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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

"Dia dos Namorados Macabro", de George Mihalka (1981) vs. "Dia dos Namorados Macabro", de Patrick Lussier (2009)


Essa coisa de dia dos namorados em junho é só aqui no Brasil, mesmo. Em grande parte dos outros países do mundo, a data dos apaixonados é comemorada em 14 de fevereiro, dia de São Valentin, padroeiro do amor. Como foi tendência no final dos anos 70 e início dos 80, os norte-americanos resolveram fazer filmes de terror para diversas datas comemorativas, "Halloween" (1978), "Réveillon Macabro" (1980), 'Aniversário Macabro" (1981), "Natal Sangrento" (1984), entre outros. O dia dos apaixonados não poderia ficar de fora e para 'celebrar' a data, em 1981, o slasher "Dia dos Namorados Macabro" foi lançado. Extremamente sangrento e com mortes cruéis e chocantes, o longa canadense sofreu com os departamentos de controle chegando ao público mais retalhado que as vítimas do próprio filme. Muito mais 'leve' e palatável na versão que foi aos cinemas, acabou, então, por não agradar os verdadeiros fãs do gênero e, desta forma, não gozando do mesmo respeito que alguns de seus similares, como um "Sexta-feira 13", por exemplo. Mas mesmo assim, "Dia dos Namorados Macabro" ou "My  Bloody Valentine" mantém um certo status de cult do gênero.

Levando em consideração todas as restrições sofridas pela produção em sua época, e diante de um cenário atual mais livre, com muito mais recursos tecnológicos e tantas produções que não aliviam na violência gráfica, era mais que justo que "My Bloody Valentine" ganhasse um remake com tudo o que tinha direito e que lhe fora negado lá atrás. O remake aconteceu e não decepcionou! Nos deu sangue, crueldade, grafismo, criatividade nas execuções. 

Parece que teremos então no confronto original versus remake uma vitória fácil da nova versão...

 Engano! 

Como aquele time que está  desfalcado, que parece que não terá seus melhores jogadores, mas, momentos antes do jogo, anuncia que terá todo mundo à disposição, o time de 1982, com sua versão uncut, com todas as mortes, sem filtro, sem tarjas, sem desfoque, liberada há pouco tempo atrás, foi pro jogo em igualdade de condições. E aí, ó... tem jogo.

No filme original, depois de uma acidente, quando trabalhadores foram esquecidos numa mina por irresponsabilidade de seus supervisores, mais interessados em ir ao baile do Dia dos Namorados do que em conferir se todos já haviam deixado o local, o único sobrevivente resgatado dos escombros, Harry Warden, fugido de um hospital, um a o depois na mesma data, comete uma série de assassinatos como vingança por o terem deixado para morrer na mina, e por, mesmo em fã e ao acontecido com ele e seus colegas, no ano anterior, ousarem voltar a realizar o baile. Harry é apanhado, preso, mas, aí, sim, com as as novas mortes, todo o trauma da primeira tragédia, a 'sombra' de Harry e tudo mais, o baile passa a não ser mais celebrado na cidadezinha. As coisas ficam assim por 20 anos quando, sentindo que as coisas foram superadas, o prefeito e os habitantes da pequena Hanniger decidem voltar a fazer a festa do dia dos namorados.

Só que às voltas com o surgimento de novos cadáveres e corações humanos em caixas de bombom, acompanhados de macabros bilhetinhos ameaçadores exigindo a não realização dos festejos, o que sugeriria que Harry poderia estar de volta, o prefeito cancela o baile. Sem, no entanto revelar os verdadeiros motivos da decisão, de modo a não causar pânico generalizado, a garotada não totalmente convencida das razões do cancelamento e com tudo pronto para a festa, decide seguir com o plano do baile assim mesmo, por conta própria. E onde seria bom, uma vez que o prefeito fechou o salão da cidade? Na mina, é claro! Ah! Era tudo que o assassino queria! Lá o matador faz a sua festa, enquanto, na área urbana da cidade, o xerife recebe novas pistas e esclarecimentos sobre o paradeiro de Harry em relação ao hospital  psiquiátrico onde se encontrava.

Embora basicamente na mesma tônica, a nova versão tem algumas diferenças: depois de sermos brevemente informados, ainda nos créditos iniciais, com manchetes de jornais, sobre os acontecimentos e desdobramentos sobre uma tragédia ocorrida numa mina na cidade de Harmony, na qual vários operários morreram numa explosão provocada por negligência, o único sobrevivente, Harry Warden, desperta do coma com uma fúria incontrolável e, ainda no hospital, nos oferece um banho de sangue brutal, tomando rumo em seguida à mina para se vingar dos que causaram a tragédia., pois a rapaziada da cidade está toda por lá curtindo e tomando umas cervejas.

Na mina, Harry encontra a rapaziada da cidade que está por lá curtindo e tomando umas cervejas e então continua sua jornada de selvageria vingativa. Trucida vários jovens com sua picareta, mas é contido por um dos rapazes e é baleado pela polícia que chegara ao local, fugindo seriamente ferido.

10 anos depois, a cidade tenta voltar ao normal. O xerife da época do massacre se aposentou, Axel, um dos jovens sobreviventes de Harry, virou xerife, o antigo dono da mineradora faleceu, seu herdeiro, Tom, voltou à cidade para se desfazer do negócio, e Sarah, sua ex-namorada, outra que escapou do maníaco, casou exatamente com o novo xerife. Mas o retorno de Tom coincide exatamente com novos assassinatos e deste modo, o herdeiro ausente da cidade por tanto tempo, passa a ser um dos principais suspeitos dos crimes. No entanto, os novos crimes têm a assinatura de Harry: caixas de bombom com um coração humano em seu interior, o que volta a levantar a dúvida se o psicopata teria realmente morrido no tiroteio na mina, dez anos antes.

Se por um lado, o remake tem a vantagem de nos apresentar mais suspeitos em potencial, principalmente, Tom, o filho pródigo da cidade, Axel, o xerife enciumado da esposa, a hipótese da possível sobrevivência de Harry, ou ainda, mais remotamente, de seu retorno sobrenatural, desperdiça toda uma boa trama com um desfecho um tanto... desapontador, cheio de clichês dispensáveis. Mas, mesmo assim, com alguns defeitos, conseguiu o mais importante que era encarar o original de igual para igual. Mas será que foi suficiente para desbancar um clássico?

Saberemos...

"Dia dos Namorados Macabro" (1981) - trailer


"Dia dos Namorados Macabro" (2009) - trailer


Os dois times começam o jogo a mil por hora: se no original temos a cena inicial pré-créditos, dentro da mina, com uma garota sendo pendurada numa picareta cravada na parede, na refilmagem, com alguns minutos a mais, temos o cenário de açougue do hospital na fuga de Harry, com tripas, mutilações e um banho de sangue. 1x1 rapidinho, em menos de cinco minutos.

O original tem o componente do baile que, na minha opinião colabora para o roteiro como um elemento simbólico marcante da recuperação emocional da cidade, item que o segundo filme praticamente ignora. Gol do filme de 1981! Em compensação a trama da nova versão é levemente mais complexa, tem mais subdesdobramentos, apresenta mais alternativas, sugere mais suspeitos e isso lhe dá uma certa vantagem sobre seu antecessor. Gol do time de 2009! 2x2, no placar.

Embora ambos tenham cenas importantes na mina, o primeiro explora melhor o ambiente: o subterrâneo, a escuridão, corredores estreitos, a sensação labiríntica, claustrofóbica, carrinhos de carga em trilhos como um trem fantasma... E tem as ferramentas (picareta, martelo, pá), assassino com máscara (de minerador), muitos jovens, nudez... Tudo muito slasher oitentista. Ah, isso é gol do time dos '80's. 3x2!

A garota pendurada no chuveiro, no vestiário da mina.
Uma das boas mortes do filme de 1981

O remake até é mais gráfico, tem uma parte técnica melhor, tem mais sangue jorrando, mas ambos os filmes têm mortes excelentes e o original, cujas cenas mais fortes só foram vistas na íntegra agora na versão integral, não fica devendo em nada ao novo no que diz respeito à maquiagem e efeitos visuais. O primeiro tem a morte da senhorinha organizadora do baile torrada na lavanderia, a do dono do bar com a picareta atravessada na cabeça arrancando um dos olhos, a do garoto com a cabeça mergulhada na panela fervente com salsichas, a do mineiro alvejado com a pistola de pregos na cabeça, e especialmente a da garota pendurada pela cabeça no chuveiro com água jorrando pela boca. Muita qualidade de execução, tranquilidade na cara do gol, frieza. 4x2 para MBV original. 

Uma pá pra alargar o sorriso da menina.
Provavelmente, a melhor morte do remake e uma das grandes
dos filmes slasher

A favor do time de 2009, além de refazer com competência, respeito e reverência (e mais sangue) algumas das mortes, como a da máquina de lavar e a da picareta no olho, nos brinda com a espetacular cena da pá na boca da garota, partindo a cabeça em duas e fazendo a parte superior deslizar pela superfície da ferramenta. Gol de quem conhece do ofício. Gol de matador! E o time de 2009 diminui: 4x3.

Um charme do filme de 1981, que até está presente na nova versão mas que não tem a mesma ênfase são os bilhetinhos do nosso assassino dentro das caixas de coração (com coração), característica típica da festa de São Valentin, explorado aqui como advertências do matador para que não se leve adiante a ideia do baile, em versinhos nada carinhosos. Gol do filme original e o nosso matador sai fazendo coraçãozinho com as mãos para torcida. 5x3

O time do século XXI tenta um recurso típico de sua época para empatar o jogo mas não surte o efeito esperado. Concebido para 3D nos cinemas, o novo MBV tem muita coisa "jogada" na tela como a picareta voando em direção ao espectador, a bala saindo do revólver, o olho saltando da cabeça, o que a meu ver ao invés de se caracterizar em algo positivo, conferiu uma certa artificialidade e uma forçação em algumas cenas que só são filmadas de determinada maneira, de determinada posição, para favorecer o efeito e, no fim das contas, não jogam muito a favor. 

E o placar fica assim. O time de 2009 faz bonito, enfrenta o original de cabeça erguida mas com o time de1981 completo, é difícil competir. Lamento,... aqui é mata-mata e só um pode sobreviver na competição.

No alto, os dois assassinos da mina, praticamente iguais,
à esquerda o original e à direita o da refilmagem.
Abaixo, seu tradicional 'presentinho' de Dia dos Namorados.
Vai um docinho aí?

"Dia dos Namorados Macabro 3D" bem que tentou, botou o coração na ponta da chuteira, mas não contava com a escalação do "Dia dos Namorados Macabro" '81, que jogando completo, conhece o mapa da mina.

E a torcida grita, "Uh, eô, o Harry é matador!"
(Mas será que é ele mesmo?)
 




por Cly Reis

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

Código Penal - Preto no Metal Festival - Bar Opinião - Porto Alegre/RS (17/12/2023)

 

Fazia tempo que queria ver a Código Penal, uma das bandas do meu primo-irmão-parceiro Lucio Agace. Digo uma das bandas, porque Lucio enfileira, desde os anos 80, algumas das bandas mais legais da cena alternativa gaúcha. A começar pela HímenElástico, projeto que tínhamos em conjunto com meu outro irmão e coeditor deste blog, Cly Reis, e meu outro primo e irmão do Lúcio, , com o adicional de nosso baterista oficial César “Pereba”. Mas a Hímen, há de se dizer, por mais legal que fosse nosso som (considero-a a grande banda gaúcha dos anos 90 que não aconteceu), foi talvez o projeto mais incipiente de Lucio. Vômitos & Náuseas, Causa Mortis e Câmbio Negro, pelo contrário, são alguns desses seus projetos mais consistentes. Mas também há de se dizer: a Código Penal é especial. O som, misto de hardcore, hip hop, funk e uma veia social e urbana muito evidente (em vários aspectos, parecida com a da Hímen) fazem da Código uma banda muito foda de se ouvir. Faltava vê-los no palco.

Pois o Festival Preto no Metal, ocorrido no célebre bar Opinião, trouxe esta oportunidade. A Código se apresentou na sequência de outras bandas muito legais com essa mesma vertente e ativismo, mas confesso que fomos mesmo lá para vê-los. E a expectativa foi totalmente atendida, numa apresentação enérgica, potente, dançante e... foda. A “arquitetura” da banda é apreciável, desde a visual até a sonora, com Lucio e Black to Face dividindo-se nos vocais como verdadeiros vocalistas MCs, dois guitarristas, Marcio Zuza e Eduardo Jack, um fazendo base e outro complementando o arranjo com efeitos e solos, o baixo poderoso de Luciano Tatu, a bateria pegada de Pereba e uma mesa eletrônica comandada pelo próprio Lucio. 

O tempo de show de festival, como de costume, curto. Então, o negócio é subir no palco e mostrar serviço, como a Código fez. Aí, foi só paulada, uma atrás da outra. “Terra de Ninguém” pra começar. “Os Dois Lados do Imoral”, na sequência, fez o ambiente pra ótima parceria da banda com Tonho Crocco em “Apologia”, que levantou a galera. “Marginalizado”,  “Justiça Injusta” e “Chove Bala”, idem. Pra finalizar, “Sexo nas Ruas” e a ótima “Gangs”, que já rodei no meu programa, o Música da Cabeça, mas que ao vivo ganha uma potência maior, tanto pela reação da galera quanto pela sonoridade própria, com seus samples da trilha de “Sexta-Feira 13”. Aliás, por falar no filme, mais uma das coisas legais da performance da banda e de Lucio, em especial, que é quando ele se ausenta um tempo do palco para voltar travestido de Jason Voorhees, com a máscara característica do personagem, um casaco com capuz preto e um temível taco de beisebol. Fez lembrar outro punk performático chamado John Cale.

Enfim, showzasso da Código, que Leocádia e eu vencemos os 48 graus de sensação de Porto Alegre àquele dia para estar no Opinião, mas que valeu totalmente a pena. Confere aí um pouco de como foi:

**********

A Código sobe ao palco do Opinião 

Lucio, performático, com a máscara do Jason junto com Black to Face

Black to Face mandando ver nas rimas

Um pedacinho de como foi o show 
da Código Penal no Opinião

Visão da mesa de som

Código in da house, motherfucker!

Mais rimas

Lucio ao centro do palco com a baita banda na "cozinha"

Preto no Metal olhando o Preto no Metal

A galera comemorando o baita show ao final:
Jamal, Val, Lucio, Leo e eu
 


Site da Código Penal: www.bandacodigopenal.com.br  


texto: Daniel Rodrigues
fotos e vídeos: Leocádia Costa e Daniel Rodrigues

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

14 anos, 14 convidados

 








E o clyblog chega a seus 14 anos de idade.

Parabéns para nós!

E parabéns para nós, principalmente, por, durante todo esse período de existência, termos tido a honra de contar com colaborações valiosas de convidados das mais diversas áreas. Escritores, jornalistas, músicos, fotógrafos, artistas, deram suas contribuições a partir de suas experiências, preferências pessoais e respectivos repertórios culturais, abrilhantando momentos especiais do nosso blog em datas importantes, números redondos de publicações ou em nossos aniversários anteriores.

Para comemorar os 14 aninhos e essas colaborações maravilhosas, relembramos aqui, exatamente, 14 momentos, 14 participações especiais, 14 grandes convidados que nos proporcionaram publicações de altíssima qualidade e conteúdo valiosíssimo para o Clyblog.

Então aí vão 14 participações de convidados durante os 14 anos, até aqui, de ClyBlog:


1.
Em 2013, o escritor, teólogo, filósofo, ensaísta, crítico de arte, poeta e cronista gaúcho, Armindo Trevisan, nos deu de presente de Natal uma belíssima crônica que sugeria uma merecida reverência silenciosa a um momento tão importante como é o caso do nascimento de Cristo, no nosso 
Cotidianas Especial de Natal.

"(...)Que maravilhoso seria se, na comemoração do Natal, as nações cristãs, concordassem em instituir um minuto de silêncio em homenagem a tão grande Mistério!
Seria preciso que não se ouvisse som algum em nosso mundo!
Seria preciso que a paz, silenciosa como as estrelas (ao contrário de nossos ícones que, para serem ovacionados, inflamam as multidões) entrasse nos corações na ponta dos pés, e aí fizesse adormecer as almas ao som da Noite Feliz, traduzida para o português por um frei franciscano de Petrópolis, o qual preferiu o adjetivo feliz ao adjetivo original alemão stille: Noite Silenciosa! (...)"


Leia o texto na íntegra:

***

2.
Marcando a publicação de número 200 dos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS, convidamos um cara com autoridade para falar de sua banda favorita: Roberto Freitas, vocalista da banda The Smiths Cover Brasil, uma das mais respeitadas bandas cover do Brasil, revelou tudo sobre sua paixão pelo disco "Meat is Muder", o primeiro que teve da banda, e o álbum que o impulsionou a querer estar em cima de um palco.


"(...) As pessoas sempre me perguntam até hoje qual a minha musica preferida dos Smiths e eu respondo sem pensar muito :"Não tenho apenas uma tenho pelo menos umas dez e a maioria estão no álbum 'Meat is Murder' (...)"




Leia o texto na íntegra:


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3.
Em 2018, para os nossos 10 anos, o convidado Wladymir Ungaretti, fotógrafo e professor de jornalismo da UFRGS, compartilhou conosco um de seus ensaios fotográficos para a nossa seção Click, chamado "Imagens para melhor imaginar". Modelos em situações sensuais, no limite do vulgar, do sujo. Erótico com um toque de mistério. Não poderia ter sido mais preciso no conceito: fotos que mostram, mas que deixam muito para a imaginação.



"(...) Este é um espaço reducionista. Escrevemos a partir de muitos pressupostos. São muitas as variáveis na conceituação do que seriam fotos pornográficas ou, simplesmente, eróticas. Conceitos determinados por cada contexto histórico e por cada cultura. Uma obviedade muitas vezes esquecida. Fotógrafos estão olhando, sempre, o trabalho de outros fotógrafos. Mesmo quando, por absoluto egocentrismo, digam que não, Faço questão de "copiar". De me deixar influenciar por outros fotógrafos. Busco o despojamento do surrealista Man Ray. A "pornografia" do japonês Araki. Os cenários surpreendentes de Jan Saudek. Pode parecer muita pretensão. Não canso de olhar livros dos fotógrafos que, por razões muitas vezes nada precisas, tocam o meu "olhar". Fotografei estas modelos inspirado pela ideia de Vilém Flusser que diz: "produzimos imagens para melhor imaginar".



Veja o ensaio:
Imagens para melhor imaginar



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4.
Para falar de uma banda e de um álbum, nada melhor do que alguém que criou a banda, foi seu integrante, compôs músicas e tocou no álbum. Carlos Gerbase, hoje, doutor em comunicação social, em outros tempos foi baterista e vocalista da banda Os Replicantes e para o ÁLBUNS FUNDAMENTAIS Especial de 5 anos do ClyBlog, falou sobre o lendário primeiro disco da banda, lá de 1986.


"(...) na hora de decidir como o nosso primeiro LP se chamaria, alguém sugeriu (provavelmente eu mesmo, mas não tenho certeza) que o disco se chamasse “O Futuro é Vortex”. Foi uma  boa escolha. Ele estava cheio de canções de ficção científica, e esse título era uma boa síntese (...)"




Leia o texto na íntegra:
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5.
O jornalista gaúcho Márcio Pinheiro, especialista na área de jornalismo cultural, com passagens pelas redações de jornais como Zero Hora, Jornal do Brasil, Jornal da Tarde, O Estado de S. Paulo, autor do recém lançado livro "Rato de Redação - Sig e a História do Pasquim", amante de música, especialmente de jazz e MPB, nos deu o privilégio de compartilhar sua admiração pelo disco "Quem é Quem", de João Donato, nos nossos 
ÁLBUNS FUNDAMENTAIS. Segue aí um trecho da resenha:


"[João Donato] Era um músico dos músicos, respeitado pelos seus pares mas pouco conhecido pelo público. Da convivência com o cantor Agostinho dos Santos, um grande incentivador de seu trabalho, nasceu a ideia de colocar letras nas suas músicas (...)"




Leia o texto na íntegra:

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6.
Cléber Teixeira Leão
, além de meu primo e um excelente músico, é professor de História e um de seus focos, nas aulas que ministra na rede estadual do Rio Grande do Sul tem sido as relações étnico-raciais, com foco no conceito do estudo crítico da branquitude. Nessa linha, falou para o Claquete do ClyBlog, sobre a representatividade negra nas mídias de entretenimento norte-americanas, nas comemorações de 12 anos do blog. Muito interessante o texto e análise do nosso convidado. Confere só:


"(...) Ainda que de forma ficcional, o Pantera Negra serviu e serve ainda hoje, como símbolo dessa quebra de padrões e imposições, além é claro de personificação imagética do antirracismo. Quando o Marvel Studios lançou em 2017 o filme "Pantera Negra" nos cinemas, a repercussão política e social do Blockbusters foi tanta, que gerou uma das maiores bilheterias da franquia de heróis até hoje (...)"




Leia o texto na íntegra:

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7.
Uma das histórias mais curiosas e engraçadas de bastidores já contadas no ClyBlog foi relatada por Castor Daudt, ex-guitarrista da banda DeFalla, sobre uma ocasião em que encontraram um integrante da banda New Order, num camarim de um show em São Paulo. Foi para o Cotidianas Especial de 10 anos do ClyBlog, em 2014. Não vou contar mais nada aqui porque vale a pena você mesmo ler.


"(...) Depois do show eu fiquei sozinho no camarim, descansando. Era raro ter um minuto de sossego, na época.
De repente entra um cara meio estranho, no camarim..."




Leia o texto na íntegra:


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8.
As andanças, por aí, dos nossos convidados também nos trazem colaborações muito interessantes. Fabrício Silveira, jornalista e escritor, quando de sua passagem por Manchester, na Inglaterra, cidade  berço de bandas como Joy Division, The Smiths, Stone Roses, The Fall, entre outras, presenciou, possivelmente, o surgimento de mais um nome para se guardar vindo daquele lugar: The Sleaford Mods, uma dupla de eletrônico, punk, minimalista..., estranha mas muito interessante. Nosso convidado nos contou da experiência de ter presenciado um show desses caras para o nosso ClyLive.


"Não há quase nada em cima do palco. Não há equipamento algum, além de um pedestal de microfone e uma mesa de bar, lado a lado. É até um pouco estranho encontrar ali aquele móvel rústico, com pernas dobráveis, trabalhado em madeira nobre. Sobre ele, há um laptop fechado, discreto, quase invisível, que se confunde aos desenhos e aos padrões cromáticos da toalha de mesa. Ao fundo, espessas cortinas de veludo escuro. Em contraste, há uma forte luz branca, opressiva e desconfortável. Este é o cenário. Não há mais nada em cima do palco (...)"



Leia o texto na íntegra:


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9.
Nosso convidado de um dos especiais dos 11 anos, lá de 2019, participou da gravação desse álbum histórico da música brasileira. Waldemar Falcão, músico, astrólogo e escritor, tocava na banda de Zé Ramalho quando o cantor gravou se clássico "Zé Ramalho 2" ou "A Peleja do Diabo com o Dono do Céu", de 1979. Ou seja, pouca gente estaria tão autorizada a comentar sobre a obra, as músicas, a atmosfera do álbum. Saca só...



"Quanto mais o tempo passa, mais nos damos conta de que ele na verdade voa mesmo... Quando penso que se passaram 40 anos desde que gravamos esse lendário LP (permitam-me...), chega a ser difícil de acreditar (...)"




Leia o texto na íntegra:

***

10.
Um dos muitos convidados que participaram das nossas comemorações de 
10 anos, foi o ator e diretor de teatro Cleiton Echeveste que destacou para a nossa seção Claquete, o filme nacional "Tinta Bruta", de Filipe Matzembacher e Márcio Reolon, de 2018. E, na boa, se ele falou bem do filme, é porque é bom mesmo, porque de atuação e direção o cara conhece.



"(...) Na minha relação com a arte, busco ser o menos analítico possível ao vivenciá-la, esteja eu no lugar de criação ou de fruição. A análise é fria e requer distanciamento, e foi exatamente o contrário disso que “Tinta Bruta” me proporcionou: a vivência da minha humanidade, da minha falibilidade, de dores que são também minhas e que são, por isso, plenamente identificáveis(...)"




Leia o texto na íntegra:


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11.
Ele já havia sido 
ÁLBUNS FUNDAMENTAIS, com seu disco  “Sambadi”, de 2013, e convidado a escrever sobre um disco de sua admiração para os 8 anos do Clyblog, o cantor, compositor e arranjador Lucas Arruda, escolheu falar sobre um dos trabalhos que mais o influenciara, "Robson Jorge & Lincoln Olivetti", de 1982. Um AF comentando sobre outro. Essa foi certamente uma participação especialíssima que tivemos.



"(...) Alegria imensa em poder falar um pouco deste álbum! Pessoalmente, é o disco que mais influenciou em termos de arranjo, sonoridade, composição. Minha bíblia! (...)"




Leia o texto na íntegra:


***


12.
Esse cara sempre trazia coisas muito curiosas, interessantes e diversificadas pra o Clyblog. Cinéfilo, fã de cinema anos 70, filmes clássicos, faroeste, colecionador e admirador de cultura pop, além de conhecedor de literatura e folclore sul-americano, Francisco Bino colaborou com o blog durante alguns meses e sempre nos surpreendeu com assuntos instigantes e muita informação. 
Num desses textos, nos conta sobre as inspirações em religiões afro na clássica canção "Sympathy for the Devil", dos Rolling Stones. Dá só uma olhada:


"Em uma sexta-feira qualquer de 1968 depois de beber uma garrafa e meia de Jim Beam, Mick Jagger invadiu bêbado e meio "alto" a uma terreira de Candomblé em Salvador na Bahia (...)"



Leia o texto na íntegra:


***


13.
Colaboração ilustre e internacional no ClyBlog nos nossos 
12 anos. A escritora angolana Marta Santos aceitou nosso convite para falar sobre algum disco importante, segundo sua opinião, e nos surpreendeu com a ótima dica do trabalho de seu conterrâneo Elias Dya Kymuezu, com o disco "Elias", de 1969, cuja qualidade e influência é reconhecida na música brasileira por nomes como Martinho da Vila e Chico Buarque de Holanda. Abaixo, um trecho da resenha da nossa convidada:



"(...) Elias Dya Kimuezu é bangāo, cheio de classe. Faz lembrar os clássicos  americanos. Podemos facilmente perceber a humildade dele e a sua sensibilidade. A sua música, ou melhor, a essência das suas músicas, as suas canções são de lamento de quem lamenta a morte de alguém. Naquela altura, quando ainda eram colonizados, não se lamentava, só isso se lamentava, o sofrimento do povo, e até hoje o cantor não sai da sua canção, do seu ritmo. Porque a sua canção é invocação. Invoca a mãe, a dor invoca toda uma sociedade (...)"



Leia o texto na íntegra:


***


14.
Um Super-Álbuns Fundamentais! Isso foi o que o convidado Lucio Brancato, músico, jornalista, colunista musical e apresentador de TV e rádio, nos proporcionou no nosso aniversário de 
10 anos. Pedimos para que ele nos falasse sobre um disco de sua preferência e ele nos deu cinco de uma vez só: Crosby, Stills, Nash & Young, com  "Déjà Vu", de1970; Yes, com "Close to The Edge", de 1971; Dillard & Clark, com o disco The Fantastic Expedition of Dillard & Clark, de 1968; Faces, com seu "Oh La La", de1973; e Kinks, com o álbum Face to Face, de 1966. Não tinha maneira melhor de fechar essa lista de colaborações do que essa. 


"Mudei o pedido do Daniel Rodrigues para escrever sobre um disco importante na minha vida.
Foram tantos que ficaria muito difícil selecionar apenas um. E mesmo assim, esta lista nunca é definitiva.
Resolvi listar cinco fundamentais na minha formação e talvez os discos que mais escutei na vida."



Leia as resenhas completas:

***


Obrigado a todos os que colaboraram com o ClyBlog até aqui.
Todos os que foram lembrados nessa pequena listagem e a todos que não aparecem nela
 mas igualmente nos honraram com suas experiências, conhecimentos, bagagem e qualidade.
Muito obrigado a todos!  




C.R.
D.R.

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

CLYLIVE ESPECIAL 13 anos do ClyBlog - Hímen Elástico - Woodstock Bar - Alvorada /RS (13/08/1993)




Pedaço do cartaz do evento















O mais alto voo "hermenêutico*" 

Hímen Elástico, sexta feira 13 agosto de 1990 e poucos....
Lembro que fizemos alguns ensaios e como de costume nunca tivemos um guitarrista fixo... mas tenho dois na memória, um canhoto e o outro destro.
Sim, ser canhoto era um pré-requisito para fazer parte da banda e nem precisava tocar bem. Se fosse canhoto estava dentro! Marcelo o “Fedor” era o destro, talvez o que mais se manteve no cargo, e Thiago Newman, o canhoto, que acho que foi quem participou do show que, certamente foi a apresentação mais insana daquela noite e que, curiosamente, não começou no palco.
Saímos eu, meu irmão, Nego Lê, nosso batera Cézah, o Pereba, e mais um amigo e personagem importante dessa cruzada, Diogo, o Tantã, rumo à Intercap, em Porto Alegre, para a reunião que daria início a saga.
Logo após a janta, todos naquele alvoroço se preparando para alçar ao que talvez fosse o voo mais ousado do nosso projeto hermenêutico, lembro da minha tia Iara, mãe dos guris Clayton e Daniel, meus primos e vocais da banda, nos encher de advertências sobre o uso do casaquinho, o cuidado com as companhias e aquela coisa toda de mãe.
Então chegou a hora, a trupe toda pronta e partimos para rua. Provavelmente eu levava alguma bebida mocozada na mochila, pois não lembro de um dia que saí durante os anos noventa onde não houvesse um vinho (hehehehe), mas o fato de já ter um trago, não impediu um dos atos que seria o marco daquela cruzada. Então, surge a dúvida: quem pegou a Cachaça Polteirgeist?
Lembro de o Pereba ter tomando mas também lembro do Tantã ser o primeiro a pegar o artefato.
Estávamos nós andando, não sei se próximo ao ponto de partida, quando numa encruzilhada nos deparamos com um despacho digno de uma legião de entidades e um dos nossos heróis teve a bendita ideia de pegar a cachaça pra tomar. 
Não sei se tomei, não sei quem tomamos, mas sei que fez toda diferença pois fomos para aquele show com uma legião de seres das ruas na nossa cola.
O lance era um pico muito louco numa festa insana organizada por uma skatista amigo nosso da Osvaldo Aranha, o Miller, que hoje mora em Viamão e que simplesmente convidou todo mundo pro evento. Lembro da Free Jack , Rapcrazy, Ultramen, Groove James, Borboleta Negra, que hoje virou Comunidade Nin-Jitsu, e nós, a Hímen Elástico, é claro...
Então chegou o momento tão esperado! Lembro de ter começado com a Marcha Fúnebre, num bass distorcidão, usando o moletom, que havia sido confeccionado num tamanho descomunal, com o capuz caindo na cara, fazendo referência à morte ou a um ritual qualquer (hehehehehehe!). Logo vinha “Carolina” ("Dá um beijo no cangote, Carolina!") e “Ex” que deram o ritmo do que seria uma metralhadora de músicas que tocamos naquela noite. Sim, foi um petardo atrás do outro e lembro que meu irmão não ficou no palco pois passou o show correndo no salão, alucinado, e geral impressionada com o que estavam assistindo. (hehehehehehehe!!!) Enfim, memorável! Logo após toda aquele frenesi, fomos para Osvaldo Aranha celebrar o grande momento. Acho que foi a primeira vez que vi Clayton e Daniel por lá!!!!!!
Até hoje não sei como acabou aquela noite mas guardo na memória, mesmo que vaga, um espetáculo inesquecível.

* Hermenêutico - termo que costumávamos usar para classificar tudo relacionado à Hímem Elástico


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A dúvida que não quer calar

Bah! Baita lembrança!
Então, o que dizer daquele dia? Eu bem moleque aprendendo os passos da adolescência e tendo exemplos, tanto de vocês, meus primos, como do Lucio, meu irmão.
Lembrando desse dia, hoje em 2021, consigo ter claro o que aquele 13 de agosto significou na construção de quem sou eu hoje, mas voltando anos atrás, era tipo um filme. Expectativa como se fosse um showzaço mas foi como uma final de campeonato, desde o ponto de ônibus, de onde já saímos rindo de tudo, até descer no centro de Alvorada, adentrar aquele bar escuro e ouvir a Hímen Elástico com vocês. 
Quebramos tudo! Foi massa demais e uma experiência única. Por isso, meu lema até hoje é: seja jovem sempre e faça tudo que quiser fazer, desde que não prejudique ninguém e não ocupe o espaço de outra pessoa. 
Contudo, depois de tanto tempo uma dúvida ainda persiste: Cachorro morto ainda late**?


** nome de uma das músicas da Hímen Elástico

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Macumba, rock ‘n’ roll e cabeças cortadas

Tínhamos a melhor banda de rock do Rio Grande do Sul dos anos 90. Digo isso sem soberba, até porque, se sobrava qualidade, faltou persistência a nós para prosseguimos e provar todo esse talento. A Hímen Elástico, nossa banda, era uma mistura muito bem azeitada de todas as referências que nós, integrantes, tínhamos: punk rock, hip hop, quadrinhos, samba, poesia concreta, música clássica, revistinha adulta, skate, hardcore, desenho animado. De tudo um pouco e tudo misturado emaranhando as mentes de Clayton Reis, meu irmão e principal vocalista/letrista; Leandro Reis Freitas, o Lê, primo backing assim como eu e dono de sacadas e ideias sempre criativas; Cezar “Pereba” Castro, o melhor batera dessas bandas sulistas depois de Pezão; e o baixo, vocais, and other instruments by Lucio Agacê, irmão de Lê e também nosso primo, um turbilhão de musicalidade e o verdadeiro músico entre nós – não à toa, o cara que mais seguiu por esse caminho entre todos nós depois da “dissolução” da Hímen, como carinhosa e debochadamente nos apelidávamos,.

Compúnhamos juntos e de forma contributiva, aliás, como sempre fizemos desde a infância, crescendo juntos como guris e seres criativos. Se a sintonia entre nós era sanguínea, geracional e afetiva, na guitarra a Hímen ainda reservava um charme à parte: sempre tínhamos um guitarrista diferente. Sabe a The The, a P.I.L., a This Mortal Coil, todos com guitarristas móveis? Pois é: éramos iguais. Dependendo da ocasião, algum amigo, familiar, parceiro ou até fã nosso era contemplado – desde que soubesse minimamente tocar o instrumento, visto que nenhum de nós tinha essa capacidade.

Todas essas características faziam da Hímen uma banda sui generis, que botava no chinelo em musicalidade Comunidade Nin-Jitsu, Cidadão Quem, Papas da Língua, Tequila Baby... todas as bandas de sucesso do RS na época. E nada dessa de banda “couve”: nossas músicas eram todas escritas por nós mesmos. O que não era de nossa autoria, transformava-se assim, como as versões de Ramones e Legião Urbana, que emendávamos com uma de nossas canções, “Fórmula de Bhaskara’, ou as ousadas versões de “Ego Sum Abbas” de CarminaBurana ou da techno-punk Suicide para o formato baixo-guitarra-bateria. Tínhamos inteligência musical e repertório suficiente para gravar um disco, certamente. Mas o fato é que não tivemos muito tempo de “estrada”. Embora as músicas ainda existam, foram poucos os que, ao contrário das bandas de sucesso do rock gaúcho, bem mais persistentes, tiveram o “privilégio” de nos ouvir. A não ser numa fatídica, gélida, perigosa e memorável noite de rock ‘n’ roll que nós promovemos.

Não vou lembrar com detalhes, pois lá se vão 28 anos, mas recordo que ensaiamos algumas horas na tarde daquele 13 de agosto de 1993 num estúdio que alugamos no Bom Fim. Terminados os ensaios, ‘simbora lá pra nossa casa, meio do caminho para nosso destino final, para comer alguma coisa feita por minha mãe, dona Iara, que levou as mãos à cabeça ao saber para onde iríamos depois dali: Alvorada. E à noite! E numa sexta-feira 13! E na cidade mais perigosa do Estado! Isso porque, naquela semana, a imprensa havia noticiado, assombrada, vários assassinatos cometidos em Alvorada em que os criminosos haviam decapitado suas vítimas. Misto de irresponsabilidade e descomplicação juvenil, obviamente, fomos. Seria a primeira apresentação ao vivo da Hímen Elástico! Nossas músicas, nós no palco! Adrenalina, rock ‘n’ roll! Não íamos perder de jeito nenhum a oportunidade de fazer aquele show, nem que, para isso, cortassem nossas cabeças!

Rock a gente associa a algo quente, infernal, furioso, certo? Neste caso, porém, substitua-se o calor dos infernos por um frio dos infernos. Sim: afora todas as justificativas que inibiriam qualquer ser minimamente ajuizado de não sair de casa, fomos nós, sob uma temperatura quase negativa, pegar dois busões em direção a Alvorada para desespero de minha mãe. Além de caminhar trechos com os instrumentos nas costas, sabe como é pegar ônibus de noite num fim de semana, né? Chá de banco. E com aquele frio! Deu pra ver que a galera não tinha grana, né? Táxi? Impossível, muito caro. Carro próprio? Àquela época, nem carteira aqueles guris tinham. Mas se faltava grana, assim como para com nossas músicas, sobrava criatividade – e um bocado de ousadia, confesso. No caminho para a condução, Cezar, quieto e sempre atento, encontrou uma garrafa de cachaça inteirinha e quase intocada. Que alento para aquele frio! E tudo bem pegar a bebida numa ocasião como aquela, não fosse a cachaça ser de um despacho. E acham que a gente se intimidou com o santo? Que nada! A insolência falou mais alto. Afinal, estávamos indo para um show de rock, caramba! O NOSSO show de rock.

Foi realmente uma apresentação digna a que fizemos no Woodstock Bar. Com uma formação de guitarra, baixo, bateria, voz e backing vocals, abrimos, como numa homenagem àquela sexta-feira 13 maldita, com “A Marcha Fúnebre”, (sim: trata-se de "Sonata para piano Nº 2 em si bemol menor, Op. 35", de Chopin), que havíamos ensaiado bastante durante o dia, embasbacando quem assistia. Seguiram-se nossas músicas: “Ex”, “Grandes Lábios”, E Daí?”, “Clayton” e outras. Nossas músicas.

Voltando a memória para antes do show, lembro de minutos antes de entrar no palco – pela primeira vez. Senti aquele famoso frio na barriga que todo músico ou ator diz ter antes de começar o espetáculo. Dei mais uns goles na nossa cachaça enfeitiçada e, não sei por que cargas d’água, arranquei o lenço que eu levava na cabeça e o amarrei numa das pernas, logo acima do joelho. Depois, foi só transe. Dito assim, parece um ato infantil, sem propósito ou até irrelevante. Mas aquilo era rock, bebês. Dadas as devidas proporções (afinal, considerávamos os melhores do nosso território, mas não do planeta), é a pulseira de spike dos metaleiros; é a camiseta rasgada de Sid Vicious; é o figurino extravagante do Elton John; é o tênis All Star dos Ramones; é o crucifixo do Ozzy. Não é a música, mas faz parte. Afinal, rock não é só som: é atitude. É o momento em que se experencia algo transformador: deixa-se de ser somente a si próprio para se tornar, pelo menos por minutos, sua própria criação artística.

Com todo o cenário que se pintou, de perigos tanto do além quanto da vida real, posso afirmar que subir num palco é como ter a sua cabeça cortada e entregue numa bandeja para o público. Como no mito de Salomé, sedução e morte se amigam. É quase um milagre. Ou dá pra explicar de outra forma a voz do Clayton ter voltado perfeitamente na hora do show depois de emborcar a nossa aguardente magiada? Deus, ou melhor, o Diabo, pai do rock, fez-se presente naquele dia para ele tão especial para nos permitir que a nós também fosse. E foi.

Não eram muitos na plateia, certamente. Mas que quem esteve lá, viu uma verdadeira banda de rock, isso, viu. A melhor do Rio Grande do Sul da década de 90, o que muitos nunca souberam. Mas a gente, “hermenêuticos”, sem modéstia, sabemos que sim.



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Cachaça Poltergeist
por Cly Reis


Ninguém tocava grande coisa. Na verdade, a maioria de nós, LucioDaniel e Eu, o núcleo da Hímen Elástico, não tocava instrumento nenhum. Éramos quatro primos muito musicais e muito criativos, o que nos despertou o desejo de botar aquelas ideias musicais, às vezes muito doidas, em prática. E o meio para isso era ter uma banda. Mas como ter um grupo musical diante da situação já relatada da total inépcia instrumental dos integrantes? Ah, o Lucio, que era o único um pouco mais habilidoso tocaria contrabaixo, que era no que se saía melhor, um de seus grandes amigos, o Pereba, que tocava bateria pra diversas bandas, acrescentaria mais essa à sua lista, e eu, que tinha o desejo mas não a coordenação motora pra tocar, tinha uma guitarra que poderia servir para algum guitarrista que convidássemos e que se encaixasse. De resto, na falta de maiores talentos, todos os três restantes seriam vocalistas, ora fazendo backing-vocals, ora se alternando na voz principal, embora o posto, oficialmente, coubesse a mim, não por ser mais ter mais qualidades para tal mas, pelo contrário, exatamente por não saber fazer mais nada.
Ensaiávamos com alguma frequência, guitarristas iam e vinham no posto que nunca fora muito fixo, tínhamos um repertório interessante e consolidado e, a partir de determinado momento, começamos a ansiar por uma oportunidade de tocar em algum lugar. Numa dessas, o Lucio, que era o cara com mais contatos, mais atuação no underground de Porto Alegre e região, conseguiu um showzinho pra nós. Seria em Alvorada, um município próximo à capital, num pequeno festival, com umas quatro ou cinco bandas, num lugar chamado Woodstock Bar. O dia? Sexta-feira 13 de agosto.
Determinados a garantir um bom desempenho, uma apresentação digna, marcamos um ensaio extraordinário para o final da tarde do dia do show. O evento no bar começaria umas10h ou 11h da noite, faríamos nosso ensaio ali pelas seis da tarde, voltaríamos pra minha casa, comeríamos alguma coisa, sairíamos por volta das oito e ainda daria tempo tranquilamente. Nosso planejamento deu certo. Deu, em termos... O ensaio da tarde e, possivelmente, algum stress por ansiedade, levou embora minha voz. Me vi, a poucas horas do nosso momento mais importante, até então, sem a coisa que eu mais precisava naquela noite: a voz. Por sorte, pouco antes da nossa vez de subir no palco, um cara de uma outra banda, vendo a minha situação, recomendou que eu tomasse uma cachaça que era certo que minha voz voltaria. Não deu outra! Foi voltando, foi voltando e na hora do show, eu estava pronto.
Subimos ao palco exatamente à meia-noite da sexta-feira 13 (bom, tecnicamente, já seria dia 14, mas pra efeito da mística da ocasião, ganha mais efeito dramático se colocado assim). Pelo soturno da situação, abrimos os trabalhos com a "Marcha-fúnebre", mas já emendando com a nossa tradicional vinheta de abertura, "Carolina", que já desembocava na nossa eletrizante música de abertura, "Ex" e a partir daí foi só pancadaria. Um show bom, modéstia à parte, mas não apenas na minha opinião, uma vez que nosso som foi elogiado por integrantes de outras bandas e, de quebra, pela gatinha que eu estava azarando.
Numa noite tão envolta em elementos sombrios, uma sexta-feira caindo em13, início do show à meia-noite, marcha-fúnebre, voz indo e vindo e tudo mais, não é de se duvidar que um fato externo tenha influenciado todo o contexto daquela jornada. Ainda na nossa ida, assim que saímos da minha casa, no meu bairro, ao passarmos por uma encruzilhada, com um respeitável despacho, vasto, abastado, repleto de guloseimas, bebidas, pipocas, galinhas e tudo mais, um amigo da banda, o Tantã, sem nenhum temor, passou a mão numa garrafa de cachaça e tascou uma bela golada. O Pereba, não se fazendo de rogado, não hesitou e também caiu dentro da cachaça da macumba. Entre risos, zoeira e muita imaginação, fantasiando que as galinhas do despacho levantariam e nos perseguiriam reivindicando a oferenda roubada, seguimos dali para o local do show, no episódio que ficou conhecido entre nós como a "Cachaça Poltergeist".
Então, não é de se duvidar que, por trás de toda aquela noite mágica, mística, da própria cachaça que eu tomei no bar, estivessem agindo forças sobrenaturais, espíritos, entidades, orixás, que fizeram com que, no fim das contas, nos saíssemos bem dentro das nossas possibilidades e que tudo desse certo no lendário primeiro show da Hímen Elástico. 



Hímen Elástico - "Fita p/ Não Comprometer"