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sábado, 11 de novembro de 2023

"Holy Spider", de Ali Abbasi (2022)




Outra cultura, outra realidade.
(mas que dá um ódio, dá)
por Vágner Rodrigues



Que filme necessário mas difícil de assistir ate o final. Vá sabendo disso.
O pai de família Saeed embarca em sua própria busca religiosa – para “limpar” a sagrada cidade iraniana de Mexede de prostitutas de rua imorais e corruptas. Depois de assassinar várias mulheres, ele fica cada vez mais desesperado com a falta de interesse público em sua missão divina.
Duas coisas importantes para você ver esse filme até o final são  que, primeiro: por mais que seja outra cultura, outros hábitos, você tem que estar preparado para o sentimento de revolta, em algum momento ele vai surgir. Outro ponto é um filme que você tem que estar atento a tudo, se você é da geração streaming e assiste a filmes fazendo outras coisas vai perder muito . 
Superadas algumas barreiras, você vai ter uma experiência magnífica, uma direção que sabe o tempo todo o que quer passar para o espectador. "Holy Spider" é muito imersivo e, tanto a narrativa quanto os  protagonistas colocam você em alerta o tempo todo, fazendo com que a gente fique constantemente no aguardo dos próximos passos de cada um.
Temos uma sequência que mostra a "interação" dos dois personagens principais e ela é de uma agonia que..., meu Deus. As interações entre eles, embora raras ao longo de toda a duração do filme, por conta das ótimas atuações dos atores são tão intensas que chegam a nos passar muita raiva.
Muito bem dirigido, "Holy Spider" tem o poder de transmitir  exatamente o que o diretor Ali Abbasi quer passar. Como falei, as atuações trazem uma verdade incrível, Zahra Amir Ebrahimi, como, Rahimi está maravilhosa, mas Mehdi Bajestani, como Saeed, faz facilmente você odiar seu personagem. Aquele ódio genuíno, sabe? Uma atuação assombrosa de boa.
As sequências dos assassinatos são regadas de tensão, porque a gente mais ou menos sabe onde elas vão terminar, sabe no que aquilo vai dar,  mas como são longas e começam desde Saeed andando de moto pela cidade à procura de vítimas, até chegar as lutas corporais em si, uma vez que o assassino gosta de métodos mais físicos, o clima é criado com sucesso e mantido com muita competência.
O longa, além do aspectos técnicos é muito bom por apresentar aspectos culturais. Você se sente em uma viagem ao Irã (mesmo que o filme não tenho sido gravado lá, uma vez que o governo não permite a filmagem de um filme tão crítico ao país). Todo ele é uma sequência de acertos, tanto na parte que aborda toda a cultura do país e sua crítica ao funcionamento das instituições como polícia, justiça e religião, como também tecnicamente é impecável, com uma narrativa imersiva e atuações  intensas, que prendem o espectador à história.
É difícil julgar uma cultura sem fazer parte dela, sem conhecê-la no dia a dia, e não é isso que pretendo, mas sim, salientar a importância de sempre estarmos abertos a conhecer novas realidades, muitas vezes até discordar de alguns costumes, sim, mas sabendo que aquilo é outra realidade.
Perseguidora e perseguido.
A dupla de protagonistas de brilhantes atuações





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"Um thriller policial diferente do que
você está acostumado a ver."
por Cly Reis



"Holy Spider" é um filme policial. Mas, espectador habituado aos padrões hollywoodianos, não espere as correrias, tiros, porradas e bombas. "Holy Spider" é um policial iraniano e como bom exemplar do cinema alternativo, independente, produzido fora dos Estados Unidos, traz uma abordagem mais sóbria e menos espetaculosa que a do cinema comercial para o gênero, além de manter a tradição de seus compatriotas como Abbas Kiarostami, Ashgar Farhadi e Jafar Panahi, de um cinema crítica e denunciatório em relação a assuntos polêmicos de seu país. "Holy Spider" é um filme de serial-killer, mas que envolve temas delicados como feminicídios, extremismo religioso, direitos humanos, liberdade de expressão, etc. Num sistema tão fechado quanto o do Irã, naturalmente, para realizar filmes assim, cineastas daquele país, não tem liberdade, autonomia ou permissão para mostrar essas realidades e, desta forma, não foi diferente com o diretor Ali Abbasi, que, assim como seus já citados compatriotas, teve que sair de sua terra para realizar seu projeto.
No filme, uma jornalista investiga um criminoso que mata prostitutas na periferia de uma cidade nos arredores de Teerã, sob o pretexto de estar realizando uma tarefa sagrada, tirando da rua aquelas pecadoras. Rahimi, indignada com a série de crimes e com a inação das autoridades, consegue a autorização de seu jornal para a investigação, embora essa permissão não signifique apoio. Tropeça na inação das autoridades, dribla a burocracia, esbarra no machismo, é emparedada pela religião, mas persiste e se aproxima perigosamente do assassino, que, por sua vez, inconformado pelo pouco reconhecimento público por seus atos "purificadores", continua a matar. 
Engana-se quem pensar que por não trazer a linguagem ocidental de produções deste gênero, com correrias, perseguições, lutas, o longa seja menos envolvente. Pelo contrário! Embora num ritmo contido, mais arrastado, como é característico desse cinema do oriente-médio, o espectador fica alerta o tempo todo, na expectativa a cada possível vítima, tenso a cada morte, a cada passo da jornalista, se frustra a cada percalço que a impede de se aproximar do criminoso, volta a se inquietar quando ela parece que finalmente encontrar o monstro, e fica verdadeiramente apreensivo, de roer as unhas, na sequência em que ela fica cara a cara com o fanático homicida.
Baseado em uma história real, "Holy Spider" é tão chocante pelos crimes quanto pela realidade do país em que a ação se passa. Os valores distorcidos, a religião, como pretexto, se sobrepondo a questões humanas elementares, a sociedade institucionalmente machista, o desprezo pela figura da mulher, a ação parcial e conveniente das autoridades, a ação nefasta do estado, tudo é tão condenável quanto a prática do assassino e, no fim das contas, incentiva que malucos como aquele do filme, e do fato acontecido na vida real, ajam dessa maneira.
Deve ser duro ser mulher no Irã...

 
"Holy Spider" - trailer





sábado, 20 de agosto de 2022

'Um Herói", de Asghar Farhadi (2021)

 



Independe da cultura, da religião, todos tem uma linha moral entre o que é aceito ou não.

Rahim está na prisão devido a uma dívida que não pôde pagar. Durante uma licença de dois dias, ele tenta convencer o seu credor a retirar a sua queixa contra o pagamento de parte da soma. Mas as coisas não correm de acordo com o plano.

 Por mais que haja uma barreira cultural por não ser um país com o qual tenhamos forte ligação cultural, isso não chega a atrapalhar a apreciação do filme do iraniano Ashgar Farhadi. O que realmente pode fazer o espectador virar a cara, um pouco, e que, particularmente, senti que atrapalhou minha experiência, é a forma como a história é narrada. Focando na vida de Rahim, o filme nos mostra as consequências das suas decisões e atitudes, com um olhar todo especial em seu passado e a importância que aquele momento tem em seus atos, sem contudo, nos mostrar muito, de fato. Há algumas lagunas não preenchidas que, particularmente, gostaria de ver esclarecidas. É claro que essa é uma visão muito pessoal  e qualquer outro espectador pode não sentir falta dessas respostas. A ligação com o passado está lá, é forte, mas parece que faltou algo...

 Um grande destaque para atuação de Amir Jadidi como Rahim, ele está impecável e o personagem é muito mais que aquilo que ele apresenta em tela. Seu jeito calmo e pacato, meio “bobo” inocente, esconde uma certa violência.

Não é e nem tem a pretensão de ser um grande clássico. "Um Herói" tem suas falhas narrativas, parece que falta algo (ou eu que não peguei), mas a mensagem é bem passada e você entende a proposta do filme, tratando da questão moral de "fazer o bem porque é a algo certo" vs. "fazer o bem pensando em ganhar algo em troca", mesmo que em ambas as hipóteses se esteja fazendo o bem. Mas o dilema deixa questões: é a mesma coisa? As consequências dos dois pode ser muito diferente?.

 Veja uma cultura diferente, veja uma bela atuação e veja como esta a sua moral e ética. Por exemplo: o que você faria com a bolsa de ouro? Recomendo muito “Um Herói”.

Um atuação bastante silenciosa mas muito impactante.



por Vagner Rodrigues


terça-feira, 10 de agosto de 2021

74º Festival de Cinema de Cannes - Os Premiados



O bizarro "Titane" ficou com o prêmio principal.
As Olimpíadas estavam começando, a gente meio que se perdeu, deixou passar mas, no último dia 17 de julho, se deu a divulgação dos vencedores do Festival de Cannes, uma dos mais respeitados e tradicionais mostras competitivas de cinema do planeta. Mesmo com algum atraso, mesmo tendo dado mole, marcado bobeira, pela importância do evento e porque a gente adora cinema, não dava pra deixar passar.
A vencedora foi uma mulher, a francesa Julia Ducournau, pelo intenso "Titane", filme em que uma menina que sofrera um acidente automobilístico na infância e tem implantada uma placa de titânio na cabeça, anos mais tarde passa a sentir atração sexual por carros e a cometer assassinatos de maneira compulsiva. A francesa de 37 anos já havia se notabilizado pelo excelente "Raw", um terror canibalístico incomum e impactante, que já causara alvoroço no Festival em 2016. Agora Julia se junta a Jane Campion, diretora de "O Piano", como, apenas, a segunda mulher a vencer o badalado prêmio francês, 28 anos depois do, até então, inédito feito, e decreta, definitivamente, que 2021 é o das mulheres nos cinema mundial!


Pra quem se perdeu, como nós, e não conhece ainda todos os premiados, segue abaixo, a lista com os vencedores em todas as categorias:

  • Palma de Ouro: "Titane", da francesa Julia Ducournau
  • Grande Prêmio: "A Hero", do iraniano Asghar Farhadi e "Compartment N. 6", do finlandês Juho Kuosmanen
  • Prêmio do Júri: "Ahed's knee", do israelense Nadav Lapid e "Memoria", do tailandês Apichatpong Weerasethakul
  • Melhor Direção: o francês Leos Carax por "Annette"
  • Melhor Roteiro: os japoneses Ryusuke Hamaguchi e Takamasa Oe por "Drive my car"
  • Melhor Atriz: a norueguesa Renate Reinsve por "The worst person in the world"
  • Melhor Ator: o americano Caleb Landry Jones por "Nitran"
  • Palma de Ouro de Honra: a atriz e diretora americana Jodie Foster e o diretor italiano Marco Bellochio
  • Câmera de Ouro: "Murina", da croata Antoneta Alamat Kusijanovic
  • Palma de Ouro de curta-metragem: "All the crows in the world", da honconguesa Tang Yi
  • Menção Especial de curta-metragem: "Céu de Agosto", da brasileira Jasmin Tenucci


C.R.

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

"Todos Já Sabem", de Asghar Farhadi (2018)



O encontro de um ótimo diretor com um ótimo elenco só poderia render um espetacular filme, com uma história que nos prende até o último segundo, como uma festa que a gente não quer ir embora.
Quando sua irmã se casa, Laura (Penélope Cruz) retorna à Espanha natal para acompanhar a cerimônia mas por motivos de trabalho, o marido argentino (Ricardo Darín) não pode acompanhá-la. Chegando no local, Laura reencontra o ex-namorado, Paco (Javier Barden), que não via há muitos anos. Durante a festa de casamento, uma tragédia acontece. Toda a família precisa se unir diante de um possível crime de grandes proporções enquanto se questionam se o culpado não está entre eles. Na busca por uma solução, segredos e mentiras são revelados sobre o passado de cada um.
É um roteiro muito bem construído e amarrado. Alguns podem achar que ele enrole demais, perca um certo tempo, especialmente no segundo ato, nos momentos de dramas e inúmeras cenas de diálogos. mas acredito que essa paciência, essa ausência de pressa, tenha sido uma forma que o diretor encontrou para nos colocar mais próximos e íntimos dos personagens.
As atuações estão nos detalhes, no choro, numa troca de olhares, nos diálogos, em pequenas frases. Penélope Cruz, Ricardo Darín e Javier Bardem mantém seus níveis altos de atuação, contudo, o que brilha mesmo é o roteiro. O longa consegue ir de um início divertido, leve e alegre para um drama pesado, de fotografia escura, em um apagar e acender de luzes. O diretor Ashgar Fahradi soube com maestria criar um clima de suspense, tensão e mistério e um ótimo exemplo disso é o momento em que descobrimos o sequestro, no pagamento do resgate. Você sente que tudo pode acontecer.
 As vantagens de se viver numa cidadezinha tranquila já sabemos, mas e as desvantagens? As fofocas, a falta de privacidade, todo mundo sabendo a vida de todo mundo, a dificuldade de se guardar segredos são, assim como brigas por terras, fantasmas do passados, amores mal resolvidos, e patriarcalismo, são elementos presentes no instigante “Todos já sabem”. O filme consegue abraçar todos estes itens e ainda contar uma história intrigante, com uma narrativa fluida que, mesmo após seu término, nos deixa inquietos, pensado no que será daquela família e daquela cidade depois de toda essa história.
Do drama profundo, da dor...

...à festa e alegria, e mais festa.




por Vagner Rodrigues