Estive no último final de semana, de feriadaço aqui no Rio, na simpática Teresópolis, na serra fluminense, e aproveitei para dar uma conferida do III Teresópolis Blues Festival que estaria rolando na cidade por aqueles dias. Evento muito bacana de fundo beneficente, cuja entrada era doação de alimentos, com boa infraestrutura de um modo geral, considerando o porte do evento. Ótimas opções gastronômicas com food-trucks variados, muita cerveja artesanal com diversos expositores de qualidade apresentando seus produtos e, é claro, muita música. Na quinta-feira, quando cheguei à cidade, só consegui ir assistir aos shows no final da tarde, pegando assim, ainda, o finalzinho da banda Belonave que fez um pop-rock competente apesar de um tanto óbvio e batido mas que serviu pra esquentar bem a galera. Na sequência, veio a boa RJ Café Band que fez tributo a dois grandes nomes do rock nacional, ambos com grande influência do blues em sua música: Cazuza e Celso Blues Boy. Números muito bem executados, chamando atenção, especialmente os de Cazuza pela semelhança do timbre do vocalista da RJ Café Band. No que diz respeito a Celso Blues Boys, se "Aumenta que isso aí é rock'n roll" levantou todo mundo, de outra feira, senti falta de "Mississipi", homenagem a Robert Johnson, ainda mais em um festival dedicado ao blues. Ouvi depois, de entreouvidos, que a produção teria impedido o bis da banda, por conta do atraso na programação, que provavelmente contemplaria a canção. Independente do quer tenha ocorrido, se o veto ou a ausência no set-list da banda, gostaria de tê-la ouvido lá, até pela relevância que tem dentro do contexto do blues produzido no Brasil e porque tenho certeza que seria muito bem executada, dada a competência e domínio que a banda demonstrou quanto ao repertório do bluesman brasileiro.
A RJ Café Band levou ao placo sucessos de Cazuza e Celso Blues Boy
Assim, um pouco atrasada, entrou no palco para fechar a noite a banda do músico norte-americano radicado no Brasil, Al Pratt, que do alto da experiência de seus longos cabelos brancos, só controlava tudo sentado à frente de órgão enquanto a meninada fazia o trabalho "pesado", mandando muito bem e a cantora convidada Camila Gobbi arrasava em interpretações contagiantes de soul, rock e rhythm'n blues.
Al Pratt, ao teclado, comandou sua banda, abrilahntada pelos vocais de Camila Gobbi
A sexta-feira foi, infelizmente, impraticável. A chuva impiedosa, constante e intensa, fez com que eu optasse por não ir ao evento que parecia, pela descrição dos artistas e de suas especialidades, muito interessante e promissor. Aliás, eu e mais um monte de gente, pois soube de um dos expositores que a presença de público acabara sendo bastante fraca. Mesmo com uma boa infra-estrutura, como destaquei, os poucos pontos cobertos no parque onde se realizava o festival, não teriam dado conta da chuva que batia lateralmente com o vento.
A Alphen, banda de Teresópolis, levantou o púlbico com seu metal de ótima qualidade.
Já no sábado, embora o tempo ainda não estivesse totalmente firme e confiável, pude voltar à praça da música de Teresópolis e de cara tive uma agradabilíssima surpresa. Cheguei por volta das 17 horas, e o que encontrei foi a banda Alphen, a única banda da cidade no line-up, que vigorosa e competente, despejou todo seu peso sobre a galera que respondeu com o mais alto entusiasmo e vibração a clássicos de todos os tempos do metal.
Os instrumentos à Bo Diddley da O Velho Bllues
Depois do êxtase causado pela Alphen, quem entrou foi a banda Corcel Mágico pra baixar a rotação e deixar tudo mais suave. Com ênfase no folk, o grupo, ainda que irretocável tecnicamente, na minha opinião poderia, para um festival, onde o público, queira ou não, é um tanto heterogêneo, ter escolhido um repertório um pouco mais popular, mais conhecido, de modo a arrebatar o público, ainda que, justiça seja feita, tenham tocado Simon and Garfunkel, Creedence, Raul, mas por outro lado, tenham executado muitas composições próprias que davam uma certa esfriada na platéia. Um Neil Young, um Dylan, um The Band, apesar de óbvios, teriam caído bem.
A noite de sábado fechou com a banda O Velho Blues, time azeitado da cidade de Petrópolis, também na serra do Rio de Janeiro, que com seus instrumentos atípicos quase rudimentares, usando caixas de charuto e uma tábua de lavar roupa fabricados pelo vocalista Bruno Fraga, ao contrário do que anunciava o nome, não tocava só os antigos nomes do blues, tendo executado "novos" clássicos de bluesman contemporâneos como Albert King, Stevie Ray Vaughan e Freddie King, mas sem deixar de lado, é claro, o bom e velho blues de mestres como Elmore James, Robert Johnson, Muddy Waters e outros. O show, que contou também com composições próprias da banda, esquentou a galera na noite fria de Teresópolis e manteve animação lá em cima.
Banda O Velho Blues
Saí de Teresópolis no início da tarde de domingo e, portanto, não pude ver os shows daquele dia, o último do festival, mas tenho certeza que, epal amostragem dos dias anteriores, mantiveram o ótimo nível do evento que me deixou com a melhor das impressões e com o sincero desejo de retornar nas próximas edições.
Apesar da chuva, quase todos os dias, o evento foi um sucesso e agradou ouvidos e paladares.
Dia desses, arrumando minha coleçãozinha de blues e topando com meus CD's de Muddy Waters e Howlin' Wolf acabei lembrando de um filme muito legal e que nenhum fã de blues pode deixar de assistir. Trata-se de "Cadillac Records, filme da diretora norte-americana Darnell Martin, que de forma apaixonante apresenta a formação do blues de Chicago nos anos 50 e a criação da Chess Records, selo que foi berço de grandes nomes do gênero contribuindo para a divulgação e popularização do estilo e de seus praticantes pelos Estados Unidos.
O filme centra-se mais na figura de Muddy Warters, sua descoberta, sua ascensão, seu sucesso e seus conflitos amorosos e musicais, mas também destaca Howlin' Wolf e sua rivalidade com Muddy; um neguinho chamado Chuck Berry que misturava blues com "música de brancos", o alcoolismo do gaitista Little Walter e seu estilo inovador no instrumento e no estúdio; o talento e o affair de Etta James, com o chefe, Leonard Chess; e até um certo grupo inglês chamado Rolling Stones.
"Cadillac Records tem momentos tristes, alegres, divertidos, emocionantes, trágicos e conta com interpretações extremamente competentes como a de Jeffrey Wright como Muddy, intensas como a de Eammon Walker na pele de Wolf, e surpreendentes como a de Beyoncé (olha só!) vivendo Etta James. Adrien Brody é que está meio insosso como Leonard Chess mas nada que seja suficiente para fazer alguém não gostar do filme por causa disso.
Mas e o Cadillac? O que é que o Cadillac tem a ver com tudo isso? Foi o presente de Chess para Muddy, seu primeiro contratado, assim que alcançaram o primeiro grande sucesso. Depois disso todos que emplacavam um grande hit passaram a querer o seu. Tornara-se uma tradição na gravadora e aí só dava "crioulo" transitando de Cadillac nas barbas da sociedade racista dos anos 50. Teriam que engolir a "negrada". Ah, teriam. E aquilo era só o início.
É interessante... Devo admitir que comprei esse disco por causa da capa. Estava numa dessas feiras de vinil fuçando na seção de jazz e blues e dei de cara com esse com um negão empunhando uma guitarra na capa. Pinta de blueseiro invocado, dos bons. Vou levar. Alguma coisa de bom devia sair daquela guitarra. Ouvi o disco e percebi o tamanho da sorte da minha escolha ao acaso. Um baita disco de blues. Já contemporâneo, mais elétrico, mais pesado mas totalmente dentro da melhor linha dos grandes músicos do gênero. Depois, buscando informações sobre o produto que comprara é que fui saber das qualificações do guitarrista. Freddie, um dos três "Kings" do blues junto com B.B. King e Albert King, fez parte da grande cena do blues de Chicago dos anos 50, tendo tocado com Willie Dixon, Robert Lockwood Jr., e o gaitista Little Walter, entre outros e, apesar da rejeição da Chess Records, que o considerava muito parecido com B.B. King, aos foi poucos conquistando seu próprio espaço ganhando reconhecimento de grandes nomes do universo musical. King foi considerado pela revista Rolling Stone o 15º melhor guitarrista de todos os tempos e sua marca registrada era o jeito de pendurar a alça da guitarra, sem cruzá-la, apoiada no ombro do mesmo braço com que tocava.
"Getting Ready..." é um belo exemplar do blues de Chicago evoluído com o passar do tempo, adaptado a seu tempo, no caso, o início dos anos 70. Mais rock'n roll, mais pesado e com uma dose de psicodelia. A melancólica "Same Old Blues" que abre o disco tem uma pegada gospel; a versão de "Dust My Broom" de Elmore James é espetacular; "Five Long Years", outro clássico, também tem execução impecável; e "Walking by Myself" é outro grande momento.
Mas a grande música do disco é mesmo "Going Down", um blues forte, intenso, tão encorpado e vigoroso que chega às raias do rock muito próximo ao som que Jimi Hendrix vinha fazendo e que o próprio mestre Muddy Waters havia experimentado em "Electric Mud".
"Palace of the King" que fecha o disco é outra com pegada mais rock, ao melhor estilo Eric Clapton, com quem por sinal, Freddie excursionaria ainda antes de sua morte prematura aos 42 anos.
********************* FAIXAS: 1. Same Old Blues (Don Nix) 2. Dust My Broom (Elmore James ) 3. Worried Life Blues (Big Maco) 4. Five Long Years (Eddie Boyd) 5. Key To The Highway (Bill Broonzy, Charles Segar ) 6. Going Down (Don Nix) 7. Living On The Highway (Don Nix, Leon Russell)
8. Walking By Myself (Lane) 9. Tore Down (Freddie King) 10. Palace Of The King (Don Nix, Donald "Duck" Dunn, Leon Russel)
Quando assisti ao ótimo bluesmanKenny Neal em São Paulo mês passado pensei que aquele breve mas impecável show
fosse uma compensação por não poder ir ao Mississipi
Delta Blues Festival, que ocorreria dali a semanas na cidade gaúcha de
Caxias do Sul. Mas era, na verdade, um bom presságio. Tal sentimento se dava
por um misto de falta de disponibilidade e a possibilidade de se fazer outra
boa programação mais próxima – e mais fácil. É que teria também o festival Som
de Peso, que ocorreria em Porto Alegre justamente no mesmo dia e hora e onde
tocariam bandas célebres do punk nacional, como Cólera e Olho Seco, e, além
destas, a Vômitos & Náuseas, a grande banda de hardcore do meu primo Lucio Agacê. Dúvida cruel. Depois de muita
combinação, tive que suplantar a vontade de ir ao Som de Peso, pois conseguimos Leocádia e eu nos organizar para subir a Serra e conferir pela primeira vez o
MDBF, vontade alimentada há anos.
Stroger, comandando o grupo no baixo.
E o esforço não poderia ter sido mais bem recompensado. Com uma
programação cuidadosa e qualificada, tanto no que se refere a atrações
internacionais quanto nacionais, além de uma estrutura planejada e eficiente, o
MDBF, em sua 8ª edição, provou (pelo menos a nós, que ainda não o conhecíamos)
que é o melhor festival de música do Rio Grande do Sul do momento. Prova disso
é que o dia em que fomos, o terceiro e último da edição de 2015, não por isso
ficou devendo. Dividido em sete palcos, o festival apronta um rodízio de
apresentações dos artistas por vários destes durante os três dias de evento,
fazendo com que se possa assisti-los em mais de uma oportunidade. Igualmente, o
local não poderia ser mais adequado: a antiga estação férrea de Caxias, prato
cheio para Leocádia fazer várias fotos pois empresta uma atmosfera onírica àquela
sonoridade melancólica, antiga e sensual típica do blues. A chuva que caía
ajudou a aumentar o clima cinematográfico.
Bob Stroger posando para as lentes.
O blues rolava por todos os cantos, dos alto-falantes, dos palcos, das
pessoas cantando, assobiando, dançando. Chegava a emanar de algumas figuras que
ali estavam. Um desses seres iluminados era Bob Stroger, o incrível baixista californiano de (acredite-se) 85
anos. Stroger, que havia estado em Porto Alegre na semana anterior – e que, novamente
por agenda e correria, não pudera assistir –, foi um dos principais motivos de
irmos ao MDBF. Artista “residente” do festival, participou de todas as edições
deste até agora, o que certamente continuará fazendo até não poder mais, haja
vista seu prazer em estar ali. Ele dizia, faceiro: “This is my house”. Um dos primeiros a se apresentar naquele dia, ele
referia-se não somente a Caxias e ao festival como ao Front Porch Stage, um
caracterizado palco que reproduzia o ambiente de uma sacada de um rancho do Sul
norte-americano, aquelas que a gente vê em filmes sobre negros pobres e
trabalhadores de fazendas de algodão de antigamente. Para alguém como ele, do
início do século passado, certamente aquilo era bem familiar. Estava se
sentindo em casa mesmo, acarinhado e admirado pelo público.
Cokeyne, à direita, e sua banda de ilustres convidados.
Na verdade, Stroger fazia o ambiente se tornar real, visto que ele em
si é uma entidade em pleno palco. De terno risca de giz escuro, sapatos e
chapéu, é a encarnação daquilo que o mundo conheceu no início do século XX chamado
blues, o gênero musical afro-americano que coloca, em ritmo sincopado,
repetitivo e simples, os sofrimentos e tristezas dos negros escravos e
apartados de sua terra. Blues, com suas raízes religiosas, de trabalho ou de protesto.
Um estado de espírito. E Bob Stroger é a representação viva disso. Ele mesmo,
orgulhoso, diz várias vezes: “I’m the
blues”. Quem há de contrariá-lo? Entre as maravilhas que escutamos de sua
voz sôfrega, mas com o aveludado que somente os negros de lá conseguem ter,
“Just a Sad Boy”, “Talk to me Mamma”, “Don't You Lie to Me” e uma canção que,
além de fantástica, se tornaria especial naquela noite: “Blind Man Blues”,
autoria do próprio Stroger. Um bluesão embalado num riff de baixo contínuo e cheio de groove, que lhe põe naquele limiar entre o blues e o rock. Esta, comporia
outro episódio importante horas depois...
"Don't You Lie To Me" - Bob Stroger - Mississipi Delta Blues Festival 2015
Sherman Lee Dillon, pura energia.
Tinham mais coisas a se aproveitar ainda. Noutro palco, o Bus Stage,
iriamos conferir o nosso amigo Cokeyne Bluesman (Beto Petinelli,
ex-Cascavelletes), que havia reunido uma galera especial para uma das
apresentações. E olha: que apresentação! Disparado a mais empolgante da noite e
que, mesmo não estando num dos palcos principais, ensandeceu o público que
assistia. Que energia que saída dali, a ponto de as pessoas serem tomadas por
ondas de euforia, respondidas pelos músicos e vice-versa. A química foi precisa:
Cokeyne, referencial na guitarra solo e slide
guitar; Lucas Chini, no baixo, um cabeludo psicodélico e tomado pela música
que parecia ter se congelado no tempo, pois era tal um integrante de banda de
rock-blues dos anos 60, uma Canned Heat ou The Band; e o norte-americano
Sherman Lee Dillon, de quem se pode dizer apenas uma coisa: nossa! Aquele
velhinho branco de camisa, calça social e quepe poderia ser, como bem Leocádia
observou, o vendedor da banca da esquina ou o dono da tabacaria. Só que quando
empunha a guitarra, sai de perto! É um furação em forma de blues.
Na bateria, Gutto Goffi.
Melhor amigo do saudoso B.B. King, Dillon, natural do Mississipi, mostrou
ser um genuíno seguidor de Muddy Waters e Bo Diddley. Com sua harmônica e sua
guitarra de metal, parecido com um banjo elétrico, ele incendiou o pequeno
palco, pondo todo mundo pra se mexer. Uma das mais quentes foi a versão de
“Maybelline”, clássico de Chuck Berry, que tocaram numa versão tão eletrizante
quanto. Além disso, quem completava a banda na bateria era Guto Goffi, o
baterista do Barão Vermelho, que estava ali animadíssimo tocando o que gosta e
sem todo o aparato e multidões de que é acostumado. Cokeyne, o anfitrião,
também não deixou por menos. Com solos arrebatadores, levantou a galera várias
vezes, mesmo sem cantar como Dillon. Ainda teve a palhinha do músico gaúcho Andy
Serrano, na gaita, o mesmo da banda de rockabilly que vimos anos atrás no Clube de Jazz Take Five, em Porto Alegre. Um empolgante e surpreendente show.
'Super Chikan' no palco principal do MDBF.
Entre uma programação e uma paradinha para comer, deu tempo de ver, no
Moon Stage, palco principal, um bom pedaço da apresentação de outra das também principais
atrações do MDBF desse ano: o norte-americano James "Super Chikan"
Johnson, mais um filho do Mississipi. Outro arraso. O cara, que ganhou esse
apelido na infância, quando ainda era jovem demais para trabalhar no campo e
passava o seu tempo conversando com as galinhas, começou tocando o diddley bow, instrumento muito
rudimentar que o ajudou a desenvolver sua capacidade de extrair sons de uma só
corda. Essa forma de tocar é evidente em seu estilo, que aproveita ao limite
uma sequência de notas, sempre com muito groove.
Isso sem falar do característico grito que lança entre uma execução e outra
imitando o cocoricó das galinhas com quem tanto conversava quando criança.
Eu com Rip Lee Pryor.
Voltando ao Front Porch Stage, pena que não deu tempo de assistir um
pouquinho de outra lenda: o harmonicista Rip Lee Pryor (filho de Snooky Pryor),
que ainda estava passando som e o pito na equipe técnica, que não acertava o
que ele pedia. Na mesma hora – essas coincidências são inevitáveis, ainda mais
para que foi em apenas um dos dias como nós – subiria no Magnolia Stage outra
das que nos motivaram bastante a escolher por essa e não outra programação: a
cantora Zora Young. Igualmente produto do Delta do Mississipi, é daqueles
vários artistas de blues cujas famílias, depois da 2ª Guerra, migraram para
Chicago em busca de novas oportunidades. Criada dentro das igrejas gospel, foi
tomando com o passar do tempo gosto pelo Rhythym
n' Blues a ponto de não o largar mais. A explicação talvez esteja no
sangue: Zora tem em sua árvore genealógica uma das lendas do blues, Howlin' Wolf. No festival, ela mandou ver num show pulsante e dançante, com sua
poderosa voz rouca muito trabalhada nos corais religiosos e nos pubs de blues. Interagindo com a
plateia, Zora e sua banda fizeram um espetáculo daqueles que não dá vontade de
sair mais (tanto que, quando vimos, já tinha acabado o de Pryor), com
repertório de primeiríssima qualidade, solos afiadíssimos e, claro, a
excelência da voz de Zora.
A divina cantora de raízes gospel e rythm'n blues,
Zora Young e o privilégio de ter na banda Stroger, ao fundo.
Mas por falar na banda de Zora Young, aqui vai aquela parte que havia
ficado faltando sobre “Blind Man Blues”, de Bob Stroger. Aconteceu que, com
receio de que sobrasse para nós algum daqueles esporros de Rip Lee Pryor com a
equipe, saímos logo do Front Porch Stage e chegamos minutos antes para assistir
Zora. Porém, para nossa surpresa quem sobre no palco são três músicos mais...
Bob Stroger! ”Ué, será que mudaram o lugar
do show dela?”, pensamos. Fomos perguntar a um rapaz do staff e ele nos confirmou que era ali,
sim, o show da cantora. Pois não é que Stroger, nos seus já mencionados (mas
que não custa relembrar) 85 anos foi, horas depois de ter aberto o festival, formar
a banda de Zora Young? Na maior simplicidade e humildade. Coisa de músico de
verdade. Já no final da noite, ele abriu com a mesma música que já tinha tocado
no outro palco para depois tocar, como apenas mais um integrante, mais uma hora
e meia – sem se sentar nem pedir água. Pelo contrário: no centro do palco,
estava lá ele postado, elegante em seu terno risca de giz e chapéu,
abrilhantando ainda mais o show da companheira de blues.
"The Thrill Is Gone"/ "I'm Freee" - Zora Young - Mississipi Delta Blues Festival 2015
Foi o próprio Bob Stroger que disse se sentir em casa. Sentimento
compartilhado com muita gente ali, entre músicos e espectadores, que fazem o
MDBF crescer a cada ano, sempre com a expectativa pela edição seguinte. Eu
mesmo já estou me vendo, lá em novembro de 2016, cantando para convencer
Leocádia: “Oh, baby, don't you want to
go? Back to the land of Caxias do Sul/ To my sweet
home, festival?”
Para não deixar passar em brancas nuvens: agradabilíssima surpresa o filme "Straight Outta Compton, a História do N.W.A". O filme, produzido por Dr. Dre, Ice Cube e pela viúva de Eazy-E (os criadores do N.W.A, ao lado de DJ Yella e MC Ren) estreou em agosto nos Estados Unidos e tá indo tri bem em crítica e bilheteria.
A história dos precursores do "gangsta rap" norte-americano é contada de maneira envolvente, sem muitos clichês e com atuações muito consistentes – especialmente a do filho do Ice Cube, que interpreta o próprio pai, e do sempre bom Paul Giamatti, que faz o empresário da banda. Mesmo quem não é chegado na música pode assistir, pois o filme traz um belo retrato e contexto da época, com as sempre pertinentes questões envolvendo a relação polícia x nigazz.
Confesso que faltou um espaço, ainda que mínimo, para apresentar Run-DMC e Body Count – outras duas bandas que revolucionaram essa "cena black" no fim dos 80 e começo dos 90 –, mas as breves menções ao surgimento de 2Pac e de Snoop Dogg são muito bacanas, lembrando um pouco os Rolling Stones gravando na Chess Records, assistidos por Muddy Waters, no genial “Cadillac Records”. F*&;#k tha Police!
Os atores que interpretaram a banda
precursora do gangsta rap, o N.W.A.
"Seus olhos se iluminavam e você podia ver as veias se incharem no seu pescoço e, irmão, sua alma inteira se concentrava naquela canção. Ele cantava com a danada da alma." Sam Phillips, da gravadora Sun Records, descrevendo Howlin' Wolf
Um uivo de lobo.
Uma voz potente.
Um homem transfigurado em animal no estúdio.
Assim era Chester Arthur Burnett, mais conhecido como Howlin' Wolf, um dos maiores nomes do blues de todos os tempos. Artista de admiráveis qualidades vocais, exímio manejo da guitarra e performances arrasadoras em shows, Wolf que começara na Sun, gravadora que revelou Elvis Presley, teve, no entanto, seu período de maior sucesso pelo famoso selo Chess, de Chicago, curiosamente levado pelas mãos do, sabidamente um arquirrival, Muddy Waters.
Rivalidades à parte, cada um com seus talentos, muitos diga-se de passagem, havia espaço para os dois na Chess. A maioria dos músicos do staff da gravadora gravavam as canções do baixista da casa e compositor Willie Dixon, mas poucos como Wolf tiraram tanto proveito desta parceria. Saíram das maos de Dixon alguns dos maiores sucessos de Howlin' Wolf e diga-se de passagem, em contrapartida, são dele algumas das melhores interpretações das músicas de Dixon.
Wolf já havia gravado um disco desde sua chegada à Chess mas que ainda trazia heranças da Sun Records, sua antiga gravadora, e contava apenas com as composições do próprio cantor, mas foi com o disco conhecido popularmente como "The Rockin' Chair Blues" que Wolf alçou voo definitivamente no universo do blues muito em função das composições de Dixon e de seu dedo na produção.
O disco abre com a excitante "Shake For Me", uma incitação à libido e já traz na sequência o clássico "The Red Rooster" cantado de maneira arrastada por Wolf com o acompanhamento de por uma slide guitar matadora do próprio cantor. A música ganharia inúmeras versões posteriores, nas quais ganharia o diminutivo pela qual é mais conhecida ("Little"), dentre elas a suingada de Sam Cooke, a suja do Jesus and Mary Chain e a maliciosa dos Rolling Stones.
"Who's Been Talkin'", um blues lento, quebrado com um toque latino é uma das duas, apenas, de autoria do próprio cantor no disco, e ""Wang Dang Doodle", que a segue é pegada, cheia de embalo, com uma guitarra vibrante e um refrão contagiante.
Outra que já foi regravada incontáveis vezes, por Etta James, Who, pelo Cream de Eric Clapton, mas que tem na versão deste blueseiro do Mississipi, a primeira, diga-se de passagem, uma de suas melhores interpretações, é a magnetizante "Spoonful", mais uma das obras-primas de Dixon imortalizada pelo vocal singular do Lobo.
Na chorosa "Going Down Slow" onde o vocalista praticamente apenas declama a letra, o que destaca-se mesmo, desde a introdução martelada, é o piano; já em "Back Door Man", Howlin' Wolf retoma o protagonismo e encarna o personagem soltando ganidos arrepiantes numa canção que é uma espécie de assombração sensual e sedutora e que cuja versão, talvez, mais conhecida seja a da banda The Doors gravada logo em seu álbum de estreia.
Bem ritmada, embalada, impetuosa, "Howlin' for My Baby" (que também é conhecida com a variação de "... My Darling"), talvez a melhor tradução da fusão de estilos do blues do Delta para o de Chicago, encaminha com grandiosidade o final do disco para que "Tell Me", a outra composição de autoria de Wolf no disco, um gostosíssimo blues com uma levada apaixonante de harmônica se encarregue de fechar de forma magistral.
Um daqueles caras para o qual a alcunha lenda do blues cabe perfeitamente, ainda mais reforçada pelo nome sugestivo que carregava, pelas performances insanas no palco, pelo feitiço que impunha às mulheres e pelos uivos quase animalescos que emitia em suas interpretações. Seria aquela figura na verdade uma criatura entre o home e o lobo? Teria ele, como o outro legendário Robert Johnson, feito algum pacto sinistro cujo preço seria que dividisse sua forma entre o humano e o bestial, metamorfoseando-se depois de determinada hora, em determinados dias, em dada fase lunar? Ficaria ele assim, mesmo em sua forma humana com traços do animal o que explicaria seus grunhidos, uivos e rosnados característicos e sua forma gigantesca e quase gutural? Bobagem, bobagem. Mas, ei... Alguém aí ouviu um uivo?
********************** FAIXAS:
"Shake for Me" – 2:12
"The Red Rooster" – 2:22
"You'll Be Mine" – 2:25
"Who's Been Talkin'" (Howlin' Wolf) – 2:18
"Wang Dang Doodle" – 2:18
"Little Baby" – 2:45
"Spoonful" – 2:42
"Going Down Slow" (St. Louis Jimmy Oden) – 3:18
"Down in the Bottom" – 2:05
"Back Door Man" – 2:45
"Howlin' for My Baby" – 2:28
"Tell Me" (Howlin' Wolf) – 2:52
* todas as faixas compostas por Wilie Dixon, exceto as indicadas
É pura mentira, mas se um dia Elvis Presley refletisse sobre o seu legado para o futuro do rock ‘n’ roll,
ele almejaria que se criasse um som de raiz, usando instrumentações e timbres
típicos do rock genuíno, porém que se evoluísse naquilo que fizeram precursores
como ele, Little Richard, Jerry Lee Lewis, Johnny Cash, Chuck Berry e cia.. A música ambicionada pelo Rei haveria de conter, além desses predicados, melodias
belas e bem elaboradas, referenciando não apenas a ele e seus companheiros de primeiros
anos, mas a outras vertentes que o rock ganharia a partir de então – o country-rock, o punk, o hard-rock, a new wave, o folk-rock, o shoegaze.
Ah! E também não abriria mão de ser uma música bem tocada e bem cantada, com um
vocal afinado e de timbre apreciável (consciente, dispensaria que fosse
necessariamente o vozeirão dele).
Até que, 40 anos depois de inaugurar o estilo mais subversivo, popular
e eletrizante da história da música, Elvis, do auge do seu trono em que se
senta lá em cima, veria os rapazes da Grant
Lee Buffalo lançarem seu primeiro disco: “Fuzzy”. Estava ali o que ele esperava! Pondo o vinil pra tocar em seu toca-discos
celeste, os primeiros sons que Elvis ouviria são de uma introdução ligeira da
bateria na caixa com escovinhas, herdada do jazz
swing e ao estilo do rock que ele inventara. “Que beleza! É isso aí, rapaziada!”, vibrou. Ele está escutando “The
Shining Hour”, um rockabilly matador em
que a banda de Los Angeles liderada por Grant Lee Phillips – juntamente com Paul
Kimble, baixo, e Joey Peters, nas baquetas – apresenta de cara as qualidades
que fazem de “Fuzzy” o disco que é: a influência direta do blues, a prevalência
da sonoridade acústica, simplicidade nos arranjos (não há nenhum sopro ou
cordas de orquestra) e o espírito desafiador do bom e velho rock ‘n’ roll. Embalada, “The Shining
Hour” conta ainda com um piano, como a letra diz, saído de um “salão de
bilhar azul de Monterey”, que sola lá pelo meio e ainda a desfecha numa
nota grave e impositiva.
Em “Jupiter and Teardrop”, balada lindíssima em que Phillips, se já
tinha mostrado suas habilidades vocais na primeira faixa, aqui, ele
impressiona. Principalmente nos momentos de maior emotividade, a qual a canção
vai ganhando à medida que se desenrola. Esse clima é ampliado pelas guitarras
que, rosnantes, aparecem pela primeira vez no disco para comporem junto com a
base do violão 12 cordas um clima carregado e melancólico. A letra acompanha a
sonoridade, contando a triste história de um casal cujo rapaz, Teardrop, encrencado
com a polícia, está prestes a ser preso novamente, forçando a distanciar-se de
sua Jupter. ”Apenas uma garota que não
pode dizer não/ E seu namorado em liberdade condicional/ Seus pais lhe deram o
nome de Jupiter/ Para abençoá-la com uma alma de sorte/ Ele é um garoto que
nunca chorou/ Quando eles o prenderam lá dentro/ E ela o apelidou de ‘Lágrima’/
Para fazer uma tatuagem de seu olho.” Ela sonha com filhos e casamento, mas
teme que o pior aconteça antes do esperado: “O
telefone toca/ É para ela/ ‘Tenho que ver você, Jupiter’/ ‘Estou com problemas
com a lei’/ ‘Traga minha calibre 38’.” Uma crônica urbana romântica e de
final trágico.
Talvez a melhor da banda, se não, seu maior sucesso – o que para um
grupo alternativo como eles é algo considerável –, a faixa-título é outra
balada com estrutura semelhante à anterior (base no violão, guitarras
intensificando o clima semiacústico, tom tristonho), visto que ganha
emotividade conforme avança. “Fuzzy”, no entanto, traz um refrão absolutamente
tocante, em que Phillips, mais uma vez explorando suas qualidades de canto,
lança falsetes para dizer com sentimento: “I've
been lied to/ Now I'm fuzzy” (“Eu tenho mentido/ Agora estou confuso”). Em
seguida, “Wish You Well”, com uma base de guitarra bem interessante, é mais
pesada mas sem deixar de ser bastante melodiosa. Realce para a interessante
linha de bateria, forjada em pequenos rolos no surdo com a caixa.
“The Hook”, totalmente acústica, é uma bela canção em que tudo funciona
com perfeição: violão de cordas de aço, baixo acústico, bateria nas escovinhas
e a voz ora deslizante ora impregnada de Phillips. Outro destaque do disco é “Soft
Wolf Tread”, que inicia só na voz e frases do violão para, em seguida, explodir
em peso e fúria. Assim é também “America Snoring”: melodiosa mas permeada pela
distorção das guitarras e por uma bateria alta, pericialmente amplificada na
produção assinada pelo próprio Kimble.
O piano estilo country volta
na excelente “Dixie Drug Store” em que, por óbvio, homenageia o bluesman Willie Dixon mas, igualmente,
referencia a ligação intrínseca que o blues tem com a música folk, tal como outro bluesman, Muddy Waters, fizera no
clássico “Folk Singer”, de 1959 – disco em que, não coincidentemente, Dixon
produz e toca. Aqui, Phillips manda ver mais uma vez nos falsetes, os quais
incorpora de forma muito natural ao próprio timbre. Com essa, Elvis deve ter
ficado arrepiado. “Stars n' Stripes”, delicada, é talvez a mais fraca do álbum,
o que nem de longe tira a graça do trabalho como um todo.
E é justamente essa característica que desfecha “Fuzzy”: graça. Afinal,
“Grace”, penúltima faixa, seguindo o mesmo conceito de “The Hook”, que revela a
leveza d’”a rocha”, contrariamente, traz agora a densidade da “clemência”. Imagino
que para alguém que morava numa mansão chamada Graceland deve ter sido uma
feliz surpresa ouvir esse tema. “You Just Have to be Crazy”, baixando novamente
os ânimos, finaliza o álbum com a mesma pegada acústica e doce já apresentada
em vários momentos. A bela letra que diz: “Você
apenas tem que ser louco, não você/ Você apenas tem que estar fora de sua
mente/ Você apenas tem que ser louco, não você/ Você apenas tem que ser/
Verdade ou não/ Verdade ou não.”
Com todo respeito que tem a seus súditos Neil Young, Bob Dylan, John Lennon, Raul Seixas, Robbie Robertson, Jimmy Page, Elton John, Renato Russo, Elvis Costello, Johnny Thunders e mais centenas e centenas de roqueiros e
não-roqueiros mundo afora, Elvis Presley – na minha invencionice apaixonada –,
deu seu troféu para a Grant Lee Buffalo por “Fuzzy”. Foi neste disco que ele
identificou aquilo que imaginava que sua música um dia chegaria a ser:
sofisticada mas popular e pungente. Dá pra enxergar Elvis tirando dos ouvidos
seu fone dourado, recostando-se no trono e dizendo emocionado: “Muito bem, rapazes! Aprenderam direitinho. Obrigado”.
E chegamos ao ducentésimo Álbum Fundamental aqui no clyblog .
Quem diria, não?
Quando comecei com isso ficava, exatamente, me perguntando
até quantas publicações iria e hoje, pelo que eu vejo, pelos grandes discos que
ainda há por destacar, acredito que essa brincadeira ainda possa ir um tanto
longe.
Nesse intervalo do A.F.
100 até aqui, além, é claro, de todas as obras que foram incluídas na
seção, tivemos o acréscimo de novos colaboradores que só fizeram enriquecer e
abrilhantar nosso blog. Somando-se ao Daniel Rodrigues,
Edu Wollf , Lucio Agacê e José Júnior,
figurinhas carimbadas por essas bandas, passaram a nos brindar com seus
conhecimentos e opiniões meu amigo Christian Ordoque
e a querida Michele
Santos, isso sem falar nas participações especiais de Guilherme Liedke, no número
de Natal e de Roberto Freitas, nosso Morrissey cover no último post, o de número 200.
Fazendo uma pequena retrospectiva, desde a primeira
publicação na seção, os ‘campeões’ de ÁLBUNS
FUNDAMENTAIS agora são 5, todos eles com 3 discos destacados: os Beatles,
os Rolling
Stones, Miles
Davis , Pink
Floyd e David
Bowie , já com 2 resenhas agora aparecem muitos, mas no caso dos
brasileiros especificamente vale destacar que os únicos que tem um bicampeonato
são Legião
Urbana, Titãs,
Caetano
Veloso, Gilberto
Gil, Jorge
Ben, Engenheiros
do Hawaii e João
Gilberto, sendo um deles com o músico americano Stan Getz. A propósito de
parcerias como esta de Getz/Gilberto,
no que diz respeito à nacionalidade, fica às vezes um pouco difícil estabelecer
a origem do disco ou da banda. Não só por essa questão de parceiros mas muitas
vezes também pelo fato do líder da banda ser de um lugar e o resto do time de
outro, de cada um dos integrantes ser de um canto do mundo ou coisas do tipo.
Neste ínterim, nem sempre adotei o mesmo critério para identificar o país de um
disco/artista, como no caso do Jimmi
Hendrix Experience, banda inglesa do guitarrista norte-americano, em que
preferi escolher a importância do membro principal que dá inclusive nome ao
projeto; ou do Talking
Heads, banda americana com vocalista escocês, David Byrne, que por mais que
fosse a cabeça pensante do grupo, não se sobrepunha ao fato da banda ser uma
das mais importantes do cenário nova-iorquino. Assim, analisando desta forma e
fazendo o levantamento, artistas (bandas/cantores) norte-americanos apareceram
por 73 vezes nos ÁLBUNS
FUNDAMENTAIS, os ingleses vem em segundo com 53 aparições e os brasileiros
em, 3º pintaram 36 vezes por aqui.
Como curiosidade, embora aqueles cinco destacados
anteriormente sejam os que têm mais álbuns apontados na lista, o artista que
mais apareceu em álbuns diferentes foi, incrivelmente, Robert Smith do The Cure, por 4 vezes,
pintando nos dois da própria banda ("Disintegration"e "Pornography"),
em um tocando com Siouxsie
and the Bansheese outra vez no seu
projeto paralelo do início dos anos ‘80, o The
Glove. Também aparece pipocando por aqui e por ali John Lydon, duas vezes
com o PILe uma com os Pistols;
Morrissey,
duas vezes com os Smiths e
uma solo; Lou Reed uma vez com o Velvet e outras duas solo; seu parceiro de Velvet underground, John Cale uma com a banda e outra solo; Neil
Young , uma vez solo e uma com Crosby,
Stills e Nash; a turma do New Order em seu "Brotherhood"
e com o 'Unknown
Pleasures" do Joy Division; e Iggy Pop 'solito' com seu "The Idiot" e com os ruidosos Stooges. E é claro, como não poderia deixar de ser,
um dos maiores andarilhos do rock: Eric Clapton, por enquanto aparecendo em 3 oportunidades,
duas com o Cream
e uma com Derek
and the Dominos, mas certamente o encontraremos mais vezes. E outra pequena particularidade, apenas para constar, é que vários artistas tem 2 álbuns fundamentais na lista (Massive Attack, Elvis, Stevie Wonder, Kraftwerk) mas apenas Bob Dylan e Johnny Cash colocaram dois seguidos, na colada.
No tocante à época, os anos ‘70 mandam nos A.F. com 53 álbuns;
seguidos dos discos dos anos ‘80 indicados 49 vezes; dos anos ‘90 com 43 aparições;
40 álbuns dos anos ‘60; 11 dos anos ‘50; 6 já do século XXI; 2 discos destacados dos
anos ‘30; e unzinho apenas dos anos ‘20. Destes, os anos campeões, por assim
dizer são os de 1986, ano
do ápice do rock nacional e 1991, ano do "Nevermind"
do Nirvana, ambos com 10 discos cada; seguidos de 1972, ano do clássico "Ziggy
Stardust" de David Bowie, com 9 aparições incluindo este do Camaleão; e
dos anos do final da década de ‘60 (1968 e 1969) cada um apresentando 8 grandes
álbuns. Chama a atenção a ausência de obras dos anos ‘40, mas o que pode ser,
em parte, explicado por alguns fatores: o período de Segunda Guerra Mundial, o
fato de se destacarem muitos líderes de orquestra e nomes efêmeros, era a época
dos espetáculos musicais que não necessariamente tinham registro fonográfico, o
fato do formato long-play ainda não ter sido lançado na época, e mesmo a
transição de estilos e linguagens que se deu mais fortemente a partir dos anos
50. Mas todos esses motivos não impedem que a qualquer momento algum artista
dos anos ‘40 (Louis Armstrong, Ella Fitzgerald, Cole Porter) apareça por aqui
mesmo em coletânea, como foi o caso, por exemplo, das remasterizações de Robert
Johnson dos anos ‘30 lançadas apenas no início dos anos 90. Por que não?
Também pode causar a indignação aos mais 'tradicionais', por assim chamar, o fato de uma
época tida como pobre como os anos ‘90 terem supremacia numérica sobre os
dourados anos 60, por exemplo. Não explico, mas posso compreender isso por uma
frase que li recentemente de Bob
Dylan dizendo que o melhor de uma década normalmente aparece mesmo, com
maior qualidade, no início para a metade da outra, que é quando o artista está
mais maduro, arrisca mais, já sabe os caminhos e tudo mais. Em ambos os casos,
não deixa de ser verdade, uma vez que vemos a década de 70 com tamanha vantagem
numérica aqui no blog por provável reflexo da qualidade de sessentistas como os
Troggs
ou os Zombies,
por exemplo, ousadia de Sonics, Iron Butterfly,
ou maturação no início da década seguinte ao surgimento como nos caso de Who
e Kinks.
Na outra ponta, percebemos o quanto a geração new-wave/sintetizadores do
início-metade dos anos ‘80 amadureceu e conseguiu fazer grandes discos alguns
anos depois de seu surgimento como no caso do Depeche
Mode, isso sem falar nos ‘filhotes’ daquela geração que souberam assimilar
e filtrar o que havia de melhor e produzir trabalhos interessantíssimos e
originais no início da década seguinte (veja-se Björk,
Beck, Nine
Inch Nails , só para citar alguns).
Bom, o que sei é que não dá pra agradar a todos nem para
atender a todas as expectativas. Nem é essa a intenção. A idéia é ser o mais
diversificado possível, sim, mas sem fugir das convicções musicais que me
norteiam e, tenho certeza que posso falar pelos meus parceiros, que o mesmo
vale para eles. Fazemos esta seção da maneira mais honesta e sincera possível, indicando
os álbuns que gostamos muito, que somos apaixonados, que recomendaríamos a um
amigo, não fazendo concessões meramente para ter mais visitas ao site ou atrair
mais público leitor. Orgulho-me, pessoalmente, de até hoje, no blog, em 200
publicações, de ter falado sempre de discos que tenho e que gosto, à exceção de
2 ou 3 que não tenho em casa mas que tenho coletâneas que abrangem todas as
faixas daquele álbum original, e de 2 que sinceramente nem gostava tanto mas
postei por consideração histórica ao artista. Fora isso, a gente aqui só faz o
que gosta. Mas não se preocupe, meu leitor eventual que tropeçou neste blog e
deu de cara com esta postagem, pois o time é qualificado e nossos gostos
musicais são tão abrangentes que tenho certeza que atenderemos sempre, de
alguma maneira, o maior número de estilos que possa-se imaginar. Afinal, tudo é
música e, acima de tudo, nós adoramos música.
Cly Reis
************************************
PLACAR POR ARTISTA:
The Beatles: 3 álbuns
The Rolling Stones: 3 álbuns
David Bowie: 3 álbuns
Miles Davis: 3 álbuns
Pink Floyd: 3 álbuns
Led Zeppelin; Massive Attack, Elvis Presley, Siouxsie and the Banshees; Nine Inch Nails, The Who; The Kinks; U2; Nirvana; Lou Reed; The Doors; Echo and the Bunnymen; Cream; Muddy Waters; Johnny Cash; Stevie Wonder; Van Morrison; Deep Purple; PIL; Bob Dylan; The Cure; The Smiths; Jorge Ben; Engenheiros do Hawaii; Caetano Veloso; Gilberto Gil; Legião Urbana; Titãs e João Gilberto: 2 álbuns
PLACAR POR DÉCADA:
Anos 20: 1 álbum ("Bolero", Maurice Ravel)
Anos 30: 2 álbuns ("The Complete Recordings", Robert Johnson e "Carmina Burana", de carl Orff)
Anos 50: 11 álbuns
Anos 60: 40 álbuns
Anos 70: 53 álbuns
Anos 80: 49 álbuns
Anos 90: 43 álbuns
Anos 00: 6 álbuns
PLACAR POR ANO:
1986 e 1991: 10 álbuns
1972: 9 álbuns
1968 e 1969: 8 álbuns
1987 e 1969: 7 álbuns
PLACAR POR NACIONALIDADE (ARTISTAS):
EUA: 73
Inglaterra: 53
Brasil: 36
Irlanda: 4
Escócia: 3
Alemanha: 2
Canadá: 2
Suiça; Jamaica; Islândia; França; País de Gales; Itália e Austrállia: 1 cada
Depois da fase experimental, uma retomada ao bom e velho
blues característico e as pazes com os fãs, críticos, e consigo mesmo. Em “Fathers and Sons” de 1969, o grande Muddy Waters retornava ao seu estilo
habitual proporcionando blues da melhor qualidade, dois discos após a
psicodelia barulhenta de"Electric Mud", disco
excelente, renegado no entanto pelo próprio artista.
Lançado originalmente como LP duplo, trazia 16 músicas no
total sendo o disco 2 apenas com versões ao vivo. O formato CD tem 4 faixas de estúdio a mais
mas mantém as seis originais de show. Entre estas ao vivo temos a arrepiante
“Long Distance Call” com sua guitarra estridente levando o público ao delírio;
“Baby Please Don’t Go” que já havia sido consagrada na versão do Them, mas aqui
não tão acelerada quanto na versão da banda de Van Morrison; e o clássico “Got My ‘Mojo’
Working”, tocada duas vezes, executada de modo vibrante com participação
entusiástica da galera. No mais, a balada com a harmônica chorosa, “Mean
Disposion”; o show particular de guitarra de Muddy em “Can’t Lose What You
Ain’t Never Had”; a performance coletiva arrasadora de todo o time em “Stand
Round Cryin’” e a incrível “Twenty Four Hours mostravam quem mandava no pedaço.
Era o velho McKinley Morganfield retornando com vivas ao seu
bom e velho blues elétrico.
A capa genial com um
Deus negro criando o Homem, de certa
forma é muito sugestiva quanto a este retorno de Muddy às suas raízes e parece
conter uma espécie de recado, tipo, Deus criou o Homem. O Homem criou o blues. Muddy Waters criou o Blues de Chicago.
Muddy fez
“Fathers and Sons”...
Deus é pai, Deus é pai.
************************************
FAIXAS:
"All Aboard" – 2:52
"Mean Disposition" – 5:42
"Blow Wind Blow" – 3:38
"Can't Lose What You Ain't Never Had" – 3:06
"Walkin' Thru The
Park" – 3:21
"Forty Days And
Forty Nights" (Roth) – 3:08
"Standin' Round
Cryin'" – 4:05
"I'm Ready"
(Dixon) – 3:39
"Twenty Four
Hours" (Boyd) – 4:48
"Sugar Sweet"
– 2:18
"Long Distance
Call" – 6:37
"Baby, Please
Don't Go" (Williams) – 3:03
"Honey Bee" –
3:56
"The Same
Thing" (Dixon) – 5:59
"Got My Mojo
Working, Part 1" (Foster, Morganfield) – 3:22
"Got My Mojo
Working, Part 2" (Foster, Morganfield) – 2:54
faixas extras da versão CD:
"Country Boy" – 3:20
"I Love the Life I Live (I Live
the Life I Love)" (Dixon) – 2:45