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segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Marcelo Gross - Oktoberfest Praia de Belas Shopping - Praça Itália - Porto Alegre/RS (1º/10/2023)

 

Depois de dias intensos de chuva, temporais, ciclones, enchentes, alagamentos, enfim, o sol raiou em Porto Alegre. E um clima solar como este é, claro, um pedido parasse aproveitar o domingo. Após algumas voltas, fomos parar no agradável Esquenta da Oktoberfest, que o Praia de Belas Shopping, empreendimento vizinho nosso, promoveu durante a tarde. O mais legal foi que, diferentemente de outros anos, quando o shopping montava estruturas assim com food trucks, atrações e tudo mais, na área interna, desta vez o evento foi levado para a Praça Itália, ao lado do shopping, e a céu aberto e em espaço público. E que céu!

A Praça Itália, que passou por uma revitalização no início deste ano sob a gestão do Praia de Belas Shopping, sediar este preparativo para a famosa Oktoberfest, tradicional evento germânico que a cidade de Santa Cruz do Sul sedia durante o mês de outubro. Com uma programação diversificada, que reuniu jogos germânicos, personagens típicos e as soberanas do Oktoberfest, o principal, entretanto, foram as atrações musicais. 

Não ficamos a tarde inteira, em que estiveram artistas como Fabrício Beck e Bando Alabama, a OktoberBand by Boris Cunha e o DJ Fábio Lopez, mas tivemos a felicidade de assistir boa parte do show do “Cachorro Grande” Marcelo Gross. Com uma formação clássica de rock, baixo, guitarra e bateria, Gross, muito à vontade e simpático, trouxe um punhado de canções que unia o seu repertório solo (“Que loucura!”, “Carnaval”), clássicos da Cachorro (“Bom Brasileiro”, “Dia Perfeito”) e outras agradáveis surpresas, como “O Novo Namorado”, do ex-parceiro Júpiter Maçã, e uma versão de “Taxman”, dos Beatles. 

Aliás, Gross e sua banda fizeram jus às próprias referências no rock e na psicodelia dos anos 60, juntando The Who, Rolling Stones e Beatles e colocando todo mundo no palco. É ou não é briga de cachorro grande? Embora não seja um fã da banda, tenho o maior respeito pela honestidade de Gross e seus companheiros de estrada, bem como pela relevância deles para a cena rock gaúcha. A Cachorro abriu pros Stones em Porto Alegre em 2016, ora essa! No show, embora intimista, era visível o som profissional dos caras, e o quanto este universo do rock faz sentido para eles.

Confiram, então, algumas imagens do belo dia de sol e que a Praça Itália foi agradavelmente aquecida pelo Esquenta da Oktober.  

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Show rolando no palco montado na Praça Itália


Marcelo Gross mandando ver no bom e velho rock 'n roll


Um pouco do show de Marcelo Gross no 
Oktoberfest Praia de Belas Shopping


Beatles, Sontes, Who: briga de cachorro grande, literalmente

A movimentação da galera no evento a céu aberto


Leocádia e eu curtindo a tarde de sol na praça



Daniel Rodrigues

terça-feira, 22 de março de 2016

TNT - "TNT" (1987)



"Entra nessa
e dança um rock'n'roll."
refrão de "Entra Nessa"




Muitos podem considerar OPORTUNISTA escrever sobre isso agora mas eu diria que a palavra correta seria OPORTUNO. Já estive diversas vezes por falar sobre esse disco mas sempre algum outro se interpunha e deixava o TNT para depois mas a morte de Flávio Basso, ex-vocalista do TNT, conhecido posteriormente como "Júpiter Maçã", no in´cio deste ano, torna inadiável o reconhecimento de uma das bandas mas legais e autênticas do rock brasileiro dos anos 80.
Conheci o TNT lá em seus primórdios na clássico álbum "Rock Grande do Sul" em 1986 e, devo admitir que embora hoje seja um replicantista de carteirinha, na época a banda que mais me impressionou numa coletânea que ainda contava com DeFalla, Garotos da Rua e Engenheiros do Hawaii foi o TNT. Um amigo que havia assistido a um show deles num Sunday da Cidade, festa tradicional dos domingos à tarde em Porto Alegre nos anos 80, já havia me falado deles com grande entusiasmo dizendo que tinham umas letras picantes, maliciosas e etc. e tal. Aí fui conhecer o som dos caras no já referido disco, um coletivo que apresentava 5 bandas gaúchas que começavam a buscar sue espaço no cenário nacional e fiquei entusiasmado com aquilo. A picardia juvenil, a linguagem direta, o rock básico e o "portoalegrês" cheio de tu sem constrangimento conquistaram imediatamente nã só a mim como ao púbico, os gaúchos em especial, transformando-se num espécie de sensação daquele momento lá pelas bandas do sul. Naquela época, rica em juventude, criatividade, com bandas surgindo e explodindo em todos os lugares do Brasil, é claro que o TNT também teve algum projeção no centro do país, alguma boa execução de uma música que outra, muito graças ao "Rock Grande do Sul" e suas consequências com o selo Plug levando as bandas gaúchas para o eixo Rio-São Paulo (que no fim das contas é onde a coisa acontece) mas o maior reconhecimento e sucesso deu-se sem dúvida em seu Estado, o Rio Grande do Sul, em grande parte pela identidade indesmentivelmente roqueira do gaúcho, mas muito também devido ao também inegável bairrismo, neste caso saudável, que faz com que o gaúcho ache sempre que o que é seu é o melhor do mundo.
Não, o TNT não era a melhor banda do mundo, mas era uma banda que fazia rock. Rock simples, sem firulas, sem inventar, um rock na essência com toda a provocação, deboche e malícia características do estilo ao longo de sua história. Seu álbum de estreia pela Plug traduzia exatamente essa honestidade e pureza. Num universo de sacanagem, garotas grávidas, cigarros, bebidas, substâncias ilícitas e rebeldia, o álbum  intitulado apenas "TNT" apresentava as duas que fizeram parte da coletânea que os projetou, "Entra Nessa" e "Estou na Mão", ganhando um pouquinho mais de tratamento e capricho na produção, e outras que viriam a tornar-se grandes sucessos entre os fãs e algumas mesmo a tocar nas rádios do centro do país, como "Ana Banana", "Cachorro Louco", "Identidade Zero" e "Oh, Deby".
Tive o LP na época, por essas coisas da vida acabei perdendo em alguma festa, trocando por algum outro ou sei lá o que, e só fui voltar a ter algo do TNT ali pelo final dos anos 90 quando uma amiga me disse que tinha a coletânea "TNT: Hot 20" e gravou pra mim e depois sim vim a ter, novamente, este disco que agora finalmente, depois de muito adiar, destaco aqui nos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS. Pena que eu tenha adiado tanto, passado outros tantos à frente por diversos motivos ou preferências que a homenagem ao disco tenha saído póstuma mas é uma justiça necessária que deve ser feita com Flávio Basso por mais essa grande contribuição para o rock brasileiro e com uma banda que, se no Rio Grande goza ainda hoje de grande prestígio, nunca teve o devido reconhecimento fora dele. Antes tarde do que nunca.
****************

FAIXAS:
1. "Ana Banana" – 3:54
2. "Cachorro Louco" – 3:47
3. "Desse Jeito" – 3:04
4. "Entra Nessa" – 2:55
5. "Estou na Mão" – 3:26
6. "Febem" – 3:29
7. "Identidade Zero" – 4:12
8. "Liga essa Bomba" – 2:50
9. "Me dá o cigarro" – 3:17
10. "Não quero mais te ver" – 3:16
11. "Oh Deby" – 3:52
12. "Ratiação" – 2:55


todas as músicas de Charles Master e Flávio Basso
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Ouça o disco:



Cly Reis

sábado, 20 de setembro de 2025

Dia do Baterista: os melhores na opinião dos bateristas (e não-bateristas também)

Tem uma história envolvendo bateristas, que traduz a magia desse instrumento. Antes do histórico show da Rolling Stones em Porto Alegre, em 2016, os integrantes da banda Cachorro Grande, minutos antes de terem a honra de abrir a apresentação para os ídolos, interagiam no camarim com Mick Jaeger, Keith Richards, Ron Wood, banda e, claro, também com o saudoso baterista Charlie Watts. 

Conversa vem, conversa vai, até que Charlie é apresentado a Gabriel Azambuja, baterista da Cachorro Grande. Imediatamente identificado com o colega brasileiro, o lendário baterista disse-lhe de forma deferente e do alto de sua experiência com seu elegante inglês: "Nunca se esqueça que você é o coração da banda".

É esse coração sonoro que se celebra hoje, dia 20 de setembro. O Dia do Baterista, data escolhida para homenagear os donos das baquetas, seja no rock, no jazz, no blues ou na música brasileira. Porque, sim, junto a grandes mestres do instrumento, temos também brasileiros, reconhecidos internacionalmente desde os anos 60. E tem elas também, as bateristas, menos lembradas, mas igualmente importantes, como Viola Smith, a mais rápida do mundo, Moe Tucker, a mais moderna, Cindy Santana, virtuosa e versátil, ou Karen Carpenter, fera também com as baquetas. 

Como sabiamente sugeriu Charlie Watts, bateria não é apenas uma mera “cozinha” ou acompanhamento da guitarra. Nossos convidados – alguns bateristas, outros não, mas todos apreciadores da boa música e da contribuição dos donos do ritmo – foram convocados para listarem seus bateristas preferidos. Mas numa coisa todos são unânimes: eles sabem que bateria é mais do que bumbo, caixa, surdo, tom-tom e pratos. 

Alguns nomes escolhidos são diretamente ligados a bandas/artistas, como Stewart Copeland e Jorginho Gomes; outros, ícones ou “free lancers”, o nome fala por si, como Steve Gadd e Max Roach. Mas todos craques na sua arte. E é por eles que a música pulsa.

Os editores

🎶🎶🎶🎶🎶🎶🎶🎶

Cláudio Mércio
Jornalista e baterista

Glenn Kotche (Wilco) 
Ian Paice (Deep Purple) 
Ginger Baker (Cream) 
Stewart Copeland (The Police) 
Budgie (Siouxsie & the Banshees)




Márcio Pinheiro
Jornalista e escritor

Max Roach
Roy Haynes
Elvin Jones
Dannie Richmond
Steve Gadd





Carlos Gerbase
Jornalista, cineasta e baterista

Clem Burke (Blondie)
Charlie Watts (Rolling Stones)
Biba Meira (Defalla)
Hugo Burnham (Gang of Four)
Cleber Andrade (Os Replicantes)




Rodrigo Coiro
Publicitário e baterista

Neil Smith (Alice Cooper Group)
Robert Erikson (The Hellacopters)
Buddy Rich 
Dennis Thompson (MC5)
Marky Ramone (Ramones)





Eduardo Wolff
Jornalista e baterista

Ringo Starr (The Beatles)
Keith Moon (The Who)
Don Brewer (Grand Funk Railroad)
Jo Jones
Ginger Baker




César Castro
Baterista

John Morello
John Bonhan
Billy Cobham
Airto Moreira
Jorginho Gomes (Novos Baianos)





André Abujamra
Músico multi-instrumentista

Kuki Stolerski
Carneiro Sandalo
James Muller
Claudio Tchernev
Jonh Bohan





Daniel Rodrigues
Jornalista, escritor, radialista e blogueiro

John Bonham
Tony Williams
Budgie
Elvin Jones
Martin Atkins (P.I.L.)
(extra: Jaki Liebezeit - Can)




Cly Reis
Arquiteto, cartunista, artista visual e blogueiro

John Bonham
Keith Moon
Stewart Copeland
Ginger Baker
Budgie
(extra: Martin Atkins)




Paulo Moreira
Jornalista e radialista (in memoriam)

Steve Gadd
Art Blakey
Edison Machado
Tony Williams
Elvin Jones





segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

Samuel Rosa & Simjazz Orquestra - Vivo Música - Parque Harmonia - Porto Alegre/RS (03/12/2023)

 

Há 30 anos, a revista Bizz, a mais importante publicação sobre música no Brasil dos anos 80 e 90, “lacrava” sobre os quatro principais nomes daquilo que chamavam de “a nova cara da música pop brasileira”. Dois eram equívoco evidentes: Cherry, a vocalista da inexpressiva e rapidamente esquecida banda Okotô, e Edu K, que, erroneamente, já era influência para a música pop há mais tempo de que todos ali por meio de sua referencial De Falla. Quanto aos outros dois “novatos”, pode-se dizer que foram mais assertivos, embora com algum porém. Um deles era Carlinhos Brown, que, assim como Edu K, não se tratava de nenhum iniciante, visto que àquela altura já gravara nos Estados Unidos com Sérgio Mendes, liderava trio elétrico na Bahia e influía diretamente na música de Caetano Veloso. Mas como o Tribalista não havia ainda se lançado em carreira solo (seu debut, “Alfagamabetizado”, sairia apenas três anos depois), até passava a classificação como “promessa” devido a isso. 

O único acerto efetivo dos editores da Bizz da naquela reportagem foi, de fato, Samuel Rosa. O líder da Skank, então em seu primeiro disco dos 15 que lançou em 30 anos de estrada, não apenas atingiria o estrelato, como se consolidaria como um dos mais importantes autores da música brasileira.

A prova daquela profecia pode ser conferida no saboroso show gratuito que o artista mineiro fez em Porto Alegre para o Vivo Música. Acompanhado de sua ótima banda e em alguns números da competente Simjazz Orquestra, Samuel, em começo de vida solo com o consensual fim da Skank, desfilou um cancioneiro tomado de hits, como “Garota Nacional”, “Jackie Tequila”, “Ainda Gosto Dela” e “Sutilmente”. Mas não só isso. Afinal, “chicletes de ouvido” são relativamente fáceis de se fazer a um músico com mínimas habilidades, visto que obedecem a uma construção melódica padrão, que formata um produto musical eficiente, mas nem sempre dotado de emoção. Samuel Rosa, desde aqueles idos de 1993, quando destacado pela Bizz, soube evoluir em sua musicalidade para unir estes dos espectros: o gosto popular e a sofisticação, o pop e o melodioso. De reggaes relativamente pobres, Samuel, principal compositor, evoluiu a olhos vistos para referências a Beatles, à turma de Minas Gerais e sons mais modernos, que o transformara num dos cinco principais compositores da música brasileira destas últimas três décadas.

Com uma sinergia incrível com o público, ao qual agradeceu pela fidelidade de não arredar pé mesmo com a chuva, foram só sucessos do início ao final do show. Algumas, que levantaram a galera, que cantou e dançou junto sem dar bola para a chuva que ia a voltava. A embalada versão da Skank para “Vamos Fugir”, de Gilberto Gil, foi uma delas, assim como “Acima do Sol”, “Vou Deixar” e “Saideira”. Só alegria. São músicas tão embrenhadas no emocional do público, que as pessoas cantam a letra completa mesmo sem saber que as sabiam de cor. Que brasileiro, afinal, não sabe cantarolar “Amores Imperfeitos”, “Tão Seu” ou “Te Ver”, por exemplo? Além destas, tiveram surpresas. Com um Samuel menos atido só ao repertório da Skank, teve cover da beatle “Lady Madonna” com “I Can See Clearly Now”, de Jimmy Cliff, uma homenagem à gaúcha Cachorro Grande, banda coirmã da Skank, com a balada “Sinceramente”, e uma esfuziante “Lourinha Bombril”, da Paralamas do Sucesso, coautoria dele com Herbert Vianna.

Por falar em chuva, que ameaçava desabar a qualquer momento, Samuel, um doce de educação e simpatia, confessou que haviam reduzido um pouco o set-list no meio da apresentação com medo de que isso ocorresse. Mas como durante o show foram, por sorte, apenas algumas pancadas leves, ele mesmo fez questão de alterar a ordem dos números e tocou todas as que haviam se programado. Isso fez com que os principais clássicos estivessem lá. O que dizer de “Resposta”, dele e de Nando Reis, uma das mais belas baladas do cancioneiro brasileiro? E “Dois Rios”, também com Nando e contando com o toque “Clube da Esquina” do conterrâneo Lô Borges? Para fechar, no bis, não uma escolha garantida de algum outro sucesso da Skank, mas, sim, uma versão de “Wonderwall”, da Oasis, pois, como Samuel justificou, o Rio Grande do Sul é terra de roqueiro, então todos ali entenderiam o porquê. 

Passados todos estes anos desde que aquela revista previa que Samuel Rosa se tornaria um pilar da música pop brasileira, fica muito claro que isso realmente aconteceu. Parceiro de alguns dos mais importantes nomes da música nacional, como Nando Reis, Erasmo Carlos, Lô Borges, Chico Amaral e Fernanda Takai, pode-se dizer que, por alto, Samuel é responsável por cerca de 20% dos grandes sucessos da música no Brasil dos anos 90 para cá. Curiosamente, a adoção definitiva do nome próprio e a dissociação direta da Skank fazem com que, de certa forma, Samuel Rosa se reinvente e renasça, como se, novamente, estivesse começando. Então: vida longa a este “velho novato”. Que venham mais 30 anos de maravilhas pop e canções que tocam o coração do Brasil.

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Confira alguns momentos:

Samuel e a Simjazz começando o show


Detalhe do telão

Público atento e interagindo


Samuel em sintonia com a galera

Os dois de rosa pra ver Samuel Rosa: coincidência



texto: Daniel Rodrigues
fotos e vídeos: Daniel Rodrigues e Leocádia Costa

quinta-feira, 18 de junho de 2020

"O Juiz", de Danny Cannon (1995) vs. "Dredd", de Pete Travis (2012)




Ambos os filmes são adaptações da HQ inglesa Judge Dredd, criada em 1976 por John Wagner e Carlos Ezquerra. A historia se passa 120 anos à frente (mais ou menos) e Dredd é um vigilante da lei que trabalha como juiz. Contudo, nessa realidade ultraviolenta, o juiz acumula os cargos de polícia, juiz, júri e executor (quando necessário). Ele trabalha ao lado de vários outros juízes, que mantêm a ordem na megalópole Mega City One. Ambos os filmes têm seus pontos positivos e negativos, portanto, chega de perder tempo e vamos a partida! É jogo de Libertadores! Vai ser briga feia, partida amarrada e a marcação vai ser dura, às vezes até desleal.
O gramando é cheio de buracos, a chuva que cai deixa muita lama, o juiz olha com cara feia os dois capitães, pede um jogo limpo, fala que ele é quem manda e grita bem alto: “EU SOU LEI”.
A bola rola e o clima tenso nas arquibancadas, com bombas, sinalizadores, passa para o campo. O início de jogo é muito “pegado”, falta técnica e sobra força. Muitas faltas, mas o juiz está em cima. "O Juiz" (1995), tem um elenco mais cheio, demonstra mais recursos e técnica, principalmente em design e visual. O time ganha  o campo do adversário, "Dredd" (2012) e mesmo com toda a técnica disponível, o diferencial do time é o craque, o atacante rompedor Sylvester Stallone no papel do personagem principal, que vem na base da força e faz 1 x 0 para Dredd '95. Mas Stallone ao comemorar tira o capacete e isso é falta grave em se tratando desse personagem, que nos quadrinhos nunca tira o acessório. Cartão amarelo para ele.
Analisando os elencos, o time de '95 tem mais nome, é mais encorpado, conta com o veternao Max Von Sydow pra dar experiência ali no meio, e Diane Lane e Rob Schneider, para fazer a bola correr, mas parece que falta entrosamento, principalmente da parte de Rob, que parece não acompanhar o ritmo do jogo. Já a equipe de 2012 depende muito da dupla de meio campo, o volante brucutu que sabe chegar na frente, Karl Urban, o Dredd da versão mais nova, e a meia-armadora que parece  ler a mente dos adversários, Olivia Thirlby, como Juíza Anderson.

"O Juiz" (1995) - trailer




"Dredd" (2012) - trailer


Não demora muito para vir a resposta do time de 2012. Urban vem lá de trás com a velocidade de uma moto, ajeita sua mira para disparar de longe e marca um golaço, mostrando todo seu talento em cenas de ação. Uma equipe em sincronia e temos o empate no placar: 1 X 1.
Fim da primeira etapa! Jogo brigado, juiz tendo que conduzir com pulso firme.
Segundo tempo começa do mesmo jeito, com muitas divididas e numa uma dessas, Rob Schneider é expulso. Só dava bola e entradas fora de tempo e já estava atrapalhando sua equipe. Dredd 95 do meio para o fim começa a perder força. Só jogadas repetitivas, frases de efeito, Stallone não consegue mais segurar a bola no ataque. Com isso, Dredd 2012 ganha força, parece gostar do jogo pegado, até mesmo sujo. Karl Urban, em lance sensacional passa por três, de maneira linda, com técnica e força (sério! a sequência em que ele enfrenta três juízes é fabulosa!), e marca virando o jogo. 2x1 para Dredd 2012.
Indo para o final desta briga de cachorro grande, Dredd '95 está muito cansado, sem forças, enquanto  Dredd '12 só vem crescendo. Ambas as equipes fazem suas últimas cartadas, sangue novo: os vilões. O time de 95, coloca Armand Assante (Rico)... Fraco demais. Não aguenta as pancadas do jogo. Ainda tenta tabela com Stallone, mas erra e faz é gol contra. Ele não deveria ter entrado... 3 x 1 para Dredd 2012. A equipe de 2012  vai de Lena Headey, que já tem até nome de craque, Madeline "Ma-Ma" Madrigal. Ela é um ótimo apoio e de cara já dá uma assistência para gol, com um cruzamento que parece deixar a zaga adversaria em câmera lenta, mas desta vez quem marca é Olivia Thirlby, pois seu personagem ganha força no final. Nada mais justo. Anderson estava merecendo esse gol. 4x1 para Dredd 2012.
 Os dois longas conseguem ter seus momentos. A primeira adaptação tem um visual muito bom, com um desconto para os efeitos da época, ok! Sua primeira meia hora funciona, Stallone convence mas seu ato final é horrível. Muita frase de efeito, clichês, e um humor desnecessário. A segunda versão é mais simples, tem menos luxo, o longa se passa basicamente em um cenário, só que essa “simplicidade” ajuda muito. Fetebolzinho arroz com feijão mas que funciona.
Urban vive bem o personagem e o melhor, não tira o capacete. Um time..., digo, um filme bem resolvido que se sustenta bem, não exige muito do espectador e no final entrega algo bem satisfatório.

Dredd '12: "Pelas atribuições de juiz concedidas a mim, eu o sentencio à... derrota."
Juiz '95: "Eu sabia que você ia dizer isso!"

Jogo pegado, tem sangue, briga nas arquibancadas, confusão no gramado, expulsão, típico jogo de Libertadores.
Jogo que valia tudo, menos xingar a mãe do JUIZ.





por Vagner Rodrigues

terça-feira, 5 de setembro de 2023

"Quadrilha de Sádicos", de Wes Craven (1977) vs. "Viagem Maldita", de Alexandre Aja (2006)

 



Aqui temos um desafiante que é tido por muitos como favorito mas que, para mim, se tanto, com um esquema muito ofensivo, consegue equilibrar o jogo. "Viagem Maldita" (2006), do diretor francês Alexandre Aja, refilmagem do clássico "Quadrilha de Sádicos" (1977), do mestre Wes Craven, é considerado melhor que seu original por muita gente e, em verdade, até tem seus méritos e virtudes para ambicionar uma vitória, mas derrotar um dos filmes referência do terror não é bem assim.

A história é basicamente a mesma nos dois filmes: uma família em férias, passando pelo deserto do Novo México, resolve pegar um atalho e passar por uma área que dizem abrigar uma antiga mina de prata, numa região que também fora uma área de testes militares do exército dos Estados Unidos. Nessa rota alternativa, o grupo formado pelo patriarca, um ex-policial aposentado, sua esposa, seus dois filhos adolescentes, sua filha casada, o sogro, o bebê do casal, além de seus dois cães, têm problemas com o carro no meio do nada, ficando à mercê de um grupo de canibais que habitam as colinas daquela região. Obrigados a se separarem por diversas circunstâncias (procura de ajuda, a fuga de um dos cães...), o grupo fica ainda mais fragilizado e vulnerável diante de seus caçadores que, depois de inúmeras perversidades, sequestram o bebê do casal e o levam para as montanhas. Aí o jogo meio que se inverte e os caçadores passam a serem caçados. A família resolve reagir e, especialmente o pai da criança, Doug, que já tivera sua esposa assassinada pelos selvagens, decide ir atrás da criança e recuperá-la custe o que custar. É o momento em que o "cidadão comum", uma pessoa que, talvez, não fosse propensa à violência, formado por todos os valores morais da sociedade, pode vir a tornar-se tão animalesco e brutal quanto seus algozes, criaturas sem nada, nem ninguém, forjados na violência desde sempre em suas vidas. Aqui, o verdadeiro enfrentamento é CIVILIZAÇÃO X BARBÁRIE.


"Quadrilha de Sádicos" (1977) - trailer



"Viagem Maldita" (2006) - trailer



As produções apresentam pequenas diferenças: enquanto, no filme de 1977, o acidente com o trailer é causado pela autossuficiência e irresponsabilidade do paizão Big Bob, no de 2006 é consequência de uma armadilha dos maníacos; se no original a parte do resgate do bebê se dá em meio à bela e labiríntica topografia rochosa do deserto, no segundo, grande parte dela se passa numa espécie de cidade cenográfica, uma "cidade fantasma" repleta de manequins sorridentes, na qual o governo simulava as situações de impacto nuclear em áreas habitadas.

Ambos são muito violentos, à sua maneira. O filme de Wes Craven é quase um precursor no que diz respeito à violência extrema, com cenas extremamente chocantes para a época, como o cachorro estripado ou o ataque no trailer; mas o remake mantém o impacto e, em alguns momentos, é ainda mais gráfico que seu antecessor, como no suicídio do dono do posto, a do genro num freezer cheio de membros, ou ainda a luta com o mutante grandalhão na cidade cenográfica.

O original tem o mérito de ter sido um rompedor, um daqueles filmes que encarou as críticas, as estranhezas, para se tornar um clássico e consolidar uma linguagem; a nova versão, por sua vez, tem o mérito de contextualizar um pouco melhor para o espectador o porquê daquele grupo, exposto à radiação dos testes nucleares, viver isolado ali, agir daquela forma e apresentar aquelas aparências repugnantes e deformadas. A propósito de deformidades, as do remake, com um orçamento bem melhor e numa época de melhores recursos técnicos, são muito superiores à esforçada, porém primária maquiagem do primeiro filme. Pluto, por exemplo, se já é repugnante e assustador em "Quadrilha de Sádicos", é algo verdadeiramente horroroso e amedrontador em "Viagem Maldita". Porém, a favor do original temos que o discurso da desumanização, da desesperança no ser humano, embora presente também na refilmagem, é mais significativa e pungente na primeira versão.

A chocante cena do pai da família, Big Bob, crucificado num cactus acontece nos dois e com o mesmo impacto; a cena do estupro da filha mais nova no trailer é clara no remake e apenas sugerida no original; a armadilha que os jovens preparam para os canibais é ótima nos dois, mas tem um efeito mais prático e decisivo no filme de 1977; a luta final nas colinas, entre o pai do bebê sequestrado, Doug, e um dos canibais (Marte, no filme antigo, e Lizard, no mais novo), é intensa em ambos os casos, tem um desfecho semelhante, mas é mais impactante na primeira versão, até porque, ali se dá a cena final, acabando o filme com uma imagem congelada e tingida. Parece que a Quadrilha vai levar a melhor com o gol decisivo no apagar das luzes, mas, nos acréscimos, quando os sobreviventes da Viagem sentem-se a salvo, depois de terem despachado 'todos' os malucos da colina, a imagem se afasta e... vemos que eles estão sendo observados por um binóculo. Hum... Deu rúim!

Até pode ter "dado ruim" pra família no deserto, mas foi a boa pro time do técnico Alexandre Aja. É o gol de empate de "Viagem Maldita". E sobem os créditos e é o apito final do árbitro.

Grande jogo, dois grandes times e um desafiante à altura para um grande clássico do terror.

No alto, as duas cenas de Bob Carter sendo queimado no cactus do deserto;
no centro, os maníacos tocando terror no trailer com a filha mais nova, Brenda;
e abaixo, o abominável Pluto da versão original, à esquerda, e o da nova filmagem, à direita.


"Quadrilha de Sádicos" pode ser clássico do terror, mas "Viagem Maldita"
não se assustou e encarou.
Aqui, a máxima se confirmou: clássico é clássico, sim, mas vice-versa vale também.





 por Cly Reis

terça-feira, 15 de julho de 2014

Belchior - "Alucinação" (1976)




"Meu nome é
Antonio Carlos Gomes
 Belchior Fontenelle Fernandes,
portanto, um dos grandes nomes
da música popular brasileira”.
Belchior,
em entrevista em 1982
para o jornal O Pasquim


Em 1976, Antonio Carlos Gomes Belchior Fontenelle Fernandes, ou simplesmente Belchior, era apenas mais um cantor e compositor cearense que tentava a vida no Rio de Janeiro. Dois anos antes, tinha lançado seu primeiro disco, “A Palo Seco”, pela Gravadora Continental, que tinha seu primeiro sucesso de crítica “Hora do Almoço”. Mas a repercussão ficou somente aí. O público não comprou. Mesmo assim, ele conseguiu um contrato com a Polygram, a gravadora mais importante do Brasil na época. Com produção de Mazzola, ele entrou nos estúdios e fez o quinto disco da minha lista de favoritos e o primeiro de MPB desta lista pessoal e intransferível: “Alucinação”.

Como todo mundo naquele tempo, ouvi o disco pela primeira vez no rádio. Continental 1120, por supuesto. A canção era a faixa que abre o disco, “Apenas um Rapaz Latino-Americano”. Com aquela maneira de se expressar, somente Raul Seixas em seu “Ouro de Tolo” tinha feito coisa parecida. Um jeito Dylan de cantar e recitar a letra ao mesmo tempo, incomum na época. Muito antes do rap. A harmônica ajuda na comparação com Robert Zimmerman. Nela, Belchior faz sua profissão de fé na condição de compositor naqueles tempos bicudos de ditadura militar: “Não me peça que eu lhe faça/ Uma canção como se deve/ Correta, branca, suave/ Muito limpa, muito leve/ Sons, palavras são navalhas/ E eu não posso cantar como convém/ Sem querer ferir ninguém”. Mais adiante, ele avisa que o ouvinte não deve se preocupar com os horrores que diz, pois “a vida é muito pior”. Na perspectiva de hoje, é incrível que a censura – tão raivosa em inúmeros momentos com outros compositores, por exemplo, Chico Buarque e Milton Nascimento – tenha sido condescendente com as letras de Belchior.

Na sequência, ele faz versões menos roqueiras de duas músicas que haviam sido gravadas por Elis Regina em seu álbum ”Falso Brilhante”: “Velha Roupa Colorida” e o hit do disco, “Como Nossos Pais”. Em “Velha Roupa...”, ele se preocupa com os saudosismos: “No presente, a mente, o corpo é diferente/ E o passado é uma roupa que não nos serve mais”. Também fala que uma nova mudança vai acontecer. Só que isto levou quase nove anos para começar. Já em “Como Nossos Pais”, ele garante que “viver é melhor que sonhar” e que, apesar de lutar para buscarmos a vida e não o sonho, a conclusão é aterradora: “Ainda somos os mesmos e vivemos/ Como nossos Pais”. O disco é todo embalado por baladas mid-tempo – como dizem os americanos –, bem ao estilo, bem... dylanesco.

“Sujeito de Sorte” já é diferente. Depois de um começo que flerta com o rock um pouco mais pesado, ela vira uma canção onde o piano elétrico de José Roberto Bertrami (do grupo Azimuth) faz a base melódica para a bateria de Ariovaldo. E a letra diz: “Tenho sangrado demais, tenho chorado pra cachorro/ ano passado eu morri mas este ano eu não morro”, numa referência direta a “Its All Right, Ma' (I'm Only Bleeding)”  de Dylan. Ele novamente. “Como o Diabo Gosta” tem um tom solene com o órgão fazendo a base para violões e violas e Belchior cantando: “E a única forma que pode ter norma/ é nenhuma regra ter/ é nunca fazer nada que o mestre mandar/ sempre desobedecer/ nunca reverenciar”. Uma moda de viola “muderna”.

O lado 2 começa com as canção mais importante de todo este grande disco, a faixa-título que, direto já diz: “Eu não estou interessado em nenhuma teoria/ Em nenhuma fantasia, nem no algo mais... a minha alucinação é suportar o dia a dia/ E meu delírio/ é a experiência com coisas reais”. E depois de toda uma descrição da vida difícil e insossa das grandes cidades, Belchior afirma que “amar e mudar as coisas/ me interessa mais”. Essa é outra canção em que a bateria de Ariovaldo faz a diferença, tocando o “feijão com arroz” necessário para passar a mensagem do compositor. Neste sentido, é exemplar a produção de Mazzola. A banda se destaca por carregar de forma convincente as letras e os vocais do bardo cearense.

A referência de Dylan misturado com Luiz Gonzaga está em “Nâo Leve Flores”, com violões e piano country ao lado de uma sanfona, sublinhando a marca cowboy ou... bem, vocês já sabem. O pessimismo de Belchior fica evidenciado neste trecho: “Tudo poderia ter mudado, sim/ pelo trabalho que fizemos - tu e eu/ mas o dinheiro é cruel/ e um vento forte levou os amigos/ para longe das conversas, dos cafés e dos abrigos/ e nossa esperança de jovens não aconteceu, não, não”.

Como muita gente não havia ouvido seu primeiro disco, Belchior resolveu regravar “A Palo Seco” (que havia sido interpretada pelo seu amigo e conterrâneo Raimundo Fagner no disco de 1975, “Ave Noturna”). E ele reforça a canção escrita em 1973 dizendo: “E quero que este canto torto/ feito faca, corte a carne de vocês”. Prestem atenção no que faz o piano de José Roberto Bertrami durante toda a canção. Lembrou-me o que Nicky Hopkins fazia nos discos dos Rolling Stones da década de 70.

“Fotografia 3X4” é, talvez, a canção mais desesperada e autobiográfica de todo o disco. “Eu me lembro muito bem do dia em que eu cheguei/ Jovem que desce do norte pra cidade grande/ Os pés cansados e feridos de andar légua tirana”. E, a partir daí, segue a saga difícil de um imigrante. E sobra até para o Caetano de “Alegria, Alegria”: “Veloso o sol não é tão bonito pra quem vem/ do norte e vai viver na rua”. Já sabedor que este disco iria mudar sua realidade, ele hesita em dizer: “A minha história é... talvez/ É talvez igual à sua/ jovem que desceu do Norte/ e no Sul viveu na rua”. Como é importante para ele reforçar esta noção de que o imigrante, especialmente o nordestino, sofria muito com este êxodo. Tudo ponteado pela guitarra de Antenor (onde andará?).

Pra fechar, numa levada country novamente, um recadinho rápido e básico de “Antes do Fim”: “Quero desejar, antes do fim/ pra mim e os meus amigos/ muito amor e tudo mais... não tome cuidado/ não tome cuidado comigo/ que eu não sou perigoso/ viver é que é o grande perigo”.
Este disco significou muito pra mim. Acredito que foi a partir dele é que comecei, aos 16 anos – atrasado, eu sei, mas antes tarde do que nunca –, a me dar conta do que estávamos vivendo aqueles anos terríveis que se convencionaram chamar de “de chumbo”. Mas acho que, aos 15 para 16 anos, eu tinha um álibi. Vivíamos numa ditadura militar onde nada era contado como devia, tudo era escondido. Foi o começo do auge da TV Globo ditando as regras da comunicação brasileira. Estudava numa escola pública maravilhosa onde, porém, estudávamos “OSPB” (pra quem não sabe Organização Social e Política Brasileira) e “Educação Moral e Cívica”. Duas clássicas matérias onde éramos ensinados a adorar a Transamazônica e as “realizações” do governo militar. Com toda esta lavagem cerebral, foi muito importante surgir um disco como o de Belchior pra dar uma desmistificada no que aprendíamos até mesmo nas escolas. E é um disco que ouço não só com o viés nostálgico, mas como um disco de música de qualidade. Quem não conhece, ouça.
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FAIXAS:
1. "Apenas um rapaz latino-americano" - 4:17
2. "Velha roupa colorida" - 4:49
3. "Como nossos pais" - 4:41
4. "Sujeito de sorte" - 3:56
5. "Como o diabo gosta" - 2:33
6. "Alucinação" - 4:52
7. "Não leve flores" - 4:11
8. "A palo seco" - 2:56
9. "Fotografia 3x4" - 5:27
10. "Antes do fim" - 0:59


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OUÇA:
Belchior Alucinação




sexta-feira, 13 de agosto de 2021

CLYLIVE ESPECIAL 13 anos do ClyBlog - Hímen Elástico - Woodstock Bar - Alvorada /RS (13/08/1993)




Pedaço do cartaz do evento















O mais alto voo "hermenêutico*" 

Hímen Elástico, sexta feira 13 agosto de 1990 e poucos....
Lembro que fizemos alguns ensaios e como de costume nunca tivemos um guitarrista fixo... mas tenho dois na memória, um canhoto e o outro destro.
Sim, ser canhoto era um pré-requisito para fazer parte da banda e nem precisava tocar bem. Se fosse canhoto estava dentro! Marcelo o “Fedor” era o destro, talvez o que mais se manteve no cargo, e Thiago Newman, o canhoto, que acho que foi quem participou do show que, certamente foi a apresentação mais insana daquela noite e que, curiosamente, não começou no palco.
Saímos eu, meu irmão, Nego Lê, nosso batera Cézah, o Pereba, e mais um amigo e personagem importante dessa cruzada, Diogo, o Tantã, rumo à Intercap, em Porto Alegre, para a reunião que daria início a saga.
Logo após a janta, todos naquele alvoroço se preparando para alçar ao que talvez fosse o voo mais ousado do nosso projeto hermenêutico, lembro da minha tia Iara, mãe dos guris Clayton e Daniel, meus primos e vocais da banda, nos encher de advertências sobre o uso do casaquinho, o cuidado com as companhias e aquela coisa toda de mãe.
Então chegou a hora, a trupe toda pronta e partimos para rua. Provavelmente eu levava alguma bebida mocozada na mochila, pois não lembro de um dia que saí durante os anos noventa onde não houvesse um vinho (hehehehe), mas o fato de já ter um trago, não impediu um dos atos que seria o marco daquela cruzada. Então, surge a dúvida: quem pegou a Cachaça Polteirgeist?
Lembro de o Pereba ter tomando mas também lembro do Tantã ser o primeiro a pegar o artefato.
Estávamos nós andando, não sei se próximo ao ponto de partida, quando numa encruzilhada nos deparamos com um despacho digno de uma legião de entidades e um dos nossos heróis teve a bendita ideia de pegar a cachaça pra tomar. 
Não sei se tomei, não sei quem tomamos, mas sei que fez toda diferença pois fomos para aquele show com uma legião de seres das ruas na nossa cola.
O lance era um pico muito louco numa festa insana organizada por uma skatista amigo nosso da Osvaldo Aranha, o Miller, que hoje mora em Viamão e que simplesmente convidou todo mundo pro evento. Lembro da Free Jack , Rapcrazy, Ultramen, Groove James, Borboleta Negra, que hoje virou Comunidade Nin-Jitsu, e nós, a Hímen Elástico, é claro...
Então chegou o momento tão esperado! Lembro de ter começado com a Marcha Fúnebre, num bass distorcidão, usando o moletom, que havia sido confeccionado num tamanho descomunal, com o capuz caindo na cara, fazendo referência à morte ou a um ritual qualquer (hehehehehehe!). Logo vinha “Carolina” ("Dá um beijo no cangote, Carolina!") e “Ex” que deram o ritmo do que seria uma metralhadora de músicas que tocamos naquela noite. Sim, foi um petardo atrás do outro e lembro que meu irmão não ficou no palco pois passou o show correndo no salão, alucinado, e geral impressionada com o que estavam assistindo. (hehehehehehehe!!!) Enfim, memorável! Logo após toda aquele frenesi, fomos para Osvaldo Aranha celebrar o grande momento. Acho que foi a primeira vez que vi Clayton e Daniel por lá!!!!!!
Até hoje não sei como acabou aquela noite mas guardo na memória, mesmo que vaga, um espetáculo inesquecível.

* Hermenêutico - termo que costumávamos usar para classificar tudo relacionado à Hímem Elástico


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A dúvida que não quer calar

Bah! Baita lembrança!
Então, o que dizer daquele dia? Eu bem moleque aprendendo os passos da adolescência e tendo exemplos, tanto de vocês, meus primos, como do Lucio, meu irmão.
Lembrando desse dia, hoje em 2021, consigo ter claro o que aquele 13 de agosto significou na construção de quem sou eu hoje, mas voltando anos atrás, era tipo um filme. Expectativa como se fosse um showzaço mas foi como uma final de campeonato, desde o ponto de ônibus, de onde já saímos rindo de tudo, até descer no centro de Alvorada, adentrar aquele bar escuro e ouvir a Hímen Elástico com vocês. 
Quebramos tudo! Foi massa demais e uma experiência única. Por isso, meu lema até hoje é: seja jovem sempre e faça tudo que quiser fazer, desde que não prejudique ninguém e não ocupe o espaço de outra pessoa. 
Contudo, depois de tanto tempo uma dúvida ainda persiste: Cachorro morto ainda late**?


** nome de uma das músicas da Hímen Elástico

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Macumba, rock ‘n’ roll e cabeças cortadas

Tínhamos a melhor banda de rock do Rio Grande do Sul dos anos 90. Digo isso sem soberba, até porque, se sobrava qualidade, faltou persistência a nós para prosseguimos e provar todo esse talento. A Hímen Elástico, nossa banda, era uma mistura muito bem azeitada de todas as referências que nós, integrantes, tínhamos: punk rock, hip hop, quadrinhos, samba, poesia concreta, música clássica, revistinha adulta, skate, hardcore, desenho animado. De tudo um pouco e tudo misturado emaranhando as mentes de Clayton Reis, meu irmão e principal vocalista/letrista; Leandro Reis Freitas, o Lê, primo backing assim como eu e dono de sacadas e ideias sempre criativas; Cezar “Pereba” Castro, o melhor batera dessas bandas sulistas depois de Pezão; e o baixo, vocais, and other instruments by Lucio Agacê, irmão de Lê e também nosso primo, um turbilhão de musicalidade e o verdadeiro músico entre nós – não à toa, o cara que mais seguiu por esse caminho entre todos nós depois da “dissolução” da Hímen, como carinhosa e debochadamente nos apelidávamos,.

Compúnhamos juntos e de forma contributiva, aliás, como sempre fizemos desde a infância, crescendo juntos como guris e seres criativos. Se a sintonia entre nós era sanguínea, geracional e afetiva, na guitarra a Hímen ainda reservava um charme à parte: sempre tínhamos um guitarrista diferente. Sabe a The The, a P.I.L., a This Mortal Coil, todos com guitarristas móveis? Pois é: éramos iguais. Dependendo da ocasião, algum amigo, familiar, parceiro ou até fã nosso era contemplado – desde que soubesse minimamente tocar o instrumento, visto que nenhum de nós tinha essa capacidade.

Todas essas características faziam da Hímen uma banda sui generis, que botava no chinelo em musicalidade Comunidade Nin-Jitsu, Cidadão Quem, Papas da Língua, Tequila Baby... todas as bandas de sucesso do RS na época. E nada dessa de banda “couve”: nossas músicas eram todas escritas por nós mesmos. O que não era de nossa autoria, transformava-se assim, como as versões de Ramones e Legião Urbana, que emendávamos com uma de nossas canções, “Fórmula de Bhaskara’, ou as ousadas versões de “Ego Sum Abbas” de CarminaBurana ou da techno-punk Suicide para o formato baixo-guitarra-bateria. Tínhamos inteligência musical e repertório suficiente para gravar um disco, certamente. Mas o fato é que não tivemos muito tempo de “estrada”. Embora as músicas ainda existam, foram poucos os que, ao contrário das bandas de sucesso do rock gaúcho, bem mais persistentes, tiveram o “privilégio” de nos ouvir. A não ser numa fatídica, gélida, perigosa e memorável noite de rock ‘n’ roll que nós promovemos.

Não vou lembrar com detalhes, pois lá se vão 28 anos, mas recordo que ensaiamos algumas horas na tarde daquele 13 de agosto de 1993 num estúdio que alugamos no Bom Fim. Terminados os ensaios, ‘simbora lá pra nossa casa, meio do caminho para nosso destino final, para comer alguma coisa feita por minha mãe, dona Iara, que levou as mãos à cabeça ao saber para onde iríamos depois dali: Alvorada. E à noite! E numa sexta-feira 13! E na cidade mais perigosa do Estado! Isso porque, naquela semana, a imprensa havia noticiado, assombrada, vários assassinatos cometidos em Alvorada em que os criminosos haviam decapitado suas vítimas. Misto de irresponsabilidade e descomplicação juvenil, obviamente, fomos. Seria a primeira apresentação ao vivo da Hímen Elástico! Nossas músicas, nós no palco! Adrenalina, rock ‘n’ roll! Não íamos perder de jeito nenhum a oportunidade de fazer aquele show, nem que, para isso, cortassem nossas cabeças!

Rock a gente associa a algo quente, infernal, furioso, certo? Neste caso, porém, substitua-se o calor dos infernos por um frio dos infernos. Sim: afora todas as justificativas que inibiriam qualquer ser minimamente ajuizado de não sair de casa, fomos nós, sob uma temperatura quase negativa, pegar dois busões em direção a Alvorada para desespero de minha mãe. Além de caminhar trechos com os instrumentos nas costas, sabe como é pegar ônibus de noite num fim de semana, né? Chá de banco. E com aquele frio! Deu pra ver que a galera não tinha grana, né? Táxi? Impossível, muito caro. Carro próprio? Àquela época, nem carteira aqueles guris tinham. Mas se faltava grana, assim como para com nossas músicas, sobrava criatividade – e um bocado de ousadia, confesso. No caminho para a condução, Cezar, quieto e sempre atento, encontrou uma garrafa de cachaça inteirinha e quase intocada. Que alento para aquele frio! E tudo bem pegar a bebida numa ocasião como aquela, não fosse a cachaça ser de um despacho. E acham que a gente se intimidou com o santo? Que nada! A insolência falou mais alto. Afinal, estávamos indo para um show de rock, caramba! O NOSSO show de rock.

Foi realmente uma apresentação digna a que fizemos no Woodstock Bar. Com uma formação de guitarra, baixo, bateria, voz e backing vocals, abrimos, como numa homenagem àquela sexta-feira 13 maldita, com “A Marcha Fúnebre”, (sim: trata-se de "Sonata para piano Nº 2 em si bemol menor, Op. 35", de Chopin), que havíamos ensaiado bastante durante o dia, embasbacando quem assistia. Seguiram-se nossas músicas: “Ex”, “Grandes Lábios”, E Daí?”, “Clayton” e outras. Nossas músicas.

Voltando a memória para antes do show, lembro de minutos antes de entrar no palco – pela primeira vez. Senti aquele famoso frio na barriga que todo músico ou ator diz ter antes de começar o espetáculo. Dei mais uns goles na nossa cachaça enfeitiçada e, não sei por que cargas d’água, arranquei o lenço que eu levava na cabeça e o amarrei numa das pernas, logo acima do joelho. Depois, foi só transe. Dito assim, parece um ato infantil, sem propósito ou até irrelevante. Mas aquilo era rock, bebês. Dadas as devidas proporções (afinal, considerávamos os melhores do nosso território, mas não do planeta), é a pulseira de spike dos metaleiros; é a camiseta rasgada de Sid Vicious; é o figurino extravagante do Elton John; é o tênis All Star dos Ramones; é o crucifixo do Ozzy. Não é a música, mas faz parte. Afinal, rock não é só som: é atitude. É o momento em que se experencia algo transformador: deixa-se de ser somente a si próprio para se tornar, pelo menos por minutos, sua própria criação artística.

Com todo o cenário que se pintou, de perigos tanto do além quanto da vida real, posso afirmar que subir num palco é como ter a sua cabeça cortada e entregue numa bandeja para o público. Como no mito de Salomé, sedução e morte se amigam. É quase um milagre. Ou dá pra explicar de outra forma a voz do Clayton ter voltado perfeitamente na hora do show depois de emborcar a nossa aguardente magiada? Deus, ou melhor, o Diabo, pai do rock, fez-se presente naquele dia para ele tão especial para nos permitir que a nós também fosse. E foi.

Não eram muitos na plateia, certamente. Mas que quem esteve lá, viu uma verdadeira banda de rock, isso, viu. A melhor do Rio Grande do Sul da década de 90, o que muitos nunca souberam. Mas a gente, “hermenêuticos”, sem modéstia, sabemos que sim.



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Cachaça Poltergeist
por Cly Reis


Ninguém tocava grande coisa. Na verdade, a maioria de nós, LucioDaniel e Eu, o núcleo da Hímen Elástico, não tocava instrumento nenhum. Éramos quatro primos muito musicais e muito criativos, o que nos despertou o desejo de botar aquelas ideias musicais, às vezes muito doidas, em prática. E o meio para isso era ter uma banda. Mas como ter um grupo musical diante da situação já relatada da total inépcia instrumental dos integrantes? Ah, o Lucio, que era o único um pouco mais habilidoso tocaria contrabaixo, que era no que se saía melhor, um de seus grandes amigos, o Pereba, que tocava bateria pra diversas bandas, acrescentaria mais essa à sua lista, e eu, que tinha o desejo mas não a coordenação motora pra tocar, tinha uma guitarra que poderia servir para algum guitarrista que convidássemos e que se encaixasse. De resto, na falta de maiores talentos, todos os três restantes seriam vocalistas, ora fazendo backing-vocals, ora se alternando na voz principal, embora o posto, oficialmente, coubesse a mim, não por ser mais ter mais qualidades para tal mas, pelo contrário, exatamente por não saber fazer mais nada.
Ensaiávamos com alguma frequência, guitarristas iam e vinham no posto que nunca fora muito fixo, tínhamos um repertório interessante e consolidado e, a partir de determinado momento, começamos a ansiar por uma oportunidade de tocar em algum lugar. Numa dessas, o Lucio, que era o cara com mais contatos, mais atuação no underground de Porto Alegre e região, conseguiu um showzinho pra nós. Seria em Alvorada, um município próximo à capital, num pequeno festival, com umas quatro ou cinco bandas, num lugar chamado Woodstock Bar. O dia? Sexta-feira 13 de agosto.
Determinados a garantir um bom desempenho, uma apresentação digna, marcamos um ensaio extraordinário para o final da tarde do dia do show. O evento no bar começaria umas10h ou 11h da noite, faríamos nosso ensaio ali pelas seis da tarde, voltaríamos pra minha casa, comeríamos alguma coisa, sairíamos por volta das oito e ainda daria tempo tranquilamente. Nosso planejamento deu certo. Deu, em termos... O ensaio da tarde e, possivelmente, algum stress por ansiedade, levou embora minha voz. Me vi, a poucas horas do nosso momento mais importante, até então, sem a coisa que eu mais precisava naquela noite: a voz. Por sorte, pouco antes da nossa vez de subir no palco, um cara de uma outra banda, vendo a minha situação, recomendou que eu tomasse uma cachaça que era certo que minha voz voltaria. Não deu outra! Foi voltando, foi voltando e na hora do show, eu estava pronto.
Subimos ao palco exatamente à meia-noite da sexta-feira 13 (bom, tecnicamente, já seria dia 14, mas pra efeito da mística da ocasião, ganha mais efeito dramático se colocado assim). Pelo soturno da situação, abrimos os trabalhos com a "Marcha-fúnebre", mas já emendando com a nossa tradicional vinheta de abertura, "Carolina", que já desembocava na nossa eletrizante música de abertura, "Ex" e a partir daí foi só pancadaria. Um show bom, modéstia à parte, mas não apenas na minha opinião, uma vez que nosso som foi elogiado por integrantes de outras bandas e, de quebra, pela gatinha que eu estava azarando.
Numa noite tão envolta em elementos sombrios, uma sexta-feira caindo em13, início do show à meia-noite, marcha-fúnebre, voz indo e vindo e tudo mais, não é de se duvidar que um fato externo tenha influenciado todo o contexto daquela jornada. Ainda na nossa ida, assim que saímos da minha casa, no meu bairro, ao passarmos por uma encruzilhada, com um respeitável despacho, vasto, abastado, repleto de guloseimas, bebidas, pipocas, galinhas e tudo mais, um amigo da banda, o Tantã, sem nenhum temor, passou a mão numa garrafa de cachaça e tascou uma bela golada. O Pereba, não se fazendo de rogado, não hesitou e também caiu dentro da cachaça da macumba. Entre risos, zoeira e muita imaginação, fantasiando que as galinhas do despacho levantariam e nos perseguiriam reivindicando a oferenda roubada, seguimos dali para o local do show, no episódio que ficou conhecido entre nós como a "Cachaça Poltergeist".
Então, não é de se duvidar que, por trás de toda aquela noite mágica, mística, da própria cachaça que eu tomei no bar, estivessem agindo forças sobrenaturais, espíritos, entidades, orixás, que fizeram com que, no fim das contas, nos saíssemos bem dentro das nossas possibilidades e que tudo desse certo no lendário primeiro show da Hímen Elástico. 



Hímen Elástico - "Fita p/ Não Comprometer"