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segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

A arte do MDC em 2023

E lá se foi mais um ano, ouvintes radioelétricos! Posso dizer, no entanto, o contrário: já se veio mais um ano. Afinal, são quase sete no ar de Música da Cabeça, o programa que comando com muita satisfação na Rádio Elétrica. E como todas as quartas-feiras tem programa novo, tornou-se habitual desde o início que a cada edição houvesse também uma arte. E é aí que a gente entra. Tal no ano passado, quando começamos a fazer essa retrospectiva específica do MDC a exemplo do "A arte do Clyblog", recorrente há mais tempo por aqui, selecionamos algumas das artes criadas para anunciar o programa em 2023, ano dos 15 do blog.

O aviso foi dado anteriormente, mas não custa repetir: não se esperem obras-primas do design gráfico, pois as ferramentas e as habilidades são, se não parcas, básicas. Sei que peco pelo acabamento (um designer profissional deve querer se enforcar a cada vez que vê). Mas não é por mal. Assim como o programa em si, a arte é fruto da vontade de fazer. Até porque, isso dá pra afirmar, busca-se sempre a criatividade, algo que instigue que vê/lê, e até que a coisa sai legal por vezes. Amparadas pelo texto, no qual também invariavelmente tento puxar por algo interessante, as artes se baseiam em acontecimentos da vida cotidiana do Brasil e do mundo que só podem resultar em algo, no mínimo, legal graficamente falando.

Houve a favor, no decorrer de 2023, um caldeirão de eventos para que isso acontecesse. Guerra na Croácia e na Faixa de Gaza, perdas de gente como Rita Lee, Ryuichi Sakamoto, João Donato e Zé Celso Martinez Corrêa, Camões de Chico Buarque, urso em Marte, submarino perdido, 8 de janeiro... É, entre fatos bons e não tão bons, a gente vai contando, quase como uma crônica semanal e musical, aquilo que nos cerca e nos interessa. As artes do MDC são um espelho disso. Então, fique aí com essa seleção do que mais de legal teve em 2023.

**************

Iniciamos o ano com nada mais, nada menos, que a edição especial de nº 200, que teve a participação à altura: o músico e jornalista pernambucano Fred Zero Quatro, líder da Mundo Livre S/A




Mas nesse Brasil, a festa demora pouco. Uma semana depois da posse do Presidente Lula, 
a barbárie do 8/1, que nos motivou a esta arte para o MDC 301


Enxergaram urso em Marte? A gente enxergou no MDC 304


Em março, ferviam as investigações sobre o "caso das joias"
apreendidas com a comitiva de Bolsonaro, mote pro MDC 311


Ainda em março, a edição 310 teve entrevista especial com meu primo-brother Lucio Agacê,
figura lendária do rock alternativo (e preto) gaúcho





Ramadã, em abril, e o programa também se inspirou pro 314. Ficou bonito


Chico finalmente pôs a mão no certificado do Camões, que, na verdade, era o MDC 316



Em maio, para o especial de nº 320, entrevistamos a psicóloga, musicista e ativista preta gaúcha Caroline Rodrigues


Em junho, a abertura do texto da chamada do programa 321 foi assim: "A gente fotografa a floresta assim,
neste ângulo, só pra que seu olhar se direcione para aquilo que deve". Cara de pau


Lembram daqueles ricaços excêntricos (e sem noção) que se meteram num
submarino sem socorro e não voltaram mais?


Foi uma reprise, mas nem por isso deixamos de comemorar com uma arte especial a primeira edição de julho com o anúncio (quase "ilegígel") da ilegibilidade do Bozo. Só de lembrar, dá vontade de gritar de novo: I-NELEGÍVEEEEL!!



Se houve o que celebrar, também tiveram perdas. E grandes. Ryuichi Sakamoto (abril),
Rita Lee (maio) e Zé Celso Martinez Corrêa (julho) foram três delas




As guerras também, infelizmente, mancharam o calendário, mas viraram arte de denúncia nas edições 324 (julho), 339 (outubro) e 346 (novembro). MDC NO WAR!





Mais perdas, algumas tristes, outras revoltantes: João Donato, em julho e, em agosto, Sinéad O'Connor, e Mãe Bernadete  


Mais uma arte legal, esta pro cabalístico programa 333, último de agosto


É "O Pequeno Príncipe de Maquiavel"? Não, só o MDC tirando sarro da cara de
gente ignorante, mas metida a sabe-tudo (setembro)


Mais uma vez, o 20 de novembro (que agora virou feriado) nos inspirando


Mais edição de data fechada, a de 340, que teve como convidado
a lenda do rock gaúcho Frank Jorge


Adentrando o último mês de 2023, uma arte baseada em grafismos


Talvez a perda mais sentida: Paulo Moreira, nosso "Cabeção", que virou "capa Blue Note"
a la Reid Miles para a nossa edição 349


Quem começa o ano com edição especial, acaba o ano com edição especial: MDC 350, que teve entrevista internacional com o produtor musical cabo-verdiano Djô da Silva (era pra ter  sido um vídeo na época, mas deu problema no programa...)



Daniel Rodrigues



quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Música da Cabeça - Programa #305

 

Não é porque a gente tira uns dias, que deixa de ter MDC. Dando uma pisada no freio, a gente reprisa nesta quarta e na próxima programas especiais. Hoje, a edição 300, que teve como entrevistado convidado o mangueboy Fred Zeroquatro, da Mundo Livre S/A, além de músicas, notícia e aquela coisa toda. Estende tua rede e escuta hoje, às 21h, na ferial Rádio Elétrica. Produção, apresentação e relaxamento: Daniel Rodrigues.


www.radioeletrica.com

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Música da Cabeça - Programa #303

 

Tentaram acertar, mas a gente se esquiva. Desviando dos atiradores, o programa vem só com aqueles que acertam no alvo: Chico Buarque, Mundo Livre S/A, McCoy Tyner, Marlui Miranda e outros. No "Música de Fato", a catástrofe humanitária dos Yanomami e no "Sete-List' sete chances para acertar uma homenagem a David Crosby. Mira no MDC, então, às 21h, na certeira Rádio Elétrica. Produção, apresentação e pontaria para o que merece: Daniel Rodrigues


www.radioeletrica.com

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Música da Cabeça - Programa #294

 

Gigante gentil, amigo de fé, Tremendão, Billie Dinamite, irmão camarada. Todos os adjetivos para a gente celebrar no MDC Erasmo Carlos, que o Brasil perdeu esta semana. Mas o programa também terá David Bowie, Sugarcubes, Rita Lee, Mundo Livre S/A e mais, além de um Cabeça dos Outros invocando a Pink Floyd. È hoje aqui na papo-firme Rádio Elétrica. Produção, apresentação e iê-iè-iê: Daniel Rodrigues


radioeletrica.com

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Música da Cabeça - Programa #237

 

Tá cada vez mais rara a carne na casa do brasileiro, né? Se isso a gente não consegue resolver, pelo menos garantimos muita música boa no seu lar. O programa de hoje vem só com filé mignon: Dimitri Shostakovitch, Arnaud Rodrigues, Ministry, mundo livre s/a, Herbie Hancock e mais. No nosso quadro móvel, um "Sete-List" em homenagem ao Dia Do Poeta. Devidamente inspecionado, o MDC de hoje vai à mesa às 21h, na apetitosa Rádio Elétrica. Produção, apresentação e melhores cortes: Daniel Rodrigues. E não te esquece de continuar votando na gente para o Prêmio Press: Música da Cabeça (Programa de Rádio) e em Daniel Rodrigues (Apresentador de Rádio): www.revistapress.com.br/premiopress/


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Chico Science & Nação Zumbi - Usina do Gasômetro - Porto Alegre/RS (1994)


O talentoso Chico Science no palco: única
vinda a Porto Alegre
Os anos 1990 foi uma década encantada para Porto Alegre. Várias capitais sentiam os primeiros sabores da democracia após mais de 20 anos de ditadura, e a minha cidade aproveitou bem isso. Um ainda embrionário Partido dos Trabalhadores conquistava sua primeira prefeitura no Brasil em 1989 através Olívio Dutra, cujo revolucionário mandato estenderia seus efeitos benéficos nas administrações de Tarso Genro (1993 a 1997) e Raul Pont (1997 a 2001). Os ares de modernidade e de administração pública pensada para o cidadão diferia de tudo o que estávamos acostumados em política (mal-acostumados, na verdade). Não se administrava para o povo e nem com o povo até então, mas a prefeitura do PT trazia, entre outras novidades, o Orçamento Participativo, o Fórum Social Mundial, a Bienal do Mercosul e diversas outras atividades que, não raro, privilegiavam a cultura. Foi assim que assisti, entre outras atrações, shows antológicos de Gilberto Gil, Paulinho da Viola e Jorge Ben Jor em praça pública. E de graça.

Contando assim hoje, em que o país vem de anos de crises econômica, política e social e massacre à cultura, parece até mentira que se teve coisas assim numa Porto Alegre não muito distante. Tanto é que para alguns é difícil acreditar quando digo que assisti, em 1994, a Chico Science & Nação Zumbi com a formação original. Sim, com Chico à frente e o como ele falecido Gira. Em plena Usina do Gasômetro, em praça pública, e de graça. E isso quando a banda ainda não era ainda idolatrada mundo afora. Os não muitos dos presentes como eu que estiveram na apresentação daquele sábado à noite certamente conheciam a banda muito por conta da Rádio Ipanema, que desde cedo identificava o mangue beat como a nova revolução da música pop brasileira.

A Nação, que cedo ganhou este apelido, já era reconhecida no centro do país e, principalmente, em sua Recife, onde reinavam na cena musical de então, a qual contava com vários outros talentos, como os coirmãos mundo livre s/a, a Devotos do Ódio, a Querosene Jacaré, a Sheik Tosado, a Mestre Ambrósio, entre outros. Mas no Rio Grande do Sul as coisas funcionavam ainda sem a velocidade que a internet ainda passaria a impor, e as informações demoravam ainda para chegar por estes pagos. O que talvez explique o porquê do público fiel mas acanhado que presenciou aquele show histórico, que registrava o primeiro disco da banda, “Da Lama ao Caos”, lançado aquele ano e que tinha produção do craque Liminha. Era o começo da carreira deles, e Porto Alegre era uma das primeiras cidades a presenciar aquele som revolucionário que mesclava rock, funk, rap, reggae, eletrônica e afro beat com maracatu, embolada, samba de roda e baião. Tudo com muita psicodelia e originalidade.

Antes da entrada dos pernambucanos no palco, teve pelo menos uma apresentação que me lembro com vivacidade: a célebre De Falla. Show bem rock ‘n’ roll com cara de anos 50/60, quando Edu K já havia passado pela fase funk-rock de “Kingzobullshitbackinfulleffect92”. Showzaço, aliás. Mas estava lá para ver mesmo a CS&NZ. A iniciante banda trouxe no repertório basicamente as faixas do seu disco de estreia, o que foi suficiente para uma apresentação memorável. Praticamente na sequência do álbum, começaram com "Monólogo ao Pé do Ouvido", em que os três tambores de maracatu, Gira, Bola 8 e o ainda percussionista Jorge Du Peixe, postavam-se à frente do palco enfileirados marcando o ritmo forte. Chico entra com o magistral texto-manifesto:

Modernizar o passado é uma evolução musical
Cadê as notas que estavam aqui?
Não preciso delas, basta deixar tudo soando bem aos ouvidos
O medo da origem é o mal
O homem coletivo sente a necessidade de mudar
O orgulho, a arrogância, a glória enchem a imaginação de domínio
São demônios os que destroem o poder bravio da humanidade
Viiva Zapata!
Viva Sandino!
Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro! 
Todos os Panteras Negras!
Lampião, sua imagem e semelhança
Eu tenho certeza: eles também cantaram um dia!

Aí, como no disco, que eu já tinha e ouvia direto, entra "Banditismo por Uma Questão de Classe", a direta crítica social que fez a galera enlouquecer com as guitarreiras de Lúcio Maia, que soavam pela primeira na atmosfera de Porto Alegre, cidade a qual a banda voltaria outras vezes, sendo nenhuma mais com Chico, que morreria precocemente num acidente de carro, em fevereiro de 1997.

Seguiram-se "Rios, Pontes & Overdrives" e o sucesso “A Cidade”, que incendiou o público, assim como “A Praieira”, a qual tocava direto na Ipanema e era já adorada pelos fãs. O peso do heavy-maracatu “Da Lama ao Caos” dava a certeza àqueles gatos pingados indies como eu que estávamos diante da maior revolução do rock desde o grunge. Os batuques nordestinos de alfaia, que carregam toda uma cultura regional dos caboclos-de-lança e dos ritos folclóricos, misturavam-se, como jamais se havia ousado (ou pensado) com o rock pesado e os samplers herdados do rap. E o jeito de cantar único de Chico, um verdadeiro mangue boy com “Pernambuco embaixo dos pés” e a “mente na imensidão” - como diz a letra de "Mateus Enter", do disco seguinte deles, "Afrociberdelia".

Na sequência, entre outras, tocam a impressionante instrumental “Lixo do Mangue”, que ganharia um registro ao vivo no póstumo a Chico “CZNZ”, de 1998, dando a ideia do que foi ouvi-la sendo tocada naquela ocasião. Também, "Computadores Fazem Arte", de autoria do parceiro de mangue beat Fred Zero Quatro, foram outras que movimentaram o público, formado essencialmente de fãs daquela que foi a grande banda da geração 90 – o que, aliás, já identificávamos sem que a mídia precisasse nos dizer.

Após a psicodélica “Coco Dub”, última faixa do disco que dava origem ao show, Chico Science e seus caranguejos musicais tocariam o que no bis? Novamente, “A Cidade”! Bem coisa de grupo iniciante ainda sem repertório além do próprio primeiro disco. Mas foi muito legal, pois a turma curtiu uma vez que sintonizada com aquele clima de banda ainda “não-profissional”. Eles, visivelmente em casa, pareciam estar num Abril Pro Rock em Recife, pois sabiam que tocavam para uma galera que os curtia. O bis teve ainda uma surpresa: Jorge Du Peixe cantando “Rise”, da Public Image Ltd. Ele, que se tornaria o vocalista da banda após, prenunciava, ali, naquela apresentação despretensiosa mas muito empolgada, o que viria a acontecer na história da banda depois que Chico deixou-a por motivos de força maior.

Haja vista que se trata de um resgate da época pré-internet no Brasil, esses registros são basicamente fruto da minha memória. Buscando em arquivos históricos físicos certamente encontraria, mas seria desnecessariamente trabalhoso para uma singela matéria como esta e até inviável neste momento de pandemia. O que me impressiona, na verdade, é que não se encontre nada sobre esta apresentação em sites e afins, nem na imprensa, nem em blogs, nem em lembranças de possíveis fãs. Nada. Sequer em matérias de veículos locais que registraram, sim, vindas mais recentes da Nação Zumbi à capital. Ou seja: ninguém se prestou, nestes anos todos transcorridos de 1994 para cá, a perguntar aos atuais integrantes sobre a ligação deles com Porto Alegre. Sobre aquele histórico show na capital numa fase romântica da carreira da banda e que marcou a única performance de Chico no Rio Grande do Sul. Se se tivessem dado conta de questionar, bairrista como se é por aqui, certamente estaria escrito em algum lugar.

Talvez, como disse no início do texto, isso seja reflexo da tal depreciação a que a cidade de Porto Alegre vem sofrendo há aproximadamente duas décadas para cá. Não se assistem mais programações artísticas como este show da CS&NZ e outros aos quais citei faz muito tempo em Porto Alegre, seja por falta de grana, iniciativa, capacidade e até bom gosto. Se naquela noite no Gasômetro já não éramos muitos, hoje parece que existimos apenas nas memórias.

Show da CS&NZ em Recife, em 1994 (parte 1 e 2)
 


Daniel Rodrigues

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

ÁLBUNS FUNDAMENTAIS ESPECIAL 12 ANOS DO CLYBLOG - Elias Dya Kymuezu - "Elias" (1969)


"Mamã kudilė ngö"


"Na vida do rei da música angolana encontrei o percurso de todos nós, angolanos. Elias fala por todos os Elias, todos os mais velhos de Angola".
Marta Santos

“O lamento transmitido na canção do povo de Luanda, que enfrentava o colono, e que o Elias espalhou por Angola inteira através da sua voz, constituiu uma forma de clamar o socorro para a liberdade do seu povo do jugo colonial”.
Marta Santos

A voz que acalma, o pranto das mamãs angolanas que viram seus filhos partirem e nunca mais voltarem.“Mamã kudilė ngö é-me muene ngui monå” (“Mamã não chores mais, eu também sou teu filho!”)  Um Semba na voz do cantor Elias Dya Kymuezu, o rei da música angolana. 63 anos de carreira, sempre a cantar em kimbundo, compondo e escrevendo as suas próprias músicas. Nunca cantou ou usou uma composição de outros.

O homem que recebeu na era colonial, pela mão do Luís Montez, o título de “rei da música angolana” quando o negro não era considerado gente, era menos que uma coisa. Ficou em terceiro lugar num festival de ex-colônias, em Santarém, Portugal. Foi chamado de fadista africano, porque diziam que: "Quando ele canta, minha alma encanta!" Santarém chorou e aplaudiu, mesmo não entendendo a letra e o dialecto. Sentiu o sentimento que a música carregava.

Em 1983, foi ao Brasil a convite do seu amigo Martinho da Vila para gravar com ele e Chico Buarque no grande projeto "Canto Livre de Angola".

Elias, hoje com 82 anos: voz e o
percurso do povo angolano


Certa vez, o cantor Percy Sledge veio até cá dar um concerto, na casa 70, e Elias faria o show de abertura. Mas Percy chegou cedo e o dono do espaço encontrou-o impávido a um canto espreitando Elias a cantar. Lembrou-lhe que o seu show do começaria às 21h, ele não entendia o porquê de tão grande estrela estar aí a espreitar o Elias. Percy respondeu que estava aí para ver um grande monstro da música angolana. E não se cansava de aplaudir de pé, apesar de algumas pessoas lembrarem-lhe que estavam aí para vê-lo a ele. Percy fez um grande show e disse a alto e bom som: "Esse homem motivou-me mais, porque acabei de ver uma coisa que qualquer grande músico espera ver no mundo”.

Elias Dya Kimuezu é bangāo, cheio de classe. Faz lembrar os clássicos  americanos. Podemos facilmente perceber a humildade dele e a sua sensibilidade. A sua música, ou melhor, a essência das suas músicas, as suas canções são de lamento de quem lamenta a morte de alguém. Naquela altura, quando ainda eram colonizados, não se lamentava, só isso se lamentava, o sofrimento do povo, e até hoje o cantor não sai da sua canção, do seu ritmo. Porque a sua canção é invocação. Invoca a mãe, a dor invoca toda uma sociedade.

Elias Dya Kimuezu traz-nós a lembrança dos ancestrais, o mesmo lamento, a mesma dor.
Ele faz a transição do tradicional ao moderno.

Um breve retrato do homem, o músico, rei da música angolana que retrata, nas suas músicas factos quotidianos, da vida nos bairros suburbanos de Luanda.

Aprendi com meu pai a respeitá-lo e a apreciá-lo.

A mensagem de conforto do filho para a mãe angustiada que vê, o filho partir a fim de se juntar aos combatentes da libertação, ou deportado (“transportado”, no dizer do povo) para o trabalho forçado nas roças  de São Tomé e Príncipe.

Essa mensagem de esperança, na qual o filho acredita na canção, “Mamã kudilė ngö”, do disco "Elias". É uma canção que acalma e limpa a lágrima da mamã negra que vê o filho partir para não mais voltar. Elias lembra as mamãs negras de Angola que “não chores mais, tu também sou teu filho...”

50 anos se passaram e eu tive o prazer de escrever o livro-biografia de Elias Dya Kymuezu: "A Voz e o Percurso de um Povo".

E continuo a emocionar-me com as canções do rei da música angolana.

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(NOTA DO EDITOR) Não há registro oficial quanto ao ano de lançamento do disco "Elias". Conforme a autora, também biógrafa do músico, a produção não ultrapassa o ano de 1970. Somando-se à informação de que o encontro de Elias Dya Kymuezo com o produtor angolano Valentim De Carvalho, produtor deste disco, ocorreu em 1969, creditou-se o lançamento  para este ano.



Vídeo de "Zé Salambinga" para a TV francesa, 1989



por  M A R T A    S A N T O S


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FAIXAS:
01. Watiaña - Instrumental
02. Uá Ué Muxima - Ai Meu Coração
03 Monami, Uá Muxima - Meu Filho Do Coração
04. Samba
05. Ressurreição
06. Ku Iéku - Não Vás
07. Entrudo
08. Nhajinga - Waya - Instrumental
09. Zom - Zom
10. Muénho Uá Mutu - Vida Humana
11. Zé Salambinga
12. Mama Kudile Ngó - Minha Mãe Não Chores
Todas as faixas de autoria de Elias Dya Kymuezu

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Marta da Silva Santos nasceu em Luanda, Angola, em julho de 1963. Com 15 anos foi para Portugal, onde decidiu viver e estudar Direito. Escritora infantil, valoriza em sua obra a oralidade e a ancestralidade do povo africano. É a primeira angolana pertencente à Academia de Letras e Artes Luso-Suíça e Membro da Associação Portuguesa de Poetas. Além da biografia "Elias Dya Kimuezo: a voz e o percurso de um povo" (2012), é autora também dos livros "Gita e Outros Contos" (2006), "Contos de Cá, Pedaços de Mim" (2013), "A Fada Clodi" (2015) e  "Tão Perto e Tão Longe: satisfação residencial e participação cívica nos bairros municipais de Lisboa" (2015).

quarta-feira, 17 de julho de 2019

Música da Cabeça - Programa #119


Já que vamos ficar todos velhos sem gozar da aposentadoria, o negócio é curtir o presente. Que tal, então, começar hoje escutando o Música da Cabeça? Vejam só quantos motivos para aproveitar a vida: Stanley Jordan, Buena Vista Social Club, Kraftwerk, Mundo Livre S/A, Gabriel Yared e outros. Além disso, nossos quadros fixos e um "Sete List" sobre os discos preferidos da música brasileira do "melopédico" Ed Motta. Tudo às 21h na Rádio Elétrica, aquela que nunca envelhece. Produção, apresentação e tempo de serviço: Daniel Rodrigues.


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Música da Cabeça - Programa #114


BOMBA! Temos uma revelação que vai abalar as estruturas da família brasileira: hackers invadiram o Música da Cabeça e descobriram o que vai rolar no programa de hoje à noite! Quer ter uma ideia deste revelador conteúdo? Então, aí vai: Morcheeba, Dead Kennedy's, Mundo Livre S/A, Kamasi Washington, Renato Russo, Beatles e outras declarações comprometedoras. Para ter acesso à íntegra deste material, só ouvindo o MDC, às 21h, na polêmica Rádio Elétrica. Produção e apresentação: Daniel Rodrigues. Por que aqui a gente vaza mesmo.


Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

cotidianas #605 - Musa da Ilha Grande




Eu não vou sair daqui sem ver ela sair da água
Eu não vou sair daqui sem ver ela sair da água
Eu não vou sair daqui sem ver você sair, não vou gostosa...

Ela entrou de biquíni branco
Deixou a blusinha na areia
Jogou um sorriso pra trás
Me deixou com a cabeça cheia...
De ideia

Lá em casa tão chiando, onde é que o mané se meteu?
Disse que voltava logo
Será que o burro se perdeu?
O almoço ta esfriando, sei que já perdi a hora
Mas hoje eu não saio daqui antes de ela ir embora

Mas nem fudendo...

Eu não vou sair daqui...
Eu não vou sair daqui...

Ela entrou de biquíni branco
Deixou a blusinha na areia
Jogou um sorriso pra trás
Me deixou com a cabeça cheia...

Não saio não...
De biquíni branco...

Eu não vou sair daqui sem ver ela sair da água
Eu não vou sair daqui sem ver ela sair da água

Não saio não...
Não saio não...
Não saio não...

Eu não vou sair daqui
Eu não vou sair daqui

****************
"Musa da Ilha Grande"
Mundo Livre S/A
(letra: Fred Zero Quatro)

Ouça:
"Musa da Ilha Grande" - Mundo Livre S/A

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Música da Cabeça - Programa #76


Como aqui ninguém é burro e nem covarde, a gente adere com todas as forças às mulheres contra “ele” e ainda sai rolando um monte de música boa pra afugentar esse inferno pra outro lugar. Espantando todo e qualquer retrocesso moral, o Música da Cabeça desta semana traz, além de seus quadros, Marina, Roxy Music, Arnaldo Antunes, Stevie Wonder, Mundo Livre S/A e muito mais. Também, um novo “Cabeça dos Outros” de fora do Brasil. Se elas se empoderam de seus papeis políticos, a gente aplaude e ainda dá uma ajudinha aqui com informação e trilha sonora. Quer entrar nessa corrente? O programa é hoje, às 21h, pela Rádio Elétrica, com produção e apresentação de Daniel Rodrigues, ok? Ah, e antes que me esqueça: #EleNão



Rádio Elétrica:
http://www.radioeletrica.com/

segunda-feira, 21 de março de 2016

Cinema Marginal


"Quando a gente não pode fazer nada,
a gente avacalha
e se esculhamba."
O Bandido da Luz Vermelha


É com grande satisfação que a hoje iniciamos uma nova série de cinema na seção CLAQUETE do ClyBlog. Vagner Rodrigues desta vez vai nos falar sobre o Cinema Marginal Brasileiro, essa forma anárquico-artística que deu mais uma reviravolta na linguagem da sétima arte produzida no Brasil e que deixou sua marca, mesmo que à força, no cinema nacional. Conheceremos melhor os filmes, seus diretores, estrelas às vezes improváveis, as particularidades, curiosidades, lendas por trás das câmeras, as inspirações e pirações que envolveram suas obras de estética e linguagem ousadas, para muitos, de gosto constestável e duvidoso. Mas enfim, vai aqui uma breve introdução, um retrato mais amplo do cinema marginal só para aquecer, para esperar pelos próximos que virão dissecando cada uma das obras marcantes deste movimento que na verdade mão era exatamente um movimento, não era exatamente cinema, não era exatamente... nada, era uma grande e admirável esculhambação.
Cly Reis
editor-chefe



Os anos 60 foram uma época de surgimento de novos cinemas de vanguarda e mudanças. A Europa como um todo passou fortemente por isso e o movimento mais famoso foi sem dúvida a "nouvelle vague". O Brasil também teve seu "cinema novo", que impulsionado por alguns conflitos ideológicos gerou outro interessante movimento o Cinema Marginal.
Mestre Sganzerla
Na metade dos anos 60 houve essa ruptura de cinemas no Brasil, o momento em que acaba amizade entre Bressane e Glauber Rocha, apos este último acusar o filme "O Anjo Nasceu"(1969) de Bressane de ter plagiado seu filme "Câncer" que fora filmado em 1968 e finalizado em 1972 (Ratinhooooo!!!). O país passava por um forte cerceamento politico, o AI-5 chegava com força, e o "cinema marginal" surgia como resposta contra essa opressão. Ele não foi um movimento organizado, os cineastas não fizeram uma reunião e decidiram criar o "cinema marginal", o nome inclusive foi dado de maneira pejorativa de modo a diminuir os filmes e atingir seus idealizadores. "Não somos marginais, fomos marginalizados" foi, inclusive, uma frase de Carlos Reichenbach, em uma entrevista quando questionado sobre o nome do movimento.
Se o Cinema Novo era popular e seus idealizadores tinham muita força na época, devido esse rixa, o "cinema marginal" foi extremamente rejeitado e boicotado, chegando ao ponto dos filmes serem impedidos de participarem de alguns festivais. A maioria das obras "marginais" só tiveram seu reconhecimento recentemente, assim, somente agora, tardiamente tivemos a oportunidade de ver toda a força de um cinema radical que existiu no Brasil na década de 60.
Como falei no inicio, não foi um movimento organizado, foram diversos focos de novos cineastas que buscavam um novo caminho cinematográfico espalhados por diversos cantos do Brasil,com destaque,é claro, para o Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo, berço da turma da Boca do Lixo.
Um avacalho de tão bom
que é esse filme.
O filme que é dado como o primeiro "marginal" e também o primeiro da Boca do Lixo é "A margem"(1967) de Ozualdo Candeias. O filme feito com baixíssimo orçamento, narra a história de personagens pobres e excluídos, como bêbados, prostitutas e loucos, que vivem na margem do Rio Tietê mas que também vivem à margem da sociedade. No ano seguinte, 1968, o "cinema marginal" e a boca do lixo, produziram o que para muitos foi o maior filme deste movimento, o clássico "O Bandido da Luz Vermelha" de Rogério Sganzela. Esta obra contém todos os elementos que marcaram o "cinema marginal", um filme de manifesto, questionamento de ordem política, uma estética diferente e bela, (apesar do baixo orçamento) e a vontade de avacalhar com tudo, "quando a gente não pode fazer nada, a gente avacalha e se esculhamba", frase dita pelo Bandido durante o filme mas que serviu como um lema do "cinema marginal".
Depois do sucesso do seu primeiro longa, Sganzela produziu seu próximo filme, "A Mulher de Todos"(1969), dando continuidade ao estilo cinema mal comportado, com clara influencia Godardiana. O longa marcou o surgimento da musa Helena Ignez, interpretando Angela Carne e Osso, a inimiga número 1 dos homens. Uma personagem que daria muito orgulho ao movimento feminista que temos atualmente pois, sim, ela transava com todo mundo mas queria, tinha autonomia do próprio corpo e, não, não a confunda com uma personagens de pornochancada, "Agora só tenho tempo para os boçais" clássica frase da personagem Angela Carne e Osso.
Esse período foi o momento de maior sucesso popular do cinema marginal, além dos dois filmes de Sganzela, as obras "O Pornógrafo"(1970) de João Callegaro e "As Libertinas"(1968) filme em episódico dirigido por João Callegaro, Carlos Reichenbach e Antônio Lima, também foram muito bem aceias pelo publico.
Helena Ignez, muito mais que simplesmente
a musa do 'Cinema Marginal'.
Nos anos 70 esse cinema mais questionador começou a perder forçar no mercado que passava a voltar-se naquele momento mias para o cinema erótico. Alguns diretores não fizeram mais longas após essa época como João Callegaro, por exemplo, outros tentaram colocar um pouco de suas e ideias e críticas em filmes eróticos como Carlos Reichbach e Ozualdo Candeias e alguns se distanciaram ao máximo das pornochanchadas e continuaram produzindo na Boca do Lixo como foi o caso de Candeias
Extremamente influenciados pela obra do poeta modernista Oswald de Andrade, muitos diretores do movimento faziam referencias a seu textos e poemas sendo Júlio Bressane o mais oswaldiano entre eles. Um exemplo é seu filme " Uma Família do Barulho"(1970) que alguns críticos consideram uma adaptação cinematográfica livre do "Manifesto Pau-Brasil" de Oswald de Andrade. O filme é anárquico, liberal e repleto de um erotismo inegavelmente oswaldiano.
Muito influenciados por esse espirito, Rogério Sganzela, Julio Bressane e Helena Ignez fundaram no inicio dos anos 70 produtora de filme Belair, que produziu 6 longas em 3 meses. Além de confrontar o AI-5 a Belair batia de frente com a Embrafilme, mostrando que e ainda se podia fazer um cinema questionador no pais, que era possível "fazer cinema do jeito que se pode fazer".
Glauber, herói e inimigo do cinema marginal
Entre os filmes da Belair estão "Copacabana Mon amour", "Sem Essa Aranha" e "Carnaval Na Lama" (filme perdido) de Sganzela, "Cuidado Madame", "Barão Olavo, O Horrível" e o já mencionado "Uma Família do Barulho", de Bressane. Foram obras mais radicais, com violência exagerada, cenas de tortura, frases constantemente repetidas, um uso bem irresponsável da câmera na mão, trilhas sonoras sendo feitas durante a filmagem, um diálogo muito próximo ao do teatro, o que alguns críticos apontam como um exagero de vômitos náuseas e cuspes e arrotos. Mas por outro lado foi da Belair o filme  "marginal" mais bem acabado, a obra mais refinada entre todas da produtora, e um dos grandes clássicos da filmografia brasileira, o já referido "O Bandido da Luz Vermelha", consolidando assim, de uma forma ou de outra, a Belair como um dos marcos mais importante do movimento "marginal e sem dúvida do cinema nacional.
Com a ameaça de prisão dos seus fundadores, que tiveram que se exilar fora do Brasil, depois de apenas 4 meses de funcionamento a Belair acabou fechando. Apos o encerramento de suas atividades o cinema marginal perdeu suas forças e nunca mais consegui voltar. Mas deixou sua marca no cinema brasileiro sendo um dos movimentos mais referenciados dentro do circuito nacional até hoje.
Um fato importante que marca o fim de uma era mas por outro lado também uma reconciliação importante e indispensável para o cinema nacional foi a morte de Glauber Rocha que, apesar de todas as divergências que tinha com a turma da 'boca do lixo' era muito repeitado por estes e considerado o pai do cinema "câmera na mão", sendo sua morte muito sentida pelos fundadores da Belair mesmo tendo sido smpre um dos principais adversários e críticos do cinema marginal. Logo após a sua morte Bressane escreveu um belo texto em sua homenagem, chamado "Da Fome da Estética do Amor" que reatou os laços do cinema novo com cinema marginal. O cinema brasileiro estava em paz de novo.