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segunda-feira, 18 de novembro de 2024

João Gilberto - “Live at The 19th Montreux Jazz Festival” ou "Live In Montreux" (1985)

 

No topo, capa do LP original
lançado no Brasil e, abaixo,
a da edição americana

“É a grande soma da obra de João Gilberto. É o disco que dá a visão mais ampla da ideia que ele tem de repertório, de estilo”.
Caetano Veloso

Os baianos, mais do que qualquer outra gente, são donos de uma genialidade que às vezes beira a ingenuidade. Caetano Veloso conta que, certa vez, ao visitar Dorival Caymmi em sua casa numa quente tarde de Salvador, o anfitrião mal o deixou entrar pelo portão e já se pôs a mostrar-lhe uma novidade que havia descoberto para aliviar aquele intenso calor. Levou, então, Caetano até a sala e solenemente lhe apresentou sua mais nova obra de engenharia doméstica: havia disposto a cadeira na qual estava sentado só de bermuda e chinelos feito um Buda nagô de frente para um... ventilador! 

Por mais óbvio que pareça o raciocínio de Caymmi, ele guarda, no fundo, uma percepção que, muitas vezes, foge aos mortais preocupados em complexar a vida: a simplicidade. Foi valendo-se do mesmo senso natural que outro baiano favorecido pelos Céus, João Gilberto, chegou a uma conclusão semelhante. Além daquilo que produzia nos invariavelmente indispensáveis discos de estúdio desde o final dos anos 50, João costumava reinventar seu repertório a cada nova apresentação ao vivo. Geralmente, só ele é o inseparável violão. Uma magia inimitável a qualquer outro momento da história da música moderna. Então, do fundo de sua cabeça privilegiada mas distraída, pensou: "porque não gravo um disco ao vivo que transmita essa atmosfera?" 

Sim, passados mais de 30 anos de carreira, João nunca havia feito um álbum neste formato. Tinha até então dois ao vivo, todos com parcerias e/ou bandas/orquestra acompanhando: "Getz/Gilberto #2", em companhia do saxofonista de jazz norte-americano Stan Getz, de 1965, e o especial da TV Globo "João Gilberto Prado Pereira de Oliveira", de 1980, no qual recebe vários convidados. Assim, só ele no palco, nunca.

O que parecia óbvio, por se tratar da essência do som do homem que inventou a moderna música brasileira com a concepção da bossa nova, ganhava, enfim, um registro fiel. Já havia se tornado comum a artistas brasileiros a partir dos anos 70 gravarem seus shows no Festival de Jazz de Montreux, na Suíça, desde que a curadoria do evento se abrira para a sonoridade da MPB como sendo cabível no gênero do "jazz moderno". De A Cor do Som a Elis Regina, passando por Gilberto Gil, Pepeu Gomes e Hermeto Pascoal. Faltava João.

E o Bruxo de Juazeiro não deixa por menos. Com seu repertório impecável selecionado cirurgicamente, une velhos sambas, como os de Ary Barroso, Haroldo Barbosa, Geraldo Pereira e Wilson Batista, a então novos clássicos. Melhor exemplo é "Menino do Rio", de Caetano, lançada em 1979 pelo autor e já versada pelo próprio João um anos depois. Mas ocorreu que a música fizera novamente muito sucesso em 1982 na voz de Baby Consuelo para a trilha do filme homônimo, e João, ao resgatá-la, transformava-a imediatamente de um hit para um clássico. 

João destila musicalidade. É tocante ouvir o trato de cada detalhe, de cada pronúncia, de cada acorde ou silêncio. A permanente confluência harmonia-melodia, as variações de ritmo, o casamento de cordas vocais e cordas de nylon num constante entendimento, entrelaçando-se, dançando. "Tim Tim Por Tim Tim", conhecida do repertório de João, abre com um verdadeiro show de gingado. Quem escuta ele tocando e cantando com tamanha naturalidade pode até pensar que se trata de um improvido. Mas o mais impressionante de João é que tudo aquilo faz parte de um exercício de controle absurdo, e ao vivo isso fica mais evidente. As soluções harmônicas, as escolhas de tempos, a voz afinadíssima mas sem vibrato, o controle da cadência, o que arpejar e o que silenciar: tudo se resolve ali, na hora, no palco, diante do microfone e da plateia. 

O público, neste show, aliás, merece uma atenção à parte. Até mais: merece também aplausos. Visivelmente formada por muitos brasileiros, mas certamente também por suíços e outros estrangeiros, na maioria da Europa, a plateia se emociona e transmite essa emoção para o artista, que retribui, numa corrente de energia poucas vezes vista ou perceptível em discos ao vivo. João brincando de "quém quém" ao cantar "O Pato" ou sambando com a voz em "Sem Compromisso" não deixam mentir. Mas, principalmente, "Adeus América". O samba de Haroldo Barbosa, escrito para outro símbolo mundial do Brasil (o maior deles), Carmem Miranda, como uma declaração de amor ao Brasil após ela ser tachada pelos compatriotas invejosos de "voltar americanizada" dos Estados Unidos, aqui soa (e ainda mais aos brasileiros da plateia) como um canto de exílio, um canto de saudade da terra mater. “Não posso mais, que saudade do Brasil/ Ai que vontade que eu tenho de voltar/ Adeus América, essa terra é muito boa/ Mas não posso ficar porque/ O samba mandou me chamar”. É certamente o momento mais emocionante do show, como talvez nenhuma outra gravação ao vivo de João neste ou noutros discos.

Há também a apropriação "mpbística" do jazz standart italiano "Estate", presente no memorável LP "Amoroso", de 1977, e, claro, a reverência à bossa nova. Mais precisamente, a Tom Jobim. Do maestro, João toca quatro das 15 do set-list: "Retrato em Branco e Preto", dois ícones da primeira fase bossanovista, "Garota de Ipanema" e "Desafinado"; e uma imbatível "A Felicidade", menos recorrente no repertório de João e até por isso ainda mais impactante.

Outro maestro, no entanto, é exaltado por João na histórica apresentação no 19º Festival de Montreux. Cabe ao legado de Ary Barroso fechar o show com três faixas: "Morena Boca de Ouro" e outras dois símbolos de brasilidade em música: as ufanistas "Isto Aqui o que É?" e aquele que é considerado o segundo hino da nação, "Aquarela do Brasil", numa execução de quase 10 minutos. João, que a havia protagonizado no disco "Brasil", de quatro anos antes e quando teve a companhia de Caetano e Gil para interpretá-la, encara aqui a empreitada sozinho. Coisa só de quem tem a mesma envergadura da própria música que entoa.

Prestes a completar 40 anos de seu lançamento, “Live at The 19th Montreux Jazz Festival” guarda a primazia de ser a primeira gravação fiel de um show de João Gilberto, abrindo caminho para vários outros que viriam nos anos seguinte e dos quais destacam-se pelo menos dois: “João Gilberto In Tokyo”, de 2004, e “Live At Umbria Jazz”, de 2002. No entanto, este registro evidentemente possui uma aura e uma importância especial. Mesmo que na maioria dos discos, inclusive os de estúdio, João fosse captado “just in time” pelas mesas de som, no palco não há o que editar ou refazer. É aquele pulsar orgânico e indelével. E no caso de João, isso vale mais do que o silêncio, como diz Caetano. 

E dizer que João levou mais de duas décadas para deixar essa óbvia joia da cultura brasileira para a posteridade... Às vezes, a obviedade é mesmo genial.

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Originalmente lançado no Brasil e no Japão em 1985 como LP duplo de 15 faixas, "Live At The 19th Montreux Jazz Festival", na versão norte-americana, de um ano após, chamou-se apenas de "Live In Montreux" e contendo 13 músicas: sem "Tim Tim Por Tim Tim", "Desafinado" e "O Pato" e tendo acrescida "Rosa Morena" (Dorival Caymmi).

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FAIXAS:
1. “Tim Tim Por Tim Tim” (Geraldo Jacques, Haroldo Barbosa) - 3:38
2. “Preconceito” (Marino Pinto, Wilson Batista) - 2:25
3. “Sem Compromisso” (Geraldo Pereira, Nelson Trigueira) - 4:05
4. “Menino Do Rio” (Caetano Veloso) - 3:45
5. “Retrato Em Branco e Preto (Antonio Carlos Jobim, Chico Buarque) - 6:36
6. “Pra Que Discutir Com Madame?” (Haroldo Barbosa, Janet de Almeida) - 6:25
7. “Garota De Ipanema” (Antonio Carlos Jobim, Vinicius De Moraes) - 3:42
8. “Desafinado” (Antonio Carlos Jobim, Newton Mendonça) - 4:53
9. “O Pato” (Jaime SIlva, Neuza Teixeira) - 6:08
10. “Adeus América” (Geraldo Jacques, Haroldo Barbosa) - 6:50
11. “Estate” (Bruno Brighetti, Bruno Martino) - 5:18
12. “Morena Boca de Ouro” ((Ary Barroso) - 5:37
13. “A Felicidade” (Antonio Carlos Jobim, Vinicius De Moraes) - 5:10
14. “Isto Aqui, O Que É? (Sandália de Prata”) (Ary Barroso) - 6:43
15. “Aquarela Do Brasil” (Ary Barroso) – 9:05



Daniel Rodrigues


quinta-feira, 16 de maio de 2024

Danilo Caymmi - "Cheiro Verde" (1977)

 

“Você gravava, vendia, corria atrás, ia pra rua. Fizemos três mil cópias e conseguimos vender todas. Mas agora, nesta era digital, esse disco ficou parado. Ele foi se valorizando com o tempo, o que é muito gratificante”. 
Danilo Caymmi

Danilo é o menos badalado entre os Caymmi. No que diz respeito a seu pai, Dorival, poucos se equiparam ao gênio deste Buda Nagô, um dos maiores nomes da música brasileira de todos os tempos. Seu irmão mais velho, Dori, gabaritado maestro de reconhecimento internacional, trabalhou com alguns dos mais prestigiados músicos do seu tempo, como os conterrâneos Tom Jobim, João Gilberto e Elis Regina e os estrangeiros Dionne Warwick, Quincy Jones e Toots Thielemans. Nana, a irmã, é nome inconteste entre as maiores vozes da MPB. Até mesmo a filha Alice, cultuada pelo público mais jovem, ganha mais holofotes do que ele. A figura modesta talvez explique. A mãe Stella Maris, mineira, sentenciou certa vez que, entre os filhos, Nana cantava, Dori arranjava e Danilo tocava flauta. Porém, Danilo é, certamente, muito mais do que uma retaguarda, visto que é o mais catalisador da família em termos musicais. Caçula, talvez justamente por ter vindo por último ele consiga recolher características de cada um: de Dorival, traz nas veias a sofisticação das canções praieiras; do irmão mais velho, a versatilidade e a musicalidade profunda; de Nana, o timbre inconfundível dos Caymmi e o apuro vocal; da filha, a modernidade musical intercambiada desde que ela estava no berço.

“Cheiro Verde”, seu álbum de estreia, de 1977, é um exemplo claro desta multiplicidade simbiótica de Danilo. Cantor, flautista, compositor e violonista, traz em sua música uma impressionante diversidade de estilos, que vão da bossa nova ao baião, passando pelo samba jazz e a soul. Com um time de grandes músicos, tal Cristóvão Bastos, Maurício Maestro e Fernando Laporace, o disco traz a mais alta qualidade melodia e harmonia quanto letrística e instrumental, ao nível do "alto escalão" da MPB, como Tom, Arthur Verocai, Ivan Lins, Waltel Branco, Antonio Adolfo, Tânia Maria, Edu Lobo. Ao nível dos Caymmi.

Afinal, Danilo, mesmo debutando como artista solo, não era nenhum novato. Flautista profissional desde os 16, o futuro arquiteto que abandonou a faculdade para seguir a vida musical já em 1968 participava do II Festival Internacional da Canção Popular. Levou o terceiro lugar com a clássica “Andança”, parceria com Edmundo Souto e Paulinho Tapajós, defendida por Beth Carvalho. No ano seguinte, venceu o Festival de Juiz de Fora com a canção “Casaco Marrom”, parceria com Renato Corrêa e Gutemberg Guarabyra, interpretada por Evinha. Bastante próximo dos colegas mineiros, de quem tem forte influência musical, já havia integrado a banda de Tom, Joyce, Milton Nascimento, Som Imaginário, Martinho da Vila, Quarteto em Cy, entre outros, além de assinar, juntamente com Beto Guedes, Novelli e Toninho Horta, um dos melhores discos de toda a década de 70.

Em “Cheiro…”, portanto, Danilo chegava pronto como que perfumado para uma festa. A primeira nota do frasco, “Mineiro”, é exemplar nisso: bossa nova com dissonâncias e harmonia típicas dos autores de grande domínio composicional. A letra de Ronaldo Bastos é uma homenagem de dois cariocas aos amigos do Clube da Esquina: “Vou por aí levando um coração mineiro, pois é”. Ainda, as participações especiais de Airto Moreira na bateria, Helvius Vilela no piano e Gegê na percussão. Com Bastos, também assina “Codajás”, que Nana gravara um ano antes. De tom ao mesmo tempo blueseiro e sambístico, traz o belo canto de Danilo soltando agudos difíceis a qualquer cantor, ainda mais a alguém de uma família cujo timbre tende sempre ao barítono. Fora isso, Danilo a aperfeiçoa ainda mais com um jazzístico solo de flauta, que encerra o número.

Com a então esposa Ana Terra, excelente musicista carioca e responsável também pela produção, compõe maior parte do repertório, como o samba “Pé sem Cabeça”, típica música do período da ditadura no Brasil - gravada posteriormente, claro, pela combativa Elis. Com cara de tema romântico, na verdade, denuncia o regime e os horrores cometidos contra os opositores: “Você me fez sofrer/ Ninguém me faz sofrer assim/ O que era tanta beleza num pé sem cabeça você transformou”. É dos dois também a brejeira e lúdica “Juliana”, de acordes jobinianos, e a subsequente “Aperta Outro”, samba cheio de suingue com toque do trombone de Edson Maciel e o baixo do parceiro Novelli. 

Ainda mais gingada é “Racha Cartola”, ode à boemia mas, igualmente, à preocupação do boêmio quando volta para casa. “Como explicar?”, pergunta-se lembrando que terá de encarar a esposa esperando-o irritada. A sincopada “Botina”, dele e de outro mineiro, Nelson Ângelo, traz novamente a atmosfera de Minas (“Velha porteira, cidade interior/ Uma voz de lavanderia, um batuque e um sabor”), referenciando, mais uma vez - além do próprio coautor -, à turma liderada por Milton Nascimento. Aliás, o gênio de Três Pontas empresta sua voz inconfundível em “Lua Do Meio-Dia”, outra com Ana e das mais belas e engenhosas melodias do disco, com sua estrutura dissonante e complexas divisões.

Em época de Abertura Política, mas de manutenção da repressão, Danilo ousa e encaminha o final do álbum com mais um tema bastante provocativo: “Vivo ou Morto”. Dele e de João Carlos Pádua, não tem como não relacionar os versos deste baião tristonho às mortes de presos políticos promovidas nos Anos de Chumbo: “Debaixo das 9 pedras/ Ele vive muito bem/… Ele respira e fala pelas bocas do inferno/…Debaixo das 9 bocas/ Ele nem mesmo se cala/ Debaixo das 9 botas/ Ele dá voltas na sala”. Para encerrar mesmo, então, a sinestésica faixa-título, quinta dele com Ana entre as 10 faixas de todo o trabalho. E que bela canção! Com a atmosfera da música “ecológica” que Tom inauguraria no início dos anos 70, quando começou a se voltar às questões do Planeta, Danilo parecia antever sua entrada anos depois, em 1984, na Banda Nova, conjunto que passaria a acompanhar o Maestro Soberano até o final de sua vida.

Desde então, Danilo seguiria intercalando uma afirmada carreira solo com participações como instrumentista em trabalhos de outros, reuniões com a família no palco e gravações e shows na Banda Nova. Lançou 10 álbuns como front man, alcançando, em 1990, grande sucesso com “O Bem e o Mal”, tema da minissérie “Riacho Doce”, da Globo. No entanto, “Cheiro Verde” permanece um marco na sua obra não apenas por ser o primeiro ato de um músico que soube aproveitar seu gene privilegiado, mas pela qualidade indiscutível que guarda até hoje. Tanto é que, lançado independentemente em 1977, teve, em 2002, sua tiragem licenciada na Inglaterra, tornando-se cult entre os jovens na Europa. Somente no ano passado, teve relançamento no Brasil para a alegria dos fãs e apreciadores. Pelo visto, esse aroma inconfundível e encantador não se dissipou mesmo tantos anos depois.

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FAIXAS:
1. “Mineiro” (Danilo Caymmi/ Ronaldo Bastos) - 3:25
2. “Pé Sem Cabeça” (Caymmi/ Ana Terra) - 2:45
3. “Codajás” (Caymmi/ Bastos) - 3:05
4. “Juliana” (Caymmi/ Terra) - 2:44
5. “Aperta Outro” (Caymmi/ Terra) - 2:54
6. “Racha Cartola” (Caymmi/ João Carlos Pádua) - 2:55
7. “Botina” (Caymmi/ Nelson Angelo) - 2:37
8. “Lua Do Meio-Dia” (Caymmi/ Terra) - 2:16
9. “Vivo Ou Morto” (Caymmi/ Pádua) - 3:07
10. “Cheiro Verde” (Caymmi/ Terra) - 4:15

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OUÇA O DISCO:

Danilo Caymmi - "Cheiro Verde"


Daniel Rodrigues


quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Criolo - “Convoque seu Buda” (2014)

 

'Convoque seu Buda' fermenta a massa modelada no antecessor 'Nó na Orelha', álbum que projetou e consagrou Kleber Cavalcante Gomes, cantor e compositor das quebradas que, comendo pelas beiradas, vem flertando com ícones da linha de frente da MPB.  'Convoque...' jamais ultrapassa a fronteira delimitada por 'Nó...', mas aprimora a receita sonora do álbum anterior."
Mauro Ferreira, crítico musical

Quando “Convoque seu Buda” foi lançado, no final de 2014, Criolo já ocupava seu merecido lugar no panteão dos grandes da música brasileira. “Nó na Orelha”, seu antecessor de três anos antes, havia garantido este posto ao cantor e compositor paulista ao lado de colegas do gabarito de Chico Buarque, Caetano Veloso e Milton Nascimento. Obras como “Subirodoistiozin”, “Não Existe Amor em SP” e “Grajauex” eram provas incontestes de que, depois de muitos anos, havia surgido um talento acima da média na já tão bem representada MPB, mas carente de novas referências.

Só status, contudo, não era suficiente para Criolo. Para um artista de alto nível e, principalmente, honesto consigo e para com seu público, contentar-se com a atribuição externa seria impensável. Ainda mais porque, indiretamente, espera-se, sim, que grandes artistas sigam produzindo bem e, consequentemente, evoluindo. Por isso, fazer um novo disco só para cumprir tabela lhe soaria, ao mesmo tempo, a mediocridade e calvário. O que se vê em “Convoque...”, além de um Criolo totalmente consciente de seu universo sonoro, é a manutenção de parte da estrutura narrativa da estreia, bem como da veia contestadora e do rap como força-motriz. Mas com acréscimos.

A pegada hip hop está lá, preservada, como na faixa-título e de abertura. Porém, já aí se nota um Criolo mais maduro e dono de uma musicalidade talvez menos instintiva. As referências não-óbvias ao rap samurai da Wu-Tan Clan, bem como a seus ídolos Sabotage e Racionais, chamam o ouvinte para uma experiência diferente. Na letra, a pungência onírica improvável de sua poética: "De uzi na mão, soldado do morro/ Sem alma, sem perdão, sem jão, sem apavoro/ Cidade podre, solidão é um veneno/ O Umbral quer mais Chandon/ Heróis, crack no centro/ Da tribo da folha favela desenvolvendo/ No jutsu secreto, Naruto é só um desenho".

Pronto: foi dada a largada para um novo grande disco de Criolo, que definitivamente não se resume ou se estreita, como “Nó...” já sugeria, apenas ao rap, sua raiz das quebradas paulistas. A musicalidade brasileira afro se homogeneíza fortemente agora. Caso evidente da obra-prima “Esquiva da Esgrima”. Misto de rap e candomblé. E que letra, que refrão! “Hoje não tem boca pra se beijar/ Não tem alma pra se lavar/ Não tem vida pra se viver/ Mas tem dinheiro pra se contar/ De terno e gravata teu pai agradar/ Levar tua filha pro mundo perder/ É o céu da boca do inferno esperando você”. E mais uma evolução visível: Criolo está cantando melhor. Seja nos detalhes de overdubs, nas variações de timbre e até na extensão, seu belo timbre está mais bem trabalhado e aproveitado.

Sem dar fôlego, Criolo apresenta aquela que é ao mesmo tempo a mais pop e uma das mais críticas do álbum: a sarcástica “Cartão de Visita”. Rap de excelente arranjo e cantado por ele com uma debochada voz afetada sobre a frivolidade perversa da alta sociedade, tem a parceira de Tulipa Ruiz no marcante refrão: “Acha que 'tá mamão, 'tá bom/ 'Tá uma festa/ Menino no farol se humilha e detesta/ Acha que 'tá bom/ Não é não nem te afeta/ Parcela no cartão/ Essa gente indigesta”. Nada menos que genial.

Mas Criolo estava, definitivamente, disposto a fazer história. “Casa de Papelão” pode não se tratar da melhor do disco, mas certamente a mais radical aproximação com aquilo que se entende por MPB. O arranjo, primoroso, lembra os dos clássicos discos dos anos 70 assinados por Rogério Duprat, Edu Lobo, Wagner Tiso ou Francis Hime. A música soa épica, densa, imponente. O forte teor social, igualmente, retraz as denúncias musicais e a atmosfera grave dos Anos de Chumbo, como "Cala a Boca, Bárbara", "Demônio de Guarda", "Sacramento", "Café". Deste nível. Criolo, que à época já ensaiava parcerias com Milton, Arthur Verocai e Tom Zé, chegava, sozinho, àquilo que seus mestres o ensinaram.

“Convoque...” tem, assim como “Nó...”, mais uma vez a mão dos produtores Daniel Ganjaman e de Marcelo Cabral nos arranjos, instrumentos e coautorias. Mas não se resume a estes, pois novos parceiros são, como o título sugere, convocados. A turma originalíssima da Metá Metá, donos da musicalidade afro mais raiz da música brasileira, são alguns deles. Seus integrantes, Kiko Dinucci, Thiago França e Juçara Marçal, aparecem em mais de uma faixa e em momentos fundamentais. É o que se vê noutra excelente do repertório, “Pegue pra Ela”, com a sonoridade folclórica dos pífaros tocados por França e a percussão marcante de Maurício Badé, bem como em “Pé de Breque”, dub jamaicano tal como reggae “Samba Sambei” do álbum anterior, compondo uma variação estratégica na narrativa sonora.

O samba, claro, está novamente presente. Repetindo também a "fórmula" de “Nó...”, que trazia o partido-alto "Linha de Frente", agora é vez da sociopolítica “Fermento pra Massa”, crônica urbana que defende em seus versos o direito à greve para se obter melhores condições de trabalho. Interessante que a música tem relação com o que Criolo fez antes, mas também com o que faria depois, a se ver por seu disco só de sambas “Espiral da Ilusão”, que lançaria 4 anos depois, e canções atuais.

Outra com olhar para a música brasileira de outros tempos, “Plano de Voo” carrega na lírica com uma letra extensa e densa que conta com ajuda do rapper Síntese. Encaminhando-se para o fim, a forte “Duas de Cinco” traz o sampler da canção "Califórnia Azul", de Rodrigo Campos, com a voz de Luísa Maita – filha de Amado Maita e de visível semelhança ao timbre da saudosa Beth Carvalho – para abrir a música com um canto melancólico e circunspecto, que dá lugar, aí sim, ao Criolo rapper. "Ela conta uma epopeia sem Ulisses", diz Criolo sobre seu rap-denúncia-confissão. Afinal, o narrador é um sujeito impregnado de "realidade", um sujeito comum que vivencia os fatos fractalmente narrados, sem a homérica intenção de heroísmo. 

A excelente “Fio de Prumo (Padê Onã)”, com os vocais de Juçara e arranjo de Dinucci, inundam de signos brasileiríssimos e põem na boca de Juçara as palavras nagô: "Laroyê eleguá/ Guarda ilê, onã, orum/ Coba xirê desse funfum". Ancestralidade poética, musical, cultura. Resistência, ode, memória. Que forma de terminar um grande disco, aquele que punha definitivamente Criolo entre os maiores. Se “Nó...” serviu para ele abrir a porta ao de muito desvalorizado rap como sendo pertencente ao universo da música brasileira, “Convoque...” solidificou sua posição e desfez de vez qualquer preconceito musical, artístico ou cultural. E pode-se dizer hoje: sim, a linhagem de Noel Rosa, Pixinguinha, Dorival Caymmi, Gilberto Gil e outros gigantes fez-se preservada em Criolo.

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FAIXAS:
1. “Convoque Seu Buda” - 3:51 (Criolo e Daniel Ganjaman)
2. “Esquiva Da Esgrima” - 4:29 (Criolo, Ganjaman e Marcelo Cabral) 
3. “Cartão De Visita” - 3:26 (Criolo, Ganjaman e Cabral)
4. “Casa De Papelão” - 4:59 (Criolo, Ganjaman, Cabral e Guilherme Held)
5. “Fermento Pra Massa” - 3:41 (Criolo)
6. “Pé De Breque” - 4:06 (Criolo)
7. “Pegue Pra Ela” - 4:25 (Criolo)
8. “Plano De Voo” - 3:39 (Criolo, Síntese, Ganjaman, Held e Cabral) 
9. “Duas De Cinco” - 3:45 (Criolo, Rodrigo Campos, Ganjaman e Cabral)
10. “Fio De Prumo (Padê Onã)” - 4:09 (Criolo e Douglas Germano)

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OUÇA O DISCO:


Daniel Rodrigues

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Xande de Pilares - “Xande Canta Caetano” (2023)

 

“Quando não genocidam as nossas crianças elas crescem e têm grandes chances de se tornar, no futuro, um Xande de Pilares, por exemplo. Que estupendo cantor ele se confirma neste álbum que não me canso de ouvir”.
Ricardo Aleixo, poeta, músico e ativista negro

"Canto e imagino que todo o povo, toda 'gente quer ser feliz, gente quer respirar ar pelo nariz' e levar a paz." 
Xande de Pilares, em carta aberta sobre “Xande canta Caetano”


O povo preto não pode nunca deixar de estar alerta. Mãe Bernadete, Moa, Amarildo, Júlio César, Genivaldo, Moïse, Sandro. Marielle Franco. Seja pela força do Estado, seja pelo braço armado do Estado, seja pela conivência do Estado, seja pela incompetência do Estado. No Brasil, o genocídio negro vem de séculos, desde os navios tumbeiros. E quando crias negras nem sequer têm a chance de conhecerem a vida? João Pedro, Heloísa, Miguel, Eloá, Thiago, Ágatha, Maria Eduarda, Kauã, Alice, Emilly, Rebecca. Chacinados da Candelária.

Acontece que, há séculos também, este mesmo povo preto massacrado e açoitado, embora submetido à pior das condições humanas, a escravidão e o aniquilamento, resiste. Resiste e dança, tal como um personagem essencial para esta análise um dia disse: "com uma graça cujo segredo nem eu mesmo sei". 

Alexandre Silva de Assis, ou Xande de Pilares, nascido no suburbano Morro da Chacrinha e que leva no nome outro bairro pobre da Zona Norte do Rio de Janeiro, é fruto deste milagre da resistência. Criado nas rodas de samba de Ramos, Cachambi, Madureira, Pilares – o Pagode do Boleiro, o da Beira do Rio, o Pagofone, o da Geci, o Compasso da Vila, o Risco de Vida, a Adega do Sambola –, chegou ao estrelato aos 22 com o Grupo Revelação na onda pagodeira dos anos 90. Sobreviveu e se desenvolveu. Solo, lançou, entre outros, discos com títulos nada despropositados: “Esse Menino Sou Eu” e “Perseverança”. Aos 53, então, Xande valeu-se da desatenção do sistema racista para cunhar um disco que já nasce, assim como ele e seus milhões de irmãos, valoroso e celebrável. “Xande Canta Caetano” é daquelas raras obras que não precisam da permissão do tempo para se tornarem essenciais. Já vem ao mundo assim.

Vários motivos levam o disco a ser especial. A começar pelo homenageado, cuja gigantesca e assombrosa obra em tamanho e importância garante um set-list de alta qualidade. Segundo: a ideia surgiu de um convite do próprio Caetano Veloso, aceita com certo temor pela responsabilidade por parte de Xande, mas assumida com reverência, respeito e entrega pelo mesmo. Terceiro, a ousadia de trazer para o seu chão, o samba, até mesmo aquilo que não é samba na roupagem original. E quarto e principal: o primoroso resultado final. São apenas 10 faixas, que levam o canto emocionado e gabaritado de Xande para canções do baiano – muitas delas, clássicos do cancioneiro brasileiro – em versões personalíssimas e inspiradas.

Xande demonstra ser um grande fã de Caetano já na escalação do repertório. Uma seleção de quem conhece a fundo aquilo a que está se dedicando. Mas sobretudo e artisticamente falando, um entendimento do que se conecta com ele como intérprete. Fora o fato de ser um disco de duração curta e exata – como os da MPB dos velhos tempos do long player, incluindo os de Caetano –, o repertório torna-se um dos diferenciais do disco. Xande optou por músicas não óbvias do farto cancioneiro caetaneno, mesmo podendo recorrer a uma maior facilidade. Não seria nenhum crime, por exemplo, aproveitar sambas consagrados como “Desde que o Samba é Samba”, "Saudosismo", “Sampa” ou “Sem Samba não Dá”. Ou, quem sabe, sambas convictos do compositor: "Festa Imodesta", "A Voz do Morto", "Samba em Paz", "Força de Imaginação", esta parceria com a "dona do samba" D. Ivone Lara? Diminuiria a margem de erro. Mas não. Xande ousou – e acertou. A se ver pela surpreendente escolha de “Muito Romântico”, que abre o disco numa tocante versão da canção feita para a voz perfeita de Roberto Carlos em 1977 e gravada pelo autor apenas posteriormente. Samba puxado no cavaquinho, instrumento-base de Xande aprendido naquelas tais rodas de samba de outrora, nos botequins da vida. No talento trazido acorrentado da África pelos ancestrais, dos batuques sincréticos na senzala.

Pois outro jovem preto que driblou o sistema genocida é corresponsável por este feito: Ângelo Vitor Simplício da Silva, mais conhecido como Pretinho da Serrinha. Igualmente rebento dos pagodes da vida, das quadras de escola de samba, do ouvido absoluto e do talento nato. Pretinho é quem, além de produzir o disco com a mais alta competência e tocar nada menos que 24 instrumentos nas gravações, assina todos os arranjos, estes capazes de operar o milagre de fazer com que músicas de estruturas rítmicas variadas soem naturalmente sambas tal tivessem sido assim desde sempre. “Luz do Sol”, o emocionante tema escrito por Caetano para a trilha sonora do filme “Índia, A Filha do Sol”, de 1982, de uma balada melancólica vira, simplesmente, um samba-canção de muito bom gosto na tradição de Cartola e Paulinho da Viola.

E o que dizer de “Qualquer Coisa”, que, de portenha, passa a ganhar ares de sambolero com direito a bandolim de Hamilton de Holanda? Até mesmo o hit “Tigresa”, outro não-samba originalmente, é vestido por uma elegante roupagem em que Xande desfila extensão vocal e fraseados num samba lânguido e sensual. Palmas, aliás, para outro preto: Diogo Gomes – mais uma de história linda de superação e perseverança –, que capricha no arranjo de metais.

videoclipe de "Tigresa", da Araguaia Filmes

Assim como “Tigresa”, “Alegria, Alegria” é outro clássico inconteste de Caetano relido no álbum. Porém, ainda mais improvável achar samba naquela marchinha psicodélica. Pois Xande/Pretinho conseguiram, e com louvor. Das melhores do álbum, um dos hinos do movimento tropicalista, defendida pelo autor no memorável Festival da Canção de 1967, transforma-se em um misto de samba rural e afoxé em que o violão do craque Carlinhos 7 Cordas prevalece. Xande, cuja memória ainda preserva da infância as festas da Folia de Reis nas comunidades em que viveu, evidencia neste samba raiz uma atmosfera que talvez até Caetano nem percebera que sua música continha.

Outra nada óbvia – e mostra do quanto Xande caprichou na pesquisa interna à música do homenageado – é “Diamante Verdadeiro”, composta por Caetano para a mana Maria Bethânia e que abre o disco de maior sucesso da carreira dela, “Álibi”, de 1978. Como se encarnasse Moreira da Silva, Xande faz o diamante reluzir verdadeiramente como um samba-de-breque. Na sequência, para uma das mais pessoais e bonitas de todo o repertório de Caetano, “Trilhos Urbanos”, o que poderia ser equivocado se torna ainda mais assertivo. Resgatando no marcante som dos atabaques e do cavaquinho o xirê de candomblé e o samba-de-roda do Recôncavo Baiano, terra-natal de Caetano, a dupla Xande e Pretinho constrói uma das mais belas músicas de todo o disco e, quiçá, da década no Brasil. O bom-senso não recomendaria que o incomum “refrão de assovio” da original de Caetano fosse reproduzido. A solução? Um coro feminino cantarolando a melodia de “Retirantes”, de Caymmi, que faz remeter imediatamente à célebre canção-tema da novela “Escrava Isaura”, presente na memória afetiva de todo brasileiro. Sacada de mestres, astúcia de uma raça que sobrevive com graça para além das desgraças.

Formando a tríade com os maiores cantores da MPB presenteados por Caetano com sua criatividade ímpar, Xande, que passara por Roberto e Bethânia, agora chega a vez de Gal Costa, mencionada na faixa anterior por seu canto de "Balancê". E fazendo jus a um repertório pinçado com sensibilidade, ele versa ainda “O Amor”, que Caetano, sobre a poesia revolucionária do poeta russo Maiakovski, deu para a voz cristalina de Gal em 1981. A mais samba, mas nem por isso menos desafiadora, é “Lua de São Jorge”, uma reverência a ao guerreiro Ogum em ritmo de pagode. Salgueirense, Xande celebra também a escola a qual pertence, devota do mesmo santo, tão vermelha e branca quanto ele. Não à toa os metais e o agogô desenham toda a melodia, afinal, está se falando do “senhor da metalurgia”.

Mas ainda mais revolucionária é a que encerra: “Gente”, o grito humanista mais pungente de Caetano. Difícil escutá-la e não ir às lágrimas, como ocorreu com o próprio Caetano ao ouvi-la pela primeira vez. Xande, com sua história pessoal e representatividade, cantando em clima de samba-enredo essa ode às pessoas simples, apropriando-se dela, reverbera em muitas dimensões do tecido social brasileiro. “Gente pobre arrancando a vida com a mão”. Quanto potência e significado versos como estes ganham ao saírem de sua boca: “Não, meu nêgo, não traia nunca essa força, não/ Essa força que mora em seu coração”.

“Xande Canta Caetano” é, sem pestanejar, o melhor álbum lançado no Brasil em 2023, um presente aos brasileiros para um festivo ano em que o país se livrou do fascismo e vislumbrou novamente a esperança na democracia, no respeito ao outro e no amor. Brasileiros como Ricardo Aleixo, Jorge Furtado, Pena Schmidt, Martha Medeiros, Nizan Guanaes e Moysés Mendes pensam o mesmo. Na mesma lógica de enumerar nomes como na música "Gente", podem-se adicionar tranquilamente a Francisco, Zezé, Gildásio, Renata, Agripino, Dolores ou João, como a poética sugere, outros nomes, tal Pretinho, tal Diogo. Tal Xande. Foi deixarem o negro existir, deu nisso: amor e arte, as armas contra a iniquidade capazes de transformar o mundo. Afinal, gente é pra brilhar como brilha Alexandre Silva de Assis. Não pra morrer de fome, de bala ou pela invisibilidade.

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videoclipe de "Gente", da Araguaia Filmes


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FAIXAS:
1. “Muito Romântico” - 3:16
2. “Luz do Sol” - 3:44
3. “Qualquer Coisa” (participação: Hamilton de Holanda) - 3:00
4. “Tigresa” - 3:59
5. “Alegria, Alegria” - 2:56
6. “Diamante Verdadeiro” - 3:14
7. “Trilhos Urbanos” (Música incidental: “Retirantes”, Dorival Caymmi) - 3:22
8. “Lua de São Jorge” - 3:01
9. “O Amor” (Caetano Veloso / Ney Costa Santos / Vladimir Maiakovski) - 3:37
10. “Gente” - 3:55
Todas as composições de autoria de Caetano Veloso, exceto indicadas


Daniel Rodrigues

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Exposições “Todos iguais, todos diferentes?” e “Orixás”, de Pierre Verger - Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS) - Porto Alegre/RS


 

"Verger era um africano nascido na França”. 
Nondichao Bacalou, assistente de Pierre Verger

"Verger é a pessoa que historicamente vem se dedicando mais a essas relações com a África”.
Gilberto Gil

Quando estivemos em Salvador, em 2015, uma das certezas as quais saímos levamos na mala era a de que queríamos ver a obra de Pierre Verger. Tanto quanto a casa de Jorge Amado e Zélia Gattai, o Pelourinho, o Elevador Lacerda, a Sorveteria da Ribeira, o Mercado Modelo, a praia de Itapuã e outros elementos turísticos e culturais da capital baiana, ter contato com o estrangeiro que melhor entendeu e melhor se hibridizou àquela cidade era um desejo alentado por Leocádia e por mim. Conseguimos visitar uma loja da Fundação Pierre Verger com um pequeno acervo próxima ao Pelourinho, onde ficamos hospedados. Saímos com alguns souvenires e roupas temáticas, que até hoje nos fazem lembrar de lá. Porém, considerando os menos de cinco dias que pudemos ficar, e que naquela época qualquer movimento maior numa cidade que não se conhece podia ser realizada apenas de táxi, pois não existiam ainda os aplicativos de transporte, a matriz da fundação, no longínquo bairro Engenho Velho de Brotas, infelizmente, não deu para irmos.

A frustração de não conseguirmos nos estender na obra de Verger, acalentada por um remoto retorno a Salvador, foi parcialmente superada com uma dupla exposição do icônico trabalho do fotográfico do etnólogo, antropólogo e escritor francês em Porto Alegre. “Todos iguais, todos diferentes?” e “Orixás” trazem o olhar de Pierre Fatumbi Verger sobre a diversidade cultural e a influência recíproca da religiosidade nas culturas africanas e afro-brasileiras. Fez-nos sentir ainda mais em Salvador o fato de que mostra é uma parceria com a Fundação Pierre Verger e as obras selecionadas pelo curador de Alex Baradel, especialista responsável pelo acervo fotográfico da Fundação.

“Todos iguais, todos diferentes?” traz um recorte dos retratos feitos por Verger a partir de seus encontros nas viagens que realizou pelo mundo durante mais de 40 anos. São imagens que, a partir de seu olhar, ressaltam os aspectos da diversidade cultural e do respeito ao outro. Vietnã, Espanha, Congo, Oceano Índico, Senegal, Bolívia, México, Togo, Peru, Mauritânia e, claro, Brasil, são alguns dos países e feições literalmente retratados no trabalho de Verger, que explora imagens em primeiro plano de indivíduos, que se tornam, mais do que apenas retratos de pessoas, mas uma intenção sociopolítica democrática e libertária típica da Antropologia Social da geração a qual ele pertenceu. Não errado dizer “de esquerda”.

Visão geral do primeiro salão de “Todos iguais, todos diferentes?”

Já “Orixás”... Nossa, “Orixás”! Este traz nada mais, nada menos do que uma seleção de fotografias ampliadas em grande formato que constam no livro homônimo de Pierre Verger, lançado pela primeira vez em 1981 e considerado como um dos 200 livros mais importantes para se entender o Brasil A exposição compila, de forma plástica e poética, as pesquisas de Verger sobre a história e mitologia dos orixás nas religiões afro-brasileiras, sobretudo em Salvador e Bahia, além de destacar a origem desses rituais na cultura e nos mitos iorubás africanos em países como Nigéria, Daomé (atual Benin) e Togo. Ao realizar esses estudos em suas viagens desde a Bahia e Recife e até a região do Golfo de Benin, entre os anos 1948 e 1978, Verger se tornou pioneiro na pesquisa quanto às influências culturais e religiosas recíprocas entre África e América, tal como passaram a se dar a partir do século XVI, com a diáspora africana ocorrida em função do tráfico de negros escravizados. As fotos são algo simplesmente arrebatador.

A sensação de penetrar no mundo de Verger ganha força a cada fotografia que se passa, a cada olhar de outra pessoa captada por ele, a cada detalhe enquadrado, a cada realidade dita em apenas um click de segundos. Ainda mais na exposição “Orixás”, que nos fez voltar àquela atmosfera da Bahia da qual nos despedimos com sentimento de incompletude. Adensa ainda mais esta percepção o fato de que a mostra é, justamente, resultado de uma parceria do Margs com a Fundação Pierre Verger e que as obras selecionadas pelo curador de Alex Baradel, especialista responsável pelo acervo fotográfico da Fundação. Só podíamos mesmo voltar à mágica Bahia de Todos os Santos, e isso sem precisar sair ali, na beira do Guaíba, abençoada por Yemanjá.

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Iguais e, sim, diferentes


Senhora típica espanhola e um belo jovem vietnamita, em fotos dos anos 30


Trabalhadores do povo daqui e de lá


Mulher africana e Leon Trotsky no exílio México


Vista geral da mostra “Todos iguais, todos diferentes?”


A vitalidade de jovens do Vietnam e de Cuba


Detalhe do preciso sorriso de um pequeno mexicano


Composições semelhantes em Tarabuco, Bolívia (cima) e em Ocongate, no Peru


Detalhe no foco, que está no rosto da jovem em segundo plano


Expressivo retrato de um idoso no Brasil dos anos 50, interior de SP


Outra marcante foto desta linda cubana (1957)


Entre os vários amigos ilustres, Dorival Caymmi, Diego Rivera e Walt Disney, ao centro, de "gaucho"


Foto da impressionante exposição "Orixás" (anos 50)


Trabalho etnológico de Verger, que rendeu fotos históricas da religiosidade africana e brasileira


Divindades do candomblé representadas


A plasticidade própria dos cultos africanos 


Yemanjá (Salvador, 1946)


Um 360° de "Orixás"


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“Todos iguais, todos diferentes?” e “Orixás”
Visitação até 08 de outubro, de  terça-feira a domingo, das 10h às 19h
Local: Museu de Arte do Rio Grande do Sul - MARGS - 1º andar expositivo do MARGS (Pinacotecas e sala Aldo Locatelli)
Praça da Alfândega, s/n°, no Centro Histórico de Porto Alegre - RS
Ingresso: gratuito


Daniel Rodrigues

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Milton Nascimento - "Geraes" (1976)

 

"Esses gerais são sem tamanho."
Guimarães Rosa, "Grande Sertão: Veredas"

"Sou o mundo, sou Minas Gerais."
Da letra de "Para Lennon e McCartney", de Lô Borges, Marcio Borges e Fernando Brant


Tom Jobim e o desenho sinuoso e sensual da Rio de Janeiro. 

Dorival Caymmi e a Bahia dos pescadores e santos do candomblé. 

Moondog e as pradarias inóspitas do Wyoming. 

Robert Johnson e as infinitas plantações de algodão do Mississipi. 

Violeta Parra e a imensidão das cordilheiras andinas. 

É sublime quando um músico consegue atingir tamanha simbiose entre ele e seu espaço, a ponto de passar a representar, através de sua arte, uma paisagem física. É como se ele fosse, por intermédio dos sons, não originário deste lugar, mas, sim, o próprio lugar.

Milton Nascimento é um destes seres que, como o próprio nome indica, nasce e gera a própria terra, Minas Gerais. O homem que integra a seu próprio nome um estado inteiro, o seu mundo. E não digam que Mi(lton) Nas(cimento) é mera coincidência linguística! Mais correto é afirmar que os Deuses - os do candomblé, da Igreja, muçulmanos, indígenas, todos aqueles que perfazem a cultura mineira - assim quiseram a este carioca desgarrado abraçado como um filho pelos morros de cor ferrosa das Gerais, os quais, junto à lúdica maria fumaça, ele mesmo representa na icônica capa em desenho a próprio punho. Como um ser pertencente àquela terra a qual se homogeiniza. 

Em meados dos anos 70, Milton já havia percorrido muita estrada de terra na boleia de um caminhão. Na faixa dos 35 anos, pai, casado, consagrado no Brasil e no exterior, idolatrado e gravado por Elis Regina, mentor do movimento musical mais cult da modernidade brasileira, autor de algumas das obras mais icônicas do cancioneiro MPB. O reconhecido talento como compositor, cantor, arranjador e agente catalisador misturava-se, agora, com a sabedoria da maturidade - como se ainda coubesse mais sabedoria a este ser nascido gênio. Quase que naturalmente a quem já havia ganhado o centro do País e desbravado o principal mercado fonográfico do mundo, o norte-americano, Milton, então, volta-se à sua própria essência: a terra que lhe é e a qual pertence. 

Mas Milton, carinhosamente chamado de Bituca por quem o ama, não faz isso sozinho, visto que convoca seu talentoso Clube da Esquina, reforçando o time de amigos, inclusive. Se "Minas", a primeira parte deste duo de álbuns gêmeos, explora a grandiosidade das geraes Guimarães Rosa de Drummond, seja em sons e letras, "Geraes" solidifica essa ideia quase que como um milagre: um homem torna-se seu próprio som. Ou melhor: transforma-se em montanha para, do alto de topografia, emitir a sonoridade da natureza. Samba, rock, soul, folk, jazz, toada, sertanejo, candombe, trova, oratório... world music, não só por acepção, mas por intuição, é o termo mais adequado para classificar.

A ligação entre uma palavra e outra, entre um título e outro, entre um disco e outro, se dá pelo mesmo acorde que desfecha “Simples”, última faixa de "Minas", e abre, em ritmo de toada mineira, a linda "Fazenda" (“Água de beber/ Bica no quintal/ Sede de viver tudo/ E o esquecer/ Era tão normal que o tempo parava"). A religiosidade católica do povo, traço cabal da cultura mineira, transborda tanto em "Cálix Bento", com a marca do violão universal de Milton e o emocionante arranjo de Tavinho Moura sobre tema da Folia de Reis do norte de Minas, quanto em "Lua Girou", outro tema do folclore popular – este da região de Beira-Rio, na Bahia – vertida para o repertório pela habilidosa mão do próprio Bituca. 

O lado político, claro, está presente. Milton, consciente da situação do País e jamais acovardado, não havia esquecido das recentes retaliações da censura que quase prejudicaram seu "Milagre dos Peixes", de 3 anos antes, um verdadeiro milagre de ter sido gestado com tamanha qualidade. O parceiro e produtor Ronaldo Bastos, além da concepção da capa, é quem pega junto em "O Menino", escrita anos antes pelos dois em homenagem ao estudante Edson Luís, assassinado em 1968 em um confronto com a polícia no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro, episódio que uniu a sociedade em protestos que culminaram com a famosa Passeata dos Cem Mil contra a Ditadura Militar. E que luxo a banda que o acompanha: João Donato (órgão), Nelson Angelo (guitarra), Toninho Horta (guitarra), Novelli (baixo), e Robertinho Silva (bateria). Com a mira militares a outros artistas naquele momento, como Chico Buarque, Milton pode, enfim, lançar a música e não se calar diante da barbárie. 

Quem também garante o grito de resistência é um recente e igualmente genial amigo, com quem tanto e tão bem Milton produziria a partir de então. Justamente o então visado Chico Buarque. É com ele que Milton canta a canção-tema do filme "Dona Flor e Seus Dois Maridos", de Bruno Barreto, um sucesso de bilheteria no Brasil à época, "O que Será (À Flor da Pele)". Fortemente política, a letra, cantada com melancolia e até tristeza, reflete os tempos de iniquidade humana: "O que será que será/ Que dá dentro da gente que não devia/ Que desacata a gente, que é revelia/ Que é feito uma aguardente que não sacia/ Que é feito estar doente duma folia/ Que nem dez mandamentos vão conciliar/ Nem todos os unguentos vão aliviar/ Nem todos os quebrantos, toda alquimia/ Que nem todos os santos, será que será...". Gêmea de "O que Será (À Flor da Terra)", Milton retribui o convite e divide com Chico os microfones desta última no álbum dele naquele mesmo ano, o não coincidentemente intitulado “Meus Caros Amigos”


Milton e Chico: encontro mágico promovido à época
de "Geraes" e que deu maravilha à música brasileira

A maturidade filosófico-artística de Milton era tão grande, que as dimensões do que é grande ou pequeno, do que é parte ou geral, se reconfiguram numa consciência elevada de humanidade. A ligação universal de Milton com sua terra passa a significar o ligar-se a América Latina. Afinal, sua Minas é, como toda a latinoamérica, dos povos originários. “San Vicente” e "Dos Cruces", de "Clube da Esquina”, já traziam essa semente que “Geraes”, mais do que “Minas”, solidificaria, que é essa visão ampla do território, dos povos. Primeiro, na realização do sonho de cantar Violeta Parra com Mercedes Sosa. Apresentada a Milton por Vinícius de Moraes, La Negra divide com Milton os microfones da clássica “Volver a los 17”. Igualmente, vê-se o encontro dos rios do Prata e São Francisco, que não poderiam deixar de fazer brotar aquilo que os perfaz e lhes dá sentido: água. É com o conjunto de jovens chilenos deste nome, amigos recém conhecidos, que Milton instaura de vez, na acachapante “Caldera”, a alma castelhana dos hermanos na música popular brasileira – convenhamos, muito mais do que os músicos da MPG, cuja proximidade regional do Rio Grande do Sul propiciaria tal fusão mais naturalmente. É o canto dos Andes – mas também de Minas – sem filtro. 

As amizades, aliás, estão presentes em todos os momentos, e o território de Milton é como uma grande aldeia onde ele, consciente de seu papel de pajé, mantém a egrégora sob a força do amor. Fernando Brant, parceiro desde os primeiros tempos, coassina aquela que talvez seja a música mais sintética de todo o disco: “Promessas De Sol”. A sonoridade latina das flautas andinas, a percussão marcada pelo tambor leguero, o violão sincrético de Milton e os coros constantes e tensos dão à canção a atmosfera perfeita para um os mais fortes discursos políticos que a Ditadura presenciou em música. “Você me quer belo/ E eu não sou belo mais/ Me levaram tudo que um homem precisa ter”. Épica, como uma ópera guarani, a melodia vai escalando de um tom baixo para, ao final, se encerrar com intensos vocais de Milton bradando, denunciativo: “Que tragédia é essa que cai sobre todos nós?” 

Parece que não cabe mais emoção num álbum como este. Mas cabe. A brejeira “Carro De Boi”, de Cacaso e Maurício Tapajós (“Que vontade eu tenho de sair/ Num carro de boi ir por aí/ Estrada de terra que/ Só me leva, só me leva/ Nunca mais me traz”) casa-se com a inicial “Fazenda” seja na ludicidade ou na sonoridade ao estilo de cantiga sertaneja. Mas tem também a jazzística e comovente “Viver de Amor”, em que novamente Ronaldo, desta vez em parceria com o excepcional Toninho Horta, compõem para a voz cristalina de Milton uma das canções românticas mais marcantes de toda a discografia brasileira. Ronaldo, múltiplo, também tira da cartola mais uma vez com Milton outra joia do disco, que é o samba-jongo “Circo Marimbondo”. Assim como Milton, de ouvido tão absoluto quanto sensível, fizera ao contar com a voz de Alaíde Costa para cantar com ele "Me Deixa em Paz" em “Clube da Esquina”, aqui ele vai na fonte mais inequívoca para este tipo de proposta musical que une África e Brasil: Clementina de Jesus. Na percussão, além de Robertinho no tamborim e surdo, também outros craques da “cozinha”: Chico Batera, no agogô; Mestre Marçal, cuíca; Elizeu e Lima, repique; e Georgiana de Moraes, afochê. E que delícia ouvir o canto anasalado e potente da deusa Quelé acompanhada pelo coro de Tavinho, Miúcha, Chico, Georgiana, Cafi, Fernando, Bebel, Ronaldo, Bituca, Vitória, Toninho e toda a patota! 

Para encerrar? A música que conjuga o primeiro e o segundo disco, o corpo e o espírito: “Minas Geraes”. O violão carregado de traços étnico-culturais de Milton, sua voz que escapa do peito emoldurando-se ao vento, a docilidade das madeiras, a singeleza do toque do bandolim. Clementina, em melismas, embeleza ainda mais a canção, lindamente orquestrada por Francis Hime – outro novo amigo cooptado por Milton da turma de Chico. Tudo converge para um final emocionante, que, como os próprios versos dizem, saem do “coração aberto em vento”: “Por toda a eternidade/ Com o coração doendo/ De tanta felicidade/ Todas as canções inutilmente/ Todas as canções eternamente/ Jogos de criar sorte e azar”. 

Ouvindo-se “Minas” e “Gerais”, duas obras não somente maduras como altamente densas, simbólicas e encarnadas, é impossível não ser fisgado pelo mistério da música de Milton Nascimento. Encantamento que remete ao mistério da criação, o mistério da vida. Wayne Shorter, parceiro de Milton e mutuamente admirador, quando perguntado sobre esta esfinge que é a obra do amigo, diz: “Bem, ouça você mesmo, pois não há palavras para descrever. Apenas sinta”. Milton, que completa 80 anos de vida sobre o mundo, o seu mundo, é tudo isso: uma força da natureza. Ele é mais do que música: é som em estado puro. É mais que tempo: é a harmonia do espaço. 

Milton é mais do que homem: é pedra. Eterna.

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É impressionante perceber hoje, em retrospectiva, que o encontro de dois gênios da música brasileira se deu exatamente na época deste trabalho. Depois de aberta a porteira da fazenda de Milton para Chico, só vieram coisas lindas. Além de parcerias nos anos subsequentes - inclusive no célebre "Clube da Esquina 2", de 1978 - naquele mesmo ano de 1976 os dois se reuniriam para gravar o compacto "Milton & Chico", lançado oficialmente um ano depois. Incluído em "Geraes" na versão para CD, esta gravação clássica dos dois traz duas faixas: a melancólica "Primeiro de Maio", que denuncia a vida oprimida do trabalhador brasileiro no feriado dedicado a ele, e "O Cio da Terra", também combativa e ligada ao trabalhador, mas do campo, que se tornaria uma das canções emblemáticas do repertório tanto de Chico quanto de Milton.

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FAIXAS:
1. "Fazenda" (Nelson Angelo) - 2:40
2. "Calix Bento"(Folclore popular - Adap.: Tavinho Moura) - 3:30
3. "Volver a los 17" - com Mercedes Sosa (Violeta Parra) - 5:10
4. "Menino" (Milton Nascimento/ Ronaldo Bastos) - 2:47
5. "O Que Será (À Flor da Pele)" - com Chico Buarque (Chico Buarque) - 4:10
6. "Carro de Boi" (Maurício Tapajós/ Cacaso) - 3:40
7. "Caldera (instrumental)" - com Grupo Agua (Nelson Araya) - 4:25
8. "Promessas do Sol" - com Grupo Agua (Milton Nascimento/ Fernando Brant) - 5:00
9. "Viver de Amor" (Toninho Horta/ Ronaldo Bastos) - 2:34
10. "A Lua Girou" (Milton Nascimento) - 3:42
11. "Circo Marimbondo" - com Clementina de Jesus (Milton Nascimento/ Ronaldo Bastos) - 2:55
12. "Minas Geraes" com Grupo Agua e Clementina de Jesus (Novelli/ Ronaldo Bastos) - 5:13

Faixas bônus da versão em CD:
13. "Primeiro De Maio" - com Chico Buarque (Milton Nascimento/ Chico Buarque) - 4:46
14. "O Cio Da Terra" - com Chico Buarque (Milton Nascimento/ Chico Buarque) - 3:48


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OUÇA O DISCO
Milton Nascimento - "Geraes" 


Daniel Rodrigues