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quarta-feira, 12 de maio de 2021

Música da Cabeça - Programa #214

 

Paulo Gustavo, Cassiano, Luis Vagner "Guitarreiro"... pra compensar tanta perda só mesmo trazendo essa gente toda no MDC. Além deles vai ter também muita coisa legal, como Black Alien, The Glove, Elis Regina, Lee Morgan, Marisa Monte e mais. Tem homenagens no "Sete-List" e no "Música de Fato" e tem até Fausto Fawcett com letra sua no "Palavra, Lê". Sobrevivendo na garra, o programa vai ao ar hoje, 21h, na vivíssima Rádio Elétrica. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues.


Rádio Elétrica:

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Música da Cabeça - Programa #97


Importa, sim. Importa quem foi Chico Mendes. Importa quem foi Ricardo Boechat. Importam quem foram os meninos do CT do Flamengo. O Música da Cabeça é isso: aquilo que importa. Nesta quarta-feira, além dos quadros “Música de Fato” e “Palavra, Lê”, a gente terá coisas da mais alta importância, como Dusty Springfield, Nei Lisboa, Miles Davis, Cassiano e mais. Prontos para se importarem conosco? É só ligar na Rádio Elétrica às 21h. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues. (E importa, sim. Muito.)


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

sábado, 29 de agosto de 2015

Gerson King Combo – Festa Voodoo – Quadra da Escola de Samba Bambas da Orgia – Porto Alegre/RS (22/08/2015)



A lenda da soul brasileira
na quadra dos Bambas.
Mais um privilégio que tenho como morador de Porto Alegre e admirador da black music do Brasil. Depois de assistir ao memorável primeiro show do pernambucano Di Melo, em julho, agora, a festa Voodoo, responsável por trazer essa turma malemolente à minha cidade, presenteou os porto-alegrenses como eu com a vinda de outra lenda da soul brasileira: Gerson King Combo. Mais um dos artistas que caiu no ostracismo com o declínio do estilo nos anos 80, King Combo foi redescoberto no estrangeiro (Inglaterra e Japão) e, atualmente com 70 anos, voltou a ser cult de alguns anos para cá ao universo do entretenimento.

O dançarino SoulBalaMachine
ditando o ritmo da galera.
Dono de uma voz possante, que salta daqueles senhores pulmões, o carioca Gerson Côrtes (irmão de outro precursor da soul no País, Getúlio Côrtes) entra no palco muito bem iluminado da Quadra dos Bambas da Orgia vestindo sua tradicional capa, esta azul-claro misto de boxeur e super-herói, mais calças do mesmo tecido lânguido e da mesma cor, casaco, colete, camisa de golas largas, colares no pescoço, sapatos bicolor e chapéu. Uma figura exótica e impressionante. A imponência do porte e do vozeirão, no entanto, se amenizam com o tratamento educado e a simpatia, que dão o clima alegre da festa. A animação foi bastante ampliada  ainda pela presença do dançarino Rafael SoulBalaMachine, que, vindo especialmente do Rio, ajudou a ditar o ritmo com seus passos mágicos e incentivando o público a fazer o mesmo.

Nós curtindo o balanço de Gerson King Combo.
Sem voltar a Porto Alegre desde 2001, o Rei da Soul Brasileira (que leva o reinado já no nome), não poderia começar a apresentação com outra música: “Estou voltando”. Os versos dizem tudo: “Está voltando com mais força (força)/ Pois nunca teve ausente/ Presente nessa guerra/ Esperou o tempo certo pra voltar”. “Uma chance”, do seu grande álbum de 1977, fez o clima ficar ainda mais quente, mesmo com a torrencial chuva que caía lá fora. “Deixe Sair o Suor” e, mais ainda, “Eu vou Pisar no Soul”, traduzem o sentimento do seleto público que, corajoso, não se intimidou com o temporal e compareceu: “Já separei a minha beca, engraxei os meus sapatos/ Espichei os meus cabelos, detonei os caras chatos/ Por que.../ Eu vou pisar no soul/ Eu vou dançar um Black”.

O mestre da soul com  a cozinha afiada da Ultramen.
O irresistível groove de “Funk Brother Soul”, outro de seus clássicos – este, do LP “Gerson King Combo Volume II”, de 1978 –, antecipa “Soul da paz” e a pacífica “Força e poder”. Das surpresas do show, King Combo, com toda autoridade que tem, encarna o conterrâneo e contemporâneo Tim Maia e manda uma brilhante versão de “Rational Culture”, a faixa em inglês da viagem esotérica de Tim presente no disco “Racional Vol.1”. A banda, os rapazes da Ultramen (Júlio Porto, guitarra; Pedro Porto, baixo; Zé Darcy; bateria; e Leonardo Boff, teclados) mais dois sopros (sax e trompete excelentes, diga-se de passagem), funcionaram perfeitamente bem assim como ocorrera no show de Di Melo, no mesmo formato. Apreciadores e fãs, eles sabem de cor as canções dos mestres – segundo King Combo, ensaiaram com ele apenas uma vez na tarde daquele mesmo dia. O “síndico” foi novamente revisitado com a cover de um de seus maiores hits, “Sossego”, num dos melhores momentos do show. King Combo convidou da plateia duas pessoas para cantarem com ele, uma delas a cantora gaúcha Nani Medeiros, que o incentivou a tocar a balada “Foi um sonho só”, que contém na original um coro feminino e que havia sido tirada do set-list por não ter quem o acompanhasse. Achou-a.
Chamando Nani Medeiros ao palco
para dividir o microfone.

Herdeiro de James Brown no Brasil, King Combo, que integrou as bandas de Erlon Chaves e de Wilson Simonal e grupos seminais da soul brasileira, como a Black Rio e a Fórmula 7, é dos poucos que tem procuração para cantar o Godfather of Soul. E foi o que fez em dois momentos. Primeiro, numa quente “I Feel Good”, dos maiores clássicos da música negra mundial. Claro que todo mundo cantou e dançou junto. A outra foi dentro do maior sucesso do próprio King Combo: “Mandamentos black” (“Dançar, como dança um black/ Amar,como ama um black/ Andar, como anda um black/ Usar, sempre o cumprimento black/ Falar, como fala um black...”), um dos hinos da cena dos anos 70. Nesta, inseriram “Sex Machine”, outro hit de Brown, incendiando de vez a quadra dos Bambas.

Na despedida do público.
Se “Estou voltando” iniciou o show, o recado final foi dado com “Good Bye”, outra bem conhecida do King of Brazilian Soul, que, particularmente, considero sua melhor música. Funk da melhor qualidade: ritmo contagiante, sopros inteligentes, letra romântica e cantarolável e aquilo que só quem faz funk no Brasil sabe: um toque de samba. Ah! Aí é insuperável, e Gerson King Combo é um dos principais representantes! Quando eu pensei que, por não ser a banda original de Kink Combo, a Ultramen não incluiria a pitada brasileira, o baterista Zé Darcy, na segunda parte, engendra um ritmo de samba. Um final perfeito.

Se continuarem assim as promoções da Voodoo, trazendo lendas da soul brasileira, vou querer ver também Hyldon, Carlos Dafé, Toni Tornado, Cassiano, Bebeto, Tony Bizarro, Arthur Verocai... Estão me acostumando mal.



fotos: Jord Hare

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Secos e Molhados - "Secos e Molhados" (1973)


"Foi meu jardim da infância,
um jardim da infância bem
barra pesada (risos).
Enfrentamos o Brasil,
o governo, a polícia,
era transgressão pura."
Ney Matogrosso



Eles foram, assim, uma espécie de mistura de New York Dolls, com Kiss, com David Bowie pelo caráter teatral, pela maquiagem, pela androginia, pela sensualidade, mas no que diz respeito à música, extremamente originais e vanguardistas na proposta, compondo uma sonoridade de influências múltiplas sem abrir mão, no entanto, da brasilidade e das raízes da cultura nacional.
Os Secos e Molhados estreavam em disco em 1973 com um trabalho recheado de ritmos variados, exotismo, lendas, folclore, poesia, psicodelia e rock'n roll. Um grupo de maquiagens exageradas, figurinos extravagantes, performances impressionantes que trazia à frente o expressivo vocalista Ney Matogrosso, um tipo exótico, provocante, cheio de requebrados, trejeitos tresloucados, de atuação singular e interpretações vocais marcantes e impecáveis. Ney chamava mais a atenção por todos os atributos enumerados, mas sua retaguarda, com os músicos Gérson Conrad, Marcelo Frias (que não permaneceu na banda) e João Ricardo, o principal letrista e compositor da banda, eram a garantia de uma sustentação perfeita além de composições precisas, inspiradas e geniais.
O clássico "Sangue Latino", cuja base marcante veio a ser utilizada, tempos depois pelos Titãs na introdução da música "Eu Não Aguento", abre o disco e, como supõe o nome, é cheia de latinidade, numa toada lenta e insinuante, com uma interpretação notável e irreparável de Ney Matogrosso. A segue outro clássico: "O Vira", ilustrado por magias, lendas e personagens fantásticos, e que mesmo com toda a evidente influência do ritmo português que lhe dá o nome, é um rock guitarrado, pesado e cheio de vitalidade.
"O Patrão nosso de Cada Dia" que vem na sequência é uma balada com ares barrocos mais uma vez com o talento de Ney extrapolando os limites; seguem a ótima "Amor", um soul-rock que muita banda por aí sonha em conseguir fazer; o blues psicodélico "Primavera nos Dentes", de belíssima introdução de piano; o rock'n roll bem percussionado de "Assim Assado"; o free jazz acelerado de "Mulher Barriguda"; e "El Rey" de Gérson Conrad (em parceria com João Ricardo, é claro) , uma curta vinheta de belíssimo trabalho de violões.
"Rosa de Hiroshima" uma balada lamentosa, cuja beleza contrasta com o pessimismo da poesia de Vinícius de Morais é outro clássico em mais uma interpretação absurda de Ney nos vocais.
Depois vem a boa, porém comum, "Prece Cósmica"; "Rondó do Capitão", adaptação do poema de Manuel Bandeira; "As Andorinhas", que assim como "O Vira" também remete à música portuguesa; e o fecha o disco de maneira magnífica com "Fala", em mais um show particular de Ney Matogrosso.
Um marco da música nacional! Um disco corajoso. Afrontador na ideia, no conceito, na atitude, na sutileza da poesia. Ícone do rock brasileiro. Do rock,sim! Por mais que em muitos momentos possa não parecer um disco de rock efetivamente, tal a singeleza das letras, a leveza dos vocais, os arranjos de viola ou de cordas, "Secos e Molhados" inova na linguagem alavancando o rock nacional a outro patamar criativo. disco essencial extremamente influente para qualquer banda do cenário pop rock que tenha aparecido depois dele.
antes de finalizar, não poderia deixar de falar da capa, igualmente uma das mais marcantes, criativas e emblemáticas da discografia nacional e que curiosamente, surgiu quase que por acaso, meio de improviso, na hora, no estúdio fotográfico. A ideia de utilizar os produtos de secos e molhados (nome dado a comércio de produtos alimentícios) já existia, no entanto, o lampejo de colocar as cabeças em bandejas, dando uma conotação um tanto antropofágica à imagem, veio na hora, ficando assim os integrantes sentados em tijolos sob a mesa, apenas com as cabeças colocadas em furos feitos nela, com as bandejas encaixadas aos seus pescoços.
Até a capa é espetacular!

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FAIXAS:
1. "Sangue Latino" (João Ricardo/Paulinho Mendonça) 2:07
2. "O Vira" (J. Ricardo/Luhli) 2:12
3. "O Patrão Nosso de Cada Dia" (J. Ricardo) 3:19
4. "Amor" (J. Ricardo/João Apolinário) 2:14
5. "Primavera nos Dentes" (J. Ricardo/J. Apolinário) 4:50
6. "Assim Assado" (J. Ricardo) 2:58
7. "Mulher Barriguda" (J. Ricardo/Solano Trindade) 2:35
8. "El Rey" (Gerson Conrad/J. Ricardo) 0:58
9. "Rosa de Hiroshima" (G. Conrad/Vinicius de Moraes) 2:00
10. "Prece Cósmica" (J. Ricardo/Cassiano Ricardo) 1:57
11. "Rondó do Capitão" (J. Ricardo/Manuel Bandeira) 1:01
12. "As Andorinhas" (João Ricardo/C. Ricardo) 0:58
13. "Fala" (J. Ricardo/Luli)


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Ouça:
Secos e Molhados 1973


terça-feira, 24 de dezembro de 2013

COTIDIANAS nº 262 Especial Natal - "Natal: Uma Crônica Para Pessoas Não Apressadas"

"Natal: Uma Crônica Para Pessoas Não Apressadas"


por Armindo Trevisan


Uma das observações mais profundas que li sobre o Natal foi a de um célebre paleontologista e teólogo jesuíta, Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), que cito de memória, parafraseando-a:
            O Verbo de Deus, Filho de Deus, igual ao Pai e ao Espírito Santo, entrou no mundo sem rumor, formando-se no seio de uma virgem que vivia em Nazaré.
            Sem rumor, também, nasceu o Menino, que Manuel Bandeira chamou “o nosso Menino”, numa gruta, em Belém, a pequenina cidade donde era originário o Rei David - do qual a Virgem descendia.
            O Menino foi colocado numa mangedoura, na qual sua mãe o aqueceu com os panos de que dispunha, e pelo bafo de dois animais, que representavam os animais saídos da Arca de Noé: um boi e um burro. O burro seria, talvez, o ancestral de outro burro, o que carregaria Jesus na sua entrada triunfal em Jerusalém, quando o Rabi foi aclamado pelos habitantes de Jerusalém, inclusive pelas crianças.
            O silêncio, com que o mundo acolheu a vinda do Criador à terra, foi acompanhado de outro silêncio, o dos campos da Judéia onde pastores apascentavam seus rebanhos.
            Os únicos a terem falado foram os Anjos. Falaram e cantaram, anunciando aos homens, amados por Deus, que o Salvador tinha vindo à terra para trazer a paz.
            Num poema da Divina Comédia, Dante celebrizou essa paz num incomparável verso:
            -A sua vontade é a nossa paz.
            É verdade que, no contexto poético de Dante, a paz era uma espécie de tradução do termo hebraico shalom, que significa a felicidade.
            As estrelas permaneciam silenciosas no firmamento. Elas costumam transmitir umas às outras suas mensagens misteriosas, sem nunca apelarem para as palavras.
             O Salmo 19 adverte:
            -Não há palavras para os dias que comunicam uns a outros seu discurso. Deles não se ouve som algum, embora suas vozes se façam ouvir por toda a terra”...
            Apesar de silenciosas, as estrelas do Oriente não permitiram que passasse inobservado o fenômeno divino da Encarnação do Verbo, que se inseriu na conturbada História da Humanidade. Uma das estrelas tomou a si a iniciativa de guiar três Reis Magos, vindos do Irã, ao humilde Presépio, que se situava numa cidade que ainda  hoje existe, já agora num território dilacerado por tensões étnico-religiosas.
            Que maravilhoso seria se, na comemoração do Natal, as nações cristãs, concordassem em instituir um minuto de silêncio em homenagem a tão grande Mistério!
            Seria preciso que não se ouvisse som algum em nosso mundo!
Seria preciso que a paz, silenciosa como as estrelas (ao contrário de nossos ícones que, para serem ovacionados, inflamam as multidões) entrasse nos corações na ponta dos pés, e aí fizesse adormecer as almas ao som da Noite Feliz, traduzida para o português por um frei franciscano de Petrópolis, o qual preferiu o adjetivo feliz ao adjetivo original alemão stille: Noite Silenciosa!
            Não seria tão complicado fazer rimar Noite Silenciosa com Solitária Rosa!
            Existe, em toda a parte uma, ou várias rosas solitárias. Aqui e acolá, descobre-se uma mulher silenciosa, um homem silencioso, um cachorro silencioso, uma coisa silenciosa.
            A alegria tende a exceder seus limites. As dores e as tristezas são, por temperamento, introvertidas. Profundamente silenciosas.  
            Podemos, pois, orar:
            Noite Silenciosa,
            Noite Feliz:
            ajuda-nos a encontrar a Deus,
            ou antes,
            a sermos encontrados por Ele!




Escritor, teólogo, filósofo, ensaísta, crítico de arte, poeta e cronista gaúcho, Armindo Trevisan nasceu em Santa Maria, em 1933. Doutor em Filosofia pela Universidade de Fribourg, Suíça. Bolsista da Fundação Calouste Gulbenkian em 1969 e 1974. Professor de História da Arte e Estética na UFRGS, de 1973 a 1986. Lecionou no Curso de Pós-Graduação em Artes Visuais da UFRGS até 1999. Vencedor do Prêmio Nacional de Poesia Gonçalves Dias (1964), pela União Brasileira de Escritores, com “A Surpresa de Ser” (comissão julgadora composta por Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e Cassiano Ricardo). Em 1972, ganhou o Prêmio Nacional de Brasília para Poesia Inédita, por “O Abajur de Píndaro”. Em 1997, venceu o Prêmio APLUB de Literatura pelo livro “A Dança do Fogo”. Em 2001, foi Patrono da Feira do Livro de Porto Alegre. Já em 2004, recebeu o Prêmio Fato Literário, dado a personalidade ou instituições que mais contribuíram com as letras gaúchas. Tem poemas e ensaios traduzidos em alemão, italiano, espanhol e inglês.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Música da Cabeça - Programa #38



Como diria Cassiano: “Então é Natal/ Estrelas no céu/ Então é Natal/ Papai Noel”. Pois o Bom Velhinho vem com um saco cheio de presentes musicais no programa de hoje, às 21h, na Rádio Elétrica! E tem pra todos os gostos: Caetano Veloso, Beatles, The Cure, Chico Buarque, R.E.M., Carole King, Mutantes e muito mais. Ah, o Papai Noel também não se esqueceu dos quadros “Palavra, Lê”, “Música de Fato” e do pedido de quem ouve o Música da Cabeça, que vai rolar no “Cabeça dos Outros”. Então, se comportem, que aí vocês ganham aquilo que pediram de Natal, ou seja: muita música. Produção, apresentação e trenó, Daniel Rodrigues.


quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Música da Cabeça - Programa #239

 

Halloween? Que nada! Aqui a gente vai é de Saci! É ele quem dá as caras no programa de hoje em um "Sete-List" especial. Além disso, tem também Beastie Boys, Cassiano, U2, Cocteau Twins, BANDA Black Rio, Carlinhos Brown e mais. Ainda, a reunião do G20 e letra de Nelson Cavaquinho, que faria 110 anos. Pulando numa perna só, o MDC surge da mata às 21h na lendária Rádio Elétrica. Produção, apresentação e carapuça vermelha: Daniel Rodrigues


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

sábado, 3 de março de 2012

Neyde Zis e Tim Maia - "Neyde & Tim" - (1974)



Tudo aconteceu numa escaldante e misteriosa madrugada carioca no estúdio Somil, em Botafogo. A data é imprecisa. Ninguém sabe ao certo; só se tem uma vaga lembrança de que foi num final de semana de fevereiro de 1974. Os técnicos do som Ary e Célio, depois de uma sessão com Belchior, que gravava seu primeiro disco, organizavam as últimas coisas antes de fecharem tudo e irem embora. Mas eis que, no final da noite, imbica enviesado na frente do estúdio o famoso Fusca 71 roxo e verde de  Neyde Zis . E quem ao volante a acompanhava? Ele:  Tim Maia . Os dois, “maleixos” de uísque e sabe-se lá do que mais, já desceram cantando em dueto “Brother”, o gospel maravilhoso do mano  Jorge Ben . Com seu barítono inconfundível, ele reforçava o agudo nos versos: “Prepare one more happy way for my Lord” como se tivesse tomado pelo espírito de um cantor de igreja norte-americano. Ela, por sua vez, usava seu timbre rouco capaz de atingir agudos impressionantes, destilando uma segunda voz cheia de swing e emoção. E quando chegava na parte: “Jesus Christ is my Lord, Jesus Christ is my friend” era um verdadeiro desbunde: os dois, em uníssono. De arrepiar. Soul music na mais pura acepção.
Ary e Célio se entreolharam, ao mesmo tempo com admiração por presenciarem aquele belo dueto, mas também segurando a gargalhada por acharem engraçadíssimo ver aqueles dois abraçados cambaleando com uma garrafa que passava de mão em mão. Mas o que não previam era que, naquela noite,  Neyde Zis  e  Tim Maia  não tinham enchido o saco para ficarem com as chaves do estúdio à toa. E o que os técnicos jamais imaginariam, depois de darem as costas e “lavarem as mãos”, era que, por exemplo, aquela versão de “Brother” que ouviram entre soluços embriagados seria, horas depois, registrada numa performance perfeita, com espontaneidade e técnica, desfechando a mais obscura e inspirada jam session já documentada na MPB: o clássico álbum “Neyde & Tim”.
O disco é o ápice da carreira da “Diva Black”, “A menina mulher da pele preta”, como a apelidara  Jorge Ben , que a homenageara com a música que dá título ao primeiro álbum dela, de 1969. Depois de várias participações em trabalhos de parceiros – leia-se Cassiano, Tony Tornado, Hyldon e Bebeto, ou seja, só a nata da soul music brasileira –, ela, influenciada pela guinada pós-tropicalista do amigo  Erasmo Carlos  e do próprio Ben, grava o já muito bem comentado neste blog por Eduardo Wolff"Dó-Ré-Mi-Fa-Sol-Lá-Zis" , considerado por Oberdan a principal influência da Banda Black Rio e o melhor disco brasileiro dos anos 70. E não só ele a idolatrava. Até artistas internacionais louvavam Neyde Zis, como declarou Isaac Hayes, em entrevista de 1997 a BBC, quando perguntado qual a melhor cantora black de todos os tempos: Aretha Franklin ou Billie Holiday. Negando ser nenhuma das duas, ele respondeu com seu vozeirão de Chef: “The best black woman singer lives in Brazil. She’s called Neyde Zis.”
“Neyde & Tim” não tem comparação, e pode ser considerado um capítulo à parte na carreira tanto dela quanto na do “Síndico”. A sessão foi quase ininterrupta, tudo ao vivo, apenas uma paradinha e outra para emborcar um gole de uísque, fumar unzinho e comer um pouco de goiabada – coisa que Tim sempre carregava consigo para a sobremesa. O disco abre com uma obra-prima composta por  Gilberto Gil  no exílio em Londres: “Nêga”, que não coincidentemente fez parte do repertório de uma outra jam que jamais existiria não fosse “Neyde & Tim”: o disco “Gil & Jorge Xangô Ogum”, confessa homenagem de Gil e do Babulina à dupla. Nessa versão, mais cadenciada e romântica que a original, o vocal fica por conta de Neyde, que carrega na sensualidade. Tim, responsável por toda a cozinha, entrecorta a linha melódica soltando versos que pareciam ter sido escritos por Gil para Neyde: “The tropical nêga” ou “This nêga is my”.
Hayes: "Neyde Zis é a melhor
cantora negra de todos os tempos."
“Zismaia”, na sequência, é um funk sincopado cujo título traz controvérsias. Primeiro, o significado mais evidente: a simbiose musical que havia entre os dois. Porém há quem credite esse título a uma tentativa de Tim, já totalmente bêbado, em pronunciar a palavra “desmaia” num momento em que Neyde teve um rápido apagão (alcoólico, claro). As más línguas dizem que, acabada a garrafa de uísque, os dois passaram a entornar uma caninha que encontraram escondida na cozinha. O que, de certa forma, explica a existência de outra faixa, “Kaxassa”, uma das oito compostas com tamanha fluidez por Tim só naquela madrugada. (Essa segunda versão até que é bem verossímil considerando a situação.)
Sabe-se lá como, mas o Paulo Ricardo, o Rubens e o Serginho Trombone, que na época tocavam tanto na banda de um quanto de outro, apareceram por lá e gravaram a guitarra, o baixo e os sopros, enquanto Tim cuidava da bateria, do violão e de uma caxeta que trouxeram de um show em Niterói ocorrido horas antes. Neyde só se incumbia de emprestar sua voz. E era o que bastava. No máximo, um chocalho ou uns acordes de violão. Foi com essa formação que gravaram “Psychoblack”, um funk lisérgico de dar inveja a qualquer Parliament-Funkadelic; “Farofa”, baião eletrificado com uma bateria pesada cheio de groove; e “Retorno”, um samba-rock que captou o momento em que Tim reclamava do técnico de som que era... humm, ele mesmo. Todos – àquela altura já envoltos na fumaceira que tomava todo o estúdio –, caíram na gargalhada, e a música ficou uma das mais espontâneas do disco.
Ao todo são apenas 10 faixas de várias que a dupla tocou até as 7 da manhã do dia seguinte. Pelo menos foi isso que veio parar na mão do produtor Mariozinho Rocha, que finalizou a mixagem. Os LP’s impressos na época hoje são raridade, e valem uma fortuna no mercado alternativo. Sabe-se de colecionador no Japão que não vende seu exemplar nem por dez castelos de Osaka. Mas agora esta versão remasterizada com capricho no Abbey Road pode fazer com que mais pessoas possam dar o devido valor a uma das obras mais importantes da nossa música e, enfim, fazer justiça a uma artista infelizmente esquecida neste Brasil sem memória. Salve o “Gênio” Tim, claro, mas, acima de tudo, salve a “Musa” Neyde Zis!
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O impacto da noite de orgia musical e lisérgica foi tanto que, logo depois desta fatídica madrugada, Tim caiu em uma forte abstenção e a uma crise existencial que lhe levou a ler um tal de livro chamado “Universo em Desencanto”. O resto da história todos sabem no que deu.
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Poucos sabem, mas “Acenda o Farol”, gravada por Tim em 1978 no disco “Tim Maia Disco Club”, foi criada naquela noite. Quando os dois tiveram a delirante ideia de se dirigir ao estúdio da Somil, ambos vinham juntos de Niterói no tal fusquinha, que aprontou de furar um pneu no caminho. Tim, puto com o ocorrido, ao invés de ralhar, inventou uma música. Enquanto trocava o estepe lá fora, gritava para Neyde lá dentro do carro: “Pneu furou/ Acenda o farol/ Acenda o farol...”. A música foi gravada para “Neyde & Tim”, mas, infelizmente, perderam o único take porque puseram outra por cima (coisa de gente grogue). Tim só foi redescobrir a música anos mais tarde porque a encontrou escrita num papel amarrotado no bolso de uma calça que tinha usado apenas uma vez, ou seja, na histórica noite da gravação de “Neyde &  Tim”.
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FAIXAS:
1. Nêga (Gilberto Gil)
2. Zismaia (Neyde e Tim)
3. Ogulabuiê (tradicional: ponto de umbanda)
4. Batuque (Neyde e Tim)
5. Farofa (Tim Maia)
6. Psychoblack (Tim Maia)
7. Kaxassa (Tim Maia)
8. Som (Ari, Célio e Tim Maia)
9. Retorno (Tim Maia)
10. Brother (Jorge Ben)


quarta-feira, 21 de junho de 2017

Banda Black Rio - "Maria Fumaça" (1977)




“A Banda Black Rio é um dos maiores acontecimentos musicais desse planeta”.
Lucas Arruda


“Coisa mais séria que tem! Um dos discos instrumentais mais bem feitos no Brasil. Tudo absolutamente certo aqui: temas, timbres, só acerto.”
Ed Motta


O jazz no Brasil teve de caminhar alguns quilômetros em círculos para que obtivesse uma identificação real com o país do carnaval. Em termos de indústria fonográfica, até os anos 70 as apostas sempre estiveram sobre o samba e derivados ou outros gêneros comerciais, como o bolero, a canção romântica, a bossa-nova carioca, os festivais, a MPB e até o rock. Mesmo presente na sonoridade das orquestras das gafieiras ou na bossa nova, o jazz se misturava aos sons brasileiros mais pela natural influência exercida pelos Estados Unidos na cultura latina do que pelo exemplo de complexidade harmônica de um Charlie Parker ou Charles Mingus. Expressões bastante significativas nessa linha houve nos anos 50 e 60, inegável, mas jazz brasileiro mesmo, com “b” maiúsculo, esse ainda não havia nascido.

Por essas ironias que somente a Sociologia e a Antropologia podem explicar, precisou que o gênero mais norte-americano da música desse uma imensa volta para se solidificar num país tão africanizado quanto os Estados Unidos como o Brasil. Essa solidificação se deve a um simples motivo: assim como na criação do jazz, cunhado por mentes e corações de descendentes de escravos, a absorção do estilo no Brasil se deu também pelos negros. No caso, mais de meio século depois, pela via da soul music. O chamado movimento “Black Rio”, que estourava nas periferias cariocas no início da década de 70, era fruto de uma nova classe social de negros que surgia oriundos das “refavelas”, como bem definiu Gilberto Gil. Reunia milhões de jovens em torno da música de James Brown, Earth, Wind & Fire, Aretha Franklin e Sly & Family Stone. DJ’s, dançarinos, produtores, equipes de som, promoters e, claro, músicos, que começavam a despontar da Baixada e da Zona Norte, mostrando que não eram apenas Tim Maia e Cassiano que existiam. Tinha, sim, outros muitos talentos. Dentro deste turbilhão de descobertas e conquistas, um grupo de músicos originários de outras bandas captou a essência daquilo e se autodenominou como a própria cena exigia: Black Rio.

Formada da junção de alguns integrantes dos conjuntos Impacto 8, Grupo Senzala e Don Salvador & Grupo Abolição, a Black Rio compunha-se com o genial saxofonista Oberdan Magalhães, idealizador e principal cabeça da banda; o magnífico e experiente pianista Cristóvão Bastos; os sopros afiados de José Carlos Barroso (trompete) e Lúcio da Silva (trombone); o não menos incrível baixista Jamil Joanes; Cláudio Stevenson, referência da guitarra soul no Brasil; e, igualmente impecável, o baterista e percussionista Luiz Carlos. Com uma insuspeita e natural mescla de samba, baião, funk, gafieira, rock, R&B, fusion, soul e até cool, a Black Rio inaugurava de vez o verdadeiro jazz brasileiro. Um jazz dançante, gingado, sincopado, cheio de groove e de rebuscamentos harmônicos.

Banda das mais requisitadas dos bailes funk daquela época, eram todos instrumentistas de mão cheia. Se nas apresentações eles tinham a luxuosa participação vocal de dois estreantes até então pouco conhecidos chamados Carlos Dafé e Sandra de Sá, tamanhos talento e habilidade não podia se perder depois que a festa acabasse e as equipes de som guardassem os equipamentos. Precisava ser registrado. Foi isso que a gravadora WEA providenciou ao chamar o tarimbado produtor Mazola – por sua vez, muito bem assessorado por Liminha e Dom Filó, este último, um dos organizadores do movimento Black no Brasil. Eles ajudaram a dar corpo a Maria Fumaça, primeiro dos três discos da Black Rio, a obra-prima do jazz instrumental brasileiro e da MPB, uma joia que completa 40 anos de lançamento em 2017.

Como se pode supor, não se está falando de qualquer trem, mas sim um expresso supersônico lotado de musicalidade e animação, que transborda talento do primeiro ao último acorde. Sonoridade Motown com toques de Steely Dan e samba de teleco-teco dos anos 50/60. Tudo isso pode ser imediatamente comprovado ao se escutar a arrasadora faixa-título, certamente uma das melhores aberturas de disco de toda a discografia brasileira. O que inicia com um show de habilidade de toda a banda, num ritmo de sambalanço, logo ganha cara de um baião jazzístico, quando o triângulo dialoga os sopros, cujas frases são magistralmente escritas e executadas. A guitarra de Cláudio faz o riff com ecos que sobrevoam a melodia; Jamil dá aula de condução e improviso no baixo; Cristóvão manda ver no Fender Rhodes; Luis Carlos faz chover na bateria. Quando o samba toma conta, praticamente todos assumem percussões: cuíca, pandeiro e tamborim.

Sem perder o embalo, uma versão originalíssima de “Na Baixa Do Sapateiro”, comandada pelo sax de Oberdan, que atualiza para a soul o teor suingado da melodia, e outra igualmente impecável: “Mr. Funky Samba”. Jamil, autor do tema, está especialmente inspirado, fazendo escalamentos sobre a base funkeada e sambada como bem define o título. Mas não só ele: Luiz Carlos adiciona ritmos da disco ao jazz hard bop, e Cristóvão mais uma vez impressiona por sua versatilidade na base de Fender Rhodes e no solo de piano elétrico. Uma música que jamais data, tamanha sua força e modernidade.

O líder Oberdan assina outras duas composições, a sincopada “Caminho Da Roça” e a carioquíssima “Leblon Via Vaz Lôbo”, em que Cláudio e o próprio improvisam solos da mais alta qualidade. Outros integrantes, no entanto, não ficam para trás nas criações, caso de Cláudio e Cristóvão, que coassinam uma das melhores do disco: “Metalúrgica”. Como o título indica, são os sopros que estão afiados no chorus. O que não quer dizer que os colegas também não brilhem, caso de Luiz Carlos, criando diversas variações rítmicas, Cláudio, distorcendo as cordas, e a levada sempre inventiva de Jamil.

A versatilidade e o conceito moderno da Black Rio revisitam outros mestres da MPB, como Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (“Baião”), onde o ritmo nordestino ganha tons disco e funk; Edu Lobo (“Casa Forte”), de quem realçam-lhe a força e a expressividade das linhas melódicas; e Braguinha, quando o lendário choro “Urubu Malandro”, de 1913, vira um suingado e vibrante samba de gafieira. Nota-se um cuidado, mesmo com a sonoridade eletrificada, de não perder a essência da canção, o que se vê na manutenção de Cristóvão nos teclados e da adaptação das frases de flauta para uma variação sax/trompete/trombone.

Outra pérola de Jamil desfecha essa impecável obra num tom de soul e jazz cool, que antevê o que se chamaria anos adiante no Brasil de “charme”. Embora a canção seja de autoria do baixista, é o trompete de Barrosinho que arrasa desenhando toda melodia do início ao fim.

Talvez seja certo exagero, uma vez que já se podia referenciar como jazz “brazuca” o som de Hermeto Pascoal, Moacir Santos, Airto Moreira, João Donato, Eumir Deodato, Flora Purim, Dom Um Romão, entre outros – embora, a maioria tenha-o feito e consolidado seus trabalhos fora do Brasil. Com a Black Rio foi diferente. Com todos pés cravados em terra brasilis, foi o misto de contexto histórico, necessidade social, proveito artístico e oportunidade de mercado que a fizeram tornar-se a referência que é ainda hoje. Uma referência do jazz com cheiro, cor e sabor latinos. Mas para além das meras classificações, a Black Rio é o legítimo retrato de uma era em que o Brasil negro e mestiço passou a mostrar a riqueza "do black jovem, do Black Rio, da nova dança no salão".

Banda Black Rio - "Maria Fumaça"


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FAIXAS
1. Maria Fumaça (Luiz Carlos Santos/Oberdan) - 2:22
2. Na Baixa Do Sapateiro (Ary Barroso) - 3:02
3. Mr. Funky Samba (Jamil Joanes) - 3:36
4. Caminho Da Roça (J. Carlos Barroso/Oberdan) - 2:57
5. Metalúrgica (Claudio Stevenson/Cristóvão Bastos) - 2:30
6. Baião (Humberto Teixeira/Luiz Gonzaga) - 3:26
7. Casa Forte (Edu Lobo) - 2:22
8. Leblon Via Vaz Lôbo (Oberdan) - 3:02
9. Urubu Malandro (Louro/João De Barro) - 2:28
10. Junia (Joanes) - 3:39

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OUÇA O DISCO


por Daniel Rodrigues

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

De Frente com Davi

Sócio do Internacional como sou, fui agraciado em um sorteio do consulado do Rio de Janeiro com um ingresso para o jogo de ontem à noite contra o Vasco da Gama em São Januário, que felizmente vencemos. Para ir ao jogo, tive, ontem à tarde, que retirar o ingresso no hotel onde a delegação estava hospedada e lá conversando sobre assuntos do clube com a pessoa que me entregaria o ingresso, abordando assuntos sobre a administração do futebol do clube, do vestiário, esta pessoa achou por bem chamar o vice-presidente de futebol que estava ali por perto para sanar algumas dúvidas que eu manifestava quanto ao que vem acontecendo com o time e no tocante à eleição que se aproxima. Assim, tive uma longa e produtiva conversa com o senhor Luciano Davi, o atual homem-forte do futebol do Internacional. Levou-me para uma sala à parte no restaurante do hotel de modo a garantir que o que fosse me falar não vazasse para algum repórter ou alguém mal intencionado, e igualmente me pediu discrição quanto ao que iria revelar, de modo a não expôr o clube em algumas circunstâncias ou influenciar no processo eletivo.
Bom, não sou jornalista e não teria a obrigação de, como se costuma dizer 'embarrigar' a notícia. Poderia muito bem dar aqui alguns furos de reportagem e causar um certo estardalhaço e alvoroço com algumas coisas que o vice de futebol do Inter me falou, mas, não só por ter-lhe dado minha palavra de que aquelas informações não se espalhariam mas também para não deixar o clube excessivamente vulnerável, só vou citar aqui alguns pontos do que falamos que não sejam assim tão comprometedores nem possam causar algum transtorno à atual gestão e ao Internacional como instituição.
Acredito que não esteja traindo sua confiança quando revelo que Luciano Davi me disse que parte técnica do trabalho de Dorival Júnior deixava a desejar e o mesmo fora demitido porque havia perdido completamente o controle do vestiário; que tentaram nomes de peso como Muricy, Tite e Abel para sua vaga e que sendo impossível qualquer um deles optaram por Fernandão por este conhecer bem todo o plantel, estrutura do clube e ter o grupo na mão; que aprovou a atitude de Fernandão no episódio do esporro geral mas que não avalizava o modo como foi feito, na imprensa, em coletiva depois de um jogo; disse ainda que este incidente demorou uma semana para ser absorvido, atenuado e resolvido mas que no fim das contas, numa confraternização interna descontraída onde todos puderam colocar o que estava incomodando ou o que achavam de errado, tudo ficou resolvido e o grupo ficou fortalecido; e ainda a propósito disso, disse-me que não há problemas internos e que Fernandão tem sim o grupo de atletas sob seu comando. Revelou-me ainda que num vestiário difícil por ter jogadores de seleção, de salários altos, etc., faz cobranças constantes pessoalmente, principalmente às 'estrelas', para que dêem retorno a seus investimentos e altos rendimentos; que neste vestiário tem que ser pai, amigo, irmão, psicólogo e sobretudo chefe, dando fortes duras em jogadores que as vezes nós torcedores julgamos que sejam bajulados e mimados. Por fim, enalteceu o trabalho da base elogiando muito o zagueiro Jackson e mostrando grande  expectativa para o crescimento do volante Josimar, saudou as já realidades Fred e Cassiano e nessa linha, disse que é necessário e inevitável uma reformulação do plantel para o ano que vem uma vez que a média de idade do grupo está muito alta (Forlán 33 anos; Guiñazu, 34; Kleber, 32; Índio, 37; e por aí vai).
Enfim..., teve mais coisas mas algumas é melhor deixar que o tempo revele ou que algum jornalista de verdade o faça. Sei que algumas coisas que coloquei aqui já eram de se supor, outras são meio que um chover no molhado mas o que restou da minha pequena entrevista com Luciano Davi foi que vi uma pessoa séria, com muita personalidade e muito mais firmeza do que eu imaginava. Sei que muitas das coisas que me falou são um pouco tendenciosas puxando a brasa pro assado da administração atual de modo a convencer mais um sócio. Sei, sei. Mas o que percebi é que independente da panfletagem que possa ter havido por trás desse papo, a impressão que ficou foi a de um dirigente sério e uma diretoria que pensa grande e não está indiferente aos problemas e questões cruciais do clube. Se sua chapa, a de situação, do atual presidente e candidato Giovanni Luigi, terá meu voto na eleição do final do ano, não sei ainda. A conversa serviu para que eu tivesse subsídios para avaliar melhor e desfazer algumas más impressões do departamento de futebol atual. Mas ainda vou pensar. Vou pensar.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Memória curta, mas uma diva eterna

"Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Zis" - Neyde Zis

Quando se fala que o brasileiro tem memória curta, essa é uma grande verdade. Principalmente, quando se refere aos importantes artistas da música. Talentos da black music como Cassiano, Noriel Vilela, entre outros, caíram numa espécie de amnésia. Infelizmente (e surpreendentemente) também é o caso de Neyde Zis - uma das maiores cantoras do País do gênero, considerada por alguns especialistas a melhor.

Conhecida como “A Musa”, “Diva da Black”, “A menina mulher”, Neyde era sinônimo de sucesso no final dos anos 1960. Não é a toa que tinha como parceiros Tim Maia e Jorge Ben (que depois colocou o "Jor"). Lamentavelmente, após uma meteórica e estrondosa carreira, caiu no ostracismo musical e no desconhecimento popular.

No entanto, canções de qualidade são eternizadas e basta uma audição para relembrar (para alguns) ou descobrir (para outros), o quão é incrível a sonoridade e a inconfundível voz de Neyde Zis. O disco “Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Zis” mostra essa riqueza de sons.

Neste registro, a cantora encerra sua "trilogia" musical. Tentou retomar a carreira nos anos 1980, com um disco honômino, mas não teve a mesma criatividade e sucesso de anos anteriores. Em “Dó, Ré, Mi”, que pode ser percebido pela capa, mostra o quanto de experimentalismo e de psicodelia (típicos da época) estão contidos no disco.

A obra - que tem Neyde nos vocais, no violão e nas composições - conta com grandes participações, como dos seus velhos e eternos parceiros: Tim Maia, Tony Tornado e Jorge Ben. Além das contribuições de Erasmo Carlos, Arnaldo Baptista (dos Mutantes) e do Trio Mocotó.


Neyde Zis no programa
do apresentador
Sílvio Santos em 1968
Na faixa "Machado de Assis era negão, sim", a letra é uma crítica ácida que, por ironia do destino, aborda a falta da memória do povo brasileiro. Além disso, valoriza tanto a literatura como da negritude no País. O Trio Mocotó contribui nesta música com um excepcional ritmo, incorporando muito swing do samba rock. Já em “Mãe preta”, Neyde mais uma vez faz um show à parte. Além da voz principal, gravou os três backing vocals, mostrando a sua facilidade de alcançar notas agudas até as mais graves.

Em “Meu nego” (tendo relatos que essa música foi dedicada ao Jorge Ben), tem o mesmo nos vocais e no violão. Já em “The black is on the table” é a vez de Tim Maia aparecer em cena, com seu inglês e voz impecáveis. Tim toca bateria nesta canção, um dos raros registros da carreira do “Sindico” neste instrumento. Aliás, esta música também faz uma crítica social, expondo-a literalmente na “mesa” para todos ouvirem.

Na “Barato total”, Arnaldo Baptista empresta suas “veias psicodélicas” no piano. Também foi responsável por samplers, com ruídos difíceis de detectar do que se tratam.

A “Ogulabuiê” é uma espécie de “revival” de Neyde no período em que cantava junto com Tony Tornado na BR3. A “Diva da black” fez questão que esta música soasse como nos tempos que participava do grupo, quando era uma mera coadjuvante. Nesta, ela divide os vocais com o próprio Tony. Na “Uh, Uh” tem Erasmo Carlos tocando guitarra. O Tremendão colaborou para que esta faixa fosse a mais rock de todas.

A “Ezistência/rezistência” é a canção que abre o disco, com início melancólico e finaliza com um samba de raiz tradicional do Rio de Janeiro. Já a “Zumbi” fecha esta preciosidade brasileira. Curiosamente, na letra, Neyde parece ter tido um pressentimento do seu declínio, cantando: “minha liberdade já se foi, sou uma escrava da dor. Meu quilombo parece longe, seja lá meu destino para aonde for”.

O esquecimento pode perdurar anos, mas não é eterno. O que é permanente é o talento de Neyde Zis, a grande musa da black music do Brasil. Recordar é viver, principalmente para apreciar a boa música.


terça-feira, 26 de setembro de 2017

Carlos Dafé - “Pra que Vou Recordar” (1977)



“A refavela/ Revela o passo/ 
Com que caminha a geração/ 
Do black jovem/ Do Black Rio/ 
Da nova dança no salão”. 
Gilberto Gil, da letra de "Refavela", de 1977

O ano de 1977 foi cheio para a Banda Black Rio. Formada a não muito da fusão de músicos de diferentes origens – os conjuntos Impacto 8, Grupo Senzala e Don Salvador & Grupo Abolição –, eles eram os reis dos bailes black da Zona Norte carioca, que eclodiram nos anos 70. Além das festas,  começaram a ser bastante requisitados para outros projetos. Só entre janeiro e março, gravaram todo o primeiro disco e foram até tema de novela da Globo, Locomotivas. Era o momento deles. Junto com nomes como Tim Maia, Cassiano, Gerson King Combo, Hyldon, Toni Tornado, Dom Mita e outros, a Black Rio não só representava como levava o nome da onda sociocultural que mobilizava milhares de negros excluídos pela sociedade. Eram jovens oriundos das "refavelas" em recente processo de ascensão social num Brasil de Ditadura Militar, que passavam agora a demonstrar seu orgulho pela raça, pelo cabelo crespo, pela dança, pela cor da pele, pelo sotaque, pela linguagem. E pelo seu som: brasileiro, mas universal.

Todos da Black Rio eram músicos excepcionais, mas nenhum sabia (pelo menos, ainda) cantar. E para incendiar a galera dos passinhos durante os bailes tinha que ter alguém chamando nos microfones e com presença de palco. Mais do que um crooner. A voz feminina a banda de Oberdan Magalhães achara: uma jovem cantora de voz rouca e potente digna das melhores da black music norte-americana chamada Sandra Sá. Porém, precisava de um gogó masculino também, o que coube perfeitamente a Carlos Dafé.

Cantor de elegância e gingado, Dafé é compositor e multi-instrumentista, capaz de mandar ver no violão, guitarra, baixo, piano, acordeão e vibrafone. Nascido no subúrbio de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, teve no pai (José de Sousa, um funcionário público tocador de chorinho) e na mãe (Conceição Gonçalves, poetisa) o incentivo à musicalidade. Tanto que, aos 11 anos, já estudava no Conservatório de Música e, na fase do serviço militar, fez turnê com o grupo Fuzi 9, do Corpo de Fuzileiros Naval. Toda essa bagagem deixava evidente que Dafé era a figura perfeita para acompanhar a Black Rio. Tanto que não ficou apenas restrito aos bailes. Assim como ocorrera com a própria banda naquele início de 1977, eles correram para o estúdio, quando se concebeu o brilhante “Pra que Vou Recordar”. Igualmente a “Maria Fumaça”, a também estreia da Black Rio, o disco de Dafé completa 40 anos de lançamento em 2017, formando o mais célebre duo de discos da soul music brasileira de todos os tempos.

A lendária Banda Black Rio: grupo de apoio de Dafé em sua estreia
Dançante mas altamente sofisticado, o álbum abre com uma das maiores canções pop já escritas no Brasil: a irrepreensível “De Alegria Raiou o Dia”. Parceria dele com outro craque da soul, Dom Mita, é um arraso em execução, timbres, sonoridade, ritmo. Que tabelinha de Luis Carlos na bateria e Jamil Joanes no baixo! Adicionado a isso, o Fender Rhodes de Cristóvão Bastos, a levada de guitarra de Claudio Stevenson, os sopros: tudo perfeito, encaixado, sonoro, musical. Mesmo sendo seu primeiro registro fonográfico, o já experiente Dafé mostra de largada toda a habilidade como compositor e cantor. A voz rasgada e de pronúncia aberta é, sobretudo, símbolo da afirmação daquela negritude adormecida e, agora, autovalorizada. O fraseado malandro, que opera propositais supressões de fonemas e adiciona ginga noutros, é de visível inspiração a nomes consagrados da música brasileira, como Seu Jorge e Criolo. Como se não bastasse o funk irresistível, na segunda parte, a “cozinha” entra com um samba-rock que, convenhamos, não tem ninguém que saiba, faça ou entenda como um músico brasileiro – quanto mais se tratando de Black Rio. Também nisso o disco de Dafé guarda semelhança com o debut do conjunto carioca, haja vista que as duas faixas de abertura trazem essa fusão dos ritmos típicos norte-americano e brasileiro como proposta conceitual.

“Tudo Era Lindo” (“Era lindo vagar, me perder de amor/ Correndo a enfrentar um mundo de loucos”) e “A Cruz” (“Se existe uma barreira/ Entre os nossos corações/ Não ligue pra essas coisas/ O importante somos nós”) dão a devida diminuída no ritmo em duas balada cheia de suingue e romantismo. Afinal, todo baile funk pede também aquela hora de dançar de rosto colado! A empolgação volta para homenagear o genial autor de “Superstition” com “Hello Mr. Wonder”, mas a um modo bem brasileiro: soul com muita carga de samba, assim como já haviam apresentado em “De Alegria...”.

Voltando para a pista, “Bem Querer” une a elegância do jazz soul com pitadas de samba, ou seja, tudo o que a turma domina. O coro feminino faz uma tabela perfeita com a voz de Dafé, enquanto Oberdan “apavora” num solo de sax. Merece ainda realce o baixo sempre incrível de Jamil, que não se restringe a simplesmente manter uma base, e, sim, desenhar linhas harmônicas sobre a escala.

A faixa-título (adicionada do complemento “o que chorei”), outro clássico do disco e da black music brasileira, faz jus ao mito. Além de trazer aquele clima das baladas dos mestres “gringos”, como Marvin Gaye e Bobby Womack, ainda adiciona-lhe a “cadência bonita do samba”. E mais uma interpretação impecável de Dafé, cheia de sentimento. Destaque para a levada de Luis Carlos e a guitarra solada de Claudio Stevenson.

“Zé Marmita” começa somente com Cristóvão ao piano elétrico e Dafé introduzindo os primeiros versos para, logo em seguida, cair num novo samba, agora bem suingado. A letra fala de um brasileiro pobre e trabalhador que se deixa levar pela alegria do Carnaval sem pensar que tem que pegar no batente no dia seguinte: “Cantando na avenida, você nem vê que amanheceu/ Esquece até da vida/ Pensa que o mundo agora é seu/ Quero só ver quando a festa acabar/ Coragem pra trabalhar”.

Ainda mais especial é “Bichos e Crianças”, que intercala uma doce melodia (“Dia de domingo/ Quem vai passear?/ Bichos e crianças vão”) com uma disco animada e lúdica cujo ritmo a Black Rio repetiria a dose na trilha do filme “Sábado Alucinante”, de 1979. Já “O Metrô”, última faixa, é o característico funk temperado com pitadas de brasilidade. A timbrística da Black Rio é algo realmente impressionante e improvável: une a sonoridade da Motown, com o padrão Steely Dan, recupera o samba telecoteco de Miltinho e o samba-rock da turma da Tijuca para chegar àquilo que eles mesmos se autodenominam: Black Rio. Ainda, é claro, a qualidade do band leader nos microfones. Um final com o que havia de melhor na cena. Em "Pra que...", Dafé e o time de Oberdan atingem um nível de musicalidade poucas vezes visto no mundo, haja vista que passa pelo funk, pela soul e pelos ritmos brasileiros em constante namoro com o jazz fusion, mas sem ser pedante nem difícil. Pelo contrário: é pop e sofisticado ao mesmo tempo.

Se 1977 ainda era tempo de Ditadura, é de se imaginar que, se a repressão recaía fortemente sobre adolescentes universitários de classe média, imagina se não iria exercer a mesma força a jovens negros da periferia? Bastou os bailes começarem a mobilizar muito mais gente que o esperado e, ainda por cima, ganhar espaço também na “branca” Zona Sul do Rio, que se resolveu dar um basta. Essa coisa de “movimento Black Rio” ou “Black o que fosse” estava começando a ficar perigosa para o governo. Então, para que os donos de equipes de som e artistas começassem a ir para o DOPS foi um passo.“Quando viram aqueles caras dançando junto, com aquelas roupas e cabelos, os militares perceberam que se nasce um líder ali no meio ia dar uma grande merda para o governo”, conta DJ Marlboro, que presenciou a cena. O movimento se tornava, da noite para o dia, subversivo.

A onda Black, pelo menos naquele momento, se esvaziara. Seguiram-se, nos anos seguintes, a última década de Governo Militar, a redemocratização, a era Collor, a ascensão do PT. Paralelamente, entretanto, o grito da periferia não se calara. Vieram o hip-hop, o break, o melô, o funk carioca, o charme, o punkadão. Se a qualidade das manifestações culturais da negritude não acompanhou aquele embrião animador e altamente musical, paciência. A bandeira pela liberdade dos negros havia sido hasteada. Dafé, Black Rio e Cia. cumpriram o papel daquilo que Gilberto Gil captara naquele sociologicamente fatídico 1977 para o Brasil negro: conceber um “samba paradoxal. Algo que só nossa “escola” é capaz. Ou seja: “Brasileirinho pelo sotaque, mas de língua internacional”.

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FAIXAS:
1. “De Alegria Raiou o Dia” (Carlos Dafé/Dom Mita) - 3:40
2. “Tudo Era Lindo” (Dafé/Jomari) - 3:34
3. “A Cruz” (Dafé/Tânia Maria Reis) - 5:52
4. “Hello Mr. Wonder” (Dafé/Claudio Stevenson/Luiz Carlos dos Santos) - 3:44
5. “Bem Querer” (Dafé/Lucio Flavio/Tião da Vila) - 3:11
6. “Pra Que Vou Recordar o que Chorei” (Dafé) - 3:46
7. “Zé Marmita” (Dafé/Vandenberg) - 3:34
8. “Bichos e Crianças” – (Dafé/Marilda Barcelos) - 2:45
9. “O Metrô” (Dafé/Lucio Flavio/Oberdan) - 2:58

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OUÇA

por Daniel Rodrigues