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quinta-feira, 28 de julho de 2016

Air - "Moon Safari" (1998)



"Tornou-se mais fácil e democrático criar música
e os home-studios foram se tornando cada vez mais sofisticados
até que chegamos a um ponto em que
começou a perder a graça, a ficar muito robótico,
 pejorativamente falando, artificial até demais.
Com isso, muitos músicos e artistas, consagrados e independentes,
chegaram ao ponto de voltar a fazer uso
dos equipamentos analógicos,
utilizando velhos clássicos como o Minimoog,
ou a nova leva de synths e drum-machines
fabricadas nos dias de hoje
pelas empresas Moog, Korg e Roland.
(...) Tudo isso com as novas técnicas, digitais ou não,
para dessa forma, mesmo com máquinas,
produzir música eletrônica  num processo
e com resultado mais "orgânico" e mais rico
em termos de qualidade sonora."
Paulo Beto
sound designer, DJ, produtor
e fundador da banda Anvil FX




Uma dupla de franceses que, quase no final do século XX, resolveu fazer música eletrônica à antiga. Bom..., quase à antiga. Embora seja inevitável a essas alturas, com toda tecnologia existente, deixar de utilizar os recursos disponíveis, Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunkel, encheram seu som de equipamentos quase esquecidos como Minimoog, sintetizadores Korg , valvulados, o velho Vocoder e o resultado foi um som sofisticadamente retrô.
Com cara de documentários dos anos 70, de jingles publicitários, de filmes de ficção científica, de sons automáticos, "Moon Safari" , do duo Air, French Band, como se apresentam na capa do álbum, é um dos projetos mais interessantes da cena eletrônica do final dos anos 90 antecipando uma tendência que cada vez mais se confirma do retorno a uma certa artesanalidade da música eletrônica depois de épocas pouco criativas e de excessiva automatização. O som robótico de "Sexy Boy", tão minimalista chegando a parecer quase como aqueles produzidos por brinquedos, é adorável, cantada em inglês na sua maior parte mas com o refrão sensualmente entoado em francês. "Remember" também carrega essa ambiguidade que é tipicamente kraftwerkiana do homem-máquina com uma introdução de um vocoder bastante marcante e duro é humanizada, por assim dizer, pelo próprio título da canção que de certa forma provoca como que perguntando "como esse 'robô' pode lembrar?". E lembrar, rever, reler é exatamente a proposta do álbum.
A belíssima "Talisman" tem um arranjo crescente extremamente bem elaborado e é enriquecida pelo preciso arranjo de cordas.
"La Femme D'Argent", que abre o disco é uma boa síntese da proposta retrô- futurista do álbum com sua base de baixo envolvente e elegante sobre a qual desfilam solos de órgãos e sintetizadores primitivos, s baladas "All I Need" e "You Make It Easy", ambas cantadas humanamente por belas vozes femininas são canções deliciosas e delicadas que remetem imediatamente à melhor tradição da música francesa; "Kelly Watch the Stars" com seu clima espacial é uma ótima canção pop; "Ce Matin La" seria perfeita para um comercial ou filme promocional setentista; e "New Star in The Sky", suave, flutuante, com sua doce melancolia parece uma viagem pelo espaço.
"Le Voyage de Penélope", a faixa final é outro dos grande momentos do disco coroando seu final com um show dos dois músicos nos sintetizadores acompanhados por um clarinete que dá um charme todo especial à canção.
O Air não reinventou a roda. Não fez nada que já não se tivesse feito em outro momento. Muita gente critica essa onda de revivalismo como sendo uma mera falta de recurso ou inventividade. Particularmente, acho válido e interessante quando feito com inteligência e criatividade o que é o caso do Air, que deu alguns passos atrás para, quem sabe, ter dado outros tantos à frente. Como dizia aquela frase de Chico Science, "modernizar o passado é uma evolução musical". E acho que talvez seja mesmo.

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FAIXAS:
1. La Femme d’argent
2. Sexy Boy
3. All I Need
4. Kelly, Watch the Stars!
5. Talisman
6. Remember
7. You Make It Easy
8. Ce matin-là
9. New Star in the Sky (Chanson pour Solal)
10. Le Voyage de Pénélope

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Ouça:


Cly Reis

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Air - "80º Below '82" (1983)



"'80° Below '82' foi o 'canto do cisne' do trio, um retorno ao formato e à magia dos primeiros anos. Como improvisador, Threadgill parecia criar um vocabulário e uma persona diferentes para cada instrumento que tocava. Todos eles compartilhavam uma paixão quase científica pela complexidade."
Piero Scaruffi,
historiador e crítico musical



Entre os discos que marcaram a minha história, está "80º Below '82", do trio Air, que não é o grupo francês. Este disco foi trazido para Porto Alegre pelo meu querido amigo David Barcellos, em 1982, a partir de uma lista feita por mim e pelo Mauro Magalhães.

O trio formado pelo saxofonista e flautista Henry Threadgill, pelo baixista Fred Hopkins e pelo baterista Steve McCall estava com tudo na época. A Down Beat só falava neles. É claro que aproveitamos a viagem do Davizinho pra Inglaterra, e ele trouxe esta maravilha pra gente. Gravei um cassete imediatamente e, quando surgiram os CDs graváveis, fiz uma cópia pra mim, que toquei muitas vezes no programa Sessão Jazz.

Como dizem os americanos, o interplay entre os caras é impressionante. O CD tem uma versão de "Chicago Breakdown", do Jelly Roll Morton, que vale o preço do disco. Infelizmente, o trio terminou. Em 1989, morreu o baterista McCall e, dez anos depois, o baixista Hopkins. Pra nossa sorte, o Threadgill está vivíssimo e esteve em São Paulo no Festival Jazz na Fábrica do SESC, em 2018, com seu grupo Zooid.

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FAIXAS:
1. "Chicago Breakdown" (Jelly Roll Morton) – 7:58
2. "The Traveller" – 9:28
3. "80° Below '82" – 8:02
4. "Do Tell" – 9:50
Todas as composições de autoria de Henry Threadgill, exceto indicada

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OUÇA O DISCO:

Paulo Moreira

quarta-feira, 28 de maio de 2014

The Jesus and Mary Chain - Vivo Open Air - Marina da Glória / Rio de Janeiro (27/05/2014)



Entrada do Vivo open Air,
proposta de sessão de cinema
ao ar livre seguida de show musical
Irmãos, eu vi Jesus!
Sim, sim, uma das minhas bandas favoritas, o The Jesus and Mary Chain, cujo álbum de estreia, "Psycho Candy" é meu disco de cabeceira frequentemente citado como um dos melhores dos naos 80, estava ali na minha frente, como um milagre. Como um milagre, sim, porque assim como o filho do Homem, ressuscitou, depois de uma longa inatividade para uma turnê, que por felicidade passou por essas terras.
Sim, Jesus está entre nós!
Shwarzie encarnando o impiedoso robô
do futuro na telona na Marina da glória
Depois de uma sessão de cinema ao ar livre com a exibição do filme o Exterminador do Futuro, ao qual eu já tinha assistido zilhões de vezes, mas que queria ver como seria numa tela grande, ao ar livre e dentro da proposta do evento, o Vivo open Air, que na verdade não é nada mais do que um grande drive-in daqueles antigos, só que sem carro, era hora de encontrar os irmãos Reid, e sua corrente de Jesus e Maria, uma das bandas mais significativas e cultuadas das últimas décadas no rock mundial.
E, irmãos, eu encontrei Jesus!
"Snakedriver" pra abrir. Delírio!!! "Head On" na sequência. Pra enlouquecer!!! "Far Gone and Out", "Between Planets", "Blues for a Gun"... Uau!!! Foda, foda, foda! Mesmo com meus joelhos detonados (minha condropatia patelar) tive que ir lá pro burburinho. Pulando e me batendo com a galera. Ah, foda-se!
Jesus cura!
Os irmãos Reid no palco. Ao centro Jim e à direita,
William exibindo uns (muitos) quilinhos a mais
Mesmo bem menos barulhentos, com um 'barulho' mais limpo, o repertório dos caras é matador e cada música executada era uma espécia de êxtase para os fãs. E vieram "Cracking Up", "Happy When it Rains", "Teenage lust", "Sidewalking". Yeah, yeah, yeah!!!
Sim, eu ouvi Jesus!
Bem mais simpático do que de costume com o público, acenando vez que outra, agradecendo os aplausos e bicando uma cervejinha o tempo todo, Jim Reid fez uma apresentação, se não perfeita, correta, enrolando-se com o fio e fazendo aquele tradicional vai-e-vem como pedestal do microfone, fazendo com que vários tivessem que ser substituídos. O surpreendentemente obeso, William Reid, ao contrário das negativas expectativas com base nos erros do show de São Paulo, foi bastante competente  e seguro na guitarra no comando daqueles solos simples, sem frescura mas extremamente cativantes. Se em São Paulo eles não haviam ensaiado, parece que o show de lá serviu de ensaio para o do Rio, que tecnicamente, de um modo geral foi bom e assim, sem maiores percalços, a primeira parte do show terminou com a doce/ácida "Just Like Honey" com uma convidada que foi chamada para fazer o backing vocal feminino mas cuja voz praticamente não foi apareceu. Jim anunciou então que aquela fora a última música e a banda saiu apressada do palco deixando a dúvida "Jesus breve voltará?". Sabendo do temperamento da dupla não era de se estranhar que a ameaça de nos deixar se confirmasse. Mas felizmente não.
Jesus voltou!
Depois de uma breve pausa voltaram, aí sim, caprichando na ruideira, nas microfonias e nas distorções para uma dobradinha "Psycho Candy", com "The Hardest Walk" e "Taste of Cindy", fechando em seguida com o clássico "Reverence" numa performance empolgante. Mas agora sim era o fim. Um show relativamente curto, mas conhecendo como conhecemos os rapazes já foi grande coisa que tenham dado o show e que não o tivessem abandonado no meio como faziam em outros tempos.
Saí contemplado por ter visto aquilo. Por ter finalmente visto uma das bandas que mais gosto e admiro e por ter ouvido ao vivo algumas das músicas que ainda hoje me marcam muito.
Eu fui abençoado.
Amém!

trechinho de "Teenage Lust" gravado de celular
(perdoem a qualidade do áudio)


sábado, 5 de abril de 2014

Jeff Beck - "Blow by Blow" (1974)




“A música deste disco
preenche a lacuna entre
o rock branco e Mahavishnu Orchestra,
ou jazz-rock” 
Jeff Beck



Há muito tempo, tinha vontade de escrever sobre minhas preferências musicais. Agora, depois dos 50 (um pouco depois, na verdade), resolvi tomar coragem e colocar no "papel virtual" minhas impressões sobre aqueles discos que significam muito pra mim. Um de suma importância é um clássico do fusion, que foi a minha porta de entrada no jazz propriamente dito: "Blow by Blow", do guitarrista inglês Jeff Beck.

Pra começar, um pouquinho de história. Jeff Beck foi um daqueles talentos da guitarra que surgiram na década de 60 em Londres, ao lado de Eric Clapton, Peter Green e Jimmy Page, entre outros. Ele integrou os Yardbirds, fez um disco de blues considerado clássico chamado “Truth” com a Jeff Beck Group e montou outras diversas bandas (entre elas, um power trio Beck, Bogert & Appice). Em 1974, porém, Beck estava numa encruzilhada: tinha desmontado o JB Group e o BBA e tinha ficado fascinado com a sonoridade conseguida no jazz-rock ou fusion de um colega guitarrista, o também inglês John McLauglhin, mentor e criador da Mahavishnu Orchestra. Ele monta então um quarteto para gravar seu novo disco no Air Studios, de propriedade de George Martin. Ao lado de Max Middleton nos teclados; Phil Chen no baixo e Richard Bailey na bateria, Beck viria a fazer história. O resultado foi “Blow by Blow”. O disco começa com um funk-jazz de primeira chamado "You Know What I Mean", que é uma espécie de carta de intenções do guitarrista. O swing é irresistível, mas ele não descuida do trabalho em grupo. Todos brilham. Na sequência, começa a aparecer a influência de Martin na produção: "She's a Woman", do repertório dos Beatles, composta por John Lennon e McCartney. Numa levada reggae, Beck acrescenta o som muito em moda na época do talk box, popularizado um ano depois por Peter Frampton em "Show me the Way".

Depois, vem uma música em que o título diz tudo: "Constipated Duck" ou pato resfriado. Munido de um pedal wah-wah e muitos efeitos, Beck brinca com a sonoridade de sua guitarra. Pra fechar o lado 1 (é, eu sou do tempo do LP e da fita cassete), uma dupla explosiva: "Air Blower", composta pela banda, e "Scatterbrain", de Beck e Middleton. Nestas duas faixas, sem intervalos entre uma e outra, o guitarrista exercita todo seu talento e exige uma performance além da conta de sua banda. Destaque absoluto pro baterista Richard Bailey, que faz coisas incríveis em seu instrumento, acompanhando as maluquices engendradas por Beck. No final de segunda, inclusive, Martin consegue romper o cerco e coloca sua orquestra pra dar um molho todo especial na pauleira fusion do quarteto. Depois de todo este virtuosismo, Beck nos brinda com uma das gravações mais bonitas que eu já ouvi em meus quase 53 anos de vida: "Cause We've Ended as Lovers", uma balada maravilhosa composta por ninguém menos do que Stevie Wonder. A relação entre os dois começou quando Beck gravou um solo no disco "Talking Book" de Stevie (já resenhado por Eduardo Wolff aqui nos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS). Depois, com o Beck, Bogert & Appice, fez uma versão da clássica "Superstition", que foi o grande sucesso do disco. Nesta balada, Beck geme, esperneia, se entorta todo com sua guitarra mostrando toda a tristeza que Stevie quis passar na canção. De tirar o fôlego.

Após isso, só mesmo um funkão em homenagem ao mestre Thelonious Monk pra gente poder respirar. Em "Thelonious", Stevie faz sua participação especial no clavinete. Em seguida, vem uma faixa estradeira, talvez a faixa mais roqueira do disco, chamada "Freeway Jam". O baixo de Phil Chen segura todas, enquanto o resto se esbalda na jam session. E, pra encerrar, um momento sublime do disco: "Diamond Dust". Outra balada, desta vez com as cordas arranjadas e regidas por Martin fazendo o contraponto à guitarra límpida de Beck. “Blow By Blow” é um disco seminal que eu não me canso de ouvir há exatos 38 anos.

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Curiosidades: Jeff Beck sempre montou bandas extraordinárias. Uma delas, a do disco “Truth” com Rod Stewart no vocal e Ron Wood no baixo. E Rod nunca se cansou de roubar os músicos de Beck. Primeiro foi o baterista Carmine Appice e, depois, o baixista Phil Chen. Os dois tocam no disco "Blondes Have More Fun", de 78, que tem o "sucesso" roubado de Jorge Ben, "Do Ya Think I'm Sexy".

Ganhei “Blow By Blow” em cassete do meu querido e saudoso primo José Carlos De Andrade Ribeiro, o popular Chico Caroço, que foi um pouco responsável pela minha educação musical. Mas esta é outra história...

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FAIXAS:
1. "You Know What I Mean" (Jeff Beck/Max Middleton) - 4:05
2. "She's a Woman" (John Lennon/Paul McCartney) - 4:31
3. "Constipated Duck" (Beck) - 2:48
4. "Air Blower" (Beck/Middleton/Phil Chen/Richard Bailey) - 5:09
5. "Scatterbrain" (Beck/Middleton) - 5:39
6. "Cause We've Ended as Lovers" (Stevie Wonder) - 5:52
7. "Thelonius" (Wonder) - 3:16
8. "Freeway Jam" (Middleton) - 4:58
9. "Diamond Dust" (Bernie Holland) - 8:26

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OUÇA O DISCO





quinta-feira, 2 de maio de 2019

Dead Kennedy's - "Frankenchrist" (1985)





“No contexto do disco,
está bastante claro que o pôster 
não é só uma brincadeira idiota”
Jello Biafra



É complicado a gente apontar um álbum melhor do que o grande clássico de uma banda porque o disco legendário vai estar, sempre ali fazendo sombra, sussurrando "Eu sou o maior!" e, no fundo, lá  no fundo, não  há  muito como negar. Mas tem aqueles que, se não são tão emblemáticos, representam o sinal definitivo de crescimento e maturidade. É o caso de "Frankenchrist" (1985) em relação  a "Fresh Fruit for Rotting Vegetables" . O álbum de estreia  dos Dead Kennedy's, de 1980, é clássico inconteste, amado e idolatrado de uma ponta à outra do planeta, e não sem razão. É um trabalho visceral no qual a sonoridade reflete perfeitamente o que o grupo pretendia e conseguia transmitir naquele momento. Mas "Frankenchrist", de 1985, é muito melhor tecnicamente. As músicas tem mais estrutura, são mais elaboradas, deixam mais evidente a influência da surf-music californiana que muitas vezes ficava escondida sob a fúria e a velocidade que definiram as músicas dos Kennedy's por quase toda sua existência. Existência  que, aliás,  foi abreviada exatamente em "Frankenchrist" por uma razão, de certa forma, um tanto banal. O encarte do álbum, idealizado pelo artista suíço H.R. Giger, o criador do design do personagem Alien, foi considerado obsceno, a banda processada, e o grupo não abrindo mão da arte, entendendo que a mesma complementava o conjunto artístico proposto no álbum, teve seus discos recolhidos e impedidos de serem comercializados, gerando prejuízos, transtornos e, no fim das contas, um desgaste que custou a vida da banda, depois de uma enorme demora para a definição do processo. 
"Landscape  #XX", mais conhecida como Penis Landscape,
a arte da polêmica. 
"Soup is a good food", que abre o disco, construída sobre um riff ondulante e cheia de alternâncias entre os instrumentos; a também bem estruturada "A growing boys need his lunch", de refrão poderosos e marcante; "Chicken farm", com seu andamento cadenciado e vocal ecoante; e as fantásticas "Goons of Hazard" e "This could be anywhere" de interpretação intensa e dramática de Jello Biafra, só comprovam o crescimento musical da banda e o salto de qualidade naquele momento com composições mais longas, mais elaboradas e com qualidade de produção. Mas faixas como "Hellnation", "Jock-O-Rama" e "MTV Get out the air", apesar da introdução enganosa, garantem a tradicional sonoridade mais rápida e barulhenta e mostram que os Kennedy's podiam até ter agregado mais elementos mas não haviam esquecido do hardcore. Aproximando-se do fim do disco, esquisita e 'pesadona' "At my job" por sua vez, está mais para o dark do que para o punk, e para fechar, os DK acertam perfeitamente no equilíbrio entre o ímpeto punk e a evolução técnica com a boa "Stars and stripes of corruption".
Um disco do tempo em que os Dead Kennedy's encaravam o sistema e brigavam por uma arte mesmo que isso viesse a custar caro, ao contrário do que aconteceu recentemente na divulgação da turnê brasileira, quando remanescentes da banda que seguiram com o nome e lançaram outros trabalhos mesmo depois da saída do líder Jello Biafra, cederam a pressões e, como se não bastasse, num primeiro momento, terem renegado o genial poster idealizado por uma artista brasileiro que havia mobilizado ainda mais os fãs para o evento e causado a ira dos apoiadores do atual governo brasileiro, ainda cancelaram as apresentações em terras brasileiras. Se tem um disco que simboliza de forma bem ilustrativa o oposto do ocorrido neste imbróglio da frustrada turnê brasileira, que simboliza o que é ser verdadeiramente punk e não se dobrar ao sistema, brigar contra censura, sistema jurídico, pressões sociais, falsa moral, conservadorismo e hipocrisia, esse disco é "Frankenschrist". 

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FAIXAS:
  1. "Soup Is Good Food" – 4:18 (Jello Biafra)
  2. "Hellnation" – 2:22 (D.H. Peligro)
  3. "This Could Be Anywhere (This Could Be Everywhere)" – 5:24 (Jello Biafra)
  4. "A Growing Boy Needs His Lunch" – 5:50 (Jello Biafra)
  5. "Chicken Farm" – 5:06 (Jello Biafra)
  6. "Jock-O-Rama (Invasion of the Beef Patrol)" – 4:06 (Jello Biafra)
  7. "Goons of Hazzard" – 4:25 (East Bay Ray, Jello Biafra)
  8. "M.T.V. - Get off the Air" – 3:37 (Jello Biafra)
  9. "At My Job" – 3:41 (East Bay Ray)
  10. "Stars and Stripes of Corruption" – 6:23 (Jello Biafra)

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Ouça:
Dead Kennedy's - Frankenchrist


Cly Reis

sábado, 8 de maio de 2010

Red Bull Air Race












DIRETO DA PRAIA DO FLAMENGO - Acompanhando, aqui a etapa brasileira do Air Race.
Demais!
Muita adrenalina e manobras radicais.
Tudo na paz. Galera na boa, curtindo a prova, ouvindo um som, sentados na areia, tomando umas geladas.
É isso aí. Grande espetáculo. Programaço pro sábado de manhã.


Cly Reis

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Underworld - "Second Toughest the Infants" (1996)

 



" 'Second Toughest in the Infants' 
perdura como um álbum marcante,
destacando o Underworld em seu
auge criativo e
permanecendo um documento importante
de uma época em que a 
música eletrônica dançante
experimental cerebral recebeu atenção
significativa do mainsteam."
Paul Simpson, da AllMusic



Conhecia o Underworld, basicamente do filme "Trainspotting, de 1996, e embora curtisse a intensa "Born Slipy", da trilha do longa, com seu vocal desalinhado e sua batida pesada, nunca procurei conhecer outras coisas dos caras. Só há pouco tempo, mais de vinte anos depois, resolvi ir atrás do disco que tinha a música do filme. E por que diabos eu esperei tanto tempo? "Second Toughest in the Infants" é incrível! Um dos grandes álbuns de música eletrônica já feitos. Uma viagem que passeia por diversos subgêneros do eletrônico ao longo da obra e, muitas vezes na mesma música, até mesmo porque como a maior parte das faixas são quilométricas, permitem idas, voltas, acelerações, recuos, desenvolvimentos, evoluções, inspiradas, criativas, surpreendentes e excitantes. 
A viagem já começa com o transe alucinante de mais de 15 minutos da "ópera eletrônica" "Juanita: Kiteless: To Dream of Love", um petardo altamente dançante, composto de três partes que se juntam e vão se somando à estrutura inicial, proporcionando algo entre a loucura e o deleite. "Banstyle / Sappys Curry" é um trance mutante que faz o ouvinte mergulhar numa verdadeira imersão sensorial. Sensualidade, mistério são as marcas mais destacadas de "Confusion the Waitress"; na minimalista "Rowla", a repetição, seria perturbadora se não fosse genial; e "Air Towel", muito viajandona, leva a uma espécie de nirvana."Blueski", a mais curtinha, tem uma pegada mais americana, meio country; "Stagger" é um caleidoscópio de sensações; e a espetacular "Pearls Girl", que lembra muito a clássica "Born Slippy", praticamente desenvolvida sob o mesmo conceito, é daquelas coisas de enlouquecer qualquer um numa pista de dança. Como diz sua letra, "Crazy, crazy, crazy..."!
"Born Slippy", que no fim das contas, foi minha motivação para ouvir mais do Underworld, na verdade nem era do álbum. Foi um single da época que, devido ao enorme sucesso, saiu numa reedição ampliada com mais quatro faixs e, posteriormente, numa reedição em disco duplo. Dos extras, todas merecem destaque. Além do hit que estimulou o relançamento, temos a ótima "Rez", muito kraftwerkiana, as atmosferas psicodélicas de "Cherry Pie", e "Pearls Girl (Carp Dreams)", uma boa remixagem da já destacada "Pearls Girl", uma das melhores faixas do disco.
Como o Underworld estará por aqui, por esses dias, para o festival C6 Fest, o momento não poderia ser mais propício para destacar um trabalho do grupo nos nossos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS, embora seja uma justiça bastante tardia de minha parte. Demorei quase 30 anos para conhecer o valor desse disco... Bom, é sinal que realmente sua qualidade permaneceu intacta durante todo esse tempo.



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FAIXAS:
  1. Juanita: Kiteless:To Dream Of Love 
  2. Banstyle / Sappys Curry 
  3. Confusion The Waitress
  4. Rowla
  5. Pearl’s Girl 
  6. Air Towel 
  7. Blueski 
  8. Stagger 
  faixas extras da 1ª reedição

     9. Born Slippy - Instrumental Version 
    10. Rez
    11. Cherry Pie 
    12. Pearls Girl (Carp Dreams) 

Disco 2 (reedição)
  1. Born Slippy - Instrumental Version 
  2. Cherry Pie 
  3. Oich Oich 
  4. Puppies 
  5. Mosaic
  6. Deep Arch 
  7. Confusion The Waitress (She Said)
  8. Rowla A1806
  9. Pearls - Version 2
  10. Born Slippy - Nuxx 

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Ouça:

Cly Reis

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Morcheeba - "Big Calm" (1998)



"Seria impossível para nós não 
soar como Morcheeba." 
Ross Godfrey

Os anos 90 foram, em termos de música pop, muito bem resolvidos, obrigado. Além dos remanescentes das gerações anteriores ainda a pleno vapor, como Peter Gabriel, Sting, The Cure, U2, Madonna, R.E.M. entre outros, houve uma série de bandas e artistas oriundos da última década do século XX que souberam aproveitar o melhor dos que os antecederam e valerem-se, igualmente, das novas possibilidades técnicas e sonoras de então. Se antes não era uma realidade comum o incremento dos elementos do hip hop ou da música eletrônica, por exemplo, ao pop-rock noventista isso estava na veia. Tinha Smashing Pumpkins, que sabia oscilar do heavy metal à mais delicada balada; a Portishead, original mistura de gothic punk, rap e dream pop com pitadas jazz; a The Cranberries, verdadeiros seguidores de Smiths e Cocteau Twins; a Jamiroquai, dignos da linhagem jazz-soul; a Massive Attack, onde o trip hop encontrava a medida certa da psicodelia indie rock e o clubber; ou a Air, a engenhosa dupla francesa que vai do clima das trilhas dos anos 50 a eletro-pop num passo.

Mas uma dessas bandas parecia unir todas as qualidades de suas contemporâneas. Tinha os samples e scratches do rap; a batida druggy do dub; a voz feminina adocicada; uma guitarra criativa e hábil; a atmosfera soturna; as texturas eletrônicas; os hits cantaroláveis. A dois anos de fechar a década de 90, os ingleses do Morcheeba catalisavam tudo isso em “Big Calm”. Completando 20 anos de lançamento, o segundo álbum da banda liderada pela cativante cantora Skye Edwards e os talentosos irmãos Paul, DJ, e Ross Godfrey, guitarrista e vários outros instrumentos, é certamente um dos mais bem acabados que a música pop já produziu.

Acordes de baixo e guitarra wah-wah anunciam a entrada da voz macia de Skye, que diz os versos: “Flocking to the sea/ Crowds of people wait for me” (“Flocando para o mar/ Multidões de pessoas esperam por mim”). É “The Sea”, um dos hits do disco. Uma batida funkeada arrastada, peculiar do estilo downtempo, entra para ajudar o arranjo a se avolumar aos poucos. Ao final, já se somaram à cozinha scratches e uma orquestra de cordas, além de solos de guitarra de Ross. Pode-se compará-la em clima e estrutura a “All I Need”, da Air, e “It’s A Fire”, da Portishead. A marcante faixa de abertura é seguida da brilhante "Shoulder Holster", esta, um funk bem mais empolgado e onde aparecem pela primeira vez as influências indianas, seja nos samples de vozes, seja no som de cítaras e percussões típicas da terra de Ravi Shankar.

Outra faceta da Morcheeba está em "Part of the Process", que é o folk-rock. O violão de cordas de metal de Ross segura o riff, enquanto sua slide guitar solta frases em todo o decorrer do tema. Igualmente, o violino bem country de Pierre Le Rue. Tudo, claro, não sem diversos efeitos eletrônicos. O refrão, daqueles que pegam no ouvido, vem numa batida funky, enquanto Skye canta: “It's all part of the process/ We all love looking down/ All we want is some success/ But the chance is never around”. Num estado parecido, mas injetando a sonoridade indiana, a boa instrumental "Diggin' a Watery Grave" funciona quase como uma vinheta em que Ross destrincha sua habilidade com a cítara e uma guitarra pedal steel muito country, aproximando oriente e ocidente.

Retomando a atmosfera viajandona do downtempo de “The Sea”, outro hit de “Big Calm”: "Blindfold".  Mais que isso: exemplo de perfect pop. Acerto do início ao fim: estrutura melódica, composição, execução, arranjo, produção.  A negrinha Skye dá um show de vocal com sua voz afinadíssimo e cujo timbre suave, quase frágil, mas com uma pitada de rouquidão que a aproxima das cantoras da soul. Ao final, mais uma vez as cordas adensam a emotividade da canção. E outro refrão de cantarolar junto com ela:  “I'm so glad to have you/ And it's getting worse/ I'm so mad to love you/ And you evil curse.” 

Os sucessos (e os clássicos) de “Big Calm” não param: na sequência, vem "Let Me See", misto de trip hop e canção pop. Arrebatadora. Aqui, o grande responsável pela melodia é Paul Godfrey, visto que a música se constrói a partir dos beats e scratches criados ele. Já Skye, de tão bem que está, exala sensualidade. Dá pra viajar no seu canto lânguido e penetrante. Detalhe para a flauta doce que executa os solos do veterano Jimmy Hastings.

A outra “instrumental” do disco, “Bullet Proof”, mostra o quanto a Morcheeba é competente com a melodia e a instrumentalização. Trip hop típico, com samples psicodélicos e descontínuos que formam a base, tem como diferencial – além dos scratches do DJ convidado First Rate, que montam uma espécie de linha vocal com as vozes sampleadas – a brilhante guitarra de Ross. Ele mostra ser de uma linhagem de guitarristas britânicos do pós-punk, como Robin Guthrie e Johnny Marr: criativos e habilidosos, mas que usam o instrumento a serviço da ideia musical (efeitos, ambiências, texturas, etc.), sem necessariamente recorrer a rebuscamentos de solos extensos e desnecessários.

Já as baladas "Over and Over" e a rascante "Fear and Love” parecem ter saído de alguma sessão de gravação do Abbey Road em que George Martin arregimenta uma orquestra sobre a concepção musical de Lennon e McCartney. Românticas, têm, antes de mais nada, melodias caprichadíssimas. "Fear and Love”, em especial, conta com um violão que sustenta a base enquanto as cordas e metais formam o corpo sonoro ao fundo, fazendo lembrar bastante o arranjo também de um clássico do pop anos 80: “Please, Please, Please, Let Me Get What I Want”, dos Smiths. Precisa de mais referências que estas?

Mais uma joia, o reggae “Friction”, assim como Jamiroquai também cumprira com sua “Drifting Alone”, faz uma deferência aos mestres jamaicanos do gênero – ainda mais pela novamente linda voz de Skye, uma oferenda ao deus Jah. O disco finaliza com a lisérgica da faixa-título, em que concentram em 6 minutos o que há de melhor da banda. Sobre uma base em compasso 2/2, os irmãos Godfrey deitam e rolam. Paul, com a programação rítmica funk cadenciada, e, principalmente, Ross, que comanda os sintetizadores e a guitarra wah-wah, com a qual dá um verdadeiro show. O rapper Jason Furlow, coautor da música, engendra seus versos rappeiros enquanto o DJ Swamp lança scratches ao psicodélico tecido sonoro. Arrematando, Skye ainda faz suaves melismas, e o disco acaba num clima apoteótico.

Mesmo sendo um extra da versão em CD, "The Music That We Hear", outro hit, vale muito ser referida. Espécie de ula-ula estilizado, traz as síncopes do ritmo havaiano para dar forma a outro perfect-pop em que, mais uma vez, a melodia de voz – e a própria voz! – de Skye encantam. Com esta, termina um dos discos mais impecáveis da música pop, certamente um dos 10 melhores da sua década. Capaz de sintetizar aquilo que de bom ocorria à sua volta, a Morcheeba concebia assim, o seu estilo. Psicodélico, chapado (afinal, o pessoal gostava da erva:“morcheeba” significa “maconha” e “big calm” faz referência ao efeito tranquilizante da droga) e, acima de tudo, musicalmente rico. O que dizem os versos de “The Music...” parecem até, de certa forma, traduzi-los: “A música que fazemos curará todos os nossos erros e nos guiará”.

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FAIXAS:
1. "The Sea" – 5:47
2. "Shoulder Holster" – 4:04
3. "Part of the Process" – 4:24
4. "Blindfold" – 4:37
5. "Let Me See" – 4:20
6. "Bullet Proof" – 4:11
7. "Over and Over" – 2:20
8. "Friction" – 4:13
9. "Diggin' a Watery Grave" – 1:34
10. "Fear and Love" – 5:04
11. "Big Calm" – 6:00 (Godfrey/Godfrey/Edwards/Jason Furlow)
12. "The Music That We Hear" – 3:49 (bonus track)
Todas as composições de Paul Godfrey, Ross Godfrey e Skye Edwards, exceto indicada

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OUÇA O DISCO:
Morcheeba - "Big Calm"


Daniel Rodrigues

terça-feira, 14 de maio de 2019

Young Marble Giants – “Colossal Youth” (1980)



“Lá vem os jovens gigantes de mármore/
Trazendo anzóis na palma da mão.”
Renato Russo
da música “L’Age D’Or”, 
da Legião Urbana, de 1992

A história do rock é escrita por linhas tortas. Aliás, não poderia ser diferente em se tratando do gênero mais subversivo da história da arte musical. Seria superficial traçar um caminho direto que fosse de Berry-Elvis nos anos 50, Beatles-Stones-Velvet-Floyd nos 60, Led-Sabbath-Bowie-Pistols nos 70 e U2-Prince-Madonna-Metallica nos 80, chegando aos 90 da Nirvana-Beck-Radiohead. Às vezes, trabalhos distintos surgem para riscar um traço transversal no mapa do rock, demarcando algo novo e que se incluirá nessa linha evolutiva, influenciando artistas que virão dali para frente. Ou o que mais seria a Can, intersecção entre a psicodelia dos anos 60 e o krautcock alemão, que alimentaria as cabeças da galera da britpop dos 90? Ou Grace Jones, que, no início dos 80, se pôs entre o reggae jamaicano e a new wave para apontar rumos ao pop que viria logo em seguida?

Um desses acidentes altamente influentes na trajetória rock é a Young Marble Giants, trio indie galês que, com um único disco, “Colossal Youth”, lançado pelo icônico selo Rough Trade, em 1980, foi capaz de abrir caminho para toda uma geração influenciada pelos acordes básicos do punk mas, naquele início de década, já desejosa de uma maior leveza pop – a qual os punks, definitivamente, não entregavam em seu grito de protesto. Era o chamado pós-punk, subgênero a que a YMG é considerada precursora. Motivos para esse apontamento existem, haja vista as marcas que a música da banda deixou em ícones como R.E.M., 10.000 Maniacs, Everything But the Girl, Nirvana, Massive Attack, Air e MGMT.

E o mais legal: a YMG fez tudo isso se valendo do mínimo. O som é calcado em um riff de guitarra, base de baixo, teclados econômicos, leve percussão eletrônica e voz. Dito assim parece simplório. Mas aí é que começam as particularidades da banda. Não se trata de apenas uma voz, mas sim o belo canto de Alison Statton em inspiradíssimas melodias vocais. Os riffs, geralmente tirados da guitarra ou dos teclados de Stuart Moxham, cabeça do grupo, são bastante inventivos. Curtos, mas inteligentes, certeiros. As bases de baixo do irmão de Stuart, Phillip, seguem a linha minimalista assim como as programações rítmicas, as quais cumprem sempre um papel essencial em termos de harmonia e texturas.

"Searching for Mr. Right", que abre “Colossal...”, de cara apresenta isso: um reggae estilizado em que baixo e guitarra funcionam em complemento fazendo a cama para um vocal doce e cantarolável. Já o country rock "Include Me Out" lembra o som que outra banda britânica da Rough Trade faria alguns anos deli e se tornaria famosa: uma tal de The Smiths.

O estilo sóbrio e produzido com exatidão dá ao som da YMG uma aura de art rock, lembrando o minimalismo da The Residents mas sem o tom sombrio ou da Throbbing Gristle sem a dureza do industrial rock. Pelo contrário: a sonoridade é delicada e lírica. Até mesmo quando namoram com a dissonância, como em “The Man Amplifier” e na ótima “Wurlitzer Jukebox”, a intenção soa melodiosa.

A lista de fãs da YMG impressiona pela quantidade de ilustres. Kurt Cobain e Courtney Love, especialmente, teceram os maiores elogios aos galeses, revelando o quanto os influenciaram. ”Music for Evenings" e “Constantly Changing” deixam isso bem claro no estilo de compor, tanto no riff da guitarra, na função contrapositiva do baixo e na melodia de voz. Mas a que deixa a reverência do casal Cobain/Love mais evidente é "Credit in the Straight World", das melhores do disco e que traz todas as características do que tanto Nirvana quanto Hole produziriam anos mais tarde. Tanto é que a Hole fez-lhe uma versão em 1994, no seu exitoso disco de estreia “Live Through This”. Se o Pixies é “a banda que inventou o Nirvana”, "Credit...”, da YMG, pode ser considerada a música que cumpriu esse papel gerativo da principal banda do grunge.

A influência da YMG, no entanto, não termina aí. Percebem-se em outras faixas de “Colossal...” o quanto previram tendências do rock, que se revelariam somente mais adiante. As instrumentais “The Tax” e “Wind in the Rigging” lembram o gothic punk minimalista que Steve Severin e Robert Smith fariam no icônico “Blue Sunshine”, de três anos depois (assim como “Colossal...”, o único disco da The Glove); “Choci loni” e “N.I.T.A.” antecipam ideias da Cocteau Twins de “Treasure”, de 1984, e da Air de “Moon Safari”, de 1998; "Eating Noddemix" é tudo que a Frente!, banda dos anos 90, queria ter feito; “Violet”, maior sucesso da Hole, poderia ser denunciada como plágio de "Brand - New - Life"; e até mesmo no Brasil a bossa nova pós-punk da Fellini traz muito da construção melódica da YMG.

A considerar o hermetismo de P.I.L, Joy Division e The Pop Group, a pegada avant-garde de Polyrock e Gang of Four, a guinada para o reggae/ska da segunda fase The Clash ou a preferência synth de Suicide e New Order, a YMG pode ser considerada, sim, a precursora do pós-punk tal como este gênero ficou conhecido. Eles conseguiram unir todas essas forças sonoras advindas com o punk e a new wave e sintetizá-las de forma concisa e pop. Como que com “anzóis na palma da mão” muito bem arremessados, os“Jovens Gigantes de Mármore” lançaram ao longe as linhas que fariam içar uma série de outros organismos vivos do rock nas décadas subsequentes, marcando, com sua simplicidade e criatividade, o pop-rock até hoje. Linhas estas, aliás, tortas, evidentemente.

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FAIXAS:
1.    "Searching for Mr. Right" – 3:03
2.    "Include Me Out" – 2:01
3.    "The Taxi" – 2:07
4.    "Eating Noddemix" (Phillip Moxham/ Alison Statton) – 2:04
5.    "Constantly Changing" – 2:04
6.    "N.I.T.A." – 3:31
7.    "Colossal Youth" – 1:54
8.    "Music for Evenings" – 3:02
9.    "The Man Amplifier" – 3:15
10.  "Choci Loni" (Moxham/ Moxham) – 2:37
11.  "Wurlitzer Jukebox" – 2:45
12.  "Salad Days" (Moxham/ Statton) – 2:01
13.  "Credit in the Straight World" – 2:29
14.  "Brand - New - Life" – 2:55
15.  "Wind in the Rigging" – 2:25
Todas as músicas de autoria de Stuart Moxham, exceto indicadas.

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OUÇA O DISCO:


Daniel Rodrigues

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Primus - "Pork Soda" (1993)



"Lugar de fenômeno 
é no 'Isto é Incrível'. "


... foi o que sentenciou o crítico da revista Bizz sobre o baixista Les Claypool, líder e mentor da banda Primus, em sua resenha na seção de discos quando da época do lançamento do álbum "Frizzle Fry". Ainda que a redução a um número num show de atrações extraordinárias na TV possa soar um tanto antipática e cruel, como aliás costumeiro entre os jornalistas da revista, o crítico não deixava de ter uma certa razão uma vez que, Les, instrumentista dotado de uma habilidade incomum e dono de uma enorme criatividade musical, não raro, exagerava um pouco no exibicionismo quase que relegando a música, em si, a uma esfera secundária. Tenho certeza que não pela dica do crítico da Bizz, mas Clypool corrigiu bastante este porém no segundo disco "Sailing in the Sea of Cheese", fazendo-o bem mais musical e palatável e, parece que, já tendo dominado bem o meio-termo entre habilidade, experimentalismo e musicalidade, conseguiu unir todos esses elementos de forma mais coesa e interessante no ótimo "Pork Soda", de 1993. "My Name is Mud", por exemplo, que abre o álbum logo depois da pequena introdução de banjo, "Pork Chop's Little Ditty", é um show de destreza no baixo sem se tornar uma mera demonstração individual. Os três membros que num entrosamento perfeito e com desempenhos tão destacados quanto o do baixista, ajudam a conduzir a música de maneira brilhante e empolgante. Aliás, em "Pork Soda", o time completado por Todd Huth na guitarra e Jay Lane na bateria, confirma definitivamente a sincronia e entendimento necessários para o tipo de proposta sonora da banda, aqui, neste álbum, bem mais coletiva e completa.
Depois da pequena sinfonia pitoresca que é "My Name is Mud", temos uma sequência matadora com "Welcome to This World" de construção preciosa, a opressiva "Bob" na letra e na atmosfera sonora, e a eletrizante "DMV", uma das melhores do álbum na minha opinião.
 Outra das grandes, "Nature Boy" tem uma sua condução simples do baixo que na verdade só espera pela forte e intensa descarga de peso que surge no refrão; "The Pressman" tem construção semelhante, com um fraseado mínimo e repetido do baixo que, nas ênfases, vê se juntar a ele os outros instrumentos para juntos darem toda uma intensidade dramática à canção; e "Mr. Krinkle", pequena obra de arte escondida sob a habitual máscara jocosa da sonoridade do Primus, é brilhantemente desenvolvida em torno de uma linha de baixo tocado com arco, ganhando assim uma atmosfera entre o burlesco e o sinistro. Antes de encerrar com duas vinhetas, uma reeditando a faixa de abertura e outra saudando o bom velhinho ("Hail Santa"), o disco ainda traz a espetacular instrumental "Hamburger Train", uma jam jazz-funk alucinante na qual o trio se esbalda em improvisos e performances individuais livres, proporcionando uma viagem sonora contagiante.
Embora ainda tenha, sim, algumas esquisitices como na faixa-título na qual o baixo parece uma motossera, alguns experimentalismos como na instrumental, praticamente toda percussiva, "Wonded Knee", e pareça em alguns momentos uma trilha de desenho animado como em "The Air is Getting Slippery", de um modo geral, "Pork Soda" mostra-se mais harmônico e convidativo ao ouvinte.
Um dos grandes discos dos anos 90 de uma das bandas mais talentosas e criativas dos últimos tempos mas que normalmente não recebe o devido reconhecimento muito pelo fato do Primus soar um tanto caricato muitas vezes, um pouco por conta da imagem "engraçadinha" que construiu em videoclipes e performances ao vivo, um pouco por conta da voz anasalada de boneco de Les Claypool e outro tanto pela ligação com animações como "South Park" e Frango Robô, para as quais a banda compôs o tema musical, que dão a impressão, a muita gente que o Primus não é uma banda a ser levada a sério.
Recordo de uma vez, numa conversa com meu irmão, parceiro daqui do blog, Daniel Rodrigues, enquanto ouvíamos o Primus, admirados com aquele desempenho, com aquela mecânica, com aquela sonoridade, de ele me exclamar que não se espantaria se alguém, naquele momento, apontasse o Primus como a melhor banda do mundo. "Um absurdo!". Pode parecer um absurdo num primeiro instante, você vai pensar em mais um monte de bandas para colocar à frente, eu mesmo coloco dezenas, centenas. Mas um boa audição de "Pork Soda", impressionando-se mais e mais a cada faixa, pode ser o suficiente para colocar uma pulguinha atrás da orelha. Será? Depois, racionalmente, a gente até chega à conclusão que não mas, ali, durante a audição, que é capaz chegar a suscitar tal sensação, é.
Será?...

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FAIXAS:
1. Pork chop's little ditty (intrumental)
2. My name is Mud
3. Welcome to this world
4. Bob
5. DMV
6. The Ol' diamondback sturgeon (Fisherman's chronicles, part 3)
7. Nature boy
8. Wounded knee (instrumental)
9. Pork soda
10. The Pressman
11. Mr. Krinkle
12. The air is getting slippery
13. Hamburger train (instrumental)
14. Pork chop's little ditty (instrumental)
15. Hail Santa (instrumental)


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Ouça:


Cly Reis