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domingo, 24 de setembro de 2023

"Conflitos Internos", de Andrew Lau e Alan Mak (2002) vs. "Os Infiltrados", de Martin Scorsese (2006)

 



"Conflitos Internos" é aquele time que ganha, com uma certa facilidade, a maioria dos jogos na sua liga continental. No quesito filme policial certamente ele se destaca em relação a seus concorrentes asiáticos. Uma ótima trama, surpresas, reviravoltas, tensão, a produção de Hong Kong entrega tudo isso e deixa o espectador na constante expectativa de como seu jogo de gato e rato vai terminar. Só que quando ele sai da seu cercadinho e pega um time de uma liga maior, mais tradicional, mais bem preparado, com maior investimento, um elenco milionário e um baita treinador, não dá nem pra saída. Embora não seja regra que com todas essas vantagens um filme norte-americano supere uma produção de mercados alternativos, "Os Infiltrados", no caso específico, atropela seu adversário. Ele é melhor em tudo! Tudo que ele se propõe a fazer melhor que o original que o inspirou, ele consegue. O enredo tem mais elementos, o roteiro é mais bem trabalhado, a trilha sonora é excelente, a parte técnica é superior (luz, som, maquiagem...), Martin Scorsese, um dos maiores diretores de todos os tempos, conduz o filme de forma precisa e seu time conta com, nada mais nada menos que, Leonardo DiCaprioMatt Damon e Jack Nicholson, sem contar com ótimos coadjuvantes como Vera Farmiga, Martin Sheen e Mark Wahlberg

Com algumas pequenas diferenças, basicamente a trama nos dois casos, nos apresenta um agente de polícia trabalhando infiltrado na máfia, e um "afilhado" de um mafioso, moldado dentro da polícia, formado na academia, a serviço do criminoso dentro da força policial. Ambos os lados, percebendo que informações vazam, tanto para a lei quanto para os criminosos, iniciam suas caças particulares ao respectivo informante, gerando situações de perseguição, suspense e constante expectativa.

A refilmagem norte-americana trabalha melhor o início de tudo, constrói melhor a formação inicial dos dois protagonistas, desde suas épocas de bairro, até o desempenho dentro da academia de cadetes. Os motivos que levam à preterição do jovem Billy Castigan para serviços convencionais dentro da polícia e a opção por colocá-lo disfarçado, bem como, do outro lado, a relação muito estreita do mafioso Costello com seu pupilo Colin Sullivan, e a ascensão do rapaz dentro da polícia, tudo é mais bem desenvolvido do que no original, honconguês, que, por sua vez, é bastante breve nesse ponto, dando apenas uma rasa e apressada noção dos fatos, já passando adiante para o momento em que os dois, Chan e Lau, trabalham para lados opostos.

Outra diferença, é que em "Os Infiltrados" a psicóloga da polícia, além de ser namorada de Colin, o filhote de mafioso infiltrado na polícia (Matt Damon), mantém uma relação íntima com o perturbado Billy (DiCaprio), o policial infiltrado na máfia. Já em "Conflitos Internos", ela sequer conhece Lau, o jovem mafioso que se passa por policial, e, embora próxima a Chan, o verdadeiro agente disfarçado, não tem qualquer relação amorosa com ele. A relação da psicóloga com os dois e como ela se desenvolve, a crise no namoro com um deles, e gradual conquista de carinho e confiança com o outro, é importante para o desfecho que Scorsese propõe e, por outro lado, a ausência de um laço emocional da dra. Lee com qualquer um dos dois, torna a resolução da primeira versão frágil e inconsistente.

A propósito, ainda que não queira dar spoiler, tenho que dizer que o final é diferente nos dois e mas no remake nos dá uma sensação um pouco mais confortante, o que não significa que seja melhor ou pior...



"Conflitos Internos" (2002) - trailer


"Os Infiltrados" (2006) - trailer


Mas então vamos ao que interessa.

Você quer bola rolando? Tá aí o que você queria:

O argumento original, cheio de revelações, reviravoltas, surpresas, é ótimo, envolvente, excitante, e isso tudo é um grande mérito do filme asiático, por outro lado, o remake aperfeiçoa essa premissa, lhe dota de mais detalhes e complementos e algumas modificações bastante válidas para o roteiro. Ou seja, "Conflitos..." sai na frente mas leva o empate logo em seguida.

Mas é basicamente o que o time honconguês consegue fazer pois a partir daí a equipe norte-americana deita e rola. Martin Scorsese é mestre e, apesar de "Os Infiltrados" nem ser seu melhor trabalho, conduz o time brilhantemente à vitória. Ele dita o ritmo, da agilidade ao filme e tem uma capacidade ímpar de combinar cenas intensas, fortes, violentas, a uma trilha sonora invariavelmente precisa e de muito bom gosto. 2x1 para os Infiltrados de Scorsese.

O ataque formado por Matt Damon e pelo badalado LeoDiCaprio é competente, joga bem, mas a dupla, no fim das contas, não desequilibra. Leozinho, que é queridinho da imprensa, pedido pela torcida na Seleção, cotado para a Bola de Ouro, na hora do vamos ver, não consegue ser, verdadeiramente decisivo, como se espera dele e faz um  jogo apenas comum. Mark Wahlberg faz bem o papel de volantão, de cão-de-guarda da defesa, Vera Farmiga, surpreende vindo de trás, mas quem faz diferença mesmo no jogo são os veteranos: Martin Sheen, só na experiência, distribui o jogo ali na meuíca, e o cracaço de bola, Jack Nicholson, três vezes Melhor do Mundo da FIFA (ou seja, três Oscar na prateleira), chama o jogo para si, dá um show e guarda o seu. 3x1, Infiltrados.

A cena do chefe de polícia caindo do prédio é mais impactante no filme de 2006, bem como toda a construção da situação que leva a ela é mais inteligente e bem elaborada (4x1); em compensação, o desmascaramento do policial corrupto num terraço de Honk Kong, é boa nos dois, porém mais impressionante plasticamente no primeiro (4x2). Será que o time asiático volta pro jogo?

Não dá, não. 

Toda a situação envolvendo o envelope, a grafia errada por fora, a entrega dele cinema para o informante, a perseguição entre os dois incógnitos pelas ruas, e a revelação de quem estava de posse da informação, tudo é muito mais bem feito no filme de Martin Scorsese. 5x2 no placar.

Como se já não bastasse o banho de bola, o fato de ter levado o Oscar de melhor filme, direção, edição e roteiro adaptado garante mais uma bola na rede para o time de Scorsese e define a vitória dos Infiltrados. 6x2, e ficou barato!

No final do jogo, os atletas trocam as camisetas e aí, sim, ninguém sabe mais quem é de quem, e quem estava de qual lado... Mas aí já não importa mais.

O policial de verdade desmascarando o falso policial nas duas versões
(à esquerda, o original de 2002, e à direita, o remake de 2006)


Com um jogo de movimentação e infiltrações na defesa adversária, 
o time do técnico Martin Scorsese,
atropela a equipe dos treinadores Lau e Mak, 
boa mas cheia de problemas de grupo e conflitos internos.





por Cly Reis

 

terça-feira, 31 de outubro de 2023

10 Filmes de Bruxas para o Halloween

 



Dia das Bruxas!

Não tem como pensar em Halloween e não remeter a filmes de terror. E o interessante é que, embora o cinema sempre tenha dado uma atenção às bruxas, talvez diante do desgaste de algumas outras vertentes do terror, como serial-killers indestrutíveis, violência gráfica extrema, remakes ineficazes e desnecessários, ou franquias comerciais de sustos pré-programados, elas estão em alta e voltam com força no cinema atual. Que o cinema tem algumas bruxas célebres isso não há como discutir, como as belas adolescentes de "Jovens Bruxas", as veteranas carismáticas da "comédia" "Convenção das Bruxas", a oculta e onipresente "A Bruxa de Blair", e, por que não, a icônica bruxa verde com verruga e vassoura voadora de "o Mágico de Oz". Mas vamos aqui lembrar algumas outras. Umas, novos ícones da cultura do terror, como a jovem Thomasin, de "A Bruxa", de 2015, outras, lá do início da história do cinema como as mulheres acusadas de feitiçaria do impressionante "Haxan - A Feitiçaria Através dos Tempos", de 1922, outras, de filmes cultuados, como as diretoras da escola de balé, do clássico "Suspíria", de Dario Argento.

Então vamos à nossa lista de bruxaria. 10 filmes de bruxas para este Halloween...


🎃🎃🎃🎃🎃🎃


1. "Häxan - A Feitiçaria Através dos Tempos" - de Benjamin Christensen (1922) - Meio documentário, meio ficção, mistura documentos históricos com reconstituições encenadas, mas que de todo esse experimento cinematográfico consegue obter uma obra singular. "Häxan", apesar de toda sua condução documental, textos na tela, limitações técnicas, soluções primárias, etc., ainda nos primórdios do cinema, consegue prender a atenção causar, sim, terror no espectador. Numa exposição sobre as superstições, interpretações, temores coletivos, preconceitos, punições, ignorância e poder, o diretor, um visionário para sua época, nos apresenta diversas situações de pessoas que eram julgadas como bruxas, ou possuídas por demônios, baseado em suas aparências, gênero, condição mental, ou até mesmo interesse social religioso, sem, necessariamente, terem qualquer ligação com bruxaria. Mas onde entra a bruxaria no filme? Bem, nas dramatizações, de modo a demonstrar o que estava em julgamento ou como aquelas "bruxas" eram vistas, nos são apresentadas torturas, demônios, feitiçarias e mutilações. Sim! Isso em um "documentário" de 1922. Obra de arte. Aqui não temos UMA bruxa e sim várias, que, no entanto, muito provavelmente não tinham nada a ver com essas atividades. Por incrível que pareça, filme ainda muito pertinente na nossa época de preconceitos, julgamentos e condenações automáticas.


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2. "A Maldição do Demônio" ou "A Máscara de Satã" - de Mario Bava (1960) - Clássico do terror italiano! No século XVII, uma nobre, acusada de bruxaria, antes de ser executada com seu amante, lança uma maldição sobre a família de seus executores. Ela os perseguirá para toda a eternidade. Isso é logo no início do filme, é a primeira sequência e, com certeza a mais impactante dada o método de execução da princesa. Uma máscara com pregos é aplicada ao rosto da bela mulher. Até por todo esse impacto inicial, o filme inevitavelmente cai um pouco depois, com uma estranha mistura de vampiros e zumbis, mas mesmo assim vale como um dos grandes exemplares do terror gótico europeu. Sem contar que o fato de ser estrelado por Barbara Steele, uma das rainhas do terror, nos papeis principais, primeiro da bruxa Asa, condenada e morta, e depois de sua descendente a sobrinha Katja, possuída pela tia e pronta para aterrorizar o vilarejo e seus amaldiçoados, dois séculos depois.


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3. "Suspíria" - de Dario Argento (1977) - Uma obra de arte de Dario Argento. A fotografia labiríntica, a iluminação intensa, a trilha sonora inquietante, a direção de arte muito geométrica e o sangue excessivamente vermelho e vibrante, compõe uma obra esteticamente incrível em uma história sobre bruxas em uma escola de dança. Uma estudante norte-americana, Suzy Bannion, chega à Alemanha para prestar estudos numa conceituada academia de balé só que, uma vez integrada ao corpo de alunas, em meio a um ambiente frio e pouquíssimo receptivo, começa a perceber coisas estranhas... Há uma aluna desaparecida, outra morre tragicamente no hall do prédio onde mora atingida por uma estrutura de vidro, um instrutor é brutalmente devorado por seu próprio cão, sua colega de quarto é dilacerada por lâminas... Ela começa a desconfiar que há alguma coisa de errado com aquele lugar, resolve bisbilhotar e descobre que ali funciona secularmente um covil de bruxas comandado por uma lendária bruxa grega conhecida como Rainha Negra. Péssima ideia ter se metido nisso, cara Suzy! Só que agora que mexeu, vai ter que enfrentar. 

O filme tem um remake de 2018, bem interessante do também italiano Lucca Guadagnino, com algumas mudanças na história, é bem verdade, um final diferente, mas bem sangrento e bastante competente. Também merece uma boa olhada.



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4. "As Bruxas de Eastwick", de Geroge Miller (1987) - Raramente lembrado quando se fala em filmes de bruxas mas que, particularmente, gosto bastante. 

Três mulheres solitárias, cansadas de tudo, desestimuladas, mas sobretudo carentes, Michelle Pfeiffer, Susan Sarandon e Cher, vivendo na pacata e bucólica cidadezinha de Eastwick, resolvem fazer um feitiço em conjunto para materializarem o "homem dos sonhos". Ele vem. Mas não é bem dos sonhos. A vida das três vira de cabeça para baixo. Daryl Van Horne, encarnado por Jack Nicholson, planta entre as três o ciúme e a discórdia, e somente a união delas, novamente, poderá expulsar aquele mal de suas vidas. 

Sexy, divertido, carregado de questionamentos à condição da mulher de meia idade, especialmente naquele momento, nos anos 80, das idealizações e do verdadeiro valor do papel de um homem na vida de uma mulher. Elencaço de primeira com atuações brilhantes de todos mas, em especial do diabão Jack Nicholson.


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5. "Quando Éramos Bruxas", de Nietzchka Keene (1990) - Filme belíssimo baseado num conto dos irmãos Grimm, "Quando Éramos Bruxas", ou no original 'A Amoreira', traz a estreia da, então, jovem Björk, no cinema. Ela faz o papel de Margit, uma das filhas de uma mulher que fora morta por feitiçaria, e que foge junto com a irmã para um lugar remoto, onde não possam ser encontradas pelos executores de sua mãe. Lá, a irmã, Katla, enfeitiça e se casa com um viúvo local. O filho do homem, Jonas, no entanto, percebendo alguma coisa de estranho na madrasta, se opõe à união, a rejeita e tenta convencer o pai a deixá-la, no entanto, se afeiçoa à irmã mais nova, Margit, que, filha de bruxa, tem visões da própria mãe e da mãe falecida do garoto. Enquanto Katla usa seus poderes para sedução e para o domínio, a mais nova, Margit, os usa positivamente. Caso da bruxinha boa e da bruxinha má. 

Belíssima releitura feminista do conto dos Grimm, com espetacular fotografia em preto e branco.


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6. "As Senhoras de Salem", de Rob Zombie (2012) - Rádio, rock'n roll, vinil.... terror. O mundo de Rob Zombie! 

Em Salem, a cidade onde ocorreram os conhecidos julgamentos de bruxas do século XVII, nos Estados Unidos, uma DJ recebe um LP com uma música estranhíssima, sons indistintos, ruídos confusos, de uma suposta banda chamada The Lords. Depois de ouvir o troço, ela então passa a ter visões esquisitas, sonhos perturbadores, coisas atormentadoras. Heidi procura um especialista em ocultismo que entende que aqueles sons gravados no disco tinham as mesmas notas de um cântico de invocação de uma seita de bruxas que pretendem sua vingança contra os habitantes da cidade que as condenou. 

Para garantir que o destino da cidade seja cumprida, um trio sinistro de tiazinhas, vizinhas da DJ, vigiam a moça e vão garantir que ela, como uma das descendentes dos inquisidores seja o instrumento da vingança. 

Zombie constrói cenas de uma psicodelia macabra impressionante, sobretudo na sequência final quando finalmente parece que a profecia das bruxas se cumprirá. Padres se masturbando, bebês crucificados, anões deformados, tentáculos fálicos, freiras purulentas, fazem parte de um sabá orgíaco surrealista à espera da chegada do demônio pelo ventre de uma herdeira da linhagem dos Senhores de Salem. A maturidade de Rob Zombie na direção depois dos decepcionantes remakes de "Halloween".



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7. "A Bruxa", de Robeert Eggers (2015) - Clássico instantâneo, inegavelmente "A Bruxa" é uma das novas referências do terror. Um filme que assusta muito mais pelo todo, pelo ambiente, do que por sangue, surpresas, violência ou clichês batidos.

No século XVII, uma família, expulsa de sua comunidade, é obrigada a abandonar a aldeia onde viviam e morar no limite da floresta. Lá eles se instalam, constroem um casebre, um estábulo, tentam começar uma nova vida mas, certo dia, do nada, praticamente diante dos olhos da filha mais velha da família, seu irmão, ainda bebê some. Some... Simplesmente some. Ela não sabe o que fazer, onde procurar, como procurar e passa a ser responsabilizada pelo sumiço pelo próprio pai que, supersticioso e fanático como é, a acusa de bruxaria. Aos poucos a floresta que margeia a casa parece começar a dar sinais, atrair o irmão do meio, atiçar a primeiro curiosidade da jovem Thomasin e depois a simpatia, como uma amiga que chama, "Venha, venha...".

O bosque estático, o bode preto, o corvo, tudo é assustadoramente silencioso. Nada de pulos, de sustos, de correrias. Só a tensão. O Bode Black Phillip, por si só, é uma das coisas mais assustadoras do cinema. Posso afirmar que nunca mais olhei para um bode da mesma forma depois de assistir ao filme.



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8. "Hagazussa - A Maldição da Bruxa", de Lukas Feigelfeld (2017) - Filme, à primeira vista, esquisitíssimo mas que carrega uma série de metáforas e questionamentos sobre a condição da mulher. Pessoas, locais, situações se confundem e confundem o espectador, especialmente na parte final, numa sucessão de delírios da protagonista, a jovem Albarn, que depois da morte de sua mãe, mal vista pela comunidade onde vive, é obrigada a se afastar para as montanhas, nos alpes suíços. Lá, depois de adulta, com sua filhinha (não vemos, não somos informados, nem temos ideia de quem seja o pai), ela tenta levar a vida, no entanto, continua, como sempre em sua vida, desde criança, sente que algo lhe observa, lhe acompanha e talvez determine seu destino.

Um pouco de "A Bruxa", um pouco de "Quando Éramos Bruxas", "Hagazuza", destaca-se, sobretudo pela fotografia incrível, a luz sempre muito precisa e uma direção de arte econômica mas igualmente certeira.

Uma experiência estética incrível.



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9. "A Avó", de Paco Plaza (2021) - Helena, uma modelo vivendo em Madri, às portas de uma oportunidade importante dentro do mundo da moda, é obrigada a voltar às pressas à sua cidade natal, no interior, em virtude de um derrame de sua avó, a quem sempre fora muito ligada desde a infância e que a criara depois do falecimento dos pais. Ela retorna supondo que seria uma estada breve, tempo o suficiente para tomar algumas providências quanto à avó, mas as coisas vão a prendendo e ela não consegue se desvencilhar. A idosa está catatônica, completamente dependente, mal a reconhece mas ela é a única parente próxima e, primeiro reluta e depois tem alguma dificuldade em encontrar uma cuidadora de idosos. Os dias vão se passando e Helena vai notando comportamentos estranhos da avó que, embora não fale com ela, fique sentada, quieta olhando para o vazio o dia todo, por vezes, do nada, ri, fala sozinha, murmura umas ladainhas, levanta, some repentinamente para reaparecer logo em seguida.

A jovem tenta sair, tenta voltar, mas parece que a velha não deixa, quando consegue contratar uma enfermeira, a pessoa morre tragicamente ao sair de seu apartamento, sob o olhar frio da velha na janela.

Teria a avó alguma coisa a ver com aquela morte? Com o fato de ela, Helena, não estar conseguindo sair dali? Estaria a avó a segurando ali? E a jovem amiga misteriosa que vem aparecendo para visitar a avó? quem era? Ela diz conhecer Helena da infância mas que ligação teria com uma idosa quase inválida?

Helena começa a remexer nas coisas, físicas e emocionais, fotos, memórias, presentes, pessoas... Começa a ligar alguns pontos... a morte dos pais, ela ficando aos "cuidados" da avó... Eaquela velha amiga que costumava estar com ela? Por onde andaria? E jovem amiga da avó... Será...?

Rejuvenescimento? Apropriação de outro corpo? Roubo de alma? Imortalidade? 

Bruxaria?


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10. "Você Não Estará Só", de Goran Stolevski (2022) - Por incrível que possa parecer, um filme lindíssimo! A bruxa é deformada com pele enrugada de queimaduras, tem garras de animal, ela estripa bicho, come gente mas o filme é belíssimo. O importante aqui é a descoberta da beleza que é SER HUMANO.

Navena, quando bebê, fora prometida pela mãe a uma bruxa que ameaçava comê-la. A proposta desesperada, para salvar a filha, era que a bruxa a buscasse apenas quando tivesse 16 anos de idade, com o pretexto de lhe a menina poderia lhe fazer companhia mais tarde. A bruxa concorda e deixa a criança, mas quando a garota completa a idade, mesmo com uma última resistência da mãe, a feiticeira volta para buscar o que lhe fora acordado. A adolescente vai, acompanha a nova "mãe" e, embora marcada por ela e também transformada em bruxa, não tem a menor aptidão para aquilo e é abandonada no bosque pela maligna tutora. Só que descobrindo a capacidade de adquirir a forma de quem devora, a menina, com a inocência de uma criança que mexe no que não deve, admirando pelos mais diversos motivos as pessoas que vai encontrando e conhecendo, as mata, come e assume por algum tempo suas vidas, experimentando experiências diferentes, no corpo, ora de uma mulher madura, ora de um rapaz, ora um animal, ora de uma criança. 

Uma jornada de descobertas, de experimentos, de provar, como diz a canção, a dor e a delícia de se ser o que é. E mesmo com todos os prós e contras, comprovar, como diz aquela outra música, que a vida, no fim das contas, é bonita, é bonita e é bonita.



Aproveitem o Halloween, bruxos e bruxas!



por Cly Reis

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Deixe a meta do poeta Chico Buarque

Chico, lançando novo disco e nova polêmica
Toda unanimidade é burra, diz o jargão popular. No caso de Chico Buarque, entretanto, esta máxima vale para os dois lados: a quem o idolatra e a quem o odeia. A quem idolatra, porque acha, infantilmente, que seu gosto tem que valer para todo mundo, fazendo com que qualquer crítica ao “intocável” Chico se transforme num manifesto político de esquerda. Uma burrice sem tamanho. Do outro lado, os que odeiam não têm nenhum pudor em deixar transparecer que todos os que, na sua visão, infantilmente gostam de Chico são burros, haja vista que se trata de um velho ultrapassado e enganador.

Primeiro, nem todo mundo gosta de Chico Buarque e de sua arte, o que, mesmo que raramente, escuta-se por aí. Até aí, ok, uma vez que é saudável que, por um motivo ou outro, haja quem discorde ou não se afine com o que o cantor, compositor e escritor faz. Por outro lado, contudo, a mesma unanimidade soa diferente – e não coincidentemente, mais burra ainda. Se praticamente toda a esquerda forma filas seguindo seus passos, há uma direita reacionária e raivosa que está permanentemente no encalço de Chico. Em tudo que ele faz, seja uma música, uma aparição pública ou algum posicionamento político. A direita não engole Chico, e por isso o persegue, tentando achar, sob a capa de uma artificial unanimidade, a ideológica, erros de conduta no artista que o incriminem.

E não conseguem, claro. São polêmicas vazias que, no instante seguinte, se esvaziam. Foi assim agora, em agosto, quando do lançamento da música “Tua Cantiga”, presente no mais recente disco de Chico, “Caravanas”. Livre dos estereótipos e dono de seu trabalho, Chico segura com açúcar e afeto essa turma irritadiça desde os anos 70, quando o patrulhamento sobre si já se manifestava com agressividade. Não foi diferente neste último episódio, quando, sem criatividade (visto que sem argumentos de fato), trouxeram mais uma vez a pecha de “machista” a ele, coisa que tentam desde o tempo em que não entenderam (ou fizeram de conta que não entenderam) a trágica ironia de “Mulheres de Atenas”. De 1976... Igual ao que tentaram imputar-lhe quando do seu até então último álbum, “Chico”, de 2011, ao implicaram com os versos: “Amar uma mulher sem orifício”. Fizeram-no idiotamente, sem fazerem questão de considerar as palavras que vinham antes: ”Hoje pensei em ter religião/ De alguma ovelha, talvez, fazer sacrifício/ Por uma estátua ter adoração...”.

Desta vez, a acusação da ala “feminista” foi a mesma, porém a polêmica foi maior. A letra de “Tua Cantiga”, um lindo maxixe moderno escrito por ele em parceria com Cristóvão Bastos, fala de um homem perdidamente apaixonado por uma mulher distante dele a quem, romanticamente, venera. Nela, os versos: “Largo mulher e filhos/ E de joelhos/ Vou te seguir”, entretanto, foram o estopim da avalanche de discussões. Desde julgamentos de que a atitude de “largar mulher e filhos” seria machista até a de que, por absoluta falta de interpretação de texto, a de que esse ato significaria um desrespeito às mulheres, por que ter uma “amante” seria inaceitável. Detalhe: em nenhum momento a letra diz que o homem ficaria com as duas mulheres ao mesmo tempo, e nem que “largar mulher e filhos” significaria precisamente isso, visto que a frase pode tranquilamente ser entendida como uma força de expressão. Ou seja, talvez nem mulher e filhos existam, apenas o arroubo romântico do personagem. Haja vista o não entendimento ou a forçada intenção de tentar não compreender o que foi dito, é fácil também de explicar porque confundem com tanta convicção este com o próprio autor.

Mallu Magalhães: fez clipe mas não soube
resistir às críticas
A repercussão que tomou redes sociais e depois a imprensa e a sociedade de um modo geral foi, de fato, surpreendente. Até para o próprio Chico Buarque, que, sem ter o que esconder, entrou no circuito de manifestações, não para explicar-se, tal qual infantilmente fizera recentemente Mallu Magalhães ao defender-se de ter posto dançarinos negros em um videoclipe, como se, de maneira racista, os tivesse “rebaixando” ao relegá-los a meros figurantes “exóticos” a seu serviço, uma mulher branca e bem sucedida (!). A inconsistente artista caiu na rede “deles”: acusou culpa por algo que, se fosse imbuída do seu próprio conceito artístico ou, simplesmente, tivesse raciocinado melhor, não tinha absolutamente nada de errado. Chico, no seu caso, entrou na jogada para, educadamente, estabelecer contrapontos às criticas. Primeiro, postou em suas redes sociais um vídeo do professor de Literatura Sérgio Freire, da UFAM, que defende, com argumentos bem embasados, a expressão “largar mulher e filhos” como uma figura de linguagem (hipérbole), e que a confusão personagem/autor é proposital e saudavelmente literária. Noutra postagem, Chico, não sem atiçar mais discórdia, propôs uma interessante leitura ao caso postando um comentário que ele mesmo ouvira num supermercado quando duas mulheres dialogavam sobre “Tua Cantiga”:

“- Será que é machismo um homem largar a família para ficar com a amante?

- Pelo contrário. Machismo é ficar com a família e a amante.”

Todo esse debate em torno da música nova de Chico Buarque é um verdadeiro espelho da sociedade brasileira, contudo. Não há, por parte de uma fatia (considerável, poderosa e midiática) da sociedade uma real vontade de que as coisas mudem: a desigualdade social, a corrupção, a hipocrisia, o preconceito e o próprio machismo pretensamente atacado. Ao invés de se preocupar e brigar por coisas que afetam a vida do brasileiro de forma estrutural, como o crítico cenário político atual e as desigualdades sociais que se dão a cada esquina, “neguinho” presta atenção no problema periférico ou naquilo que nem problema é. Porque dar atenção demasiada ao que Chico Buarque está falando na letra da música é, sim, desviar do que importa. Afinal, é mais fácil isso do que fazer um mea culpa por bater panela e alçar ao poder o primeiro presidente julgado por corrupção no exercício do mandato. E que ainda está lá.

Jack Nicholson em "O Iluminado"
Para além das interpretações positivas ou não, a questão, porém, nem devia ser esta, o que adensa ainda mais a percepção de que o Brasil idiotizou-se. É ridículo, se não, maldoso e tendencioso, deslocar o discurso de uma obra artística e jogá-la num contexto sociopolítico para que esta responda a problemáticas outras que não lhe dizem respeito. Fosse assim, todo ator que fizesse o intrigueiro e invejoso Iago, do “Othelo” shakesperiano, seria linchado em praça pública. Ou mesmo todo mundo correria de Jack Nicholson após vê-lo violento e ensandecido em "O Iluminado", ainda mais porque o primeiro nome do personagem leva o mesmo do ator. É claro que tem sempre um pouco de criador na criatura, mas, convenhamos: menos, né?

O que está escrito em “Tua Cantiga” e todas as interpretações que a obra suscita são, impreterivelmente, do âmbito artístico. São da obra, e devem ser vistas como tal. Mesmo que fosse (e não é) um trabalho autobiográfico de Chico Buarque, ainda assim exigiria que fosse visto como arte. Que interessa se o “eu-lírico” da letra é ou não machista, ora essa! Se o é ou não, é objeto da obra, e assim foi intencionalmente escrita. E ponto. É sinal de um retrocesso descomunal observar que algo desta natureza ainda gere controvérsia e, ainda mais triste, precise ser explicado. De outra música da safra nova de Chico, "As Caravanas", uma denúncia do preconceito racial e social, ninguém comenta.

Desculpem, mas não é por aí que se defende o “empoderamento feminino” – ou pior: não é por aí que se usa a moda do “empoderamento” para atacar ideias políticas divergentes. A questão é que, em época de evidente crise moral brasileira, o mínimo suspiro de linguagem culta só vem confirmar o empobrecimento cultural no qual nos forçam a afundar todos os dias. “Porcaria na cultura tanto bate até que fura”, né, Itamar Assumpção? Outro poeta, Gilberto Gil, sabiamente esquivo, escreveu certa feita: “Uma meta existe para ser um alvo/ Mas quando o poeta diz: Meta/ Pode estar querendo dizer o inatingível”. Não atingir isso é burrice. Unanimemente.

Clipe de "Tua Cantiga" - Chico Buarque



por Daniel Rodrigues

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Os 12 personagens mais assustadores do cinema


O cinema é capaz de mexer com as nossas emoções como pouca coisa consegue, mesmo a gente sabendo que, na grande maioria das vezes, aquilo que estamos vendo seja apenas uma encenação. Somos, com total aceitação, levados a acreditar na “mentira” e com ela se comover. Jean-Claude Carrière, fascinado por essa magia que talvez apenas o cinema tenha no universo das artes, comenta em seu “A Linguagem Secreta do Cinema” que os instrumentos de persuasão do cinema podem parecer simples: emoção, sensação de medo, repulsa, irritação, raiva, angústia. Mas, pontua ele, “na realidade, o processo é muito mais complexo”, provavelmente até indefinível. “Envolve os mais secretos mecanismos do nosso cérebro, incluindo, talvez a preguiça, a natural indolência, a disposição para renunciar às suas virtudes por qualquer adulação.”

Isso explica em parte porque sentimos tanto medo de alguns personagens. E não estou falando apenas dos assassinos dos filmes de terror: há pessoas (afinal, acreditamos que elas, mesmo lá dentro da tela, existam de verdade) que, mesmo num drama ou outro gênero menos horripilante nos provocam igual sensação de temor. Quando essa magia intrínseca do cinema observada por Carrière se junta ao talento de cineastas e atores, a química é bem dizer infalível. Aí, soma-se a isso ainda nossa aceitação quase pueril ao que vemos e dá pra imaginar o que acontece: frio na espinha.

Ainda por cima, o universo dos vilões aterrorizantes é inegavelmente fascinante. Quem, mesmo tremendo as pernas a cada gesto que o dito cujo venha a dar, não aprecia (ou pelo menos reconhece que é sui genneris) a figura de um Freddy Krueger ou Michael Myers? Mas, como disse, não tratamos aqui somente dos carniceiros, afinal, destes é até previsível que imputem medo. Elencamos aqueles personagens e seus respectivos atores cujos papeis são tão críveis que não faríamos nenhuma questão de cruzar com eles algum dia na vida – e não precisa nem ser uma pessoa, inclusive.



O penetrante olhar do canibal Lecter.
1 – Hannibal Lecter (Anthony Hopkins)
O absolutamente frio psiquiatra, que atravessou a fronteira da sanidade para passar a matar por prazer – às vezes, até se alimentando de suas vítimas, dando-lhe o simpático apelido de Hannibal “Canibal” –, é provavelmente o mais célebre psicopata da história do cinema. Hopkins, com talento e muita sensibilidade, dá vida ao personagem do escritor Thomas Harris, o qual aparece pela primeira vez na tela no clássico “O Silêncio dos Inocentes” (Demme, 1991). Continuou assustador em outros longas, “Hannibal” (2001), “Dragão Vermelho” (2002) e “Hannibal - A Origem do Mal” (2007), mas vê-lo no primeiro e disparado melhor da série é até hoje imbatível em termos de qualidade cênica – e de medo também.





2 – Norman Bates (Anthony Perkins)
É inegável que as patologias psíquicas dão muito substrato para a criação deste tipo de personagem, seja na literatura ou no cinema. E claro que os diversos transtornos mentais existentes são um prato cheio para roteiristas. Norman Bates, psicótico atormentando pelo Complexo de Édipo encarnado como jamais o próprio Perkins conseguiu igualar, é até hoje um enigma que desafia os psiquiatras. Mas numa coisa todo mundo concorda: o cara dá medo pacas! Com a mão habilidosa de Alfred Hitchcock"Psicose", de 1960, tem talvez o melhor personagem de um thriller no melhor filme do mestre do suspense.


Monólogo final de Norman Bates - "Psicose"


Pacino, mais assustador que
muito serial-killer.
3 – Michael Corleone (Al Pacino)
Os filmes de máfia são recheados de personagens marcantes e não raro assustadores, pois altamente violentos. Porém, talvez pelo tratamento literário de drama dado por Mario Puzo, pela escolha acertada de Coppola do jovem Pacino para o papel e, obviamente, pelo talento do ator, nenhum se compare ao filho mais novo de Don Corleone. Empurrado pelo destino para o crime organizado, o ex-oficial do Exército tornou-se, mais do que qualquer outro de seus irmãos, o chefão mais impiedoso e frio da cosa nostra. Se no primeiro longa vê-se sua conversão à máfia até a natural sucessão ao pai, em "O Poderoso Chefão - parte 2", de 1974, ele está mais apavorante do que muito serial killer. Com um olhar, ele faz qualquer um congelar. Poderoso, dá-se direito a qualquer coisa, e nunca se sabe o que está maquinando naquela mente obsessiva. Coisa boa, não é. Seja nos acessos de raiva, seja no mais contido e calculista silêncio, Michael é apavorante.





Close com um sorriso nada covidativo.
4 - Alex Forrest (Glenn Close)
Não são apenas homens que fazem o espectador arrepiar. A maníaca de Alex Forrest, de “Atração Fatal” (Lyne, 1988), vivida por Glenn Close, é o melhor exemplo. Inconformada com um “pé na bunda” que levara de um homem casado, Dan Gallagher (Michael Douglas), com quem tivera um caso, ela passa a persegui-lo e a assombrar não apenas a ele, mas toda a sua família. Memoráveis cenas, como a do coelhinho de estimação da filha de Dan cozinhando na panela ou quando, depois de uma briga em que ele quase a estrangula, ela solta um sorriso horripilante, não deixam dúvida da força dessa personagem. Aliás, através da psicopatia, um símbolo à época do novo comportamento feminino, que não aceita mais a imposição machista nas relações. Não tem mais perdão: traiu, é penalizado.





5 - Alien (Bolaji Badejo)
Na magia do cinema, o medo pode vir da maneira que se bem entender. Pois não é a forma humana do ator nigeriano Bolaji Badejo que configura o seu personagem mais marcante. É a fantasia que ele veste, a do extraterrestre mais apavorante do cinema: Alien. Vários da mesma espécie dão as caras no bom “Aliens - O Resgate” (Cameron, 1986) e nas desnecessárias sequências. Mas nada se compara à excelente ficção-terror de 1979, de Ridley Scott, em que apenas um exemplar da espécie vai parar dentro da nave espacial em uma missão cheia de problemas. Um, aliás, é mais que suficiente para botar terror em todo mundo. O mais interessante é que o bicho não é muito visto, pois há o recurso fotográfico e cênico de dificultação do olhar, como pede um bom thiller. O vemos de fato, por inteiro e em luz suficiente, apenas mais para o fim da fita, quando o clímax já está lá em cima. Aí, só resta se segurar na poltrona.


Cena do gato de Ripley - "Alien, o oitavo passageiro"


O Cady da primeira e o da segunda vaersão.
6 - Max Cady (Robert De Niro)
Um dos maiores atores da história, De Niro de tempo em tempo encarna figuras assustadoras, desde o taxista louco de “Taxi Driver’ até o comerciante de escravos Rodrigo Mendoza de “A Missão”. Mas nada se compara a Cady, em que revive o já ótimo personagem de Robert Mitchum na versão que inspirou Martin Scorsese a rodar "Cabo do Medo", de 1991 (“Círculo  do Medo”, 1962). União de QI elevado e músculos, o algoz da família Bowden é capaz de, aliado à abordagem do roteiro, confundir os papeis de vilão e herói. Quem é mais filha da puta ali: o ex-presidiário que se vale da liberdade para perseguir os outros, o advogado que o prendeu deliberadamente, a esposa conivente ou as leis da sociedade, interpretáveis e permissivas?






7 - HAL-9000 (Douglas Rain – voz)
Quem disse que só a violência do homem ou a selvageria do bicho podem assustar? A inteligência, quando direcionada para o lado ruim, é devastadora. Ainda mais quando essa inteligência for artificial, como a do computador HAL-9000, o cérebro-mãe da nave especial de "2001: Uma Odisseia no Espaço" (1968). Kubrick e Clarke criam o personagem mais estático e, talvez até por isso, amedrontador do cinema moderno. Mirar aquele seu “olho” de plástico é deparar-se com a frieza inumana capaz das piores coisas. Através de meticulosos comandos, a máquina, rebelde e neurótica, põe à sua mercê toda a tripulação, afetando, mesmo depois de “morto”, toda a expedição. Detalhe: a voz original de Douglas Rain já é suficientemente aterradora, mas a da dublagem para o português, feita pelo célebre Marcio Seixas na clássica versão da Herbert Richards, consegue superar.

Dublagem clássica de HAL-9000 - "2001: Uma Odisseia no Espaço"




8 - Zé Pequeno/Dadinho (Leandro Firmino da Hora/ Douglas Silva)
Tem que ser muito sem noção para dizer para um mal-encarado “como é que tu chega assim na minha boca?!” Não precisa ser cinéfilo pra conhecer a resposta que é dada, pois é naquela cena que um dos personagens mais incríveis do cinema dos últimos 30 anos surgia ainda mais temível. Se o pequeno Dadinho já apavorava por se ver uma criança com sede de matar nos olhos, o jovem traficante vivido magistralmente por Firmino em “Cidade de Deus” (2002), então, “lavou a égua” neste quesito. Violento, entorpecido, marginal, cruel. Como não esbugalhar os olhos quando esse cara manda matar uma criança pequena a sangue frio? Ninguém se meta com Dadinho! Ops! Agora é Zé Pequeno, foi mal aí.






O brilhante personagem de Barden.
9 - Anton Chigurh (Javier Barden)
Os irmãos Cohen são mestres do anticlímax, uma vez que seus filmes se valem largamente desse expediente, usado por eles com muita habilidade de forma a gerar impactos surpreendentes no espectador pelo jogo oportuno de quebra ou confirmação da expectativa. O personagem Anton Chigurh, encarnado por Javier Barden no faroeste moderno "Onde Os Fracos Não Tem Vez" (2007), é montado todo em cima dessa premissa. Absolutamente inexpressivo e unidirecional, o psicótico Anton não sente nada, apenas mata. A naturalidade com que ele elimina suas vítimas não tem glamour nenhum. Ele simplesmente pega e mata, e nada é capaz de freá-lo. Fora isso, dá um pavor danado sempre que ele aparece com aquela arma de ar comprimido.







10 - Harry Powell (Robert Mitchum)
“Lobo em pele de cordeiro” é a melhor definição para Harry Powell. Afinal, quem desconfiaria que um pastor aparentemente cheio de boas intenções se revelaria um tirano doméstico da pior espécie? Se a interpretação de Mitchum fora superada pela de De Niro como Max Cady, esta de "O Mensageiro do Diabo" (Laughton, 1955) fica para a história do cinema como uma das mais fortes e impressionantes já vistas nas telas. Filme impecável, também mas não apenas pelas atuações. Mas Mitchum, inegavelmente é o destaque.

"Amor-Ódio" - "O Mensageiro do Diabo"



Mais insano que qualquer outro Coringa.
11 – Coringa (Heath Ledger)
 O alucinado e diabólico vilão das histórias do Batman é um dos personagens mais originais da cultura pop mundial. Interpretá-lo é, obviamente, um privilégio. George Romero o fez muito bem na série e até o craque Jack Nicholson mandou muito bem no papel, mas nada se compara ao que Heath Ledger fez em "O Cavaleiro das Trevas" (Nolan, 2008). Ele encarna Coringa, a ponto de, dizem, amaldiçoar-se, haja vista que morreu logo depois das filmagens. Ledger achou como poucos atores para o limiar entre a loucura e a lucidez, entre o burlesco e o austero. Menção que não podia deixar de faltar na lista.






12 - Jack Torrance (Jack Nicholson)
Se Stanley Kubrick já conseguira assustar com um computador, imagina quando ele volta toda a história para isso. É o caso do perfeito "O Iluminado" (1979), outra das obras-primas do cineasta costumeiramente reconhecido como o grande filme de terror de todos os tempos e a melhor adaptação de Stephen King para as telas. Mas seu impacto certamente não seria o mesmo se não tivesse a força de Nicholson no papel de Jack Torrance. Ele vale-se de toda sua técnica e sensibilidade cênicas a serviço da construção do personagem que vai perdendo o controle de sua sanidade, pois, mediunicamente vulnerável, sucumbe aos espíritos “sanguessugas” ligados àquele que Jack foi na vida passada: um serial killer que matou toda sua família.

por Daniel Rodrigues

domingo, 9 de novembro de 2014

Robert Evans: o homem que bancou Coppola


Não sei o que mais chama a atenção nesta foto: a superbarba do Lee Marvin, o tapa-olho do John Wayne ou a elegância do Clint. Mas uma coisa eu sei: o que tem as mais escabrosas histórias a contar é o Robert Evans. O homem já era um milionário da Costa Leste, ligado à indústria da moda, quando foi descoberto por Norma Shearer nadando numa piscina de hotel em LA. Virou ator famoso, ainda que medíocre. Não se contentou: queria ser o novo Darryl Zanuck, o bambambam dos estúdios de “OIiú”. E conseguiu. Como produtor, tirou a Paramount da ingrata nona posição entre os maiores estúdios para o primeiro lugar – em apenas quatro anos, entre o fim dos 60 e o começo dos 70. Produziu “Love Story”, "O Poderoso Chefão", “Ensina-me a Viver”, “Chinatown” e “Maratona da Morte”.
Quando ninguém queria dirigir o filme inspirado no livro de Mario Puzo, foi ele quem teve a ideia de chamar Coppola, um jovem de 30 anos que tinha feito três fracassos até então, mas que reunia uma virtude: era o único diretor ítalo-americano da época. E um filme sobre a máfia só funcionaria se fosse comandado por alguém "de dentro" – até então, a maioria dos filmes de gângster eram dirigidos por judeus. E não emplacavam.
À época de ‘Love Story” (filme que causou uma explosão de nascimentos de crianças nove meses depois do lançamento), Evans casou com a Ali McGraw. Era rico, bonito, bem-sucedido, tinha a mulher mais linda da época e linha direta com Henry Kissinger. Enfim, a vida mais invejável do mundo, aparentemente. Mas ele se preocupava demais em trabalhar. Em novos sucessos. Depois de dois meses na Europa comercializando os direitos de “O Poderoso Chefão”, Evans lembrou de ligar para a esposa, que filmava “Os implacáveis”, com Steve McQueen. Pobre Evans. Logo para quem acabou perdendo a mulher. "Você poderia ser o homem mais poderoso do mundo, mas perder a esposa para McQueen fazia me sentir insignificante", reconheceu.
Dali em diante, Evans ainda emplacou algumas coisas nos anos 70, como o próprio “Chinatown”, baseado num roteiro que ninguém entendia. "Eu não compreendia aqueles diálogos, mas se o Robert Towne garantia que era bom, então eu insisti", relembra. Valeu e pena, tanto que ganhou tudo quanto é prêmio, como todos sabem. Fato é que a traição pesou. Nos 80, Evans apostou todas as suas fichas em “Cottom Club”, também de Coppola e com o Richard Gere, que acabou sendo um fracasso. Ali, na verdade, o próprio produtor já estava fracassando. Pirou na cocaína, foi parar num hospital psiquiátrico – de onde conseguiu fugir a muito custo. Perdeu sua mansão em LA. Como não conseguia se desvencilhar da velha vida, acabou alugando a ex-casa para morar. Pagava 25 mil dólares mensais – isso estando quebrado. A casa acabou recomprada por Jack Nicholson, que presenteou o amigo com o pequeno regalo.

Quando recomeçava, foi acusado de assassinato, em um processo inconclusivo que levou quase uma década. Nos 90, recomeçou como produtor, tentando emplacar porcarias como “O Santo”, “O Fantasma” e “Jade”. Ganhou dinheiro (e provavelmente mais alguma coisa da Sharon Stone) com “Invasão de Privacidade”. Na prática, a melhor coisa que fez desde então foi escrever o livro "The Kid Stays in the Picture", que deu origem ao documentário "O Show Não Pode Parar", de 2002 – onde conta tudo isso. Na carreira, no entanto, fico em dúvida entre as coisas pelas quais mais o admiro: 1) Ter batido pé para Coppola estender “O Poderoso Chefão”, quando o diretor entregou o filme com 2h7min; 2) Ter metido a mão na trilha de “Ensina-me a Viver”, colocando Cat Stevens no filme mais sui generis que já vi; ou, claro, 3) Ter casado com a Ali McGraw. Cara legal esse Evans.


por Ricardo Lacerda

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Meus 50 atores e Christhopher Walken



Christopeher Walken na marcante cena
da roleta russa em "O Franco Atirador"
Ainda hoje tenho certeza que foi o Christopher Walken que matou a atriz Natalie Wood em 1981. Na fatídica noite, estavam ela, seu marido, o ator Robert Wagner, e Walken, todos bebendo muito a bordo de um iate. Após uma discussão entre os dois "amigos", a atriz sumiu e só foi encontrada horas depois, morta afogada. Naquele ano o caso foi encerrado e a causa da morte foi diagnosticada como afogamento. Em 2011, os arquivos foram reabertos e com novas evidências, hematomas no corpo da atriz levaram a investigação para outros rumos que poderiam apontar um assassinato. Acusações à parte, o certo é que Walken sempre me assustou. Aquela sua cara de “American Psycho” poderia muito bem ter dito a Wagner; "Se você me dedurar, será o próximo, te acharei no inferno". Eu entenderia o aviso rapidinho.

Quatro anos antes ele ganhava o Oscar de melhor ator coadjuvante por "O Franco Atirador", do Michael Cimino, um filme totalmente ambientado em diversos contrapontos que vão da loucura, drogas, sexo etc. Pra ter uma noção do clima do filme, nas cenas de roleta russa, os atores Robert De Niro, Walken e John Cazale chegaram a usar balas de verdade para das mais veracidade. Cazale, que já estava com seus dias contados por um câncer terminal, dizia que nada tinha a perder. Na minha lista de 50 atores em grandes atuações, Walken está presente como um símbolo de visceralidade, loucura e medo em termos de atuação. O ator já fez mais de 100 filmes, clipes e peças. Na vida real, ele consegue ser um dos únicos seres na terra o qual eu temeria mesmo. Tenho um certo “amor e ódio” por sua figura. Mas desejo longa vida ao mr. Walken, e que não saia impune de seu(s) crime(es), se é que foi ele.

Abaixo, senhores, minha lista de melhores atores em suas grandes atuações. Completei com atores das listas que amigos compartilharam comigo e fiz uma única:



Marlon Brando - O Poderoso Chefão


- Robert De Niro - Touro Indomável
- Al Pacino - Scarface
- Malcom McDowell - Laranja Mecânica
- Dustin Hoffman - Midnight Cowboy
- Henry Fonda - Era uma Vez no Oeste
- Sean Connery - Os Intocáveis
- Jack Nicholson - O Iluminado
- Paul Newman - Butch Cassidy
- Robert Redford - Todos os Homens do Presidente
- Robert Duvall - Apocalypse Now
- Anthony Hopkins - Silêncio dos Inocentes
- Joe Pesci - Os Bons Companheiros
- Tom Berenger - Platoon
- Val Kilmer - The Doors
- River Phoenix - Conta Comigo
- Bruno Ganz - A Queda
- Jean Reno - O Profissional
- Cristian Bale – Psicopata Americano
- Gael Garcia Bernal - Amores Perros
- Heath Ledger – Batman - O Cavaleiro das Trevas
- Cristhoph Waltz - Bastardos Inglórios
- Wagner Moura - Tropa de Elite
- Ian McKellen - O Senhor dos Anéis
- Daniel Day-Lewis - Sangue Negro


- Kevin Costner - Dança com os Lobos
- Charlton Heston - Ben-Hur
- Leonardo DiCaprio – O Lobo de Wall Street
- Rutger Hauer - Blade Runner
- Javier Bardem - Onde os Fracos não Tem Vez
- Eli Wallach - O Bom, o Mau e o Feio
- Harrison Ford - Indiana Jones, Caçadores da Arca Perdida
- Russel Crowe - Gladiador
- Charlie Sheen - Platonn
- Ricardo Darin - O Segredo dos Seus Olhos
- Woody Harrelson - O Povo Contra Larry Flint
- Emile Hirsch - Na Natureza Selvagem
- Roberto Benigni - O Monstro
- Willian Holden - Meu Ódio será Sua Herança
- Morgan Freeman - Um Sonho de Liberdade
- John Cazale - O Poderoso Chefão II
- Warren Oates - Traga-me a Cabeça de Alfredo Garcia
- Matheus Nachtergaele – O auto da Compadecida
- César Troncoso – O Banheiro do Papa
- Juan Villegas - El Perro
- Mel Gibson - Gallipoli
- Michael Fassbender - 12 Anos de Escravidão
- Matthew McConaughey - Clube de Compras Dallas
- Sean Penn - O Pagamento Final
- Christopher Walken - O Franco Atirador





com a colaboração de:
Carlos França, Josi Rizzari, Daniel Cóssio Porto,
Daniel Russell Ribas, Fernando De Souza Médici,
Daniel RodriguesRicardo Lacerda e José Francisco Botelho.