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segunda-feira, 10 de abril de 2023

Philip Glass – "Koyaanisqatsi - Life Out of Balance - Original Soundtrack Album from the Motion Picture" (1983)

 

Versões da capa da trilha do filme
lançadas entre 1983 e 2009
Ko.yaa.nis.qatsi (da língua Hopi), n. 1. Vida louca. 
2. Vida turbulenta. 
3. A vida se desintegrando. 
4. Vida desequilibrada. 
5. Um estado de vida que exige outra forma de viver.

"'Koyaanisqatsi' permite que você experimente a aceleração e a densidade da sociedade moderna de uma nova maneira. Ele convida você a considerar a benevolência da tecnologia e a noção de progresso no mundo em que vivemos. Um mundo fora de equilíbrio".
Philip Glass


Um dos principais pensadores sobre a relação homem/meio ambiente dos tempos atuais, o cineasta alemão Werner Herzog disse, certa vez, que o engano da humanidade reside na falta de controle desta sobre seu próprio desenvolvimento. A ciência, a tecnologia, os avanços são soltados aos borbotões, numa corrida frenética desenvolvimentista que, a rigor, ninguém sabe onde vai dar. Suspeita-se, contudo, pois a natureza vem há tempos dando seus sinais. Se a Rio 92, há pouco mais de 30 anos ensinou o mundo a adotar a linguagem antes apenas restrita meramente à "ecológica", inserindo no seu vocabulário termos como “sustentabilidade”, “ESG”, “responsabilidade socioambiental” e afins, a agenda sustentável, por outro lado, não avançou tanto assim na prática. Os resultados da COP-27, em 2022, o mais importante e o maior evento já realizado sobre o tema das mudanças climáticas, foram parcos e inconsistentes. A crescente crise de energia, as concentrações recordes de gases de efeito estufa e o aumento de eventos climáticos extremos pelo globo colocam uma interrogação sobre a sociedade: ainda há tempo de reverter este quadro?

O alarme é ainda maior quando se constata que tais indagações urgentes não são de hoje. Há 40 anos uma obra referencial já trazia, com o devido peso e teor denunciativo, a questão do desequilíbrio causado pelo homem à natureza: “Koyaanisqatsi – Uma Vida Fora de Equilíbrio”. O filme do cineasta norte-americano Godfrey Reggio e produzido por Francis Ford Coppola, tornou-se rapidamente um cult movie desde seu lançamento, em 1982, prenunciando a realização de outros dois longas em formato semelhante, "Powaqqatsi - A Vida em Transformação", de 1988, e "Naqoyqatsi", de 2002, todos dirigidos por Reggio. Todos documentários experimentais forjados com imagens espetaculares sobre as consequências da mão humana sobre o Planeta e cuja trilha sonora é assinada pelo genial compositor Philip Glass. Embora a trilogia mereça total audiência, é o primeiro da série aquele que mudou parâmetros tanto do cinema quanto da música moderna. E não se está falando somente da música de vanguarda ou “erudita”, mas, sim, da música pop. Isso porque a trilha sonora de “Koyaanisqatsi”, lançada em disco um ano depois do filme, passou a servir de referência a publicidade, cinema e demais produtos sonoros e audiovisuais com que se deparam milhões de pessoas todos os dias ao acessarem seus celulares ou ligarem um aparelho de TV.

Entretanto, é a pungência da proposta de “Koyaanisqatsi”, inédita até então em formato e proposta, que a faz uma obra referencial. Meio sinfonia, meio ópera, meio vídeoarte, “Koyaanisqatsi” tem uma narrativa até simples comparado à complexidade de sua trilha sonora e de sua montagem. Os povos originários, com sua sabedoria inata e imaterial, prenunciam que o homem caminha para o próprio cadafalso. A natureza, pujante, apresenta-se em sua majestade quase intocada. Porém, integra inevitavelmente esta mesma natureza uma espécie animal que soube valer-se de artifícios biológicos e etológicos para perpetuar sua sobrevivência e passar a supostamente comandar o rumo da biosfera: um tal de homo sapiens. Este ser é capaz de, por meio de sua interferência negativa sobre a natureza e com a justificativa de progresso da própria espécie, desequilibrar todo o sistema vital. Após uma enganosa escalada desenvolvimentista, a realidade de destruição e desrespeito com a Mãe-Terra cobra o preço e os as profecias ancestrais se concretizam tragicamente.

Uma das versões de poster
do filme de Reggio
Com a ajuda do Polyrock Kurt Munkacsi na produção, Glass desembaraça esta narrativa em brilhantes 13 peças/faixas onde, absolutamente integrado com o corpo imagético do filme, não desaproveita com sua ensemble nem os ruídos de multidão e o momento de créditos finais para musicar. Tudo muito orgânico. A faixa título, um sinistro canto nativo em tom baixo, acompanhado de um órgão igualmente denso, pronuncia apenas o próprio título: “Koyaanisqatsi”. Aqui já começa a genialidade atemporal de Glass, compositor talhado na vanguarda minimalista dos Estados Unidos da geração anos 60, mas que sempre soube conciliar esta visão contemporânea à tradição musical secular. Nesta abertura, ao mesmo tempo em que se escutam aborígenes encavernados, é possível identificar traços do canto gregoriano, criado à época do cristianismo primitivo, a meados do século VII. Já “Organic” acompanha os impactantes planos aéreos de cânions e rios através de sons leves e anunciativos. “Clouds”, porém, adiciona a esta solenidade sons refletidos e longilíneos acordes de clarinete, dando maior tensão e grandiosidade à música. É a natureza em sua imponência. 

Imponência ameaçada, contudo. “Resource”, colada à anterior, quebra de vez a linha sonora e adiciona sons eletrônicos em repetições mecânicas e contínuas. O bicho-homem chegou. A paisagem das montanhas é desfigurada por explosões e máquinas pesadas, que trazem consigo o pretenso progresso. Para isso, Glass engendra sons nervosos e automáticos. O teclado vira sirenes gritantes sustentadas por intensas sessões de cordas. Não é mais a natureza que emite sons: é a consequência da mão humana, com suas máquinas implacáveis e sem alma. A pequena orquestra, fervorosa, corre para dar conta da velocidade da tecnologia simbolizada pelos teclados. Fábricas soltam seus vapores poluidores. Extensos campos são invadidos por estruturas de ferro e metal. Rios são desviados deu seu curso. Uma bomba explode em fogo sob o olhar indefeso de uma árvore...

Todas as maravilhas que o homem cria agora estão à disposição para consumo. Carros, aviões, estradas, arranha-céus. A fantástica “Vessels” aprofunda o conceito denunciativo de “Resource” ao manter a base minimalista, mas adicionando-lhes poderosas vozes. E não mais as vozes dos povos originários do início da obra, mas corais bem mais clássicos, com tons agudos e variações de escala expressando autodevoção e fascínio. É o ser humano, crendo-se Deus e apaixonado pela própria inteligência. E não há mais freio a tamanha adulação: quer-se cada vez mais e mais apressadamente. Dentro da mesma faixa, Glass promove outra quebra brusca de ritmo e passa a empregar uma conjugação do órgão, flautas e as mesmas vozes deslumbradas em células sonoras repetidas em cinco tempos para representar o frenesi do trânsito de automóveis, símbolo da indústria capitalista. Só que o compasso se torna ainda mais frenético, começando a sair do apreensível, justo quando imagens de equipamentos bélicos são mostradas. Nenhuma coincidência.

“Pruitt Igoe” ensaia um adagio que tenta reduzir tanta impulsividade. Porém, já é impossível. A própria música, à medida que avança, vai ganhando corpo e novas formas de tensão, principalmente quando se veem as assombrosas imagens de prédios de arrabalde inteiros sendo implodidos para dar lugar ao mentiroso circo do capital. A confusão da percepção de tempo é trazida com alta sensibilidade em “SloMo People”, onde pessoas ora parecem formigas numa multidão movida em altíssima velocidade, ora estão num igualmente artificial slow-motion, como o título bem sugere. De propósito, elas nunca são enquadradas tal como a realidade é. Sutilmente, Glass impõe um compasso de dois tempos, os quais simbolizam o passo de um caminhar. Passos lentos, aliás, supondo que algo está claramente descompassado. 

O compositor mantém a estrutura dual para iniciar aquele que é o mais chocante tema de “Koyaanisquatsi”: “The Grid”. Agora, perde-se de vez o controle do destino. Usando sua assinatura sônica, os sistemas de ostinatos rítmicos (motivos ou frases musicais sempre repetidos). tal como em "Rubric", das "Glassworks", de um ano antes, Glass põe agora, inversamente ao que fez antes, as flautas e piccolos sobre uma base de sintetizador grave e num ritmo convulsivo. Enquanto isso, na tela, são expostos vídeos super acelerados de carros, fábricas, supermercados, filas, telas. Movimentos tão velozes que formam traços de luzes incompreensíveis ao olho do espectador. São minutos de imagens carregadas, labirínticas, mostrando a loucura da vida cotidiana de uma metrópole. A música, por sua vez, soa vertiginosa e espiral. As vozes reaparecem com as mesmas frases e variações delas para intensificar e ratificar a lógica narrativa. Sufocante, mas genial.

cena do filme com a trilha de "The Grid": a corrida maluca da vida moderna

A breve “Microchip” (em que inteligentemente Reggio traça um comparativo de imagens de satélite das cidades com as de estruturas destas minúsculas peças de silício, as quais compõem a “alma” dos artefatos digitais) funciona como um movimento larghetto, que reequilibra o andamento. Afinal, impossível andar mais rápido do que aquilo. Este breve “knee”, no entanto, é a deixa para que Glass volte àquilo que motivou toda a obra desde o começo: a tal profecia. Criador e criatura, é o homem que tem o bônus e o ônus dos próprios atos. Assim, a música se torna um andante, porém a construção melódica começa a parecer errática. As repetições, antes simétricas, independentemente se num compasso moderado ou ligeiro, agora se tornam quebradas, inconclusas. Como uma máquina que apresentou defeito e passa a funcionar mal. Forma-se uma sucessão de sons em que as repetições denotam a prisão a que o homem se colocou: não é mais possível sair daquele círculo, que vai e volta, sem se resolver. As vozes, então, passam a conviver e a se confundirem: o coral se aproxima agora do cantochão gregoriano e o canto ancestral retraz, convicto, aquilo que já avisava: “Koyaanisquatsi”.

A cena final, um extenso plano sequência de um acidente com um ônibus espacial, profetiza, através de sua crítica ao desenvolvimento a qualquer custo, o famoso acidente com a Challenger em 1986, quando, 73 segundos após o seu lançamento, a espaçonave explodiu em pleno ar, matando todos os sete astronautas tripulantes. Para este derradeiro ato, Glass emudece todos os outros instrumentos e opta por manter apenas o órgão, que agora não tem mais caráter tecnológico, mas sim litúrgico, como uma missa fúnebre. O morto? Claro, o próprio homem. 

Assim como Herzog, o paleontólogo e biólogo evolucionário britânico Henry Gee, editor sênior da revista científica Nature, tem uma visão nada alentadora do que pode acontecer com o planeta. Aliás, no caso de Gee, ainda mais pessimista. Segundo ele, se a humanidade seguir a tendência atual, a espécie humana corre sérios riscos de entrar em extinção ou, pelo menos, ser reduzida a um número bem restrito de indivíduos. A se ver pelo atraso em se tomar medidas efetivas, o prognóstico não pode ser diferente. Isso fica escancarado quando se vê que, quatro décadas atrás, Reggio e Glass já se uniam para lançar este manifesto fílmico-sonoro em que a simbiose entre imagem e música simboliza justamente a necessidade de integração homem-natureza. Um não pode viver sem o outro. Se hoje a ideia de motivos sônicos desta trilha são largamente imitados para inumeráveis produtos audiovisuais, de comerciais de televisão a jogos de videogame, de posts em redes sociais a outras trilhas para cinema, a mensagem ecológica que a obra traz bem que poderia ser copiada também. Visionário, o filme previa com assombrosa clareza uma série de questões hoje em pauta na sociedade moderna. E embora em seu decorrer sejam cantados outros versos (principalmente, no último movimento), “Koyaanisqatsi” se resume basicamente a este termo exótico, mas que traduz o mais óbvio e essencial alerta: se não houver uma radical mudança de comportamento planetária, este “mundo em desequilíbrio” está com dias contados. E o homem também.

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FAIXAS:
1. “Koyaanisqatsi” - 3:27
2. “Organic” - 4:57
3. “Clouds” - 4:38
4. “Resource” - 6:36
5. “Vessels” - 8:13
6. “Pruitt Igoe” - 7:51
7. “Pruitt Igoe Coda” - 1:17
8. “Slo Mo People” - 3:20
9. “The Grid – Introduction” - 3:24
10. “The Grid” - 18:06
11. “Microchip” - 1:47
12. “Prophecies” - 10:34
13. “Translations & Credits” 2:11
Todas as composições de autoria de Philip Glass

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OUÇA O DISCO:


Daniel Rodrigues

sexta-feira, 29 de abril de 2022

cotidianas #753 - O Cangaceiro

 

por Daniel Rodrigues

Admirar e criar arte tem, claro, muito da sensibilidade daquilo que vem conosco na alma. Porém, não podemos esquecer daqueles que, de alguma maneira, contribuem para esse olhar artístico e sensível que se desenvolve na vida. Meu irmão é um caso cristalino disso para mim. Já falei para ele do quanto de responsabilidade ele tem no que se refere à minha paixão pelo cinema desde quando, generosa e amoravelmente, me contava ipsis litteris as histórias do que havia visto nos cinemas quando eu ainda não podia acompanhá-lo em determinadas sessões por causa da idade. Mas não é sobre isso que eu quero falar agora (quem sabe, deixo para uma outra recordação escrita) mas, sim, justamente sobre este olhar artístico. Um olhar que não deixa de ser, no final das contas, a preservação daquele sentimento lúdico de quando nós, eu e ele, crianças, brincávamos juntos, tornando ideias inanimadas em algo nosso, em diversão, em comunhão. Em arte.

"O Cangaceiro" (2022)
RODRIGUES, Daniel
Pastel sobre papelão pardo (21x29cm)
E posso afirmar que a arte salva. Ao menos, salvou a minha pele uma vez em que contei com esse olhar artístico de meu irmão para me tirar de uma enrascada. E que salvamento foi aquele! Sabe aquela mania de aluno de deixar para fazer o que foi pedido na escola para a última hora? Quem nunca, né? Pois, desta vez, no entanto, não foi uma mera lição de casa, mas a preparação para uma festinha na escola. 

À fantasia. 

Eu e meu irmão estudávamos no Edgar Luiz Schneider, escola estadual na Intercap, bairro periférico da Zona Leste de Porto Alegre, que ficava a poucas quadras de nossa casa. Ele, mais velho, pela manhã, nos anos mais avançados do Ensino Fundamental, e eu, criança, à tarde, pela quarta ou quinta série. Haveria, portanto, uma festa à fantasia na minha sala naquele dia, a qual havia sido anunciada pela professora a todos os alunos com a devida antecedência. Tudo bem, considerando que não era incomum as professoras mobilizarem os alunos para alguma celebração, às vezes nos pedindo para levar de casa lanches ou bebidas. E tudo bem também em deixar para a última hora, pois dava para comprar uns salgadinhos ou um refri no mercadinho a caminho do colégio. Porém, naquela vez eu havia deixado de providenciar justamente o motivo da festa, ou seja, a fantasia.

Almoçado e de mochila pronta, lembro que congelei antes de cruzar a porta de saída de casa: “E a minha fantasia?!”, lembrei-me. Bateu aquele pavor. Mesmo que aquela falta não tirasse ponto no boletim, seria muito vexatório chegar com a roupa do dia a dia e encontrar meus colegas vestidos de Super-Homem, fadinha, Batman, bailarina, She-Ra, Smurf ou seja lá o que fosse. Havia apagado da mente a tal festinha e, com isso, cancelei a oportunidade de ir à antiga loja SuperFestas, no Centro, com minha mãe para achar algo que me trajasse. Aliás, minha mãe, no trabalho àquela hora, início da tarde, nem desconfiava que o filho passava por uma complicação daquela natureza. 

O que eu faria? Como sairia daquela? Nada ocorria a mim, criança pouco despachada para traquinagens que poderiam desencavar alguma solução. Foi então que, percebendo minha aflição, um anjo se postou à minha frente. E quem tem anjos em forma de irmãos artistas, tem mais chances de ser salvo – nem que seja da reprimenda da profe ou, pior, da tiração de sarro de coleguinhas fantasiados.

Informado do meu caso, meu irmão (não sem antes me lançar aquele olhar repreensivo de: “Tu, hein, Dã!...”), pôs-se a pensar comigo numa roupa que tivesse caráter de alegoria, mas que conseguíssemos resolver ali, dentro de casa e em poucos minutos, pois a sirene do colégio tocaria dali a pouco. O que poderia ser com o que se tinha a mão? Quem sabe, algo dele mesmo. Não daria, visto que a nossa diferença de idade, àquela época, eu, criança, e ele, adolescente, significava também uma brutal diferença de medidas. Esquece... Algum vestido de minha mãe? Mas seria uma fantasia de que, de Super-Dona Iara? Não, não era uma boa ideia também... Ou, talvez, procurar alguma peça guardada de minha vó... mas o que exatamente? E quanto tempo se levaria para, provavelmente, não encontrar algo que cumprisse a função de fantasiar? Estava difícil. Até que ele, artístico como sempre foi, afeito ao desenho e às formas, teve uma brilhante ideia. Afastou-se de mim e saiu pela casa. Via-o passando de peça em peça procurando coisas. Depois, vasculhou o guarda-roupa e, de volta, por fim, me perguntou: “Tu ainda tem aquela sandália horrível de couro que a mãe te deu?” Sim, eu ainda tinha as tais sandálias de dedo, as quais, de fato, eram horríveis, próprias para um bom retirante nordestino. Nunca gostei de usar sandálias, mas daquela vez não só tinha de usar como acabei gostando da ideia. Explico.

Obediente e colaborativo, visto que parecia que meu problema ia se resolver, fiquei tal um manequim imóvel à disposição de meu irmão enquanto ele, com um figurinista, me produzia. Pôs-me um casaco de inverno bege com as mangas encurtadas e aproveitou a própria calça de jeans escuro que eu já vestia dando um jeito de virar suas bainhas até quase a altura dos meus joelhos. Também enrolou um lenço em meu pescoço com o nó para a frente, fechado no gogó. Claro, tive que trocar meus confortáveis tênis pelas benditas sandálias franciscanas, mas eu estava convencido de que calçar aquilo era por uma boa causa. O requinte final do figurino foi um malcheiroso chapéu de couro de vaqueiro que decorava a parede de nossa sala, o qual meu irmão enfiou-me na cabeça, e ainda me deu na mão uma espingarda de plástico tipo baioneta tirada do nosso cesto de brinquedos. 

Estava pronta minha fantasia: eu havia virado um cangaceiro.

De quase intruso e deslocado, eu virei a atração da festa por causa de minha fantasia de pequeno Lampião. Até meus óculos de armação redonda lembravam, coincidentemente, os usados pelo valentão Virgulino. Não teve pra Super-Homem, bailarina, fadinha, Batman, She-Ra, nenhuma daquelas fantasias prontas e compradas pelos pais de meus colegas. Embora perfeitas, nenhuma batia a minha em criatividade e impacto, tanto que as professoras, que me queriam muito bem e admiravam aquele guri dedicado e estudioso que eu era, perguntavam-me, admiradas: “Quem teve a ideia de fazer essa fantasia, Daniel?” E eu dizia, orgulhoso: “Meu irmão”. O mesmo que hoje, arquiteto, pai dedicado e compartilhador de sua veia artística com a filha e com o mundo, completa mais um aniversário. Um eterno cúmplice e parceiro de minhas investidas artísticas. Estarei sempre aqui para te servir de manequim e me transformares naquele homenzinho do Cangaço ou naquilo que te vier à mente. Sei que será algo muito criativo e inspirador para a minha vida, com certeza. Isso é infalível. 

Te amo, cabra da peste.


Para Clayton

quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

"Hulk", de Ang Lee (2003) vs. "O Incrível Hulk", de Louis Leterrier (2008)




Não é exatamente de um remake, é mais um arrependimento. Depois de ver o resultado final de "Hulk", de 2003, sua baixa aceitação e fraca bilheteria, a Marvel, até para incluir no arco de seu Universo Cinematográfico que começara a se desenvolver a partir de "Homem de Ferro", resolveu fazer tudo de novo.. só que diferente. 
Mesmo contando com um belo orçamento, com um elenco interessante de nomes como Eric Bana, Jennifer Connely, Nick Nolte, e com um diretor de primeira, o oscarizado Ang Lee, o primeiro filme do monstrão verde não agradou a quase ninguém. A história até que era boa, explorando desde a origem, desde as experiências do pai de Bruce, resultando na mutação que o tornava resistente aos raios gama, só que desenvolvida de maneira um tanto atropelada, cheia de pontas soltas e bastante insatisfatória, como o próprio diretor, inclusive, admite. A linguagem visual também era bem interessante, remetendo diretamente às HQ's, com tela dividida, um colorido bem característico vivo e vibrante, fontes de texto típicas de HQ e onomatopeias na tela. O grande problema mesmo foram os efeitos especiais e, principalmente, o visual da criatura. 
Meu Deus!...
O Hulk, exatamente o elemento que deveria receber o maior cuidado, o melhor tratamento, parecia de borracha, totalmente artificial. Parecia um daqueles bonecos que se vende nos camelôs em época de Dia das Crianças ou Natal. Deprimente! Aí não teve jeito: o filme perdeu todo o crédito e toda a boa vontade por parte de crítica e público.
Já que ia começar, mesmo, um novo projeto, um universo contínuo, interligado e coerente entre os personagens, a Marvel, diante do insucesso do filme de origem do homem verde, resolveu refilmar o negócio todo, reformulando o elenco e trocando o diretor. É que nem aquele clube que investiu no time numa temporada, fez boas contratações, chamou um técnico de renome mas não ganhou nada e ainda foi malhado pela crônica esportiva. O que que o presidente do clube fez, então? Pra começar, contratou um gerente de futebol, que seria, no caso, o Kevin Feige, pra capitanear o projeto MCU. Com o novo manager à frente, contrataram um novo camisa 9, Edward Norton, pra ser o homem decisivo; alguém competente ali pro meio-campo, a simpática Liv Tyler, que não é nenhuma craque mas dá conta do recado; um cara ágil pra acelerar o jogo, o bom Tim Roth; e um medalhão, o veterano William Hurt, já com um prêmio de melhor do mundo FIFA nas costas (ou seja, um Oscar), pra ser aquele cara pra garantir a experiência do grupo. Pra conduzir o time, ao invés de apostar em nome de impacto, faixa no peito, taã no armário e coisa e tal, o novo diretor de futebol acabou optando por um técnico mais afeito com o tipo de jogo pretendido: correria, bola na área, marcação alta... Tiro, porrada e bomba, pra resumir. Louis Leterrier, não era nada de mais, nada brilhante, mas era acostumado com filmes de ação e, até por isso, o resultado final ficou bem mais aceitável. "O Incrível Hulk", de 2008, também não é nenhuma obra-prima mas atendia melhor as expectativas do estúdio e do público, que, até pela relação estabelecida com "Homem de Ferro" e a promessa implícita de um longa dos Vingadores, recebia bem melhor o novo projeto.
O reboot abria mão de toda a parte de origem do personagem, o que no original era crucial e ocupava boa parte do filme, para limitar-se a resumir todo o surgimento do Hulk ao longo os créditos iniciais, e daí já desembocar no momento em que, meses depois do incidente, nosso herói, alvo dos militares que desejavam o poder obtido na experiência, se escondia numa comunidade do Rio de Janeiro, tentando viver sua vidinha o mais normalmente possível, enquanto tenta descobrir uma forma de dominar permanentemente aquela coisa que quando surge de dentro dele, é incontrolável.
A sequência da perseguição na favela da Rocinha é eletrizante, a cena no campus da universidade é muito legal e a briga final entre o Hulk e o Abominável, o monstro em que o militar Blonsky, vivido por Tim Roth, se transforma, é, esta sim, digna de um filme de super-herói. Sem falar nos easter-eggs recheados de nostalgia: os olhão verdão arregalado de Banner, na primeira transformação, na fábrica, imitando a expressão de Bill Bixby, o Banner do seriado dos anos 70; a própria "aparição" de Bixby, já falecido, na tela de uma TV, na casa de Bruce; a participação de Lou Ferrigno, o fortão que fazia, sem efeitos especiais, o homem-verde na série, como segurança na faculdade; e uma breve mas significativa execução de "The Lonely Man Theme", aquela música triste que tocava no final da série quando, depois de transformado, reestabelecido como humano, o Dr. Banner seguia, sem destino por alguma estrada em busca de si mesmo e convivendo com aquele monstro que não sabia como controlar.

"Hulk" (2003) - trailer




"O Incrível Hulk" (2008) - trailer


Ampla vantagem para o filme novo: Edward Norton é muito mais jogador que Eric Bana, William Hurt, como General Ross, é muito melhor que Sam Elliot, no mesmo papel; o Abominável é um vilão muito mais fodão que o Homem-Absorvente (agora, veja só o nome...); o Hulk em si, sua figura, sua textura, sua interação com o ambiente, toda a CGI dão um banho de bola no antigo; e as referências ao seriado antigo...ah! aí desequilibra o jogo.
A namoradinha, Beth Ross é um caso à parte porque, se, por um lado, Jennifer Connely do filme de 2003 é mais atriz, por outro, a personagem da segunda versão é mais fiel, mais parceira, menos filhinha-do-papai.
A favor do primeiro filme temos o fato de esmiuçar as origens, a experiência, que levou à metamorfose; e, especialmente, a estética de histórias em quadrinhos que ficou muito show. Mas não é o suficiente. O "Incrível Hulk" de Louis Leterrier esmaga o "Hulk" de Ang Lee e vence facilmente.


Aqui, os principais destaques
das duas versões, lado a lado.


O Hulk de 2008 dá uma surra no Hulk de 2003 igual àquela que 
ele mesmo viria a dar no Loki em "Os Vingadores". 
Tratando como se fosse um boneco (e parecia ser mesmo, não?)
Vitória fácil do Verdão.
(Ah, os dois jogam de verde...)
Então, vitória do Incrível Verdão!





por Cly Reis

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Copa do Mundo Gilberto Gil - classificados da terceira fase





Quem disse que seria fácil?
É, quando se trata de música do Gil, contra música do Gil, muitas vezes fica quase impossível decidir qual a melhor.
Mas essa é nossa tarefa aqui e a fase de dezesseis avos-de-final foi torturante para fás como nós.
Ter que eliminar Domingo no Parque, Raça Humana, Tempo Rei, Drão... Pois é, caros clybloguianos, essas são algumas das grandes que ficaram pelo caminho nesta fase.
"Mas como???", pode questionar alguém, indignado.
Calma, calma e veja abaixo a justificativa dos nossos treinadores.
(O que não significa que você vá concordar com ela)


Seguem, abaixo, todos os jogos e os classificados para as oitavas-de-finais:

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resultados de Joana Lessa

PANIS ET CIRCENCES 1 x 0 AMARRA O TEU ARADO A UMA ESTRELA
Pela importância histórica, Panis et Circense leva de Amarra O Teu Arado A Uma Estrela num resultado simples, 1x0

FILHOS DE GANDHI 5 x 3 DOMINGO NO PARQUE
Jogo que deveria ser empate por conta da qualidade das equipes, Filhos de Gandhi leva o clássico contra Domingo no Parque por 5x3

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resultados de Kaká Reis

REALCE 2 x 1 ILÊ AYÊ
Começando a disputa com uma das mais icônicas músicas de Gil, Realce x um hino da Senzala do Barro Preto, o bloco que leva o nome da música: Ilê Ayie (Ayê). Disputa acirradíssima não fosse o fato da composição de Ilê Ayê ser de Paulinho Camafeu, fazendo com que Realce ganhe esse jogo por 2x1.
Fim de jogo e Realce permanece!

THREE LITTLE BIRDS 0 x 2 ZUMBI, A FELICIDADE GUERREIRA
Mais uma vez, a composição do gênio vai vencer essa disputa! Bob Marley x Gilberto Gil e Wally Salomão… é 0x2 pra Zumbi! que segue na disputa!

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resultados de Daniel Rodrigues

TEMPO REI 0 X 1 SÍTIO DO PICA-PAU AMARELO
Para terem chegado a esta fase, é claro que se trata de dois clássicos do repertório de Gil. Confronto muito parelho este. De um lado, “Tempo Rei”, com sua maturidade e pensamento claro com a pegada elevada do seu autor; do outro, a poética do universo lobatiano que tanto marcou gerações na TV. Difícil, mas quem tira do zero o certame é “Sítio...”. Cheia de encantos, ela fez uma jogada tão mágica que surpreendeu seu adversário, que, quando viu, a bola já estava dentro do gol. “Pode isso, Arnaldo?” A jogada foi pro VAR e o juiz de vídeo não detectou nada, então ficou valendo a decisão de campo mesmo. Final: “Sítio do Pica-pau Amarelo” 1 x 0 sobre “Tempo Rei”

MARACATU ATÔMICO 1 X 2 HAITI
Outro jogo pegado. No ritmo nordestino, “Maracatu...”, do alto de seu prestígio de clássico, mal começa o jogo e já marca o seu. Enquanto isso, “Haiti” mantém seu estilo lento mas contundente, que mantém o mesmo ritmo em praticamente todo o andamento, mas sempre sendo perigoso, ousado. Até que, de tanto envolver o adversário com seus versos misto de rap e repente, “Haiti” empata. Lembram do bordão da torcida organizada de “Haiti”, né? “O Haiti é aqui!” Pois embalado pelas arquibancadas e sem medo do enfrentamento, a parceira Gil/Caetano põe de novo na rede para se consagrar vencedora. Vitória apertada de 2 x 1,

ORIENTE 0 X 1 BACK IN BAHIA
O clássico “Oriente-Ocidente” é um verdadeiro jogo de extremos. As músicas coirmãs formam, grosso modo, começo e fim de “Expresso 2222”. “Back...” com um brit-rock empolgante, daqueles que partem pra cima já de cara sem deixar o adversário respirar. Já “Oriente”, voz e violão, é dona de um futebol mais cadenciado, mas cheio de surpresas em seu arranjo/esquema intrincadíssimo, quase intransponível. Mas pra “Back...” não tem time invencível. Depois de uma bola dividida pra lá e pra cá, e é ela que, num rebote, quase ao final da partida, quando já se imaginava que a igualdade no placar iria se manter, que põe pra dentro. Na comemoração, o goleador ainda tira uma onda com a adversária: “Se oriente, rapaz!”


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resultados de Leocádia Costa

VITRINES 1x 4 CÁLICE
Essa versão violão e voz de Gil para a composição feita com Chico é linda! Escutei essa canção desde sempre, daquelas que emocionava por toda a sua crítica e representatividade. A versão ao vivo, na USP, no ano que eu nasci, onde a galera pede bis e Gil pede a letra ganhou de goleada do adversário, que entrou bem no clima mais rock e distorção, mas perdeu no quesito, pra história!

REFAZENDA 3 x 2 DRÃO
A vitoriosa tem tudo aquilo que Gil domina: letra, música, violão, ritmo, fala e os “ááááááás”! O arranjo harmonizado com cordas amplia ainda mais a canção na versão original. “Refazenda” é um alerta importante de renovação constante. Amo! Porém, “Drão” é uma música que traz o coração, a amizade e a forma poética de Gil e Donato. Difícil, mas ao final “Refazenda” leva!

AQUELE ABRAÇO 3 x 2 BARATO TOTAL
A Copa é do Gil, né? Essa canção, “Aquele Abraço”, é ele, sempre! É que nem um time entrar em campo sem a sua lenda, sabe? Faz falta! E a versão de “Barato Total” é eterna na voz de Gal. Por isso o jogo foi se complicando e chegou na vitória para o hino “Aquele Abraço”, que fazia o Chacrinha balançar a pança, nas tardes de sábado e embalou a minha caminhada inicial musical da primeira infância até os dias de hoje.


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resultados de Rodrigo Dutra

PALCO 2x1 SÃO JOÃO XANGÔ MENINO
Xangô Menino entrou em campo querendo festa e puxava o coro “Viva São João, Viva Refazenda”, mas distraído pela pouca idade, foi vencido no “Palco” pelo ritmo dançante do hit oitentista. Foi eliminado cantando e comendo milho verde.

ESOTÉRICO 1x0 MARGINÁLIA II
“Marginália II”, Aqui é o fim da Copa do Mundo, óóóó. O reggae de “Esotérico” (e outras versões, como a linda acústica da turnê dos 50 anos) são lindas demais, mas o placar foi apertado.

SUPER-HOMEM (A CANÇÃO) 0x0 TODAMENINA BAIANA (4x1 nos pênaltis)
Caetano viu o filme dos anos 70 e saiu entusiasmado contando pro Gil, que fez essa ode às mulheres, uma vibe homem feminino, linda linda, como toda menina baiana. Jogo parelho no tempo normal, mas nem toda menina baiana sabe cobrar pênaltis (inventei desculpa porque com dor no coração elimino essa lindeza de música).


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resultados de Cly Reis

O SOM DA PESSOA 2 x 1 FLORA
Jogo dificílimo! Grandes músicas, cada uma com seus méritos diferentes. Passa 'O Som da Pessoa' pela concisão, pela poesia concreta. Mas foi ali, ali...

ANDAR COM FÉ  6 x 0 KAYA N'GAN DAYA
'Kaya N'Gan Daya' já entra em campo perdendo. Mesmo com os méritos pela releitura, 'Kaya' é do Marley. Sem chance. 

RAÇA HUMANA 0 x 1 EXPRESSO 2222
Putaparil!!! Esse confronto é pegado!!! Toda a poesia filosófica de 'Raça Humana', contra toda a riqueza e vitalidade de Expresso 2222. 'Raça...' tem o lindíssimo verso do refrão que é quase um provérbio, mas 'Expresso...", por tudo, sua força, energia, ritmo, além de ser da época de Londres, do exílio, leva pequena vantagem e se classifica. No sufoco. Gol aos 49 do segundo tempo.

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CLASSIFICADAS PARA AS OITAVAS-DE-FINAL
PANIS ET CIRCENCES
FILHOS DE GANDHI
REALCE
ZUMBI, A FELICIDADE GUERREIRA
SÍTIO DO PICA-PAU AMARELO
HAITI
BACK IN BAHIA
EXPRESSO 2222
ANDAR COM FÉ
O SOM DA PESSOA
ESOTÉRICO
SUPER-HOMEM (A CANÇÃO)
AQUELE ABRAÇO
PALCO
REFAZENDA
CÁLICE




Assim que realizarmos o novo sorteio e tivermos definidos os confrontos, 
eles estarão aqui no ClyBlog.
Fique ligado!


quinta-feira, 8 de setembro de 2022

"Hera, A Glória de Uma Deusa", de George O'Connor - Coleção Deuses do Olimpo - ed. Paz e Terra (2012)





"Hera é minha deusa favorita.
Em parte, porque é o único ser que Zeus realmente teme (...)"

"(...) Hera é uma megera.
Talvez isso seja verdade me relação a Hera, mas só porque Zeus é um péssimo marido.
Caramba, ele devorou a primeira esposa,
 teve dezenas de filhos com dezenas de namoradas e
levou algumas para morar a seu lado no Olimpo... com Hera.
Quando Hera fica com ciúmes, dá para culpá-la?"
George O'Connor



Novamente, minha filha me possibilitou ler mais um número da coleção Deuses do Olimpo, adaptações para quadrinhos das lendas dos deuses da mitologia grega. Desta vez, trouxe da biblioteca da escola "Hera, A Glória de Uma Deusa", edição dedicada à mulher que teria feito o "galinha" e infiel Zeus, andar miudinho. Hera não conseguiu colocá-lo na totalmente na linha, é verdade, mas exigiu ser respeitada como nenhuma outra das conquistas, terrestres ou celestes, do deus máximo do Olimpo, havia ousado reivindicar.

Cortejada por Zeus, Hera colocou como condição para se entregar a ele que o mesmo a reconhecesse como sua legítima esposa e renegados seus, não poucos, filhos bastardos. Ele aceitou, escondendo, no entanto, um pelo qual nutria um carinho especial, Hércules, semideus conhecido por sua incomensurável força. Hera sabendo da existência daquele bastardo e, uma vez falhando em tentar matá-lo ainda na origem, pequeno, se fez de desentendida, agindo na surdina, de modo que o filho ilegítimo de seu marido fosse submetido pelo nobre Eristeu, a seu serviço, às mais duras provações, tarefas que ficaram conhecidas como Os Doze Trabalhos de Hércules. 

Nesse ponto da história, o protagonismo se desvia de Hera e é direcionado para Hércules, acompanhando seus desafios e dando à história características de HQ de super-herói com todas as demonstrações de força do semideus em combates como o enfrentamento com o leão da Nemeia, criatura gigantesca à qual o herói não somente derrota como ainda tira o pelo passando a usá-lo como manto; a captura de Cérbero, o cão do inferno; a batalha com a Hidra de Lerna, mostro de oito cabeças, que teve todas elas decepadas pela espada de Hércules; e a caça às aves de Estínfale, usando flechas embebidas, por sinal, no sangue venenoso da Hidra. Coisas de super-homem com superpoderes!

Mas apesar do destaque do fortão, todos os episódios se passam à sombra da verdadeira poderosa: Hera é a mulher que se impõe, se faz respeitar, utiliza seu poder para colocar ordem na casa, e o autor da HQ, George O'Connor, faz questão de salientar essa justiça com a personagem, frequentemente mencionada de forma muito superficial apenas sempre à margem dos feitos e estrepolias de seu marido Zeus.

Interpretação interessante do autor que utiliza uma graphic-novel e a mitologia grega como um canal para salientar o valor da mulher e destacar sua importância, seja na sociedade grega, no Olimpo, ou nos dias de hoje. Seja ela deusa ou mera mortal.
Hércules, o super-herói da mitologia grega, em dois momentos:
enfrentando a temível Hidra (à esq.) e, à direita, capturando o feroz Cérbero.





Cly Reis 

segunda-feira, 10 de maio de 2010

"Homem de Ferro 2" de Jon Favreau (2010)








Sabadão... Depois de ir ao Atêrro do Flamengo pela manhã para ver as classificatórias do Air Race, emendei a tarde com uma sessão de cinema de “Homem de Ferro 2”. Estava mais com vontade de ver a sequência pelo fato do primeiro ter sido muito legal, de gostar de quadrinhos e do personagem, do que com esperanças que repetisse a qualidade do original. No início o filme parecia que iria desmentir minha expectativa e possivelmente ser até melhor que o anterior, mas aos poucos acabou-se confirmando ser apenas mais uma seqüência com muita ação, explosões, correria e tudo mais. A revelação da identidade de Tony Stark como Homem de Ferro em um noticiário de TV funcionando como um flashback ágil e inteligente; a dimensão da Iron-Mania visto na Expo-Stark; e toda a cena de Mônaco, com aéreas, câmeras on-board nos carros , inserções de imagens de telejornais e todo o ambiente, davam um ritmo alucinante e qualificado até ali. Somando-se à ótima a cena em que a câmera, na visão de Stark ,atravessa entre os fãs e imprensa, lembrando o clipe de "Smack My Bitch Up" do Prodigy; e aos afiadíssimos diálogos, principalmente as falas de Tony Stark, na sessão do congresso para “estatização” do Homem de Ferro, pareciam indicar que teríamos algo a mais nesta nova aventura. Engano! Aos poucos a coisa vai amornando; algumas coisas ficam sem explicações razoáveis; nosso vilão, Ivan Vanko (Mickey Rourke), tem motivos meio vãos e vagos e além do mais, no fim das contas, não mostra-se tão ameaçador assim. E o que temos então é SOMENTE um bom filme de ação sem grandes brilhos, novidades, tecnologias ou tramas.
Vale pelo super-herói, vale pela seqüência, pelos quadrinhos, pela roupa colante da Scarlet Johanson (à direita) e pelo ótimo Robert Downey Jr que, aliás, acho que nasceu para interpretar o homem da armadura vermelho e dourada. A propósito, Tony Stark é provavelmente o personagem mais filha-da-puta da história dos quadrinhos, não? Não vale nada! Provavelmente é por isso que simpatizo tanto com ele (hehehe)!


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Detalhe: assim como em “X-Men – Confronto Final” e “Wolverine”, tem uma cena extra depois dos créditos bastante curiosa, já encaminhando sobre uma próxima aventura da Marvel. Fiquem ligados!
É aguardar.


por Cly Reis

domingo, 31 de março de 2024

cotidianas #826 - 'SPQR: O Super-Soldado Romano'

 




- Mandou me chamar, Senhor?

O governador se ajeitou no trono e encarou o homem à sua frente com um olhar sentencioso.

- Chegou a meus ouvidos que teria sido ideia tua aplicar a tal poção bizantina em um dos condenados.

O centurião, um tanto embaraçado, hesitou um instante mas confirmou:

- Sim, meu senhor..., a sugestão foi minha.

Novamente acomodando-se no trono, desconfortável, incomodado, o governador da Judéia, claramente impaciente, lançou ao centurião:

- E não te passou pela cabeça, em nenhum momento que DANDO AQUELES PODERES A UM INDIVÍDUO QUE JÁ ERA ADORADO, IDOLATRADO, ELE PODERIA  FICAR AINDA MAIOR COM TUDO ISSO? - aumentando gradativamente a voz até terminar a frase praticamente num berro.

- Eu... eu considerei que deveríamos testar antes de dar aos nossos soldados e... pensei que fosse melhor dar a um condenado pacífico do que àqueles outros, bandidos, assassinos... se tivesse algum outro efeito, se ficasse violento, seria mais fácil de controlar e...

- ... E então ele resiste a mais castigo e torturas do que qualquer outro homem resistiria, revive dias depois e ainda assim pareceu uma boa ideia? - completou interpondo-se na frase do subordinado. 

O legionário não soube o que responder.

- Bem, - tentando acalmar-se - ao menos agora temos a certeza que a tal poção para o super-soldado romano funciona. Nossos homens ficam mais resistentes, suportam qualquer dor e, principalmente, não podem ser mortos. 

- Sim, meu senhor... Embora não tenhamos certeza de quanto tempo podem viver depois de retornarem da morte, creio que a experiência foi positiva. - argumentou o centurião, um pouco aliviado.

- Tragam aqui o alquimista bizantino, ou seja lá como chamam aquilo que ele faz. - ordenou o governador Pilatos a um dos soldados que guardava a porta.

O governador da judéia bebeu um gole de vinho e, enquanto aguardava o retorno do soldado trazendo o místico, voltou a dirigir-se ao centurião:

- Quero, então que dê a solução para todos os soldados. Mandem esse hierofante ou seja o que for preparar a fórmula. Dêem-lhe o que for preciso para produzir para todos nossos homens.

- Sim, meu senhor. - assentiu o militar.

- Quanto ao judeu, - prosseguiu com as ordens - localizem-no, dêem um fim nele e certifiquem-se de que todos que o viram vivo não possam confirmar o fato.

Neste momento, quase correndo entrou pela porta o soldado, com uma aparência pálida e olhos arregalados.

- O que foi? - quis saber o governador - Onde está o homem?

- Sumiu, meu senhor.

- Como assim sumiu? Alguém deixou que ele fugisse? Abriram sua cela, foi isso?

- Não, meu senhor... Sumiu! Evaporou...

- Como 'evaporou'? - duvidou o nobre - Isso é alguma espécie de brincadeira? Vou mandar te crucificar e ao responsável por essa troça!

- Eu juro, meu senhor, eu juro. Se desfez como fumaça, passou entre as grades, voou pela janela, se espalhou pelo ar...

- Centurião Flávio Augusto, leva este homem. Crucifiquem-no e a todos envolvidos nessa galhofa!

- Sim, meu senhor. Ave, Tibérius! - E saiu segurando o soldado pelo braço sem resistência alguma.

Novamente sozinho no salão, em seu trono, Pôncio Pilatos recostou-se reflexivo. O estrago já estava feito: eles endeusariam o tal nazareno, o seguiriam incondicionalmente. Sabia que os tempos, a partir daquele momento seriam diferentes para Roma e seu Imperador. O mundo acabara de recomeçar.




Cly Reis

 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Rio Comicon 2011





Acontece a partir de hoje e vai até domingo, dia 23 de outubro, aqui no Rio, a segunda edição do Rio Comicon apresentando as mais variadas facetas dos quadrinhos, artes gráficas, animação e afins. A primeira foi muito bacana e além dos paineis, vídeos, estandes de editoras e expositores, apresentou um espaço especial reservado a Milo Manara, contando inclusive com a presença do próprio para uma palestra e debate com o público.
Este ano a ênfase do festival de quadrinhos e afins é nos mangás e super-heróis, inclusive aproveitando para celebrar os 75 anos da major DC Comics, proprietária de nomes como Batman e Super-Homem.
Outros destaques também são a exposição do pessoal do estúdio japonês de mangás CLAMP e as presenças do ótimo cartunista argentino Liniers e do roteirista Chris Claremont, a principal estrela da festa, responsável pelos textos dos quadrinhos dos X-Men e que inspiraram suas recentes adaptações cinematográficas.

Vou dar uma conferida lá, provavelmente domingo.
Depois posto fotos e comentarios aqui no blog.



A DC Comics, do Batman, será
homenageada no evento


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O Rio Comicon 2011
acontece na Estação Leopoldina, aqui no
Rio de Janeiro
e os ingressos custam R$20,00 (inteira)
e podem ser adquiridos no local


quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Copa do Mundo Gilberto Gil - Oitavas-de-Final



Restaram apenas dezesseis.
Justo ou não, ei-las aqui.
Algumas gigantes já deram adeus, é verdade, mas, por outro lado, só restaram potências da discografia do baiano.
Destaque para alguns confrontos explosivos nessa rodada: 'Sítio...' contra 'Palco', 'Panis...' enfrentando 'Expresso 2222', e, talvez o maior embate desta fase, ' a destruidora 'Refazenda', que vem eliminando adversários difíceis como 'Pai e Mãe' e 'Drão', encara a poderosa 'Super-Homem', que vem com fama de indestrutível. será que vai ter cryptonita o suficiente?
Queremos saber...

Assim que nosso corpo de super-técnicos encarar os confrontos e informar seus vencedores, traremos os classificados aqui no ClyBlog.  

Confira abaixo, todos os jogos das oitavas-de-final:





sábado, 28 de dezembro de 2013

cotidianas #263 - Projeto R



Foto dos restos do incêndio
com os arquivos encontrados.
Os relatórios a seguir foram encontrados nos escombros do incêndio do III Grupamento Militar da  Zona IV, Phoenix, AZ.
Os própros soldados do batalhão combateram o fogo, até a chegada dos bombeiros, mas não puderam evitar a destruição praticamente total da unidade. Pouca coisa foi salva, mas registros parcialmente recuperados da Divisão de Ciências do grupamento, ajudam a conhecer algumas circunstâncias, até hoje não totalmente esclarecidas, do incêndio que destruiu as instalações do quartel e vitimou grande parte do batalhão.
Além do arquivo-geral da batalhão, foi encontrado o diário pessoal do Dr. Stewart, médico-responsável do local e chefe dos projetos científicos. Muitas páginas foram queimadas mas, na medida do possível, as informações foram colocadas em ordem cronológica.
Esta parte, encontrada danificada, parece definir os objetivos da Divisão naquele momento. O nome do relatório, e outras partes da introdução, encontravam-se chamuscados mas o procedimento cinetífico em questão parece ter sido chamado de PROJETO R.


 (sem indicação de início)
...jeto R visa a imunização total contra quaisquer tipo doenças, o aumento de resistência a ferimentos em áreas não vitais do corpo, e ainda um (...) força muscular em um curto prazo sem a necessidade de atividade física específica, de modo a dotar o solda... divisão e...
(...) graus de longevidade, força e ...stência para ...tividades de campo e combates.
(...)
...cedimentos com ratos, macacos...
(...)
...humanos

dia #7
As experiências têm sido bem sucedidas. Os rato responde bem à substância.

dia #8
Os ratos continuam apresentando atividade normal.
Nada de diferente, por enquanto.

dia #9
Algo interessante. O rato A, que recebeu injeção da substância parece subitamente inquieto. O rato B, sem o medicamento, parece acuado.

dia#10
A srta. Bailey , minha assistente foi quem notou que o rato A está extremamente agressivo, até mesmo...
(…)

 provavelmente dia #11 ou #12 (cabeçalho queimado - impossível identificar)
… terrível quando encontramos o rato B totalmente devorado pelo rato A.
(...)
Sacrificamos o animal de experiên...
(...)

dia #16
Modificações na formulação do AH-30 foram feitas. Aplicamos em outro rato.

Páginas do dia #17 a #35 destruídas

dia #36
...sde a redosagem da medicação, a nova amostra, rato C, tem reagido normalmente em relação ao outro. Maior resistência na esteira, mais força, sem indícios de degeneração celular.
Impressionante.

dia #57
(…) substituir as amostras...

dia #60
… macacos respondem bem à substância.

dia #123 (apenas fragmentos de palavras podem ser identificados no diário neste dia)

(…) redosagem... tentativas...
...macacos … experiência... humanos...
… força …
imortalidade.

dia #157
Não sei se devo fazer isso mas, diante dos resultados positivos obtidos com os macacos, resolvi trocar a amostra (…)
Indivíduo branco, aproximadamente 32 anos (…)
Se tudo der certo estaremos fazendo aqui o super-soldado, talvez o super-homem.

(Os dias #158 a #165 apenas apresentam relatos da melhora de saúde do indivíduo, do qual não conseguimos identificar a procedência nos arquivos)

dia #166
É com pesar que registro a perda da amostra. O paciente faleceu subitamente depois de vir apresentando impressionante evolução de saúde. Uma pena.
Temo não ter mais o devido entusiasmo para retomar as experiências.
Comunicarei a decisão a meus...

dia #167
Está vivo! Está vivo!
Acredito que a substância tenha agido de alguma forma, de maneira retardada. A move-se com alguma dificuldade, parece confusa (...)dócil.
(...)íris e pupilas totalmente esbranquiçadas.
(...) fome...

dia #167
(...) erece uma comemoração!
(...)i uma champagne e comemorei com a srta. Bailey, o único outro ser-humano que tenho contato nos últimos 5 meses. Até hoje, é claro. Hoje juntou-se a nós a 'amostra '.
(Tenho que dar um nome para a amostra)

dia #168
(...) amostra (...) agressiv...

dia #169
Fui mordido (...)

dia #170
Infelizmente, a amostra, que vinha-se mostrando cada vez mais agressiva, teve que ser eliminada. Creio que, agora sim, o projeto esteja encerrado.
Devo apenas juntar minhas coisas e deixar o laboratório nos poróximos dias.

dia #171
(...)-me estranho. Passei mal durante o dia inteiro.
(...) vômitos, calafrios... pulsação baixando
(...)
uita fome.

(Ilegível. Pela sequência, provavelmente dia #181)
Meu Deus, o que eu fiz?
O que eu fiz com a srta. Bailey?
Que horror!
Que horror!
Eu tinha muita fome (...)

(provavelmente #dia 182. Apenas uma frase legível em todo esta página do diário)
(...) já não sou mais eu mesmo (...)

dia ####################
qdeorfntyfbbrceis bhrvnrkwdljcbeubjdcs
deufbefjeefd fome fnrgru  rjgjrijfe
odfepep hhrffbfbf

(dia seguinte. sem indicação)
to cbcedc edfnfjpppppoododd
fome
nnmkklels gfdddddoooppxx

dia#? nao sei mais em que dia de experiencia estou
cosegui injetar em mim mesmo uma medicacao que havia testado nos macacos e recuperei creio que temporariamente alguma razao. estou morrendo eu sei. alias ja estou morto pois nao tenho mais pulso estou frio. foi (...) experiencia. o soro noa pode ser produzido. ele mata e traz de volta a vida. mas quando se volta na verdade ja se esta morto e ................................. diferente. com fome (...) fome do qe houver pela frente (...) de outros humanos.
(...) eliminar o projeto r. não posso permitir que ele seja levado adiante.
(...) que ele seja conhecido.
(...) superiores não devem saber que pretendo destruir o projeto e todos seus registros (...) talvez o objetivo do exeército tivesse sido exatamente (...)
(...) espalhando gasolina (...) laboratório.
(...) elesestõachegando!!!!!!!!!!!!!!!!!!!1111111111111111111111opvodnddddkhjfjf
(...) fogo
...................................................


Não há como confirmar precisamente mas, com base nas descrições dos sintomas feitas pelo Dr. Stewart, é bastante provável que a presente epidemia que ameaça praticamente todo o mundo neste momento tenha alguma ligação com o próprio Projeto R e com suas pesquisas, e que, mesmo com a tentativa de eliminar-se todas as amostras e experimentações, algum soldado ou bombeiro que participou do socorro, de alguma forma tenha sido infectado e a partir daí espalhado o mal.
Acreditamos que os materiais salvos do incêndio, da Divisão de Ciências do Grupamento Militar, nas condições que se encontram, queimados, extraviados e bastante reduzidos, sejam insuficientes para dar-nos algum indicativo de como deter a peste.
Prossegiremos em nossas pesquisas. 
E que Deus nos ajude.


Dr. William Otterlay
Centro de Controle de Doenças, Atlanta, GA
27 de outubro de 2019






Cly Reis


quinta-feira, 30 de junho de 2022

Gil 80 Anos - As 80 músicas preferidas pelos fãs


E ele chegou aos 80. Tomado de significados, o aniversário de Gilberto Gil está sendo uma celebração nacional. Por vários motivos: ele é a nossa arte maior, o nosso orgulho enquanto povo, a representação da nossa raça, da nossa sapiência espiritual, da nossa resistência política e cidadã. O Brasil que deu (que pode dar) certo. No Clyblog, basta fazer uma breve pesquisa pelo nome deste artista que se encontrarão diversas referências, talvez a de maior volume nestes quase 14 anos de blog.

Tanto é que nós, como se parentes ou súditos muito próximos, haja vista que sua arte perfaz nossas vidas desde crianças, aqui estamos reunidos para celebrar os 80 anos deste baiano que quis falar com Deus e conseguiu. Gentes de diferentes idades, estados, profissões, mas impregnados da mesma admiração pela vasta, vastíssima obra de Gil, um autor, assim como o mano Caetano Veloso – o próximo oitentão da turma – capaz de produzir misteriosamente com uma qualidade superior por décadas a fio praticamente sem quebras neste alto padrão artístico.

O “nós” a quem me refiro, claro, inclui-me, mas vai além disso. Somos oito seguidores da egrégora Gil das áreas do jornalismo, da arquitetura, da biblioteconomia, da arquitetura, da produção cultural e outros e, claro, da própria música. O talentoso músico paulista Mauricio Pereira, que já versou Gil n’Os Mulheres Negras, é um dos que generosamente colaboram conosco elencando suas preferidas. Como ele, tivemos a árdua tarefa de escolher cada um 10 músicas, chegando, devota e festivamente, à soma de 80, igual a suas primaveras completas no último 26 de junho.

Creio que, daqui a 2 anos, quando Chico Buarque completar esta mesma idade (o que todos esperamos), talvez haja comoção parecida. Mas somente parecida. Gil guarda particularidades junto ao coração das pessoas que somente ele é capaz de provocar. Tanto que não foi assim quando Roberto chegou ao time dos oitentões, nem com ErasmoTom Zé, FloraHermeto, Donato e nenhum outro da música brasileira que já tenha rompido a barreira das oito décadas. Além de recentemente sentar-se na cadeira da eternidade da Academia Brasileira de Letras, ratificando o que construiu ao longo de 60 anos de carreira, a própria imortalidade, este aniversário de Gil é um aniversário de todos: dos fãs, dos brasileiros, da América preta e mestiça, da África diáspora, da cultura latino-americana, da arte universal. De nós.

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Kaká Reis

produtora cultural
(Rio de Janeiro/RJ)

"Gil sempre fez parte da minha vida. Meus dois irmãos (autores desse blog), mais especificamente Daniel, sempre trouxeram suas melodias e letras para perto e realmente conquistaram meus ouvidos a ponto de 'Tropicália 2' ser, com ainda uns 7 anos de idade, meu disco favorito. Um ancestral vivo, ativo, criativo, que eu posso ver com meus olhos, ouvir com os ouvidos e sentir com a alma… assim é Gil. Um griot da sabedoria!”

1. "Super-homem, a Canção" ("Realce", 1979)
2. "Haiti" (com Caetano Veloso, "Tropicália 2", com Caetano Veloso, 1993)
3. "Domingo no Parque" ("Gilberto Gil", 1968)
4. "Abre o Olho" ("Gilbert0 Gil Ao Vivo" ou "Ao Vivo no Tuca", 1974)
5. "Refazenda" ("Refazenda", 1975)
6. "Sarará Miolo" ("Realce", 1979)
7. "Quanta" ("Quanta", 1997)
8. "Parabolicamara" ("Parabolicamará", 1992)
9. "Nos Barracos da Cidade" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
10. "Drão" ("Um Banda Um", 1982)


Leocádia Costa

publicitária, produtora cultural e locutora
(Porto Alegre/RS)

"Escolher 10 canções na imensa e maravilhosa discografia de Gilberto Gil, Ave, é desesperador. Quando recebi o convite de participar dessa homenagem por ser uma fã dele e da sua expressão, precisei estabelecer algum critério para escolher 10 canções. Gostar, gosto de praticamente tudo o que ele canta, então esse não seria um critério adequado. Depois, pensei naquelas canções que me tiram do chão, me fazem vibrar em espirais que só ele produz. A missão de escolher ficou ainda mais complexa, porque algumas canções de Gil dizem o que meu coração gostaria de dizer, ou aquilo que minha cabeça pensaria, ainda coloca na minha boca a indignação ou a descoberta mais sensível dos inúmeros graus da Espiritualidade que ele percorre. Então, descartei esse critério também. Daí me dei conta que boa parte das iniciais 33 canções que eu havia escolhido se dividiam entre canções que estão eternizadas na voz do Gil e outras que eu escuto na voz dos seus intérpretes sendo praticamente deles (Cássia Eller, "Queremos Saber"; Rita Lee, "Panis et Circenses", João Donato, "Bananeira"; Dominguinhos, "Só quero um xodó"; Elis Regina, "Rebento"; e Cazuza, "Um trem pras estrelas", só para citar algumas, sendo impossível nominar as composições de Gil e Caetano que me nutrem a alma). Então, cheguei ao critério que me fez melhorar um pouco a seleção para chegar nas 10 escolhidas: destacaria somente aquelas canções que, para mim, são ouvidas na voz do compositor e que me marcaram profundamente e aí estão elas!"

1. "Lamento Sertanejo" ("Refazenda", 1975, com Dominguinhos)
2. "Sitio do Pica-Pau Amarelo" (Trilha sonora "Sítio do Pica-Pau Amarelo", 1977)
3. "Filhos de Gandhi" ("Gil & Jorge" ou "Xangô/Ogum", 1974, com Jorge Ben)
4. "Drão"
5. "Tempo Rei" ("Raça Humana", 1984)
6. "Vamos Fugir" ("Raça Humana", 1984, com Liminha)
7. "Domingo no Parque"
8. "Zumbi (A Felicidade Guerreira)" (Trilha sonora "Quilombo", 1985, com Wally Salomão)
9. "Aquele Abraço" ("Gilberto Gil", 1969)
10. "São João, Xangô Menino" ("Gilberto Gil ao vivo em Montreux", 1978, com Caetano Veloso)




Tatiana Viana

assessora de planejamento da Secretaria da Cultura de Viamão
(Viamão/RS)

"Acho que ele tem lugar garantido no coração, em algum lugar da memória afetiva de todo brasileiro, uma obra ampla, maravilhosa, que fala dos dilemas humanos, de amores e sofrimentos da vida de um modo geral, a desigualdade social, cultura. Gil é um pouco de cada um de nós e nós carregamos um pouco dele em nossas vidas."

1. "Emoriô" (por João Donato, "Lugar Comum", 1975, com Donato)
2. "Extra" ("Extra", 1983)
3. "Nos Barracos da Cidade"
4. "Tempo Rei" 
5. "Esotérico" ("Um Banda Um", 1982)
6. "Drão"
7. "Andar com Fé" ("Um Banda Um", 1982)
8. "Parabolicamará"
9. "Buda Nagô" ("Parabolicamará", 1992)
10. "Metáfora" ("Um Banda Um", 1982)




Maria Joana Lessa

jornalista
(Rio de Janeiro/RJ)

“Eu acho que Gil é um orixá vivo”.

1. "Extra"
2. "Afoxé É" ("Um Banda Um", 1982)
3. "Abre o Olho"
4. "Sarará Miolo"
5. "Refazenda"
6. "Back in Bahia" ("Expresso 2222", 1972)
7. "Domingo no Parque"
8. "Filhos de Gandhi" 
9. "Babá Alapalá" ("Refavela", 1977)
10. "São João, Xangô Menino"




Clayton Reis

arquiteto, cartunista e blogueiro
(Rio de Janeiro/RJ)

"Tarefa dificílima! Sempre me ocupei meramente em apreciar e nunca em elencar minhas preferidas. Numa obra tão linda, nunca me preocupei em saber se eu gostava mais dessa ou daquela. Enfim, aí estão as 'do momento'. Talvez depois me arrependa e pense em alguma injustiçada que não entrou. Mas por agora,  minhas 10 são  essas aí..."

1. "Drão"
2. "Febril" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
3. "Domingo no Parque"
4. "Refazenda"
5. "Roque Santeiro (O Rock)" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
6. "Raça Humana" ("Raça Humana", 1984)
7. "Ela" ("Refazenda", 1975)
8. "Back in Bahia"
9. "Parabolicamará"
10. "Lamento Sertanejo" 




Luciana Danielli

bibliotecária
(Niterói/RJ)

"Gil, baluarte da música brasileira e o maior ministro da cultura que o Brasil já teve! Grande artista!!!! Parabéns Gil! Feliz 80!"

1. "Marginália II" ("Gilberto Gil", 1968, com Torquato Neto)
2. "Refazenda"
3. "Tempo Rei"
4. "Aquele Abraço" 
5. "Toda Menina Baiana" ("Realce", 1979)
6. "Domingo no Parque"
7. "Expresso 2222" ("Expresso 2222", 1972)
8. "Lamento Sertanejo"
9. "Refavela" ("Refavela", 1977)
10. "Pela Internet"  ("Quanta", 1997)




Daniel Rodrigues

jornalista, escritor, radialista e blogueiro
(Porto Alegre/RS)

"'Gil engendra em Gil rouxinol', cantou Caetano usando as palavras do poeta Souzândrade para falar de Gilberto Gil. A obra de Gil é gigante em vários sentidos, por isso, misteriosa. Inclusive no assombroso volume de canções da primeira linha da música mundial. E quantas que eu adoro tiveram que ficar de fora da minha lista! 'Aqui e Agora', 'O Oco do Mundo', 'Haiti', 'Febril', 'Rock Santeiro (O Rock)', 'Beira-Mar', 'A Balada do Lado sem Luz'... Apenas 10 é pouco para representá-la e representá-lo, mas creio que, sim, muito bem representadas quando junto às 10 de todos nós. Viva Gil!! Axé!"

1. "Filhos de Gandhi"
2. "Lamento Sertanejo"
3. "Back in Bahia" 
4. "Drão" 
5. "Cores Vivas" ("A Gente Precisa Ver o Luar", 1981) 
6. "Domingo no Parque"
7. "Palco" ("A Gente Precisa Ver o Luar", 1981)
8. "Queremos Saber" (por Erasmo Carlos, "A Banda dos Contentes", 1976)
9. "Cinema Novo" ("Tropicália 2", com Caetano Veloso, 1993)
10. "Lamento de Carnaval" ("Quanta Gente Veio Ver", 1998, com Lulu Santos)




Maurício Pereira

músico e jornalista
(São Paulo/SP)

Difícil demais escolher 10 músicas do Gil pra passar pra vocês, o repertório dele tem coisas fundamentais, de cara eu já pensei numas 30… E não tou falando não como o Maurício músico ou compositor, não. Falo como ouvinte, como um brasileiro comum que se serviu da poesia, da sensibilidade, da inquietude filosófica, da visão de mundo desse artista, pra poder tentar entender e viver o mundo (e o Brasil) dum modo mais profundo e mais misterioso. Salve o Gil! .”

1. "Retiros Espirituais" ("Refazenda", 1975)
2. "Jeca Total" ("Refazenda", 1975)
3. "Vitrines" ("Gilberto Gil", 1969)
4. "Aquele Abraço"
5. "Louvação" ("Louvação", 1966)
6. "Raça Humana"
7. "Domingo no Parque"
8. "Batmacumba" (por Os Mutantes, "Tropicália" ou "Panis et Circensis", 1968, com Caetano Veloso)
9. "Meio de Campo" (por Elis Regina, "Elis", 1973)
10. "Tradição" ("Realce", 1979)



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As mais votadas

- "Domingo no Parque" - 7 votos
- "Drão" - 5 votos
-"Lamento Sertanejo", "Refazenda" e "Tempo Rei" - 4 votos
- "Back in Bahia" , "Parabolicamará", "Aquele Abraço" e "Filhos de Gandhi" - 3 votos
- "Abre o Olho", "Raça Humana", "Extra", "Sarará Miolo", "Nos Barracos da Cidade" e "São João, Xangô Menino" - 2 votos
"Super-homem, a Canção", "Haiti", "Quanta", "Sitio do Pica-Pau Amarelo", "Vamos Fugir", "Zumbi (A Felicidade Guerreira)", "Emoriô", "Esotérico", "Andar com Fé", "Buda Nagô", "Metáfora", "Afoxé É", "Babá Alapalá", "Febril", "Roque Santeiro (O Rock)", "Ela", "Marginália II", "Toda Menina Baiana", "Expresso 2222", "Pela Internet", "Cores Vivas", "Palco", "Queremos Saber", "Cinema Novo", "Retiros Espirituais", "Jeca Total", Vitrines", "Tradição", "Meio de Campo", "Batmacumba" e "Louvação" - 1 voto



Daniel Rodrigues