sábado, 20 de setembro de 2025
Dia do Baterista: os melhores na opinião dos bateristas (e não-bateristas também)
segunda-feira, 5 de setembro de 2022
V.S.O.P. - “Five Stars” (1979)
No jazz? Tão improvável quanto. Para formar um timaço de melhores, só se fosse no Japão! E não é que este milagre aconteceu? E, pasme-se: não foi nos Estados Unidos, berço do jazz, mas, sim, na Terra do Sol Nascente. O feito raro tem um responsável: Herbie Hancock. Além de ser um dos integrantes deste “dream team”, foi ele quem catalisou as intenções e teve a ideia de, junto com o empresário David Rubinson, formar a “The Quintet”. Mas uma reunião tão especial não poderia chamar-se de outro jeito que não de algo que transmitisse bem essa ideia. A criativa solução foi dar o nome ao grupo de V.S.O.P., sigla que significa, na linguagem etilista, "Very Special One Time Performance", ou seja, a classificação dada à bebida conhaque envelhecida de alta qualidade.
Para isso, Hancock chamou, claro, só os melhores. Amigos músicos tão brilhantes quanto ele: Ron Carter, para o baixo; Tony Williams, para a bateria; Wayne Shorter, no sax; e Freddie Hubbard, ao trompete. Todos “all stars”, todos band leaders, todos lendas do jazz, que tocaram com outras lendas como Charlie Parker, Dizzie Gillespie, Miles Davis, Tom Jobim e Art Blakey. Todos senhores de obras que revolucionaram o jazz e a música moderna. Estavam todos ali, milagrosamente juntos. Seja por currículo ou por talento, a V.S.O.P. era o verdadeiro “dream team” do jazz.
Para materializar essa conjugação tão estelar, Rubinson promoveu um histórico show em San Diego, em 1977, que foi registrado no álbum “The Quintet”. O projeto deu tão certo, que deu vontade de também produzirem algo em estúdio. Foi aí que a turma foi parar no Japão, onde já eram individualmente aclamados. Foi a conexão que faltava: além de realizarem um novo disco ao vivo naquele mesmo ano, “Tempest in the Colosseum”, que encerrava a turnê, a turma, principalmente Hancock, acabou ficando lá pelo outro lado do mundo. Somente em 1979, dos seis discos que o pianista lança naquele ano, entre projetos solo ou acompanhados, quatro são gravados em Tóquio e lançados pelo selo Sony Japan. Um deles é justamente o colossal “Five Stars”, da V.S.O.P., único trabalho de estúdio da banda e cujo título não poderia ser mais adequado.
Coube ao engenheiro japonês Tomoo Suzuki comandar as mágicas gravações de 29 de julho daquele ano, nos estúdios CBS/Sony, em Tóquio. Mesmo experiente e calejado, por incrível que pareça o que o quinteto traz é de um frescor surpreendente e até tocante, não fosse, principalmente e acima de tudo, empolgante. Donos dos melhores currículos do jazz, eles tocam com a graça de jovens iniciantes. É surpreendente e comovente o misto coração e habilidade que estes cinco amigos, senhores do mais alto nível da música internacional, entregam na exuberante faixa de abertura, “Skagly”. São 10 minutos que é fácil duvidar que qualquer criatura que goste de música queira que em algum momento acabe.
Sob a energia funk que todos conhecem e dominam, a faixa é um verdadeiro show de cada um dos participantes. Trata-se de um tema tão rico, que merece uma apreciação pormenorizada. A começar pelo autor, Hubbard. É ele quem dá as costuras altamente sofisticadas de fusion e hard bop do chorus. É ele quem estica as notas para os tons agudos, bem a seu estilo. É ele quem, com mérito, começa solando com a técnica invejável de quem tem seu nome gravado em álbuns como “Empyrean Isles”, de Hancock, “Free Jazz”, de Ornette Coleman, ou “Out to Lunch”, de Eric Dolphy. Carter: o único que não “sola”. Mas para quê? Afinal, o que o maior baixista da história do jazz faz é milagre. Quem conseguiria extrair tanta sonoridade, tanta personalidade do baixo acústico? Carter, que dispensara o baixo elétrico fazia tempo, prova por A mais B o porquê de sua escolha. Em “Skagly”, suas deliciosas ondulações e sua timbrística característica, aquela do quinteto mágico de Miles Davis e da sonoridade de Gil Scott-Heron, estão mais do que palpáveis: são uma caixa de ritmo. Só podia vir de quem já fez samba-jazz com Tom, Hermeto Pascoal e Airto Moreira.
Hancock: sabem aquelas notas que saltitam do piano em “Cantaloupe Island” e “Blid Man, Blind Man”? E a noção de ritmo repleta de groove e blues de quem contribuiu para a construção da sonoridade de gente como Miles, Shorter, Milton Nascimento, Lee Morgan e Joni Mitchell? De quem faz a improvável ligação entre Gershwin a hip hop? Pois é: Hancock em “Skagly” é tudo isso. Falemos, então, de Shorter. Bem, o que dizer de Shorter? A genialidade em forma de saxofone, a estirpe de Coltrane, a mente fusion da Weather Report, o buda do jazz, o solista incansavelmente criativo e hábil, o autor das obras-primas “Juju”, “Night Dreamer”, “Speak no Evil”? Pouco tem a se dizer e muito a aplaudir. Por fim, Williams. Este não ficou por último à toa, pois sua performance na faixa de abertura (nossa, isso, ainda é “apenas” a abertura do disco!) é, mesmo para os que sabem se tratar do, provavelmente, mais influente baterista da história do jazz, assombrosa. O que é I-S-S-O? Williams dá, literalmente, um show do início ao fim do tema, sem que isso, porém, se torne maçante ou confuso. Pelo contrário! É ele quem segura no punho o ritmo funk de cabo a rabo, mas não deixa de esmerilhar nas quebras e descidas. Quantas variações de rolos, polirritmia, mudanças de timbres! Conhecido por sua categoria nas baquetas, como as que executa em clássicos como “Maiden Voyage”, de Hancock, “Refuge”, de Andrew Hill, ou “Shhh”, de Miles, e inúmeros outros, aqui ele não economiza na explosão.
Bastaria falar apenas sobre a faixa de abertura, mas esses cinco jovens tarimbados não deixariam o ânimo cair jamais. Tanto que, na sequência, vem o sofisticado jazz bluesy “Finger Painting”, com lances modais e bopers fluindo naturalmente entre si, coisa de quem toca jazz de olhos fechados. O baixo de Carter escalona sons ondulados enquanto Shorter e Hubbard se encarregam de lançar frases em colorações medianas, Williams privilegia o tintilar dos pratos e chipô e Hancock mantém o clima onírico em notas claras e prolongadas. Em “Mutants On The Beach”, a terceira, hard-bop mais clássico e não menos gracioso, Carter novamente “carrega” no baixo, dando agora aos sopros maior amplitude para voaram com apoio do ritmo embalado marcado por Williams e Hancock. O pianista, aliás, confere dissonâncias perfeitas em seu improviso, ligando o anterior, de Hubbard, com o seguinte, de Shorter. Mas Williams estava chispando fogo como um dragão japonês, e manda ver num magnífico solo para terminar a música.
Sabe o gol de Carlos Aberto para a Seleção Brasileira sobre a Itália na final da Copa de 70? Ou a trinca “Golden Slumbers/Carry That Weight/The End” para encerrar o último disco dos Beatles, “Abbey Road”? É esta sensação que deixa “Circle”, a que finaliza o disco do “dream team” V.S.O.P. Quanta perfeição! Enigmática, é um misto de “In a Silent Way”, de Miles, com “Maiden Voyage”, com “Psalm”, de Coltrane, e mantra oriental. A melodia espiral, cadenciada pelo baixo já tradicionalmente assim de Carter, dá literalmente uma sensação de circularidade, absorvendo quem escuta numa atmosfera de vertigem. Ainda bem que se trata da menor faixa das quatro, pois se não os ouvintes entrariam em transe – se é que não entram.
Depois deste álbum japonês, a V.S.O.P. lançaria ainda apenas mais um disco também ao vivo como os dois primeiros antes de se dissolver ou transformar-se em outros projetos, visto que os integrantes seguiram contribuindo uns para os outros em vários momentos. Porém, embora a formação do grupo tenha se dado ainda nos Estados Unidos para um show quase comemorativo de músicos “envelhecidos de alta qualidade”, foi no Japão que este prosseguiu e onde se concretizou o histórico registro do quinteto em estúdio – feito que, infelizmente, nunca mais se repetirá uma vez que Hubbard faleceu em 2008. Contudo, é normal que “times dos sonhos” não permaneçam por muito tempo mesmo. A conjunção de fatores para que esse milagre ocorra é tão improvável que os deuses podem resolver que ela ocorra quando e onde menos se espera. No Japão, por exemplo.
FAIXAS:
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Daniel Rodrigues
segunda-feira, 20 de abril de 2020
Discos para (e de) quarentena
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| A Queen, isolada numa fazenda para gravar sua obra-prima |
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| Woodland, a casa que viu nascer "Trout...", da Captain Beefheart |
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Colaboração: Cly Reis
quinta-feira, 7 de março de 2019
Led Zeppelin - "Led Zeppelin II" (1969)
Tinha eu tenros 11 aninhos de idade quando ganhei meu toca-discos Phillips, daqueles cuja caixa de som é a tampa, bem pequeno, mas que me servia muito bem na época. Como não tinha muita grana pra comprar LPs, comecei a atacar as discotecas dos primos. As primeiras vítimas foram a Tania e o Clebar Derivi Barros, que moravam na César Lombroso. Peguei emprestado com eles três discos: "The Best of The Ventures", com a banda de surf music tocando o tema da série Batman; o disco psicodélico dos Stones, "Their Satanic Majesties Request", e o "Led Zeppelin II".
Fiquei fissurado pelos três mas o Led Zeppelin me impressionou, porque era “roquenrou” de verdade. Peso, muito peso. De cara, curti "Living Loving Maid" e "Whole Lotta Love". Aos poucos, fui entrando no clima da banda e passei a ouvir com atenção "The Lemon Song", "Heartbreaker", "Ramble On" e mais o resto do disco. Posso dizer que este LP preparou minha pobre cabecinha de guri para o que vinha pela frente. Continuei comprando os compactos da moda e ouvindo a Continental mas nunca mais me recuperei do "trauma" de ouvir Led Zeppelin aos 11 anos.
Tempos depois, aos 17, quando estava no cursinho IPV, a Yes Discos ainda na Rua da Praia fez uma superpromoção com todos os discos do Led sendo vendidos a um precinho razoável. Tentei convencer minha mãe a me dar de presente mas ela achou muito caro. Me vinguei anos depois, na era do CD, comprando TODOS os discos oficiais da banda. E descobri que alguém mais gosta de Led, especialmente do "Led IV", que sumiu lá de casa.
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FAIXAS:
1. "Whole Lotta Love" (Jimmy Page/Robert Plant/John Paul Jones/John Bonham/Willie Dixon) - 5:34
2. "What Is and What Should Never Be" (Page/Plant) - 4:47
3. "The Lemon Song" (Page/Plant/Jones/Bonham/Howlin' Wolf) - 6:20
4. "Thank You" (Page/Plant) 4:47
5. "Heartbreaker" (Page/Plant/Jones/Bonham) - 4:15
6. "Living Loving Maid” (“She's Just a Woman”) (Page/Plant) - 2:40
7. "Ramble On" (Page/Plant) 4:35
8. "Moby Dick" (instrumental) (Page/Jones/Bonham) - 4:25
9. "Bring It On Home" (Page/Plant/Dixon) - 4:19
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OUÇA O DISCO:
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
POA Jazz Festival - Centro de Eventos BarraShoppingSul - Porto Alegre/RS (9, 10 e 11/11/2018)
Começou a 4° edição do POA Jazz Festival no Centro de Eventos do BarraShopping Sul. Como não estou envolvido profissionalmente neste ano, pude acompanhar com atenção a primeira noite. Quem abriu os trabalhos foi uma das minhas bandas favoritas da nova geração: a Marmota Jazz. Como sempre, os meninos mostraram a qualidade de sua música aliada a uma apresentação expressiva. Com o repertório calcado no segundo disco, "A Margem", os marmotas impressionaram o público do festival com suas composições cheias de passagens intrincadas e soluções rítmicas que se transformam a cada instante. O guitarrista Pedro Moser estava particularmente inspirado mas a banda inteira deu show de musicalidade. Na metade do show, entra no palco o cantor Pedro Veríssimo. O repertorio mudou, passando para a reinterpretação de standards como "The Man I Love" e "My Funny Valentine". Este encontro do cantor com a banda está rendendo bons frutos e o caminho natural para esta parceria parece ser a gravação de um disco. Pedro foi feito para cantar com a Marmota e vive-versa. A surpresa foi a inclusão de "Time of the Season", da banda roqueira sessentista The Zombies. Em tese, um corpo estranho mas que Pedro e os Marmotas se encarregaram de "transformá-la" em outro standard.
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| A talentosa Marmota Jazz com o convidado já parceiro Pedro Verissimo |
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| As argentinas Bourbon Sweethearts: emulando o som dos grupos vocais femininos das décadas de 30 e 40 |
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| Mahanthappa hipnotizando o público com sua destreza |
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| Vitor Arantes Quarteto abrindo a segunda noite do festival |
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| Uma viagem ao hard-bop anos 50 com o quinteto de Mariano Loiácono |
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| Grupo do baterista Edu Ribeiro: formação não usual que agradou |
3ª noite – 11/11
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| Instrumental Picumã, uma das mais interessantes bandas surgidas nos últimos tempos no RS |
Toda a sonoridade do grupo é voltada para uma concepção acústica coletiva, o que não impede de destacarmos os trabalhos de Matheus no violão e de Bruno, se virando em vários instrumentos de percussão ao mesmo tempo. Destaque para algumas canções do primeiro CD como "Salsilla Y Scooby", "Milonguera" e "Chacareta".
Na sequência, tivemos o show mais descontraído de todo o festival: o mestre da harmônica Maurício Einhorn, acompanhado de duas feras: Nelson Faria, na guitarra, e o nosso querido gaúcho de Frederico Westphalen, Guto Wirtti, no baixo acústico. Como se estivessem na varanda, os três tocaram standards ("The Days of Wine and Roses"e "Blusette"), clássicos da bossa-nova ("Corcovado"), MPB ("Pra Dizer Adeus", numa linda versão) e as composições de Einhorn que ganharam o mundo ("Estamos Aí" e Batida Diferente"). O repertório era escolhido na hora, segundo a vontade do líder, que se esbaldou contando histórias, chamando o homenageado Zuza Homem de Mello ao palco e falando de seus amigos gaúchos. Tudo isso com o acompanhamento luxuoso de Faria e Wirtti, ambos dando um show de musicalidade. Claro que esta atmosfera relax conquistou o público, que acorreu em hordas aos bastidores após a apresentação.
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| Einhorn, sua harmônica e sua banda no show mais descontraído do festival |
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| O craque Peranzzetta: formação em trio que vai além da bossa-nova |








































