obra-prima e um marco da música em todos os tempos: “A Love Supreme”.

Gravado em apenas uma sessão, em 9 de dezembro de 1964, e lançado em fevereiro do ano seguinte, “A Love Supreme” logo se tornaria uma referência essencial não só para toda a geração posterior do jazz como Archie Sheep, Pharoah Sanders, Grant Green, Wynton e Brandford Marsalis, John McLaughlin e o próprio filho Ravi Coltrane, mas para músicos de outros estilos: a turma do rock clássico (Greatful Dead,Joni Mitchell, Santana, Jimi Hendrix), punks (Patti Smith, Tom Verlaine, Bono Vox), roqueiros mais atuais (Bob GillespieMobyPeter Buck), músicos da soul (Gil Scott-Heron, Marvin Gaye, Stevie Wonder) e da vanguarda (Steve Reich, Carla Bley, Lester Bowie, Frank Lowie). Porém, mais do que somente um espelho musical, “A Love Supreme” passou a dar também inspiração tanto política, visto que, na época, seu sucesso ajudou a inflamar o discurso racial de um grupo em formação chamado Black Panthers, quanto espiritual, como um manuscrito sagrado a ser decifrado. “Você entenderá a mensagem [de ‘A Love Supreme’] quando estiver pronto, como nos ensina a filosofia hindu. Se não estiver pronto, terá de recuar, se preparar e caminhar tudo de novo”, sentencia o baixista Reggie Workman, que tocara na banda de Coltrane em 1961, no livro “A Love Supreme: a criação do álbum clássico de John Coltrane”, do jornalista e pesquisador norte-americano Ashley Kuhn.

O livro do jornalista Ashley Kuhn
que disseca o grande álbum de Coltrane
De fato, para muitos Coltrane é um anjo que pousou por aqui com saxofone e asas e que, por apenas 41 anos, promoveu prodígios, deixando um lastro de beleza e amor. Nascido na Carolina do Norte em 1926 e criado na Filadélfia, o habilidoso instrumentista começou tocando clarinete, mas logo passou para o sax alto. Nos anos 40, integrou a bjg-band de Dizzie Gillespie, escola para a maioria dos jazzistas de alto nível, e a King Kolax Band ao lado de Charlie Parker, quando trocou o sax alto pelo tenor tendo em vista que o Bird já dominava o alto como ninguém. Nos anos 50, dado o seu reconhecível talento e estilo, é chamado para integrar o mágico quinteto de Miles Davis ao lado de Red Garland, Paul Chambers e Philly Joe Jones. Também com Miles, no final daquela década, compõe a banda que gravaria o mítico "Kind of Blue", considerado por muitos o melhor disco da história do jazz. O vício em heroína (comum aos músicos de jazz da época), no entanto, quase o faz abandonar a carreira. Mas após uma tortuosa recuperação, por volta de 1957, limpa-se das drogas e volta à ativa em alto nível e decidido a cumprir uma “missão musical”.

É justamente a trajetória de Coltrane como band leader que o impulsionaria ao status de um dos maiores músicos de sua época, formando a mística em torno de si e de sua obra. Se todas as experiências anteriores ajudaram a forjar o solista sui generis e o compositor criativo cunhado no be-bop, hard-bop, jazz modal e free-jazz, foi o contato com o pianista Thelonious Monk, no final dos anos 50, a chave para o encontro interior de Coltrane. Era a liga que faltava a este neto de bispo protestante com fortes raízes religiosas que tencionava transmitir em música algo transcendente e pessoal, numa concepção que incorporasse o hinduísmo, a astrologia, a filosofia ocidental, a cabala, a herança africana e, obviamente, um autorreconhecimento da presença de Deus.

Nas breves semanas que esteve com o didático e transgressor Monk, jazzista de fortes influências em Messiaen e Bártok que não se furtava em criar estranhas transições melódicas e mudanças rítmicas, Coltrane achou seu caminho. Foi quando vieram, por exemplo, obras autorais como “Blue Train”, "My Favourite Things", “Giant Steps”, “Africa/Brass” e “Olé”, todos essenciais a qualquer discoteca. É nesta época, também, que ele forma a banda que o acompanharia em várias gravações e shows e que comporia o time de “A Love...”: McCoy Tiner (piano), Elvin Jones (bateria) e Jimmy Garrison (baixo). Há três anos apoiado por esta formação, Coltrane caminhava firmemente para a música de vanguarda, espelhando-se nos trabalhos Charles Mingus, Ornette Coleman e Cecyl Taylor. Após o bem recebido “Crescent”, de 1963, “A Love...” era o sucessor aguardado pela crítica e público. “O que John Coltrane trará dessa vez?” “Em que ponto ele evoluirá com sua música?”, indagavam.

A resposta a essas perguntas não foi difícil de ser respondida. “A Love...” trazia o ápice da genialidade composicional, de arranjo e improvisação de John Coltrane. Além disso, carregava, do primeiro ao último acorde, todo um misticismo e espiritualidade que de pronto foram captados pelos fãs. E, ao invés de ser taxado como algo “menor” ou meramente “religioso”, este fator engrandeceu a obra. Não por acaso: “A Love...” consegue, em sua musicalidade vanguardista mas universal referenciar todo seu legado precedente, do jazz clássico de Count Basie e Dexter Gordon, o jazz moderno de Miles e Monk, passando pelo erudito de Messiaen e Stravinsky e pelos contemporâneos dele (Coleman, Herbie Hancock, Lee Morgan, Sonny Rollins, Wayne Shorter) sem suprimir sua subjetividade como indivíduo, como ser espiritual.

As quarto faixas de “A Love...” compõem uma “oferenda a Deus”, ideia que o próprio Coltrane deixaria clara no poema da contracapa original. “Vamos cantar todas as canções a Deus”, diz em um dos versos. E é isso que se sente na música. “Acknowledgement” acende os caminhos. Numa das mais marcantes aberturas de álbum da discografia jazz, um gongo rufa, como se soltasse cristais sonoros pelo ar. Surge a imagem de uma portada celeste abrindo-se sob uma radiante luz branca. É a elevação do espírito materializada em sons. No que o ressono oriental começa a apagar-se, vem o sax alto junto aos pratos, o piano e o baixo, que entram para manter de forma suave a seriedade da introdução. Um fraseado de sax é vigorosamente tocado, numa benção de boas-vindas. A invocação dura aproximadamente 35 segundos e, antes que a sensação de levitação se dissipe, Garrison entra com um acorde de quatro notas, que é o verdadeiro riff da canção, pois transforma em som as cadências do nome do álbum – afinal, como não intuir que naquele dedilhado está sendo dito: “A Love Supreme”? Tanto o é que, no final da faixa, depois de um verdadeiro show multitonal de Trane, de uma explosão polirrítmica de Jones e de um passeio pelos acordes de Tyner, Coltrane larga o bocal do instrumento e, com humildade e devoção, entoa com sua própria voz ao microfone: “a love supreme/ a love supreme...”, repetidas vezes.

Antes, no entanto, “Acknowledgement” nos dá uma sensação de intensidade e paixão. Coltrane inicia seu solo com acordes suaves e firmes, tal um orador de igreja. À medida que a emoção toma conta, sua “fala” vai se tornando insistente, adicionando ao lirismo inicial altas cargas de solenidade, graça e pesar. Vêm, então, ondas de alegria, acompanhadas com sabedoria pela mão esquerda de sensibilidade astral de Tyner e pela batida 6/8 de Jones, a qual remete aos ritmos latinos e afro-caribenhos. O baterista ainda sustenta a condução rítmica nos pratos, como lhe é característico. Coltrane pula de tom para tom repetidamente, numa desconstrução melódica que normalmente soaria desconfortável aos ouvidos, mas que, no contexto, demonstra sua “profunda ressonância espiritual”, como diz o escritor e biógrafo Lewis Porter. No ápice, o saxofonista dá uma guinada que joga o tom lá para cima, elevando a emotividade. Até que a intensidade cai e, depois das impressionantemente simétricas 37 repetições do riff pelo sax, a voz entra para entoar o mantra. No final, a banda desce um tom inteiro, preparando a cama para a parte 2 da suíte.

Rudy Van Gelder, o técnico de som com mãos de cirurgião, faz a colagem perfeita para a entrada do outro take: “Resolution” – minha preferida do disco. Talvez a mais “tradicional” do álbum, visto que, a priori, trata-se de um hard-bop bluesy como os que todos ali eram profundamente conhecedores. Porém, parece que, mais uma vez, a carga incorpórea dada à música por Coltrane e a banda eleva o “material” a outro patamar. O baixo abre sozinho, engenhosamente quieto, num preâmbulo lento e carregado de blues. Isso antecipa uma virada ruidosa, quando a banda entra explodindo e Coltrane, principalmente, detonando o riff. Ele novamente exercita saltos de modulação, subindo e descendo as escalas e imputando drama com seu saxofone. Tyner, invariavelmente inteligente, providencia um acompanhamento de ambivalência harmônica, dando liberdade ao solista. Em seguida, o líder empurra todo o quarteto para uma série de clímaces marcados por gritos ríspidos de seu sax, instigados pelos rolos da bateria e os pratos nervosos de Jones. Garrison, por sua vez, destaca-se pela combinação de notas curtas e precisas com outras longas e ressonantes.

Cabe a Jones fechar “Resolution” com uma virada na caixa e uma batida no prato de condução, pois é o baterista quem, num solo exuberante – que celebra os mestres do instrumento do jazz (Jo Jones, Art Blakey, Max Roach) e os influenciados do rock (Ginger Baker, Keith Moon, Mitch Mitchell) –, inicia a terceira sequência de “A Love...”: “Pursuance”. Usando baquetas de madeira, retoma a polirritmia africana e o toque caribenho, estabelecendo um ritmo saltitante e gingado que se incorpora ao seu estilo democrático da bateria, o qual se vale dos timbres de todo o aparato: caixa, tan-tan, pratos, tambor e bumbo.

A “procura” pela iluminação de Coltrane atinge limites épicos nesta faixa – gravada de primeira num irrepreensível take. Na primeira parte, sobre o ainda improviso da bateria (Jones, na verdade, não para de solar até o fim de sua participação na faixa), apenas apresenta o tema, dando a deixa para a rica e engenhosa improvisação de Tyner. O pianista sai ordenando uma sucessão de frases livres de pura inventividade melódica, criando quase uma nova estrutura à música. Aparecem com clareza seus característicos voicings, saltos de três intervalos acima da tônica da melodia que fazem o ouvinte saltar do sofá. Pura energia, pura música.

Detalhe para ouvidos atentos: a “deixa” de Tyner para Coltrane acontece segundos antes do esperado, forçando o atento e novamente cirúrgico Van Gelder a aumentar o volume do microfone do sax (detalhe perceptível na amplitude do som dos pratos de Jones). É quando Coltrane entra para serpentear em vários motivos surgidos ali, no calor do momento, conduzindo frases frenéticas até as alturas. Erupções, dissonâncias, ruídos roucos, ideias cíclicas do tema original, citações do riff de “Acknowledgement”. Tudo isso condensado em apenas 2 minutos e meio. É o momento de maior expressividade de improviso de Trane, quando a minissinfonia que é “A Love...” atinge o que seria seu allegro vivace. Como diz Kahn: esta parte é “o coração do álbum”.

Mas não para por aí: Coltrane chama Jones para a prece. Extremamente cúmplices, o sax e a bateria de um e de outro, velhos parceiros, atingem um nível de diálogo telepático. Jones dispara uma fuzilaria de rolos, estrondos e batidas nos pratos. Coltrane responde com grunhidos tumultuosos do seu arco. Ambos se homogeneízam, sem definir quem comanda e quem acompanha. Para finalizar, Jones metralha viradas na caixa e Garrison, já em pleno improviso, tem sua vez de realce com um solo de três minutos. Idas e vindas, menções ao tema do primeiro número e, claro, da própria “Pursuance”, são ouvidas num improviso hábil e “intrigante” do contrabaixo, como classificou outro craque do instrumento, Ron Carter.

Depois da fúria de “Pursuance” e do balanço de “Resolution”, o clima meditativo do início do disco vem com força total para finalizá-lo na tocante “Psalm”. Tão distinta que parece isolar-se do restante, como um recolhimento ao altar para a oração. Sequência de “Pursuance” (foi gravada no mesmo histórico take), é nada mais nada menos do que a declamação quieta e etérea de Coltrane do seu poema da contracapa. Frase por frase, sem melodia cantarolável, sem centro tonal. Apenas acompanhado dos acordes atmosféricos do piano de Tyner e do baixo de Garrison, além dos pratos de Jones, que ainda surpreende ao operar inusitados tímpanos de orquestra, os quais dão um ar ao mesmo tempo introspectivo, solene e raveliano. E quem “declama” é o sax, e não a voz. Num movimento inverso ao de “Acknowledgement”, quando começa o disco indo da melodia para a palavra, aqui, no final dele, Coltrane vai da palavra para a melodia. Lê-se num dos versos a citação de um trecho dos salmos bíblicos do livro do Gênesis: “Vi a Deus face a face, e a minha alma foi salva”. Ninguém duvida que John Coltrane de fato tenha tocado o divino.

Em vida, ainda deu tempo de o músico gravar mais um trabalho fundamental do jazz, “Ascension”, de 1966, ponte determinante entre o free-jazz e a avant-garde. Se é coincidência que seus últimos dois discos se chamam “um amor supremo” e “ascensão”, não se tem certeza. O fato é que, acometido de um câncer (o qual se desconfia que ele já soubesse da existência antes de compor “A Love Supreme”) foi, um ano depois, levado por seus colegas alados para habitar, definitivamente, nos céus. E ao que tudo indica, em paz. Pelo menos é o que o seu testamento musical nos diz. A morte prematura; a aura espiritual de “A Love...”; a única apresentação ao vivo do repertório do disco (em Antibes, na França, show que compõe a edição especial do CD); a dimensão de sua influência ao longo dos tempos; tudo isso dá corpo à mitologia em torno de Coltrane e sua obra.

No entanto, mais do que qualquer atributo, o fato é que “A Love...” foi concebido com a alma, e é isso que emana do sulco toda vez que se põe o disco para tocar mesmo hoje em 2015, 50 anos depois de seu lançamento. Elvin Jones, talvez o músico que melhor tenha se entendido com Coltrane entre os diversos que tocaram com ele nos 28 anos de carreira do saxofonista, parece compreender com profundidade o porquê da passagem do colega e amigo por essas bandas terrenas e o legado de “A Love...”: “Quem quiser saber o que foi John Coltrane tem de conhecer ‘A Love Supreme’. É como o apogeu da vida de um homem, a história completa de uma vida inteira. Quando alguém quer se tornar um cidadão americano, deve fazer o juramento de fidelidade diante de Deus. ‘A Love Supreme’ é o juramento de John.”

Não tenho dúvida que a alma de John Coltrane foi salva.
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FAIXAS:
1. A Love Supreme, Pt. 1: “Acknowledgement” - 7:47
2. A Love Supreme, Pt. 2: “Resolution” - 7:25
3. A Love Supreme, Pt. 3: “Pursuance” – 10:43
5. A Love Supreme, Pt. 4: “Psalm” – 7:40

todas as composições de John Coltrane









sexta-feira, 5 de julho de 2019

Nick Drake - "Five Leaves Left" (1969)



"O violão de Nick sempre foi perfeito, sua voz era sempre perfeita".
Joe Boyd, produtor musical

"Existe algo místico sobre Nick Drake, pois ele gravou apenas três discos e não é muito conhecido. Mas há algo mágico em sua música, uma espécie de fragilidade que muitos podem reconhecer".
Paul Weller

"Eu não acho que tencionava ser uma estrela, mas creio que ele sentiu que tinha algo a dizer às pessoas de sua própria geração, que poderia torná-las mais felizes, e ele sentiu que não havia conseguido".
Molly Drake, mãe de Nick Drake

O ano de 1969 é talvez o mais abundante da história da música moderna. Na música clássica e de vanguarda, John Cage, Dimitri Shostakovitch e sir. Maxwell Davies produziam obras referenciais como a “HPSCHD”, “Sinfonia nº 14” e “Vesalii Icones”, respectivamente. No jazz, Miles Davis trazia o duo de discos que abriria as portas para o fusion, “Bitches Brew” e “In A Silent Way”, e Manfred Eicher lançava na Alemanha o revolucionário selo ECM. No Brasil, já exportador da bossa nova, o Tropicalismo erigia seus mais pungentes manifestos ainda hoje em processo de assimilação. Se foi assim para estes gêneros, imagine para o rock! Tudo culminava naquele último ano da efervescente década de 60. A segunda geração do pós-guerra, os baby boomers, deparava-se com a emergência de uma nova sociedade num mundo em transformação, o que se expressava nas artes de maneira avassaladoramente criativa, sendo a música, especialmente o rock, a principal delas.

São deste ano, só para se ter ideia, o Festival de Woodstock, a pintura musical-impressionista “Astral Weeks”, de Van Morrison, os dois primeiros da Led Zeppelin, começo do metal/hard rock, o grito da denúncia Black Power “Stand!”, da Sly & Family Stone, a paulada inicial do punk da MC5 e da The Stooges e a perfeição do “canto do cisne” beatle, “Abbey Road”. Mais do que os dois anos anteriores, também fartos, a sensação que se tinha em 1969 era a de que se findava um ciclo sem acabá-lo. Talvez por isso a angústia gerada em artistas e músicos em simbolizá-lo, em registrá-lo, em guardá-lo para a posteridade. Uma dessas mentes impactadas pelo contexto sociocultural da época é o cantor e compositor britânico-birmanês Nick Drake. É dele um dos históricos trabalhos cunhados naquele fatídico 1969 e que está completando 50 anos de lançamento: “Five Leaves Left”.

Capaz de unir a postura transgressora do rock com a tradição dos trovadores medievais, Drake traz em seu folk uma poesia ora arcadista ora romântica. Isso aliado a uma sonoridade altamente expressiva e penetrante, reforçado por um canto sóbrio, na medida exata. Tudo numa atmosfera cult que nem Dylan e nem Donovan conseguiram atingir. Ainda, bom gosto absoluto nos arranjos de Harry Robinson e Robert Kirby, os quais, sintonizados com os gostos de Drake, traziam como referência a atmosfera vanguardista da Velvet Underground, o barroco da Beach Boys de “Pet Sounds” e o primor melódico dos mestres do folk e do blues.

Clássica sessão de fotos de Keith Morris em 1969
mostra o alto e elegante Drake
O clima sombrio e peculiar da música de Drake era fruto do gênio de um jovem alto, elegante e bonito, porém tímido e antissociável. Em contrapartida, absolutamente inventivo e capaz. Além de praticar vários esportes na adolescência, desde cedo mostrava habilidades musicais. Tocava clarinete, saxofone, piano e, com muita desenvoltura, o violão, seu instrumento-base. É do pinho que Drake tira preciosidades como “Time Has Told Me”, cuja combinação com a guitarra folk abre “Five...” numa declaração bastante confessional e sobre a passagem do tempo, tema recorrente na obra do músico: “O tempo me disse/ Você é um achado raro/ Uma cura problemática/ Para uma mente problemática”. Das mais lindas canções daquele ano – talvez da década de 60, como uma “Blackbird”, "Blowin' in the Wind" ou “Little Wing”  – “River Man” é tão melancólica e potente, que parece o escorrer de uma lágrima mansa. As cordas intensificam o sentimentalismo dos versos entoados com rara candura sobre uma sofrida personagem Betty: “Estou indo ver o homem do rio/ Indo dizer a ele tudo que eu puder/ Sobre o plano/ Pra quando desabrocharem as violetas”.

Outra de “beleza sombria e arrepiante”, como classificou o crítico musical Richie Unterberger,  vem na sequência. É “Three Hours”, um country de ares dark cujo baixo acústico mantém um tom grave enquanto o violão dedilha um riff variante, quase improvisado. As cordas orquestradas por Kirby carregam na intensidade para fazer cama à voz seca e contida de Drake, lembrando temas como “She’s Leaving Home”, dos Beatles, e aquilo que Morrissey repetiria quase duas décadas mais tarde com a igualmente arrebatada “Angel, Angel, Down We Go Together” – inclusive no final repentino.

A habilidade de criar afinações diferenciadas para o violão aparecem muito claramente em “Way To Blue”, outra cortante, e o country-rock “'Cello Song”, que tem um acompanhamento interessantíssimo de congas e, como o título indica, de um violoncelo. “The Thoughts Of Mary Jane” é, assim como “River...”, mais uma canção introspectiva que versa sobre um alter ego feminino: “Quem pode saber/ Os pensamentos de Mary Jane/ Porque ela voa/ Ou vai lá pra chuva/ Onde ela esteve/ E quem ela viu/ Na sua jornada para as estrelas”.

“Man In A Shed”, um blues “piano bar”, é cantado tão delicadamente que a voz quase se dissolve em meio ao som dos instrumentos, cujo arranjo privilegia, com muito bom gosto e economia, apenas o piano, um baixo acústico e o violão de Drake. Não dá pra dizer que seja alegre, mas é com certeza a mais animada do disco, com o arejamento jazzístico que outro contemporâneo de Drake, Tim Buckey, também apresentaria naquele mesmo ano em “Happy Sad”.

A fossa retorna, no entanto, com mais uma balada sangrenta: “Fruit Tree”. Novamente autobiográfica, como o tema de abertura, de certa forma prevê a trajetória curta que o homem/artista Nick Drake teria: “Fama é uma árvore frutífera/ Tão estática/ Que pode nunca florescer/ Até que os ramos encontrem o chão/ Alguns homens de renome/ Podem nunca encontrar um caminho/ Até que o tempo voe/ Além do dia de sua morte”. Mais uma vez o arranjo de Kirby dá cores especiais à composição sem competir com o violão cristalino de Drake, intenção esta obtida pelo produtor Joe Boyd: “Quando você ouve os álbuns dele uma das coisas que são extraordinárias é o violão, porque soa tão limpo e forte, e todas as notas são equilibradas. É muito raro isso, pois é muito complicado".

Um final digno para um disco sem ressalvas, “Saturday Sun”, a única do disco com bateria – cuja leves batidas ainda têm o acompanhamento de um elegante vibrafone –, traz em sua poesia novamente a questão do tempo emocional e a relação de seu autor com o mundo externo, revelando os elementos naturais quase como personagens: “O sol de sábado/ veio cedo em uma manhã/ Em um céu tão limpo e azul/ O sol de sábado/ veio sem aviso/ Então ninguém soube o que fazer “. E, pessimista, conclui, sua única maneira possível: “E o sol de sábado/ Se tornou a chuva de domingo/ Então o domingo cobriu o sol de sábado/ No sol de sábado/ E entristeceu-se por um dia que se foi”. De arrepiar.

Depois dessas dez obras-primas escritas para “Five...”, Drake se reclusaria cada vez mais e registaria apenas outras 21 canções, as quais compõem os discos “Bryter Layter”, de um ano depois, e "Pink Moon", de 1971. Apenas três álbuns, que, com o tempo, entraram para a história, visto que todos figuram entre os 500 Discos de Todos os Tempos da Rolling Stone, mesma consideração dada pelo livro “1001 Albums You Must Hear Before You Die”, do jornalista Robert Dimery. Que o digam Robert Smith, Paul Weller, Peter Buck, David Silvian e Renato Russo, fãs que o reverenciam e justificam a essencialidade de 100% de sua obra. A morte prematura, em 1974, aos 26 anos, por overdose, não impediu que, ao contrário dos próprios versos pessimistas, Drake se transformasse em um “homem de renome”. Desconfia-se, contudo, que tenha, na verdade, cometido suicídio - ou, talvez ainda pior, não tenha se importado em perder a vida. Como um tardio poeta romântico, o sensível e deslocado Drake morria antes do tempo para que sua obra fosse reconhecida. Fatídico, mas tragicamente procedente. Como o próprio ano de 1969: uma incompletude que não tem o que tirar nem por.

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FAIXAS:
1. Time Has Told Me - 3:56
2. River Man - 4:28
3. Three Hours - 6:01
4. Day Is Done - 2:22
5. Way To Blue - 3:05
6. 'Cello Song - 3:58
7. The Thoughts Of Mary Jane - 3:12
8. Man In A Shed - 3:49
9. Fruit Tree - 4:42
10. Saturday Sun - 4:00
Todas as composições de autoria de Nick Drake

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OUÇA O DISCO:

Daniel Rodrigues